Montalegre, pelo Trilho do Leiranco

Por Ana Isabel Mineiro
Castelo de Montalegre
Castelo de Montalegre

Montalegre parece terra conquistada ao lobo; as torres cinzentas do castelo medieval saem de uma paisagem agreste, de uma beleza selvagem, e vários são os percursos marcados nos arredores que nos fazem penetrar na natureza. Escolhemos o Trilho do Leiranco, percorrendo campos cultivados, pequenas florestas e aldeias de pedra quase desabitadas, com uma aura de mistério. Relato de uma caminhada nas Terras do Barroso.

Serra do Leiranco

Primeiro há a atração do castelo, presença forte e teimosa no alto da colina sobranceira à vila de Montalegre. Rodeia-o uma colmeia de casas feitas da mesma pedra, algumas pintadas de branco, só a revelando nas cantarias que debruam janelas e portas. Sente-se um ritmo naturalmente calmo nas conversas de vizinhos, nas vendedoras que esperam clientes fora das lojas, na sombra fresca das ruas estreitas em redor do pelourinho.

Trilho do Leiranco: aldeia de Arcos
Chafariz e tanque na aldeia de Arcos

A história deixou outras marcas visíveis desde tempos pré-históricos, mas esta construção do século XIV é, sem dúvida, uma imagem de marca. À volta espalham-se as casas, que se vão misturando com uma paisagem feita do cinzento do granito e do verde das terras lavradas, dos pastos e das manchas de árvores.

O trilho que escolhemos para um dia bem “oxigenado” leva o nome da serra do Leiranco, já que é sobranceiro à sua encosta ocidental. Está bem marcado e assinalado com as marcas amarelas e vermelhas dos circuitos pedestres, e começa na aldeia do Zebral, aqui próxima. Uma dúzia de quilómetros que se fazem em quatro pausadas horas e muito mais rapidamente no regresso, passado o pasmo da descoberta.

O carro fica numa sombra enquanto avançamos para fora da população, primeiro por um caminho usado para chegar aos campos de batata e centeio, em direcção ao Santuário da Senhora dos Galegos, e depois por suaves montes desertos de gente que nos vão desfiando um rosário de povoações já pouco habitadas e muito tradicionais. O trilho é fácil, um percurso linear que “fazemos render” com paragens frequentes para apreciar a paisagem e a impressionante arquitectura de algumas aldeias, nomeadamente a de Arcos e a de Cervos, que marca o fim do percurso.

O Santuário da Senhora dos Galegos fica num pequeno bosque, fresco e húmido, e em frente à capela fechada, num socalco pedregoso, descobrimos as sepulturas antropomórficas escavadas na pedra descritas no folheto do turismo, pintadas pelo musgo. Transformadas em pequenas piscinas por qualquer réstia de humidade, dão o primeiro toque numa atmosfera encantatória que as flores espalhadas por campo aberto contrariam. Fora da zona agrícola, a atmosfera parece propícia a encontros com lobos e bruxas, mesmo num luminoso dia de sol – imagine-se durante um brumoso dia do longo inverno do Barroso. A atmosfera fica misteriosa à menor sombra, lembrando as bruxas em que ninguém acredita mas que as há, há, e que têm festa marcada em Montalegre todas as sextas-feiras 13.

Capela da Senhora dos Galegos
Capela da Senhora dos Galegos, Trilho do Leiranco

Não é isso que nos tira o apetite, que pede água fresca e bolachas enquanto se aprecia a sombra de carvalhos e castanheiros de grande porte. Mas certo é que, passando a aldeia de Cortiço e a ponte romana sobre o Rio Beça, a paisagem é tão agreste, coberta de rocha e mato, que bem podemos dar largas à imaginação: bruxas, lobos – quem sabe ursos, extintos na Península desde o século XVIII -, gnomos e duendes, podiam bem aparecer vindos das brenhas para indagar sobre a nossa presença. Mas a única presença confirmada é a das divertidas lontras que ainda nadam no Beça, e nem dessas tivemos notícia.

Em mais alguns passos chegamos a outra aldeia. É mais do que evidente que aqui não se pode viver sozinho, e daí os laços comunitários que ainda hoje subsistem em algumas povoações, como as vezeiras, o pastoreio dos animais por turnos (cabras e ovelhas), e o forno do povo, usado também à vez por todos.

Em Arcos damos com um forno comunitário e um magnífico conjunto de casas em redor de um fontanário público da época dos romanos, com um lavadouro ainda utilizado nos dias de hoje. Tudo feito no granito cinzento e maciço que transforma qualquer construção numa fortaleza: chão, paredes, espigueiros, muros e até telhados nascem desta pedra rija, que refresca no verão e protege do frio no inverno.

O caminho termina na aldeia de Cervos, uma daquelas povoações praticamente abandonadas e tão bonitas que apetece recuperar na íntegra, nem que seja para criar um turismo rural, um museu, impedir de alguma maneira que se funda de novo na paisagem. Não é o tipo de local que se pode qualificar de paradisíaco, como não o são nenhum dos locais por onde passámos; toda a região tem um carácter demasiado forte e marcado para que se lhe atribuam adjectivos relaxantes e amorosos, terminados em “inho”.

Impressionante, pela força que emana, perturbador até, porque se aprecia como único. Apercebemo-nos que é impossível ser daqui e não ser também assim, forte e duro, um sobrevivente. E a nós, meninos da cidade, só nos resta fazer como os lobos e as bruxas, e desaparecer nas brumas. Mas refazemos o caminho a planear o próximo, que Montalegre tem mais caminhos do outro mundo.

Centro histórico de Montalegre
Centro histórico de Montalegre

Guia de viagens a Montalegre

Este é um guia prático para viagens a Montalegre, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos em Montalegre, os melhores hotéis e sugestões de actividades na serra do Leiranco.

Quando visitar Montalegre

De climas extremos, a região é muito fria de inverno e muito quente de verão. O Trilho do Leiranco tem boas zonas de sombra, bem adequadas para um piquenique, e há pontos de água pelo caminho, nomeadamente nas aldeias do Cortiço, Arcos e Cervos.

Como chegar

Montalegre fica no distrito de Vila Real, pelo que um dos caminhos mais directos será a IP4 do Porto até esta cidade, ou a IP3, para quem vem de destinos mais a sul, seguindo depois em direcção de Chaves por Vila Pouca de Aguiar, e desviando para Boticas e Montalegre pela N103. Outra hipótese, para quem vem da costa, é apanhar a A7 que liga a Póvoa de Varzim a Vila Pouca de Aguiar.

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Onde ficar

Na vila existem várias possibilidades de alojamento, como o Hotel Montalegre, de quatro estrelas, que fica na Rua do Avelar e tem quartos duplos com preços a partir de 58€. Ali ao lado, em Boticas, a Casa de S. Cristóvão é um bom exemplo de uma casa tradicional recuperada, onde pode ficar num duplo com pequeno-almoço a rondar os 40€.

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Onde comer

Em Montalegre, dois dos restaurantes mais conhecidos são o Nevada, na Rua Camilo Castelo Branco, e o Castelo, no Terreiro do Açougue, ambos com honras da casa nos produtos do Barroso, nomeadamente carne e enchidos. Com bom tempo, o Sol e Chuva, em Pisões, tem uma esplanada e vista para a barragem do Alto Rabagão.

Informações úteis

Montalegre e Boticas são os concelhos da Região de Barroso, dominada por uma geografia que manteve a zona “isolada” em relação ao resto do país. Igualmente fruto desse isolamento é a raça de bovinos barrosã, já pouco mantida no trabalho do campo mas ainda estimada pela carne e usada nas famosas “chegas” de bois tradicionais. As festas dos Rapazes e de Santo Estêvão são outros exemplos de tradições conservadas neste planalto elevado dominado pela Serra do Barroso, ou de Altura. Vale a pena passar pelo Posto de Turismo local, mesmo no centro, que tem uma série de desdobráveis sobre os trilhos disponíveis na zona.

O site oficial do Turismo de Portugal oferece informação atualizada sobre os principais pontos turísticos do país, incluindo, naturalmente, a região de Montalegre.

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Ana Isabel Mineiro

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