A ilha de Rodes, terra grega junto à costa turca, parece navegar num mar morno e azul por entre épocas e culturas: castelos de cruzados, ruínas dóricas e minaretes de antigas mesquitas brotam da paisagem a cada instante. Relato de uma viagem à ilha de Rodes, a maior do Dodecaneso, na Grécia.
Rodes, pérola medieval do Dodecaneso
Rodes é a maior ilha da península do Dodecaneso, cuja localização geográfica resultou numa história particularmente agitada: foi base e fortaleza dos cruzados entre 1300 e 1522, ocupada por otomanos e italianos, palco de guerra entre britânicos e alemães nos anos de 1943-44. Tornou-se definitivamente grega em 1948, mas continua a existir um sentimento de ameaça graças à proximidade da costa turca.
A mistura arquitectónica é única, com a cidade medieval de Rodes, cenário de filmes de época, a destacar-se, e inúmeros marcos históricos abertos à visita: as ruínas da cidade dórica de Kameirós, a fortaleza de Lindós, majestosos edifícios públicos, geralmente de construção italiana, mesquitas e palácios otomanos dispersos um pouco por todo o lado.
A ilha possui ainda um coberto vegetal generoso, que ocupa mais de trinta por cento do solo, devido à abundância de água – coisa de que poucas ilhas gregas se podem gabar. Se lhe juntarmos o enquadramento mediterrânico de mar ameno e transparente e temperaturas agradáveis, temos o cenário ideal para umas férias de sonho que uma média de cem mil turistas, provenientes sobretudo do Norte da Europa e de Itália, aproveitam durante nove meses por ano.
A cidade de Rodes
Cheguei de Creta depois de onze horas de viagem, e a vista sobre a cidade não podia ser mais impressionante: uma cortina de muralhas desdobrava-se ao longo da costa, interrompida apenas pelas ameias de um castelo, uma cúpula oriental pintada de amarelo e os cedros escuros que se levantavam de um jardim.
Na sua frente deslizavam grandes barcos brancos carregados de turistas. Para entrar na cidade antiga é preciso passar por um dos grandes arcos com portas de acesso, todos restaurados na perfeição – só falta o fosso com crocodilos e a ponte levadiça, para a viagem no tempo ser ainda mais completa. À noite, algumas destas portas são fechadas, e as ruelas estreitas ficam ainda mais quietas.
É uma delícia deambular por estas vielas, sobretudo nas zonas fechadas ao trânsito automóvel. Calcetadas com seixos da praia brancos e pretos, geralmente formando desenhos (barcos, flores, sóis…), decoradas com cachos de buganvílias, parreiras com uvas e jasmins, e muitas delas ainda com arcos que unem as casas dos dois lados da rua, uma estética prevenção contra os frequentes sismos da zona.
De todo o lado saem cúpulas, minaretes e torreões de muralhas; duas grandes praças com esplanadas marcam a presença de antigas mesquitas no mais puro estilo otomano, assim como os complementares lava-pés, mimosos e bem desenhados, usados agora como banheira pelos pássaros.
A mais impressionante é, sem dúvida, a Mesquita de Suleimane: às riscas vermelhas e brancas, no alto de uma colina e não muito longe dos banhos turcos, alcança-se por ruas que são autênticas feiras, labirintos de lojas de joalharia de ouro, cerâmicas modernas a imitar cerâmicas antigas, peças de couro e t-shirts “eu estive em Rodes” – uma homenagem aos souks do Médio Oriente. A sinagoga, das mais barrocamente decoradas que conheço, relembra os milhares de judeus levados daqui pelas forças nazis, e que nunca mais voltaram.
O imponente Palácio dos Senhores está recheado de estátuas, mosaicos, e uma excelente colecção que documenta a presença dos cruzados na ilha. Mais adiante, na Rua dos Cavaleiros, onde se situavam as suas estalagens, encontramos uma mansão otomana com um belo pátio sombrio e arborizado, decorado por bolas de canhão feitas em pedra, provavelmente destinadas a serem lançadas de catapulta.
E este deve ser o objecto decorativo mais comum por aqui: mais ao menos por todo o lado, nas ruas e pelos jardins, em cima de muros e em varandas, é normal as pessoas terem duas ou três bolas de canhão, como se fossem vasos de flores.
O Museu Bizantino, na Catedral dos Cavaleiros, e o Museu Arqueológico, ficam a dois passos um do outro e são apenas mais dois exemplos da riqueza histórica concentrada dentro destas muralhas. Muitos dos pátios de edifícios antigos estão agora ocupados por bares e pequenos restaurantes; aliás, a oferta é tanta que me custou a compreender os preços altos praticados – até assistir a uma conversa entre um empregado de café e um casal de nórdicos (Suecos? Dinamarqueses?), em que o casal perguntava timidamente se 30€ era o total da conta ou o que devia cada um, e se achava que 10€ de gorjeta eram suficientes, porque não conhecia os costumes…
A concorrência é renhida e, à hora do jantar, os estrangeiros que passam na praça central são interpelados várias vezes para entrarem em restaurantes. Se optarmos por comer ao ar livre, os detalhes das paredes, os escudos, as imagens de pedra, cordames entrançados escavados nas colunas, as decorações em redor das janelas, tudo nos tira os olhos do menu; o melhor é escolher um lugar o mais grego possível, afastado do centro, e dedicarmo-nos por completo à excelente gastronomia, que combina legumes, lacticínios e sabores do mar de forma admirável.
Uma vez do lado de fora das muralhas, a cidade nova estende-se, arejada, junto ao porto. No cais há um permanente desfile de barcos, cada um no seu estilo: vedeta de Cannes, barco pirata, iate moderno de tamanho variável, catamarã, veleiro clássico.
Passamos pelo velho mercado, que tem mais ourivesarias, relojoarias e artesanato do que propriamente alimentação. Continuamos até à Mesquita Murad Reis, junto ao romântico e sombrio cemitério otomano, com as suas lápides cobertas de inscrições em árabe e turbantes de pedra, onde muitos dos gatos da cidade gostam de vir dormir a sesta.
Contornando o majestoso teatro municipal, encaramos com a entrada do porto, onde se levantava o Colosso de Rodes; o local é agora assinalado por duas modestas colunas, encimadas por dois igualmente modestos veados, desproporcionalmente representados nos postais de Rodes.
Sendo esta uma das ilhas mais visitadas da Grécia, a sua “capital” é, com toda a certeza, uma das mais agitadas em termos de serviços turísticos. O mistério e a maravilha desta cidade é não se ter tornado num daqueles lugares indistintos, feito de prédios sobre a areia, onde se acumulam durante meses nórdicos cor de lagosta e americanos de indumentárias paranormais.
Apesar da abundância de turistas Rodes mantém-se como um cenário vivo, oferecendo-nos as alegrias de um mar transparente e morno a par do toque exótico do Médio Oriente, e ainda umas lições de história clássica e medieval. Podemos escolher entre o puro lazer e o cultivo do conhecimento empírico.
E há locais onde até podemos ter os dois ao mesmo tempo: basta sair pelo arco de Ayía Ekateríni em direcção ao mar, e vamos a banhos a cinco metros da muralha medieval, com vista sobre uma fila de moinhos de vento.
Lindo como Lindós
A costa Oeste sempre teve turismo organizado, o que significa que há uma linha de hotéis a acompanhar grande parte da linha do mar. Para encontrar as origens da ilha, é indispensável visitar Kameirós, a mais bem preservada das três cidades dóricas da ilha.
Apesar da ausência de construções espectaculares, não deixa de ser extraordinário reconhecer a organização rigorosa dos arruamentos, o bem definido desenho das casas, ainda com alguns mosaicos, as colunas da acrópole e a enorme cisterna de uma cidade que já existia há cerca de três mil anos. E tudo isto localizado numa verdadeira varanda sobre o mar azul, enquadrado por uma das manchas verdes de pinheiros da ilha.
Uma outra cidade dórica, Jalissós, situa-se a caminho do interior da ilha, mas a construção mais evidente é o recente Mosteiro Filérimos. Na costa Leste encontramos a terceira cidade dórica e a segunda maior – e bem merecida – atracção turística da ilha: Lindós.
Um dédalo de ruelas brancas que se enrolam à volta de uma colina como um cachecol branco. Portas que abrem para pátios de empedrados artísticos desenhados com seixos, velhas entradas com brasões de pedra, que rompem das paredes para lembrar que aqui eram as casas dos capitães mais importantes.
No alto da colina, como uma coroa, levanta-se (mais) um castelo dos cruzados. E lá dentro, a cidade dos dórios. Sobe-se por um passeio íngreme e estreito, e a última parte, escavada nas rochas, é uma autêntica feira de crochés e bordados fabricados pelas mulheres da aldeia. Burricos de olhos doces levam os turistas menos enérgicos – e mais gordos – até à entrada. Lá do alto, a vista é magnífica: a enseada azul depois das casas brancas da aldeia, de onde sobressai uma torre sineira em pedra, uma ilhota rochosa, uma península estreita onde jaz a ruína de um moinho, uma praia escondida.
Dentro das muralhas, a reconstrução do Templo de Atenas já deixa ver a imponência que teria este centro religioso, o mais importante da ilha. A combinação do teatro, do templo dórico, dos túmulos bizantinos e da fortaleza que os rodeia, usada como defesa desde a antiguidade, refortificada pelos cruzados nos séculos XIV e XV e posteriormente ocupada durante o período otomano, formam um conjunto contrastante em que é evidente o passar dos séculos, a mudança de estilos com a evolução da vida – e da morte – no local.
Podemos passar uma tarde inteira dentro das muralhas, descobrindo novas estruturas que dão sobre uma paisagem aberta e acolhedora de mar e vegetação. Mas a pequena praia lá ao fundo chama-nos.
Não que seja a melhor da ilha; tal como em outras ilhas gregas, sabemos que as melhores praias são as que ficam só para nós, aquelas que descobrimos quando descemos a pé por um carreiro até ao mar, escorregando na terra amarela e seca, respirando o perfume quente do matagal. E mesmo aqui próximo há duas pequenas praias melhores que a de Lindós: a de Pallas, visível da fortaleza, e a de Vlikhá, 5 quilómetros mais a Norte.
Mas a caminho da praia há um pequeno cemitério muçulmano abandonado, ainda com restos de pinturas nos túmulos, e uma capelinha ortodoxa, tudo misturado com a sombra de olivais e cactos. Burricos vêm cumprimentar, pousando a cabeça sobre os muros.
Quanto mais descemos mais a fortaleza se levanta, e da areia branca a nuance de cores é admirável: areia e guarda-sóis brancos, vegetação verde-seca, casario branco, pedra bruta que se transforma na pedra ordenada das muralhas. E em que outro lugar podemos estar mergulhados até ao peito em água azul-transparente, com os olhos postos numa paisagem tão perfeita como esta?
O Colosso de Rodes
Criado entre 292 e 280 a.C. pelo escultor Carés de Lindós, o colosso era uma imagem do deus do Sol, Hélios, protector da ilha, e pretendia celebrar a retirada das tropas do rei macedónio Demétrio, depois de um longo cerco. O material usado na sua construção, setenta toneladas de bronze, veio do armamento abandonado pelo exército macedónio.
A estátua tinha trinta metros de altura, era oca, e um homem de compleição normal teria dificuldade em rodear com os braços um dos seus dedos. Cada uma das suas pernas apoiava-se sobre uma margem do canal de acesso à ilha, de modo a que os barcos passassem por baixo para atracar. Na mão direita tinha um farol que guiava as embarcações na escuridão.
Considerada, na Antiguidade Clássica, como uma das Sete Maravilhas do Mundo, a estátua durou cerca de cinquenta e cinco anos, até um terramoto a atirar para o fundo da baía. Os árabes, que chegaram no século VII, venderam o metal como sucata, tendo sido necessários novecentos camelos para a transportar na totalidade.
À excepção das pirâmides de Gizé, nenhuma das Sete Maravilhas sobreviveu, e na maior parte dos casos nem deixou mesmo evidências da sua existência. É o caso do Colosso de Rodes.
Os Dórios – memórias de um povo
Sabe-se que vieram do Norte e que eram ferozes guerreiros. Invadiram o Peloponeso, Creta e Rodes, durante o século XII a.C. Apoiados por uma aristocracia guerreira e armas de ferro, puseram fim à civilização Micénica e estabeleceram a sua cidade mais importante em Esparta (mais tarde, a única cidade-estado que conseguiu rivalizar com Atenas).
Com a chegada destas migrações dóricas, o comércio e a arte regrediram, mas a verdade é que pouco se sabe sobre o período de quatrocentos anos que durou o seu domínio, à parte as marcas de incêndio e destruição generalizada que chegaram até nós.
Esta época está também associada a introdução do trabalho em ferro, a um estilo arquitectónico particular – o dórico, evidentemente – e ao aparecimento de uma nova cultura e tipo de vida que participou no que mais tarde ficará conhecido como Civilização Helénica, e que virá a atingir o apogeu no século V a.C.
Halicarnasso, Cós, Cnido, Jalissós, Lindós e Kameirós, as três últimas na ilha de Rodes, formavam uma importante confederação de cidades dóricas no Mediterrâneo, a hexápode dórica; mais tarde, no século V a.C., Jalissós, Lindós e Kameirós uniram-se para fundar a cidade-estado de Rodes.
Guia de viagens a Rodes
Este é um guia prático para viagens à ilha de Rodes, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e sugestões de actividades na ilha.
Quando ir
A ilha de Rodes é agradável todo o ano, sobretudo no Outono e na Primavera. O clima mediterrânico é suave e o Verão é longo, com as temperaturas mais altas entre Maio e Outubro. A maior parte da chuva cai em Janeiro, e em Dezembro as temperaturas médias descem para 12 ou 13 graus.
Como chegar a Rodes
Voar para Atenas. Daí pode apanhar um voo directo para Rodes, mas aconselhamos a viagem de barco para um primeiro contacto com o mar e a para manter a noção de chegada a uma ilha. Pode obter informações sobre os ferries que partem do porto de Pireu, em Atenas, nas informações turísticas do aeroporto. Os horários e preços variam entre o Verão e o Inverno.
Onde ficar
Por exemplo, no Hotel Alexia, a cinco minutos do centro de Rodes, que tem quartos entre os 30€ e os 65€. Mais económica é a Pension Nassos, a dois passos do porto, na Rua Dimosthenous e Laokoontos. Não faltam também quartos para alugar em casa de famílias; para isso, contactar o turismo local, na Platía Rimínis.
Restaurantes
Em Rodes, tal como em toda a Grécia, a comida é excelente: não perder as dolmadas (folhas de vinha recheadas), a moussaka (gratinado com beringelas e cogumelos), e o frapé, café batido de café bem frio que servem em todos os cafés.
Há restaurantes e esplanadas para todos os gostos, da pizaria ao bistrot francês, sobretudo no centro. Um lugar não muito caro e com boa comida é o Nireas, com comida exclusivamente grega. Fica na Platía Sofkléous.
Informações úteis
Os preços de Rodes, afectados pela extrema insularidade e pelo excesso de turismo, são exagerados: qualquer “salada grega” (queijo Feta, tomate e azeitonas) custa 4€ ou 5€. A hora grega está duas horas adiantada em relação a Portugal. Os transportes públicos da ilha são um pouco escassos, mas permitem visitar os sítios principais. Também existem transportes internacionais para Chipre, Israel e Turquia.
Seguro de viagem
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