
Decido incorporar uma excursão de turistas chineses ao Parque Natural de Jiuzhaigou, situado na província de Sichuan. Encontro um cenário deslumbrante mas sou obrigado a abandonar o grupo, para bem da minha saúde mental. Guias turísticos de bandeira em riste não são, definitivamente, para mim.
Conhecia de antemão histórias de forasteiros em longas jornadas de autocarros repletos de passageiros chineses, quase sempre descritos como fumadores compulsivos e exímios escarradores. Relatos asquerosos de experiências difíceis de suportar do ponto de vista ocidental.

Sabia ainda, por observação directa noutras ocasiões, que os turistas chineses adoram seguir em grupos compactos dirigidos por uma bandeira colorida erguida pelo braço de um guia. Sem lugar à iniciativa individual ou a qualquer lampejo de vontade própria. Apenas copiando os movimentos do companheiro imediatamente anterior, as poses fotográficas em frente das chamadas atracções, todos os passos. Um grupo de turistas chineses em férias faz lembrar uma linha de montagem de uma qualquer indústria de transformação onde, no final, se obtém o mesmo grupo de turistas satisfeito por ter visto o que lhe quiseram mostrar. Nada de muito emocionante, portanto.
Mas decidi, mesmo assim, juntar-me a uma dessas excursões e rumar ao muito elogiado Parque Nacional de Jiuzhaigou. E ao entrar no autocarro, antevia-me como uma espécie de ovelha tresmalhada num rebanho de trinta turistas chineses e, felizmente, três novos companheiros israelitas. Seguimos viagem.
Para minha surpresa, os pretensos fumadores e escarradores comportaram-se de forma exemplar no interior da viatura. Mas descobri da pior maneira que as excursões chinesas contemplam inúmeras pausas para compras. E nunca de forma espontânea. São paragens em locais específicos onde todos os autocarros se detêm, numa espécie de romaria a grandes lojas que aguardam a chegada daqueles grupos ávidos de gastar dinheiro. Quinquilharia barata, velharias que mais não são do que artigos novos com aspecto de velho, colares, pulseiras e trapos, chás e ervas medicinais, de tudo um pouco se compra nestas paragens. Alguém a viver na China disse-me numa ocasião que as férias chinesas são tanto melhores quanto mais se gastar. Já não duvido.
Ao segundo dia, antecedendo um sobe e desce permanente com infinitas curvas e contracurvas em alta montanha, nova surpresa. Paragem para comprar oxigénio. Pequenas garrafas contendo a preciosa molécula para auxiliar os menos aptos a suportarem a altitude. Achei desnecessário e não comprei. Tal como os israelitas e um par de chineses mais confiantes. É certo que em determinadas partes do percurso senti, ainda que ligeiramente, os efeitos da altitude. Uma leve pressão na cabeça, não propriamente dor ou náusea, antes um ténue sinal de que o corpo procura ajustar-se à mudança nas condições exteriores. Mas nada de anormal, quando se está quatro mil metros acima do nível do mar.
Desce-se para o Parque Natural de Jiuzhaigou – que a UNESCO elevou à categoria de Património Mundial – e os sintomas desaparecem. O parque fica situado numa prefeitura autónoma do noroeste da província de Sichuan, uma zona com notórias afinidades com a cultura tibetana. Algumas das mais relevantes comunidades tibetanas a viver fora do Tibete encontram-se precisamente nesta região. De Xiahé, mais a norte, na província de Gansú, até Langmusi e Songpan, já em Sichuan. A excelência das paisagens proporcionadas por um cenário alpino, com lagos cristalinos em várias tonalidades de azul a elevada altitude, floresta e quedas de água, é de uma beleza desarmante. Jiuzhaigou é um lugar invulgarmente tranquilo para o que tenho visto na China. Principalmente em lugares onde o olhar apenas conseguia encontrar os parceiros israelitas e ninguém mais. Sem guia, sem bandeira, sem ser uma ovelha num rebanho. Abandonámos o grupo. A única forma de apreciar a excelência deste lugar.
Esta é a capa do livro «Alma de Viajante», que contém as crónicas de uma viagem com 14 meses de duração - a maioria das quais publicada no suplemento Fugas do jornal Público. É uma obra de 208 páginas em papel couché, que conta com um design gráfico elegante e atrativo, e uma seleção de belíssimas fotografias tiradas durante a volta ao mundo. O livro está esgotado nas livrarias, mas eu ofereço-o em formato ebook, gratuitamente, a todos os subscritores da newsletter.
Olá. Adorei a sua crónica! Estou a pensar numa viagem pela China e adorava visitar Jiuzhaigou. Seria possível indicar a agência ou como conseguiu agendar a excursão? Obrigada.
Visitei Jiuzhaigou há muitos, muitos anos… não faço ideia com que agência foi.