Destino: Ásia » Mongólia

Lua de invulgar mel na linha transmongol (VM #05)

Por Filipe Morato Gomes

Viagens: Irkutsk e transiberiano, Rússia

A caminho de Ulan Bator, capital da Mongólia, percorrendo as míticas linhas de caminho-de-ferro transiberiana e transmongol, conheci Fran e Ricardo, um casal chileno que viajava de mochila às costas durante a sua lua-de-mel. A confirmação de que, para muita gente por esse mundo fora, o casamento não implica o fim das aventuras de viagem. Hasta la vista, amigos!

Amigos no transiberiano, na fronteira da Rússia com a Mongólia
Os amigos Fran e Ricardo, na povoação fronteira entre a Rússia e a Mongólia

O amor é bonito quando acontece. No compartimento ao lado daquele que me foi atribuído acabo por conhecer Fran e Ricardo e logo um aconchego me invade a alma. Viajam juntos desde há várias semanas por países como a Tailândia ou o Vietname, agora a Rússia, depois a China e o que mais vier. Poderiam ter optado por oito dias numa ilha paradisíaca com requintados prazeres, muito marisco e revigorante vista para o mar algures nas Caraíbas ou no Pacífico.

Mas ei-los aqui, no desconforto de um comboio onde têm de dormir e comer e ainda amar, carregando como qualquer viajante independente as suas mochilas às costas – qual casa onde nada cabe e tudo pesa – numa fase da vida em que normalmente pouco mais do que os dois conta, denominada lua-de-mel. Admiro-os imensamente. Conversámos bastante, colocam com a naturalidade de um sorriso o seu futuro lar em Santiago do Chile à minha disposição, tornámo-nos amigos – se é que a uma forte empatia entre temporários companheiros de viagem pode chamar-se amizade.

Paredes-meias com o do casal chileno divido o meu compartimento com Christian, amistoso canadiano a leccionar inglês numa escola privada em Irkutsk. Conta-me que não sabia sequer a localização geográfica dessa tal povoação de nome estranho quando lhe propuseram o dito emprego. “Procurei num mapa e aceitei de imediato o lugar” – diz, encolhendo os ombros. Partiu.

Irkutsk, uma das principais paragens ao longo da linha transiberiana, Siberia, Rússia
Vista de Irkutsk, uma das principais paragens ao longo da linha transiberiana, Rússia

Encontrou uma cidade que não considera particularmente encantadora ou interessante. Mesmo assim, ficou. Compreendo. Eu próprio, enquanto em Irkutsk, procurei sem sucesso motivos para o “Paris da Sibéria” com que em tempos foi carinhosamente apelidada. Retenho no olhar, ainda assim, a originalidade dos inúmeros edifícios de madeira em pleno centro da cidade, sóbrios e elegantes. Reparo nas suas janelas à altura do passeio – algo muito comum na arquitectura local -, num ou noutro espaço público bem cuidado e, obviamente, na imagem cartaz da cidade que é o grande Teatro Drama, edifício belíssimo de cores suaves e agradáveis. Mas, acima de tudo, não esqueço a hospitalidade e amabilidade das pessoas sempre que solicitadas a ajudar qualquer desorientado visitante. Reconfortante.

Deixei Irkutsk, subindo para este comboio, satisfeito por ter conhecido o principal aglomerado urbano desta região siberiana, e mais ainda por levar na memória imagens inesquecíveis desse lago que domina o pensamento de todos os que por aqui passam – o mítico Baikal.

Bar do comboio russo Irkutsk que percorre a linha transiberiana, Rússia
Bar do comboio russo “Irkutsk” que percorre a linha transiberiana de Moscovo até Irkutsk

Consta, a propósito, que perdemos magníficas visões das suas margens a caminho de Ulan-Ude, quando a linha-férrea serpenteia as curvas do lago sem dele se afastar. Infelizmente, passámos de noite neste troço do trajecto que nos levará calmamente a Ulan Bator, capital da Mongólia, onde haveremos de chegar na madrugada de um novo dia.

Para mim, é agora tempo de desvendar um pouco da magia deste inóspito país que piso pela primeira vez. Quanto a Fran e Ricardo, prosseguem a sua lua de invulgar mel algures em território chinês. Haverei de os visitar um dia, se e quando este périplo pelo mundo me fizer parar em Santiago do Chile, com a convicção de os encontrar juntos e felizes. Até lá, companheiros!

Livro Alma de ViajanteEsta é a capa do livro «Alma de Viajante», que contém as crónicas de uma viagem com 14 meses de duração - a maioria das quais publicada no suplemento Fugas do jornal Público. É uma obra de 208 páginas em papel couché, que conta com um design gráfico elegante e atrativo, e uma seleção de belíssimas fotografias tiradas durante a volta ao mundo. O livro está esgotado nas livrarias, mas eu ofereço-o em formato ebook, gratuitamente, a todos os subscritores da newsletter.

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.

1 comentário em “Lua de invulgar mel na linha transmongol (VM #05)”

  1. Os meus parabéns para o seu trabalho fabuloso.

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