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Trondheim por quem lá vive: Carla Carvalho

Por Filipe Morato Gomes
Rio Nivelva, Trondheim
Rio Nivelva, em Trondheim

Hoje, na série de portugueses pelo mundo, vamos até Trondheim, no centro da Noruega, pela mão da Carla Carvalho. A Carla tem 28 anos, é arquiteta e está a viver em Trondheim há três anos. Convidei-a a partilhar connosco as suas experiências, sugestões e dicas para quem quiser visitar Trondheim.

É um olhar diferente e mais rico sobre a pequena cidade norueguesa – o de quem vive por dentro o dia-a-dia de Trondheim, estando simultaneamente fora da sua “zona de conforto”, deslocado, como acontece a todos os viajantes. Este é o 35º post de uma série inspirada no programa de televisão “Portugueses pelo Mundo”.

Conteúdos do Artigo

Em Trondheim com a Carla Carvalho (entrevista)

Define Trondheim numa palavra.

Talvez “aldeia-grande”.

Trondheim é uma cidade boa para viver? Fala-nos das expectativas que tinhas antes de chegar, e se a realidade que encontraste bateu certo com a ideia preconcebida que trazias.

Eu diria que Trondheim é uma cidade confortável. Grande o suficiente para se encontrarem espetáculos e festivais de cinema, mas pequena o suficiente para se conhecer o vizinho do quiosque ao lado.

Não é fácil falar de expectativas e realidades. É diferente viver numa cidade quando se pensa ficar temporariamente ou quando se vive sem intenções de mudar de território. Eu adapto-me facilmente às circunstâncias, por isso quando é normal, por exemplo, jantar-se às 17:00, uma pessoa habitua-se a jantar a essa hora e deixa de estranhar. Cada costume em sua terra.

E o que mais te marcou em Trondheim?

Antes de vir para a Noruega, pensei que o frio fosse uma barreira mas, como aqui se diz: “não há mau tempo, só más roupas”. Na Noruega, tanto as casas como os edifícios públicos são aquecidos e, por isso, enquanto em Portugal é preciso ter uma manta ou uma camisola dentro de casa, em Trondheim é normal andar de manga curta quando lá fora estão 20 graus negativos.

O que mais me marcou e marca são talvez as grandes variações de luz solar entre as estações do ano. Devido à posição de Trondheim, a variação de luz solar é enorme entre o verão e o inverno. No verão, os dias são infinitos, não chegando a escurecer, enquanto que no inverno há apenas algumas horas de luz que iluminam a cidade.

Como caracterizas os noruegueses?

Os noruegueses são muito atenciosos. A “distância social e pessoal” é diferente da dos países do Sul. O cumprimento é sempre com um aperto de mão e não com contacto facial. No entanto, é quando as relações de amizade são mais próximas que o abraço entra em cena.

Mas, para quem vem do Sul da Europa, onde temos costumes mais “quentes”, como é a convivência com povos mais “frios” no trato? É fácil fazer amizades?

A descrição “povos frios” acerta na sensação que tenho da cultura nórdica. É fácil fazer amizades mas são amizades muito superficiais – talvez formais seja o termo mais correto. Formalidade social é talvez, a meu ver, a descrição mais exata da vida social norueguesa em relação aos países do Sul.

Lago Estenstaddammen, Trondheim
Vista do Lago Estenstaddammen, Trondheim © Claudia Calvet

Viver em Trondheim implica dias de verão infindáveis e dias de inverno minúsculos. Como foi a adaptação a essa realidade?

A extrema diferença entre as estações do ano e a variação enorme entre a quantidade de luz solar que enchem os dias são provavelmente os fenómenos que mais me fascinam e que, ao mesmo tempo, mais “luta” dão a nível de adaptação.

Um truque: usar cortinados pesados e escuros no verão e tomar tran (um concentrado de óleo de peixe) todos os dias no inverno!

Já tiveste o privilégio de ver auroras boreais? Conta-nos.

Aqui em Trondheim não é comum haver auroras boreais (vi apenas duas vezes).

No entanto, estive recentemente numa ilha chamada Fleinvær, no Norte da Noruega, a cerca de uma hora de ferry para Sul de Bodø. As condições climáticas estavam perfeitas. Tinha parado de chover, o céu estava sem nuvens, começou o frio seco e o céu cheio de estrelas. A partir daí foi possível ver auroras boreais todas as noites. Tive o privilégio de assistir a uma aurora boreal espetacular mesmo em cima de nós. Verde e lilás dançante e tridimensional como um vórtex que durou uns bons minutos e que se tornou num momento mágico.

Como terminarias esta frase: “Não podem sair de Trondheim sem…”

Sem dar um passeio pela rua mais encantadora da cidade, Bakklandet. É uma rua a este do Rio Nidelva. Com edifícios de madeira restaurados, típicos da classe trabalhadora do séc. XVII, a rua tornou-se um trend com casas, cafés e lojas artesanais que enchem a vizinhança de vida.

Quanto ao turismo, vamos tentar fazer um roteiro de 3 dias em Trondheim. Indica-nos as coisas que, na tua opinião, sejam “obrigatórias” ver ou fazer.

Trondheim não é grande, mas há sempre coisas para se ver. A não perder, um passeio pelo centro da cidade, pelas ruas pedestres Munkegata (liga a Catedral ao mercado do peixe) e Nordregata (com lojas e cafés, especialmente iluminada no Natal); pelo Mercado do Peixe onde é possível comprar peixe fresco ou comprar uns petiscos marítimos.

Atravessando a cidade, é um must atravessar a ponte Gamle Bybro, que significa Velha Ponte da Cidade, com os seus arcos vermelhos e com a vista para os armazéns defronte para o rio. Perfeito para uma fotografia que identifica a cidade. Pode continuar-se pela Rua Bakklandet rumo a norte e, na volta, fazer uma paragem pelo café Skysstasjon. Uma paragem perfeita para uma refeição tradicional ou um chocolate quente com um bolo de maçã. Em frente ao café pode “entrar-se” nas ruas traseiras que dão para o rio. Uma caminhada fresca com paisagem sobre o centro da cidade, até à Catedral Nidaros e aos edifícios radiantes, também a não perder.

Para quem aprecia vistas panorâmicas, aconselha-se uma caminhada (ou ir de autocarro) até ao forte da cidade, Kristiansten festning. Ao atravessar as muralhas do forte é possível desfrutar de uma vista fantástica sobre a cidade e sobre o fiorde. Para o mesmo lado de Trondheim, é possível subir à Tyholt Tower (torre de comunicações) e ter uma vista de 360 graus sobre a cidade.

Para o lado oposto, é possível visitar a nova zona em desenvolvimento, Bratøra. Com um hotel que salta à vista e que tem provocado polémica pela sua estética; com as piscinas da cidade; com o museu de música rock Rockheim; com o cais de ligação à Ilha Munkholmen. E, continuando pela marginal, passa pelo Sjøbadet, uma espécie de piscinas exteriores com patamares de salto; mais adiante, chega-se a Illa, uma zona de casas de madeira características e uma marina para veleiros onde é possível beber ou petiscar alguma coisa ao fim da tarde.

Para quem gosta de ar fresco, a zona da floresta e dos lagos é especialmente atrativa no verão. Para quem esteja interessado, um ponto de referência é o Lago Lian, onde é possível chegar a partir de autocarro urbano (cerca de 20 minutos do centro de Trondheim).

Para mais informações ver o site da cidade em www.trondheim.no.

Universidade de Trondheim
Universidade de Trondheim © Claudia Calvet

A Noruega é um dos destinos de viagem mais caros do mundo. Tens algumas dicas para poupar dinheiro em Trondheim?

É verdade que é das cidades mais caras do mundo mas, como trabalho em Trondheim, não sinto isso. Mas cada viajante tem sempre os seus truques e dicas, por isso acredito que seja possível uma visita moderadamente económica a Trondheim.

Falemos de comida, até porque a gastronomia nórdica está na moda. Que especialidades gastronómicas temos mesmo de provar?

Quando falamos de comida, os sabores são bem diferentes dos sabores mediterrâneos. Na Noruega não é o azeite e o tomate que predominam. Para quem gosta de provar coisas novas, há uma série de pratos para degustar.

O “Rakfisk”, um half-fermented truta ou salmão. Come-se cru com batatas cozidas, cebola às rodelas, beterraba e “flatbrød”, um tipo de pão fininho e estaladiço.

“Rømmegrøt med spekemat”, uma espécie de sour cream meal com manteiga, açúcar e canela e a acompanhar carnes de enchidos bem salgadas e um sumo leve de frutos silvestres.

O “Bacalao”, que na Noruega não é o nome do peixe mas o nome da receita. Basicamente, é a receita portuguesa de bacalhau à espanhola.

E há bacalhau na Noruega?

Há bacalhau, claro! Mas não é utilizado como em Portugal. Aqui chama-se klippfisk e é confecionado como Bacalao (uma espécie de bacalhau à espanhola). O prato é tradicional de Kristiansund (cidade com fortes ligações ao mediterrâneo devido ao mercado do bacalhau) mas baseado na cultura portuguesa e espanhola.

Imagina que queremos experimentar comidas locais. Gostamos de tascas, botecos, lugares tradicionais com boa comida e se possível barato. Onde vamos jantar?

Para experimentar comida tradicional aconselho dois restaurantes. O Skysstasjon Bakklandet no centro da cidade e o Tavern (junto ao Museu Sveresborg). O primeiro talvez mais para almoço e o segundo para jantar. O Tavern tem um menu semanal e, para lá chegar, basta apanhar um autocarro urbano até ao Museu Sveresborg (cerca de 15 minutos do centro de Trondheim).

Margens do rio Nivelva, Trondheim, Noruega
Casario nas margens do Rio Nivelva, Trondheim © Claudia Calvet

Uma das decisões críticas para quem viaja é escolher onde ficar. Em que bairro nos aconselhas a procurar hotel em Trondheim?

Trondheim é pequeno o suficiente para não ser difícil estar sempre no centro. Os hotéis são todos centrais. Uma dica, talvez o Scandic Nidelven Hotel que tem sido premiado nos últimos anos com tendo o melhor pequeno-almoço do país.

Procurar hotéis em Trondheim

Escolhe um café e um museu.

Talvez o café Skysstasjon Bakklandet pela atmosfera, localização e por ter comida tradicional.

Um museu, sem dúvida o já referido Rockheim Museum, um museu de música rock. O próprio edifício é uma atração para os interessados em arquitetura.

Falemos de diversão. O que sugeres a quem queira sair à noite em Trondheim?

Para sair à noite em Trondheim sugiro dois espaços na mesma zona. Antikvariatet, na Rua Bakklandet, com diferentes espaços onde os móveis retro e os livros enchem o ambiente, com vários tipos de cerveja e que ocasionalmente tem concertos ao vivo. E o Den Gode Nabo, mais tipo taberna ou pub, com um menu de cervejas extensivo e o tradicional fish & chips para acompanhar.

Tens alguma sugestão para quem pretender fazer compras em Trondheim? O que comprar?

No que toca a souvenirs, o que me ocorre é o brunost. Literalmente significa “queijo castanho” e encontra-se em muitas variantes. Pode comprar-se em qualquer supermercado (o pacote vermelho da Tine), assim como nos mercados locais (ao sábado de manhã) onde os produtores expõem os seus produtos.

Antes de te despedires, partilha o maior “segredo” de Trondheim; pode ser uma loja, um barzinho, um restaurante, um parque, uma galeria de arte, algo que seja mesmo “a tua cara”.

Sem dúvida, o restaurante Bjørnvåg. É um restaurante num barco construído em Ålesund mas que, nas últimas décadas, fez parte das rotas locais. Agora é um restaurante dirigido por um casal. O ambiente e a experiência são únicos e a comida é, sem dúvida, a melhor de Trondheim! Entrada só com marcação. É um jantar de vários pratos com cerveja e/ou vinho para cada prato, sugeridos pelo chef. Alerta: se procura algo “económico”, aqui não é o lugar certo.

Obrigado, Carla. Encontramo-nos numa próxima viagem à Noruega; já fiquei com umas ideias sobre o que fazer em Trondheim…

Veja o artigo Trondheim com crianças: as dicas de Alice Pinto no Diário da Pikitim.

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.