
Desço ao sul da Turquia para procurar contornar pelo Chipre e por Israel sem que tenha de voar, mas encontrar um barco que ligue os dois países revela-se uma missão impossível. Voo até Israel e num pulinho ponho-me na Jordânia, rumando a sul até às portas de África.
Existem dois barcos a fazer a travessia para o lado norte da ilha de Chipre: um parte habitualmente por volta das 11:30 da manhã e segundo consta, demora duas horas e meia a cruzar as águas do mediterrâneo, sendo por isso mesmo mais caro. O outro sai às 24 e leva toda a noite para aportar do outro lado. Como fiquei em terra no dia anterior, estou disposto a seguir no barco da manhã de modo a chegar o mais rapidamente possível ao outro lado.
Às 9 horas estou na agência. No dia anterior, por detrás da folha que anunciava o cancelamento das travessias, era possível ver um amontoado de bagagem no seu interior e, aparentemente, os proprietários das malas estão hoje de volta aguardando novidades quanto à partida dos barcos. O tempo melhorou significativamente apesar de alguns chuviscos mas do outro lado do guiché a informação é de que ainda não há certezas dos barcos poderem zarpar. A espera prossegue.
Tomo o pequeno-almoço num restaurante vizinho e, no regresso, há finalmente agitação no interior da agência. As notícias são de que o barco das 11:30 não vai sair mas para o da meia-noite já se vendem bilhetes e eu faço-me então à fila. A funcionária informa que tenho de estar no porto duas horas antes da saída do barco. Faltam umas 12 longas horas e nada mais me resta que não seja esperar.
Os ponteiros marcam finalmente 22 horas. Dirijo-me para o barco, que ainda nem sequer começou a ser carregado, na companhia de dois sul-africanos a caminho de casa em bicicleta, e subimos ao convés para uma última cerveja antes das gotas de chuva nos atirarem em definitivo para dentro. Uma vez mais, nada resta que não seja esperar. Os passageiros vão procurando a melhor forma de se acomodar e tentar dormir e nós fazemos o mesmo, diligenciando o melhor lugar para nos esticarmos dentro do saco-cama. À meia-noite não há qualquer sinal de que o barco esteja para zarpar em breve.
Na verdade, só deixa o porto por volta das 6 da manhã e com a ajuda da forte ondulação que se faz sentir, teremos ainda umas largas horas de mar pela frente.
Vou passando os dias no Chipre na esperança de conseguir um barco para Israel.
Ainda em Plovdiv, tinha encontrado um horário de uma companhia transportadora que anunciava uma partida neste domingo; contudo, a informação telefónica dada pela própria empresa diz que nenhum barco partirá para Israel antes de meados de dezembro. É demasiado tempo de espera. Resignado, compro passagem aérea para Telavive com o lenitivo de poder visitar um casal amigo que meses antes “surfou o meu sofá” e que agora me oferece o seu.
Voo para Israel e ao cabo de 3 dias estou a saltar para a Jordânia
De Telavive até à fronteira são precisos três autocarros e, procedimentos alfandegários cumpridos no lado israelita, sou forçado a entrar num outro para fazer alguns metros até ao posto fronteiriço jordano. No exterior, apenas táxis fazem a ligação a qualquer que seja o destino a partir da fronteira e eu resolvo apanhar o mais barato até Al-Mashari’a – a primeira povoação em frente e que fica a apenas a 1 ou 2 km de Pella e é igualmente base para explorar Umm Qais, dois locais com ruínas romanas que me proponho visitar.
De Al-Mashari’a sigo para Amã. Pelo caminho chamam-me a atenção as habitações que parecem estar sempre à espera de qualquer coisa; mais um andar, uma pintura nova ou simplesmente uma cobertura condizente, como se as pessoas construíssem à medida das suas possibilidades – e necessidades (com certeza!) – deixando sempre espaço para ampliações. Por todo o caminho vi casas de um só piso mas que guardavam os pilares saídos da cobertura – armação de fora – aguardando por mais um piso.
De Amã sigo para sul ao encontro de Petra e dos beduínos que vivem nos seus arrabaldes. Pelo caminho fica o Castelo de Karak e a primeira vez que um jordano me tenta ludibriar. O autocarro que me trouxe de Amã deixa-me no sopé da colina que abriga o castelo e para subir um pouco mais apanho outro autocarro numa distância tão curta que não demora 5 minutos. Quando tento pagar pedem-me 2 dinares quando eu sei que meio é mais que suficiente. Não me deixo enganar e exijo o troco certo. Mas não contente, o puto que recebeu o dinheiro – e visto que o autocarro não avançará mais – insiste em levar-me até à entrada do castelo. Quando chegamos pede-me o passaporte, como se isso fosse condição para comprar bilhete e julgando ele que me deixaria enganar. Compro eu mesmo o bilhete e dirijo-me para a entrada. É persistente e insiste em seguir comigo. Ao cinto traz uma navalha de tal forma explícita que chego a julgar ter um objetivo intimidativo. Digo-lhe suficientemente alto para quem se encontrava presente ouvir, que não preciso da sua companhia e que não tenho dinheiro para lhe dar. Com a presença de polícias no interior do castelo, fica-se pela entrada e eu sigo sem problemas.
Os autocarros na Jordânia só partem quando cheios e, qualquer que seja a viagem, não custam mais de 2 euros; além disso só circulam havendo luz do dia.
Terminada a visita ao Castelo de Karak, sigo para Petra. É uma e meia da tarde e o motorista diz-me que partiremos apenas dentro de uma hora e eu sei que serão precisas pelo menos 2 horas e meia de viagem até Ma’an, onde terei de conseguir outro autocarro ou então um táxi para o resto do trajeto. Sair a esta hora pode vir a ser um problema, uma vez que o sol se põe às 4 e meia da tarde e às 5 é definitivamente noite. Quando chego a Ma’an, com o autocarro cheio de egípcios que se dirigem para Aqaba e que carregam sacos do tamanho de cada um deles, já o sol se foi e o motorista do autocarro procura um outro colega ou táxi que me leve até Petra. Todas as suas tentativas são infrutíferas e propõe ele mesmo levar-me até lá por um preço igual ao que pagaria num táxi.
À falta de alternativas, sou quase que forçado a aceitar. O condutor acelera estrada fora, agora que o autocarro vai vazio e a noite se adensa. A certa altura toma um caminho suspeito mas então percebo que se dirigiu a casa. Para o autocarro e do grande portão metálico retira o seu carro particular com o qual me levará o resto do caminho.
Depois de Petra – e resignado por aparentemente ser impossível visitar o deserto do Wadi Rum por conta própria e dispendioso fazê-lo com um guia – sigo de táxi para Aqaba de forma a averiguar da situação do visto para o Egito, que ao que parece é bastante contraditória. Tenho informações que dizem ser possível conseguir no ferry e outras que dizem que tal só se verifica se a intenção for unicamente visitar a região de Sinai.
A meio da viagem, o taxista pergunta-me se estive no Wadi Rum e, perante a minha resposta negativa, esclarece-me todas as dúvidas que tinha em relação à possibilidade de poder caminhar e acampar livremente no local, bem como da possibilidade de conseguir o visto para o Egito no barco, não precisando assim de procurar o consulado em Aqaba e aconselhando-me a apanhar um autocarro e seguir para o deserto vermelho de Wadi Rum, não perdendo a possibilidade de visitar um dos mais belos locais da Jordânia.
Assim faço. Espero uma hora para que o autocarro parta de Aqaba e me leve directamente até à aldeia que fica às portas do deserto, entalada entre duas enormes formações montanhosas e já bem dentro da zona protegida, não precisando assim sequer de pagar entrada. São já duas da tarde, não me sobrando muito tempo para enveredar deserto adentro. Na Rest House pergunto por uma possível rota para duas horas e um bom local para montar a tenda. Depois de explicar que não tenho dinheiro para pagar a um guia de jipe ou camelo e muito menos para pernoitar num acampamento onde dormida e refeição ficam por pelo menos 25 euros, o funcionário que me escuta indica-me um percurso e diz-me que posso ficar no seu acampamento que esta noite se encontra vazio.
Compro mantimentos no supermercado vizinho e faço-me ao caminho. A principal estrada da povoação – onde miúdos jogam à bola, agora que a sombra das montanhas a cobre por completo – desemboca literalmente nas areias vermelhas do deserto. As montanhas são tão altas que facilmente se perde a noção de escala. Aquilo que parece estar a 10 minutos de caminhada está na verdade a uma hora ou mais. Vejo camelos e jipes carregados de turistas tão longe que nem ou oiço.
A solidão no deserto é um aconchego.
Encontro o acampamento vazio e monto tenda enquanto o sol parece estar de despedida por hoje, recolhendo atrás do horizonte e alagando de púrpura as areias onde me sento para o ver retirar-se.
De Cabo a Cabo tem por objetivo unir os pontos mais a norte da Europa e mais sul de África, numa viagem em busca das afinidades e multiplicidades dos povos, das suas culturas, crenças e esperanças, das suas singularidades e de como o homem é um ser “pacífico e cooperativo”, como dizia o professor Berger a Paul Theroux durante a sua «Viagem Por África». Com saída de Santa Maria da Feira, Portugal, no dia 28 de agosto de 2011, Mateus Brandão percorreu 20 países em 3 continentes durante 9 meses.
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Olá! Vou ai Egito e gostaria de ir também a Israel, passando pelo Chipre. Sabe dizer se há outro meio de transporte (por exemplo, barco), do Egito para o Chipre? Obrigada!