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Arte urbana em Lisboa

Por Filipa Chatillon
Arte urbana em Lisboa
Arte urbana em Lisboa

Descendo a Avenida Fontes Pereira de Melo, os nossos olhos são imediatamente atraídos para a cara amarela, que espreita por baixo do lenço cor-de-rosa. A sua mão, também amarela, segura uma fisga humana.

O mural dos artistas brasileiros Os Gémeos anda nas bocas do mundo desde que foi pintado num prédio devoluto nessa avenida. Junto com as obras de Blu, Sam3, Ericailane e Lucy Mclauchlan, todas no mesmo quarteirão, fazem parte da última fase do projeto Crono de 2010.

Foi este projeto que pôs Lisboa no panorama das cidades de arte urbana, mas o trabalho da Câmara Municipal para a valorizar começou dois anos antes. A Galeria de Arte Urbana (GAU) faz parte do Departamento de Património da Câmara Municipal de Lisboa. Começou por ser constituída por dois painéis na Calçada da Glória, com o objetivo de dar um enquadramento legal à pintura de graffitis, ao mesmo tempo que se procedia à limpeza de tags e murais ilegais no Bairro Alto.

Ao longo dos anos, foram sendo disponibilizados outros espaços e o âmbito da Galeria espalhou-se a vários projetos. Há concursos para a pintura de vidrões e camiões do lixo, mais painéis na Calçada da Glória, que vão sendo periodicamente alterados, e disponibilização de muros, paredes e fachadas para intervenções organizadas pela própria Galeria ou em parceria com outros intervenientes, como aconteceu no projeto Crono. “Pretende-se contribuir para a valorização do património da cidade, para este tipo de expressões de arte urbana, e dar-lhes um espaço de modo a evitar atos de vandalismo contra o património”.

A GAU faz a ligação entre a Câmara (no caso de edifícios públicos e para emitir as licenças necessárias), os proprietários de edifícios privados e os artistas, de modo a disponibilizar espaços onde possam realizar as suas obras. Promove também projetos com o objetivo de usar a arte urbana como uma ferramenta para a inclusão social, para atenuar tensões sociais e culturais e para a promoção do diálogo entre gerações, como o “Há arte no bairro”.

No muro do Hospital Psiquiátrico Júlio de Matos podemos ver “Rostos do Muro Azul”, um mural com mais de 1 km. Tem trabalhos de dezenas de artistas nacionais e internacionais, mais e menos conhecidos, selecionados através de concurso público. Todos obedecem ao mote do rosto, com o azul como cor dominante.

O mural das Amoreiras é um dos símbolos da arte urbana em Lisboa. Hoje é um local “aprovado” para realização de obras, mas desde a década de 90 que é utilizado, sendo considerado o Hall of Fame da cidade. Tem, neste momento, entre peças dessa década e outras que foram surgindo, três murais que ficaram muito conhecidos pelo teor de intervenção político-social; e foram pintados aquando da visita da Troika a Portugal, em 2012. Nomen, Slap, Kurtz, Exas e Luka pintaram Passos Coelho e Paulo Portas como fantoches de Angela Merkel; um Passos Coelho pistoleiro; e uma criança com a mensagem “Pray for Portugal”.

Em Alcântara, na Rua do Cais de Alcântara estão pintados vários murais que fazem parte do projeto “40 anos, 40 murais”, da Associação Portuguesa de Arte Urbana. Recriam “momentos históricos da Revolução de abril e outros acontecimentos políticos, mas com a particularidade de não se fazerem referências partidárias, como era comum nos murais políticos que explodiram em Portugal depois da Revolução dos Cravos e que agora estão praticamente extintos”. A mesma associação foi responsável pela remodelação da passagem subterrânea da Avenida da Índia, junto à estação ferroviária de Alcântara. Um espaço que se encontrava degradado, está agora de cara lavada com painéis de arte urbana, com desenhos das paisagens, monumentos e edifícios mais emblemáticos da cidade.

O parque de estacionamento do Mercado do Chão de Loureiro, perto da Sé de Lisboa, funciona também como uma galeria de arte urbana. A cada andar foi atribuído um artista, que pintou várias paredes. E os exemplos multiplicam-se pela cidade.

Vhils, de Lisboa para o mundo

Alexandre Farto aka Vhils é um dos rostos principais por detrás da explosão de interesse na arte urbana portuguesa. Literal e figurativamente. As suas caras esculpidas em paredes estão espalhadas por vários países e é um dos nomes mais conhecidos internacionalmente. Por cá, para além do seu trabalho pessoal como artista, foi um dos responsáveis pelo projeto Crono e é um dos donos da Underdogs, uma “plataforma internacional de trabalho, com base em Lisboa, que visa criar espaço dentro da cena da arte contemporânea para artistas ligados às novas linguagens da cultura visual urbana”.

Desde 2013 que têm um programa de arte pública, em que convidam alguns dos mais conceituados artistas urbanos contemporâneos pertencentes à plataforma, a visitar Lisboa e a trabalhar na e com a cidade, segundo formatos e tipologias diferentes. Realizam trabalhos originais, alguns unicamente através de intervenções no espaço público (murais de grande dimensão), outros juntando às suas peças no exterior a realização de uma exposição individual. A GAU disponibiliza as paredes, e a plataforma faz o resto com o objetivo de “estabelecer uma relação privilegiada entre os artistas, a cidade e os seus habitantes, e tornar a arte urbana uma experiência do dia-a-dia”.

Deste projeto surgiram já 22 murais, espalhados por toda a cidade de Lisboa, quer em zonas mais centrais e turísticas, quer em zonas residenciais e menos óbvias como Marvila e Xabregas.

Este ano a plataforma começou com visitas guiadas, em minibus, a alguns destes murais. É uma maneira de chegar a alguns dos menos acessíveis, mas principalmente de ficar a conhecer melhor a intenção dos artistas por trás das obras e as técnicas utilizadas. Fica-se a saber, por exemplo, que no mural de Vhils e Pixel Pancho, na Avenida Infante D. Henrique, se pretendia dar a ideia de um Homem-vento a empurrar o barco para porto seguro, quando a interpretação geral, como constatam em várias visitas, é a oposta, a de uma tempestade que o destrói; que o Pedro Álvares Cabral em versão sem abrigo, do brasileiro Nunca, em Marvila, compara a situação de Portugal na altura dos descobrimentos, com hoje; ou que os azulejos de Olivier Kosta-Théfaine, numa casa na Rua Dr. Estevão de Vasconcelos fizeram tanto sucesso que os vizinhos queriam intervenções nas suas casas também.

Conhecer a arte urbana em Lisboa: com guia ou sem guia?

Para além destes locais onde o trabalho é de grande escala, ou se concentram trabalhos de vários artistas, Lisboa está cheia de obras mais pequenas espalhadas nas suas paredes. É estar atento nos seus passeios pela cidade e pode descobrir pequenos (e não tão pequenos) desenhos, ou mensagens, de artistas conhecidos e anónimos. Esse também é parte do encanto. Por exemplo, repare no gato de C215, na Rua das Janelas Verdes, que poderá passar despercebido, estando o stencil maior mesmo na rua em frente. O autor francês deixou vários destes pormenores pela cidade.

Na tentativa de explorar o que começa a ser um nicho de mercado, existem já vários tours que exploram esta faceta da cidade. Há que ter algum cuidado, uma vez que alguns dos guias não têm informação suficiente, ou correta sobre as obras. Por exemplo, já aconteceu atribuírem a imagem de um dos personagens do mural pintado pela população local, nas escadinhas de São Cristovão, a Salazar, quando na verdade a pessoa representada é o padre da Igreja de São Cristovão.

Se preferir explorar por si mesmo, mas gostava de mais informação, o livro Street Art Lisbon, feito em parceria com a GAU, vem com um mapa com as coordenadas de todas as obras fotografadas, e fará uma boa recordação do que foi visto, e poderá desaparecer. Porque a efemeridade é uma característica inerente à arte de rua.

Veja também onde ficar em Lisboa.

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Filipa Chatillon

Tem Lisboa na palma da mão, a América do Sul debaixo da pele, a Argentina no coração e o mundo na cabeça. Escreve para partilhar histórias e inspirar mudanças. Podem encontrá-la no blog Contos Alfacinhas.