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Ceviche, emblema nacional peruano

Por Kiko Martins
Ceviche de peixe
Ceviche de peixe

Peru, a capital gastronómica da América do Sul

Nos últimos trinta anos, o Peru assistiu a uma revolução: a cozinha peruana pôs o país na boca do mundo. Num território com mais de dois mil quilómetros de costa, muito montanhoso e com uma selva imensa, há todo o tipo de matéria-prima: desde peixes, moluscos, frutos tropicais e “legumes indígenas” a animais estranhamente suculentos e mais de três mil tipos de batatas.

A uma boa dose de sabedoria inca acresce uma culinária típica que é o ponto de encontro de várias culturas, resultado da mestiçagem entre os vários povos que ajudaram a escrever a História peruana.

Grande parte do que aprendi sobre a culinária peruana, devo-o aos Albrizzio, sobretudo à Rita, a matriarca. Nos dias que passei em Lima, instalado em casa deles, tive oportunidade de estar na festa de anos da Verónica, a filha mais velha, dei inúmeras voltas turísticas e provei um sem fim de receitas diferentes.

A maior parte das vezes, tomámos as refeições em casa porque o desenvolvimento gastronómico tinha feito aumentar os preços e, tal como para tantos outros peruanos, também para os Albrizzio se tornou difícil frequentar restaurantes.

Por isso, quando, numa manhã, a Rita me surpreendeu com um convite muito especial – ir conhecer uma das opções gastronómicas mais económicas e deliciosas que ficava na outra ponta da cidade -, disse imediatamente que sim.

Ceviche
Para além do Peru, o ceviche é popular em países como o Panamá e a Costa Rica (na foto, um ceviche de polvo no Mercado de Marisco da Cidade do Panamá)

Para chegarmos ao Terminal Pesquero de Lima tive de acordar bem cedo, por causa do trânsito caótico da cidade. E também porque quanto mais cedo chegássemos, mais frescos seriam os produtos. Logo, melhor seria o nosso almoço.

Na costa peruana, é tal a quantidade e variedade de produtos do mar – e ainda por cima custam seis vezes menos do que em Portugal. Sapateiras, ameijoas, búzios, lapas, camarão, algas e peixes de todos os tamanhos e feitios. Alguns familiares, outros que nunca tinha visto. E, no segundo andar do mercado, descobri que os peruanos sabiam o que fazer com o peixe.

A Rita começou por pedir sudado, um peixe delicioso cozinhado num caldo onde não faltou nenhum tipo de marisco, temperado na perfeição. E logo depois revelou que estávamos num dos melhores sítios da cidade para provar o famoso ceviche, peixe fresco marinado em caldo de peixe e sumo de lima que, graças à acidez do citrino, fica cozinhado na perfeição, sem necessidade de recorrer a nenhum método de confeção. A receita foi criada há mais de quatro mil anos pelo povo Mochica, que preparava um prato de peixe marinado em tumba, um fruto semelhante ao maracujá.

A malagueta foi adicionada alguns séculos mais tarde. E com os espanhóis chegaram os citrinos, que rapidamente se tornaram indispensáveis na preparação do ceviche. Enquanto estive sentado à mesa, comecei a perceber por que motivo a culinária peruana compete de igual para igual com as grandes cozinhas do mundo.

Mais do que alta ou baixa cozinha, produtos gourmet ou comida caseira, existe boa ou má cozinha. E uma coisa é certa: em qualquer parte do território peruano é sempre boa. A partir do momento em que voltei a Portugal, o Peru nunca mais me saiu da cabeça, de tal forma que não consegui não abrir um novo restaurante com uma forte inspiração peruana. A Cevicheria fica em Lisboa e é lá que consigo matar saudades deste país mágico.

Ceviche, emblema nacional peruano

Ceviche peruano
Ceviche (no caso, de peixe), um dos pratos mais populares da gastronomia peruana

O ceviche é uma das receitas mais deliciosas que se podem provar no Peru. Preparado com peixe branco ou marisco, servido quente ou frio, é um dos pratos peruanos com maior sucesso. A receita é preparada com diversos tipos de malagueta, praticamente impossíveis de encontrar em Portugal. Por isso, doseiem o picante a vosso gosto. Num país onde se cultivam perto de três mil variedades de batata – a papa – e duas mil variedades de batata-doce – o camote –, nada melhor do que optar pela batata-doce para acompanhar este prato.

Ingredientes

  • 4 batatas-doces
  • 1 filete de peixe branco (± 2 quilos)
  • 1 malagueta sem sementes, picada
  • Piripiri em pó
  • Sal
  • 1 cebola cortada em tiras finas
  • 1 mão-cheia de coentros picados
  • Sumo de 3 limas

Receita

Numa panela com água, coza as batatas-doces com pele durante cerca de 30 minutos. Espete um palito para verificar se estão cozidas. Retire a panela do lume e descasque as batatas. Prepare o ceviche: corte o filete de peixe branco sem pele e sem espinhas em pedaços (1 cm por 1 cm). Numa panela prepare um caldo de peixe bem apurado. Numa tigela, coloque o peixe cru com a malagueta, o piripiri, o sal, a cebola, os coentros e regue com o caldo de peixe e o sumo de lima. Não espere mais do que 5 minutos para servir. Acompanhe com a batata-doce.

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Kiko Martins

Cozinheiro e viajante e um dos professores da Chefs' Academy. Já deu uma volta ao mundo gastronómica, é casado, tem dois filhos e está à frente das cozinhas d'O Talho e d'A Cevicheria. Gosta de estar à mesa, ainda mais a beber pisco sour.