Monte da Fornalha, um espaço fora do vulgar

Por Ana Isabel Mineiro

Não é apenas mais um monte alentejano recuperado para turismo: da decoração ao jardim, a mão da sua proprietária transformou o Monte da Fornalha num espaço fora do vulgar, onde o Alentejo aparece apenas na sua história e na placidez do local.

Monte da Fornalha

É um monte alentejano sim, e não fica longe de Estremoz. Confirma-se nas linhas baixas da maior parte do edifício, na cor branca das paredes, nas barras azuis que debruam portas, janelas, e as paredes junto ao chão. Mas mais à frente o edifício levanta-se num primeiro andar com acesso por uma pouco comum escadaria, que dá para um terraço coberto, e as cores frias transformam-se num ocre forte, que contrasta pelo calor que emana. O jardim é frondoso e um corredor de colunas cobertas por trepadeiras transforma parte do caminho até aos confins da propriedade num caramanchão bem sombreado, onde cadeiras estrategicamente colocadas convidam ao descanso.

Também os interiores fogem à simplicidade e ao branco característicos das casas alentejanas, sempre à procura de uma frescura tão desejada durante os tórridos verões: paredes em tons de ocre, desta vez do amarelo-torrado ao tijolo, contrastam com a alvura costumeira. Numa sala exterior, lâmpadas de metal trabalhado distribuídas pela mesa e por um nicho reaproveitado dão um toque arábico, reforçado pelo acesso a um pequeno jardim fechado, como um espaço reservado a odaliscas ausentes. Também em redor da piscina, um antigo alpendre de utensílios agrícolas transformado em zona de repouso estabelece uma ligação entre o Oriente e o Ocidente através da decoração: grandes cortinas brancas, canapés cobertos de crochés e colchas de algodão, abundância de almofadas.

Orlanda Alves, a proprietária, conta-nos um pouco da história do Monte da Fornalha no seu sotaque madeirense, que sobrevive a muitos anos de continente: “Eram vinte casas que pertenciam a dez famílias; todas tinham uma cozinha, uma sala com lareira e um quarto nas traseiras. Era gente humilde, que trabalhava na agricultura. Isto é o que consegui saber, o que se pode retraçar até ao século XVIII”. Quando adquiriu a propriedade, em 1995, já estava tudo em ruínas e só uma família vivia no último quarto. A filha do dono e a sua irmã, que concretizaram a venda, contaram que este núcleo de casas juntas, onde chegou a viver muita gente, formava como que uma pequena aldeia. “Davam aqui muitas festas, cantavam e dançavam todos depois de jantar. Ainda hoje há gente que me pede para entrar e ver o jardim, porque foi aqui, numa dessas festas, que conheceram o marido ou a mulher”.

As amigas de Orlanda diziam-lhe que é muito difícil arranjar trabalho depois dos quarenta; “então pensei em criar o meu próprio trabalho”. Quando vivia em Cascais vinha muito ao Alentejo, que ficou a conhecer bem, e ia procurando montes à venda, na esperança de encontrar um lugar onde fosse agradável viver e instalar o seu projeto de turismo rural. Mais tarde mudou-se para Vila Viçosa, e aí foi acumulando muito do recheio que agora vemos, entre antiguidades e imitações, peças da Índia, da China, coisas compradas em Lisboa e Cascais.

As cores que vimos nas paredes são ensaiadas por si própria com argamassa e ocre numa “parede-paleta”, antes de decidir a sua aplicação. Tudo revela um toque muito pessoal, sem grandes preocupações de obediência ao que seria de esperar num monte alentejano, mas ao mesmo tempo sem nada de demasiado chocante num edifício tradicional, criando um ambiente rústico-oriental muito a seu gosto – e de muitos clientes que, para seu desconcerto, lhe afirmam que “não o vão indicar a ninguém, para não estragar o lugar”.

Depois da aquisição do monte fez uma candidatura ao SIR, e para provar à Direcção Geral de Turismo que falava muito a sério, deu início às obras. Do SIR recebeu cerca de 35% do custo, mas levou anos a terminar o projeto, que custou cerca de cento e vinte mil “contos”, por falta de financiamento; as obras principais arrancaram em 1998, e conseguiu abrir em 2000. “Lembro-me que os primeiros clientes foram alemães – ainda nem tinha posto a placa e estava a fazer os jardins”.

Nesses primeiros tempos, Orlanda “pensava à noite no jardim – amanhã faço aquele bocadinho”. E ainda hoje é ela quem o limpa e decora as mesas do exterior com ramos de oliveira e limões apanhados das árvores, mantém os canteiros com flores que saem da erva rodeada por pequenos muros de buxo. São quatro hectares de campo que estão sob o seu governo, um trabalho incessante mas do qual não desdenha; afinal, esta é a sua casa e tudo é fruto da sua imaginação. A piscina comprida situa-se ao longo do telheiro, vasos de cerâmica antiga saem das esquinas de buxo ou de pedra crua que delimitam os passeios, um tanque antigo foi pintado de branco e polvilhado de pétalas, pequeno requinte no que já foi o tosco quintal das habitações.

As obras de reconstrução do edifício contaram com a ajuda de um amigo arquiteto “não encartado”, João Kaditch, e as maiores alterações deram-se no interior, para adaptação do espaço à sua nova funcionalidade. Renovaram-se paredes exteriores e interiores; as que se mantiveram são de pedra espessa, revestidas a cimento e pintadas com cal; as novas são de tijolo, com caixa-de-ar. Uma das paredes da sala separava-a de um quarto, que se transformou numa cozinha convenientemente perto da parte da sala onde se serve os pequenos-almoços, que contam com compotas caseiras, pão e queijos regionais.

Dois dos seis quartos de hóspedes ficaram inalterados, com os seus nichos e arcos originais, apenas se acrescentou a casa de banho que todos têm. Cresceu o primeiro andar no fim do edifício baixo e corrido que constitui a casa principal e nasceu mais um quarto, independente, no fundo do jardim. Renovaram-se os telhados e tetos, com proteção térmica, ondulina e telha de canudo no exterior, travejamento à vista de madeira de pinho e eucalipto no interior.

A combinação do teto de madeira, as paredes brancas e ocre, as lareiras, tapetes e outros elementos decorativos com um toque oriental, dão às salas, levantadas por uma coluna e unidas por um arco tosco, um ambiente de conforto caseiro que ao mesmo tempo tem algo de sofisticado. As paredes traseiras, mais sombrias, possuem agora janelas duplas, a primeira de alumínio e a segunda de madeira, mas na frente, onde bate o sol, a caixilharia é de madeira de casquinha, como a das portadas e das portas. O chão é de cimento afagado pigmentado, mas em alguns lugares aproveitou-se a tijoleira antiga. A entrada tem lajes de xisto, assim como um dos quartos.

Ao lado das salas e fazendo parte do espaço comum, Orlanda criou agora uma pequena sala de leitura envidraçada, onde o frio tem dificuldade em entrar, mas não a luz. Aqui deixou-se a pedra da parede espreitar por baixo do ocre, e mais uma vez se recuperou a lareira. No total ficaram oito das dez, e uma delas, na sala, foi transformada em estante. Também os postigos foram restaurados, porque “são arte”. E para o provar encontramo-los transformados em quadros, pendurados nas paredes dos quartos. Nas suas tábuas tratadas, que exibem furos, riscos e marcas de uso, só falta a assinatura do artista: o tempo. E a fornalha que deu nome ao monte? “Durante as obras chegaram a uma parede oca, e pensaram que podia lá estar escondido um tesouro – mas era apenas o vão onde trabalhava o ferreiro, o lugar da sua fornalha…

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Ana Isabel Mineiro

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