Nova Iorque por quem lá vive: Irina Matos

Irina Matos em Nova Iorque
Irina Matos na ponte Manhattan, Nova Iorque

A Irina Matos tem 33 anos, está a fazer um postdoc em Biologia Celular e do Desenvolvimento e vive em Nova Iorque, Estados Unidos da América, há 2 anos. Convidei-a a partilhar connosco um pouco da “sua” Nova Iorque, marcada pelas vistas do rooftop de um prédio vizinho, corridas no Central Park e os pores-do-sol no Christopher Street Pier ao som de uma milonga.

É um olhar diferente e mais rico – a de quem vive por dentro o dia-a-dia da cidade, estando simultaneamente fora da sua “zona de conforto”, deslocado, como acontece a todos os viajantes.

Este é o nono post de uma série inspirada no programa de televisão “Portugueses pelo Mundo”.

Em Nova Iorque com a Irina Matos (entrevista)

Define Nova Iorque numa palavra.

Excêntrica.

Embora seja uma cidade que de facto vai dormir, é uma cidade que acorda diferente todos os dias, está em mudança constante e não para. Cresce e renasce a cada dia. É agitada, obriga-nos a mexer mesmo quando só queremos descansar.

Nova Iorque é uma cidade boa para viver? Fala-nos das expectativas que tinhas antes de chegar, e se a realidade que encontraste bateu certo com a ideia preconcebida que trazias.

Nova Iorque é uma cidade fantástica quando aqui se quer viver. Não tinha quaisquer expectativas, sabia apenas que era a “cidade que nunca dorme”. Hoje sinto-me feliz e em casa.

É bom viver aqui quando se está de passagem, quando se pode arranjar tempo e quando se tem algum dinheiro no bolso. Nova Iorque é uma cidade que nos desafia constantemente e onde verdadeiramente tudo acontece. É uma cidade com uma oferta cultural incrível, com a vantagem de juntar gente de todo o lado.

Esta cidade não deixa ninguém indiferente e a sua enorme diversidade ensina-nos a ter uma perspectiva diferente do mundo que nos rodeia.

E o que mais te marcou em Nova Iorque?

A oferta cultural. É inimaginável a quantidade de eventos que acontecem por aqui. Desde o primeiro dia que senti que estava no centro do mundo e que dependia de mim aproveitar essa oportunidade. Todos aqueles eventos que sonhava ir quando estava em Portugal, passaram a ser uma realidade e estão ao meu alcance.

Houve dois eventos que nunca esquecerei. O concerto que os The National deram no MoMa PS1, em que tocaram durante 6 horas a mesma música. Foi indescritível presenciar aquele momento onde recomeçavam uma e outra vez, sempre com a mesma garra e, tal como Nova Iorque, em mudança constante – cada versão era diferente da anterior. O outro momento foi ter assistido no Park Avenue Armory ao concerto Music in 12 parts de Philip Glass e, no final, ter falado com ele e apertado a mão. Estas pessoas existem mesmo para além do nosso imaginário.

Como caracterizas os nova-iorquinos?

É difícil perceber quem são as pessoas de Nova Iorque, porque somos uma mistura de gente de todo o mundo. É engraçado ir no metro e olhar para a diversidade de cor da pele, dos olhos, dos sorrisos, das expressões.

As pessoas de Nova Iorque têm, no entanto, formas de estar semelhantes. São muito críticas e competitivas, têm de saber sempre onde é o melhor sítio ou a melhor coisa a fazer. Há um ranking constante em tudo o que fazem. Andam depressa na rua: se um sinal está vermelho, atravessam a rua perpendicular a essa e continuam o seu caminho. Há um stress inerente, estão sempre com pressa para ir para qualquer lado e, no meu caso, sinto que estou sempre atrasada.

Viver aqui tem-me permitido conhecer pessoas de diferentes partes do mundo e tem sido bastante interessante conhecer as suas culturas, o seu modo de vida, a forma como encaram cada desafio. Tem sido uma experiência muito enriquecedora ter a oportunidade de interagir com pessoas tão diferentes. Nesta cidade, que pode ser bastante solitária, é de facto possível fazer uma nova família de amigos.

O Central Park de Nova Iorque na Primavera
O Central Park de Nova Iorque na Primavera

Como terminarias esta frase: “Não podem sair de Nova Iorque sem…”

Viver Nova Iorque. Embora não sendo capital dos Estados Unidos da América e nem do estado de Nova Iorque, esta cidade é por muitos considerada a capital do mundo. Tentar vivê-la é o melhor que dela se pode levar. E tentar vivê-la é experimentá-la, é sentir as diferentes formas de arte, as diferentes culturas, os diferentes bairros, os diferentes cheiros, os diferentes sabores, os diferentes sorrisos.

Vamos complicar a conversa e tentar fazer um roteiro de 3 dias em Nova Iorque. Indica-nos as coisas que, na tua opinião, sejam “obrigatórias” ver ou fazer.

Um dos passeios que adoro fazer começa na 23rd Street com a 6th Av. Caminhem em direcção ao Oeste da ilha. Do lado esquerdo vão encontrar o emblemático Chelsea Hotel, onde viveram conhecidos músicos, escritores, artistas. A primeira paragem pode ser para um donuts e um café no Doughnut Plant, um café muito simpático com donuts deliciosos.

Seguir até ao High Line e de lá seguir em direcção a sul. O High Line é um parque construído sobre os carris elevados duma antiga linha férrea de Nova Iorque, que tenta preservar o aspecto selvagem da vegetação que foi surgindo. O parque mistura-se com o lado oeste de Chelsea e vai desde a 34th até à 14th street; é interessante apreciar a arquitectura dos edifícios e inevitável sonhar que um dia ali poderia morar. Chegando à 14, desçam e visitem o Chelsea Market. Lá é possível encontrar diferentes lojas e restaurantes com a interessante particularidade de se estar na antiga fábrica nacional de biscoitos.

Do Chelsea Market sigam para o Sul da Ilha e apanhem o ferry para Staten Island. É uma viagem gratuita e o ferry passa ao lado da emblemática Estátua da Liberdade. Chegando a Staten Island apanhem o ferry de volta para Manhattan, a vista para o skyline de Nova Iorque é a fotografia que irão recordar para sempre. Depois caminhem até à ponte de Brooklyn e apreciem a luz do final de tarde sobre Manhattan; se houver energia, desçam para Brooklyn e caminhem até Dumbo, onde o pôr-do-sol é fantástico.

No segundo dia devem aproveitar para visitar museus. Não perder o MoMa.

No terceiro dia podem começar por passear no Central Park. Embora pareça um cliché de Nova Iorque, é de facto uma experiência a não perder. O Central Park é um dos meus locais favoritos, um dos poucos sítios onde é possível encontrar alguma paz nesta cidade acelerada. O parque responde a cada estação do ano com todas as cores que pintaram os nossos livros da primária. É uma sensação única poder testemunhar nesta “selva de cimento” as quatro estações do ano. As cores douradas do Outono, a neve no Inverno, as flores da Primavera e um verde carregado no Verão. Nunca vou esquecer uma das corridas de Inverno depois de um nevão. Se Narnia existisse, era ali!

Depois de visitar o parque podem apanhar o metro até Union Square e de lá seguir para Williamsburg, Brooklyn. Andem pelas ruas, e desçam até “waterfront” para ver a vista sobre Manhattan. Caminhem pelas ruas, sintam a cultura hipster, entrem na Earwax e comprem um vinil. No final, se ainda tiverem energia, caminhem até à ponte Williamsburg e atravessem-na para Manhattan.

Chelsea vista do Christopher Street Pier
Vista para Chelsea a partir do Christopher Street Pier

Tena algumas dicas para se poupar dinheiro em Nova Iorque?

Esta não é uma cidade compatível com poupar dinheiro, mas é sempre possível encontrar eventos gratuitos, principalmente no Verão, como concertos e cinema ao ar livre.

Visitar as galerias de arte em Chelsea e, se for dia de inaugurações, aproveitar o vinho e os aperitivos que são oferecidos.

Os restaurantes têm sempre specials ao almoço e muitos até às 16:00. Vale a pena experimentar a comida de rua, mas atenção: neste caso vou sempre aos que têm a maior fila. Os nova-iorquinos são bastante críticos e, normalmente, as filas são uma boa indicação da qualidade.

Para beber um copo, vale a pena aproveitar as happy hours, onde as bebidas são normalmente a metade do preço.

A fruta é normalmente mais barata nos carros de rua.

Falemos de comida. Que especialidades gastronómicas temos mesmo de provar?

Em Nova Iorque pode-se encontrar e experimentar de tudo um pouco. Partilho as coisas que mais gostei e que desconhecia:

Ramen. Uma espécie de sopa japonesa que faz lembrar a nossa canja, mas com muitos mais ingredientes. É deliciosa principalmente no Inverno.

Soup dumpling. Uma espécie de rissóis mas em vez de fritos são cozidos a vapor numa espécie de cesto. É característico da região de Xangai.

Halal Food. Normalmente encontrada nos carros de comida de rua. É comida do Médio Oriente, super saborosa.

Bublle tea. Um chá taiwanês com uma particularidade interessante: bolinhas de tapioca cobertas com uma gelatina.

Imagina que queremos experimentar comidas locais. Gostamos de tascas, botecos, lugares tradicionais com boa comida e se possível barato. Onde vamos jantar?

Em Nova Iorque não é fácil perceber o que é a comida local, porque aqui estão representadas todas as regiões do mundo. Aqui ficam os meus locais favoritos:

Experimentar uma sopa ramen no Totto Ramen, considerado o melhor de Nova Iorque, barato, mas sempre com lista de espera, o local é muito pequeno, mas vale muito a pena.

Soup Dumpling no Joe’s Shanghai na Chinatown de Nova Iorque, sempre com muita gente a entrar e a sair e o mais provável é partilhar a mesa com desconhecidos! Adoro.

Slow food do Médio Oriente, Moustache em West Village.

Não perder ainda o Hangawi, um restaurante vegetariano coreano com um ambiente zen, bastante calmo e acolhedor.

E, finalmente, o meu restaurante favorito: Hakata Tonton, um restaurante japonês muito delicioso, onde devem experimentar os pezinhos de porco (quase todos os pratos têm-nos como base), o avocado tofu e o spicy tuna carpaccio.

Como é a movida em Nova Iorque? O que sugeres a quem queira sair à noite?

Mais uma vez, a oferta é imensa. Eu normalmente não me importo muito onde vou, desde que esteja com os meus amigos. Por vezes procuramos locais com cerveja portuguesa só para matar saudades. Outras, gosto de ir beber cocktails: não perder o Pineaple Express no rooftop do Hotel Chantell. Há ainda um bar especial que deve ser visitado, chamado Please Don´t Tell; tal como o nome indica, não digo porquê.

Skyline de Nova Iorque
O famoso skyline de Nova Iorque

Escolhe um café e um museu.

Sem dúvida que o meu museu favorito é o MoMa, não só pela coleção permanente mas também pela dinâmica da organização das exposições temporárias. Outro aspeto interessante é o facto de o MoMa ter diferentes ciclos de cinema durante todo o ano e, muitas vezes, os realizadores estão presentes para uma sessão de perguntas e respostas com o público. Finalmente, há ainda a não perder os ciclos de música com bandas emergentes.

Café favorito: La Colombe. O barulho da máquina de café faz lembrar o das nossas e o café é muito bom.

Uma das decisões críticas para quem viaja é escolher onde ficar. Em que bairro nos aconselhas a procurar hotel em Nova -iorque?

Ficar em Manhattan é de facto muito caro. Mas qualquer local da cidade está relativamente perto de uma estação de metro e é fácil chegar a qualquer lado.

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Tens alguma sugestão para quem quiser fazer compras em Nova Iorque?

Gosto dos farmer markets que se vão encontrando pela cidade ao fim de semana e em especial uma feira em Williamsbourg que se realiza aos sábados de manhã.

Antes de te despedires, partilha o maior “segredo” de Nova Iorque; pode ser uma loja, um barzinho, um restaurante, um parque, uma galeria de arte, algo que seja mesmo “a tua cara”.

Por ser uma cidade que não para, os meus locais “secretos” são os que me conseguem fazer esquecer o rebuliço da cidade. Subir ao rooftop do prédio vizinho e olhar para Manhattan quando vai dormir, correr no Central Park e parar junto da minha árvore favorita com um ramo em forma de baloiço, ver o pôr-do-sol no Christopher Street Pier e quase não ouvir a cidade enquanto atrás de mim se dança a milonga.

Obrigado pelas dicas, Irina. Encontramo-nos numa próxima viagem a Nova Iorque.

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.

6 comentários em “Nova Iorque por quem lá vive: Irina Matos”

  1. Adorei ,

    Com esta descrição apaixonante da cidade dá mais vontade de revivê-la novamente.
    Parabéns pela descrição da tua, agora, cidade.
    Deixo uma sugestão: e porque não uma descrição de uma cidade que gostasses de viver para além de Manhattan?

    Manuel Teles

    Responder
  2. Grande entrevista e excelentes dicas.
    Em Setembro irei pela 1ª vez a NYC e muito provavelmente seguirei algumas dicas.
    Parabéns

    Tiago Pacheco

    Responder
  3. Oi Filipe. Apesar de existirem muitos guias e textos que falam sobre NY, li este relato e ele foi particularmente importante para mim. Procurei pela Irina no Facebook, mas lembrei que não chegam mensagens de desconhecidos na mesma caixa das de amigos. Então, se você puder, manda pra ela isto aqui:

    Olá Irina, tudo bem?
    Estou escrevendo porque li o que você disse no blog do Filipe Gomes. Eu vi um milhão de opiniões sobre Nova York depois que comecei a planejar a viagem e nem por isso escrevi para alguém, mas a parte que você falou do show do National, especialmente, me fez vir até aqui te procurar.

    A verdade é que o dólar está muito caro para nós brasileiros e eu estava quase remarcando a minha viagem, mas encontrar o seu relato me fez ter uma vontade inadiável de conhecer a cidade, apesar de infelizmente não ter nenhum show incrível como aquele no período em que a minha estadia está programada.

    Bem, não sei mais o que dizer. Não se preocupe que não sou nenhuma louca que vai ficar te incomodando, nem pedir favores ou algo do tipo.
    Sei também que existem mil pessoas que partilham dos meus gostos por aí, mas não tinha ainda encontrado nenhuma que eu me identificasse, por isso o impulso de te contar tudo isso.

    Um abraço.
    Ana.

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  4. Coloco este comentário porque as dicas neste artigo foram bastante importantes na minha última visita a Nova Iorque (no princípio de Agosto).

    Gostei particularmente de:
    – a High Line pelo seu ambiente peculiar;
    – o Doughnut Plant no Chelsea Hotel (infelizmente com a frente em obras, cheia de andaimes) – os donuts são espetaculares :-));
    – a vista do Skyline na viagem no ferry para Staten Island, que fiz de noite e de dia (uma maravilha das duas formas, mas se não puderem optem pela viagem diurna);
    – o parque Dumbo mesmo junto à ponte Brooklyn também proporciona uma boa vista sobre NYC só tenho pena de lá não ter ido no pôr-do-sol, pois o skyline com o sol ardente por trás doss arranha-céus deve ser uma coisa única.
    – Central Park continua a ser de visita obrigatória.

    Secundo a opinião da Ana (acima) de que NYC é uma cidade bastante cara, particularmente para um europeu com hábitos alimentares de “restaurante”. Os preços estão muito elevados e as gorjetas que praticamente exigem são muito pesadas (15-25%).

    Obrigado pelas dicas.

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    • Fico muito feliz que estas dicas de Nova Iorque tenham sido tão úteis. É sempre diferente ver uma cidade pelos olhos de quem lá vive. Grande abraço e boas viagens.

      Responder
  5. Excelente “entrevista”.

    No próximo ano iniciarei um MIT num hotel de NY. Vou com uma amiga… o que recomenda? Cada um alugar um quarto ou acha que é possível encontrar um t2 em Manhattan? Digamos o salário do MIT pode ser uns 2000 dólares /mês…

    Necessitaria de umas dicas mais direccionadas para quem vai viver para aí… ou com esta bolsa acha que não é possível viver em NY?

    Muito obrigado.

    Cumprimentos

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