Entre Nantes e Saint-Nazaire, na margem norte do Rio Loire, em Couëron, há uma casa inclinada, dentro do rio. Parece abandonada. É oca por dentro. Em Cordemais, vê-se uma outra casa, pequena, amarela, no topo de uma chaminé industrial. Na margem sul, no Canal de La Martineré, um barco parece saltar por cima de um dique, torcido e inclinado sobre ele. Em Nantes, destacando-se numa elevação sobre o rio, na zona do Quartier Chantenay, uma árvore nua, branca, de 12 metros, aponta os seus ramos ao céu. À noite cada ramo emanará um halo de luz, iluminando-a no breu da noite.
Como estas, outras instalações de artistas nacionais e internacionais bordejam o Rio Loire, no seu percurso entre Nantes e Saint-Nazaire. Fazem parte do projeto Estuaire, uma “aventura artística”, desenrolada em três atos, nos anos de 2007, 2009 e 2012. Em cada um deles foram convidados artistas a desenvolver instalações, colocadas em ambas as cidades e ao longo dos 60 km de estuário do Loire que as unem.
Algumas destas instalações foram provisórias, estando visíveis apenas em determinadas alturas do ano. Outras, 29 até à data, mantêm-se in situ compondo uma rota cultural e artística que pode ser visitada todo o ano. Pensadas para o local onde se inserem, elas pretendem também chamar a atenção para características e pormenores dessa área, aliando então a história dos lugares, à obra.
Os chateaux do Vale do Loire, muito mais do que palácios
Esta ligação entre as margens do Loire e a arte não é de agora. Ao longo do Vale do maior rio de França distribuem-se centenas de palácios. Alguns destes, principalmente desde o século XVI, com a influência do Renascimento Italiano e de mulheres como Catarina de Médicis e Diane de Poitiers, até aos dias de hoje, têm estado associados à promoção das artes. Com as obras que, ao longo dos séculos, foram trazidas para os castelos pelos seus vários ocupantes, e lá se mantêm, e as exposições de arte contemporânea que hoje se realizam em alguns deles, a região mantém a ligação histórica que a associa ao mecenato.
Quinta de Chaumont-sur-Loire
O exemplo mais marcante desta associação está na Quinta de Chaumont-sur-Loire, constituída pelo chateaux com o mesmo nome e os 32 hectares que o rodeiam. Antiga propriedade de Catarina de Médicis, de Diana de Poitiers e da Princesa de Broglie, em 2008 foi adquirida pela Região Centro do Vale do Loire, e é, desde então, um Centro para as Artes e Natureza.
Aqui, a par da manutenção e divulgação da propriedade e da sua história, desenvolve-se uma programação artística dedicada à ligação entre a arte e a natureza. No interior do castelo e através dos trilhos do parque distribuem-se instalações de diversos artistas contemporâneos. Este ano, no castelo, o artista mexicano Gabriel Orozco com as suas «flores fantasma», os artistas suíços Gerda Steiner e Jörg Lenzlinger com o jardim surrealista suspenso, o brasileiro Tunga com uma instalação espetacular nas cavalariças, o escultor ganês El Anatsui, na Galeria do Celeiro. No parque histórico, as estruturas aracnídeas da artista alemã Cornélia Konrads, a “Constelação do Rio” de Christian Lapie e a árvore-cavaleiro do finlandês Antti Laitinen.
Grandes fotógrafos, como Edward Burtynsky, Naoya Hatakeyama e Alex MacLean, colocam em destaque, através de imagens de uma beleza incrível, os estragos provocados pelo Homem na Natureza, enquanto Mélik Ohanian, Xavier Zimmermann e Jean-Christophe Ballot revelam o esplendor pictórico das árvores deste lugar e arredores. A simbiose do antigo com o moderno, da história com a arte, da natureza com os materiais permite uma apreciação do palácio que é diferente a cada visita e para cada visitante, e torna-o, em vez de um monumento parado no tempo, uma experiência sensorial.
É também aqui que se realiza o Festival Internacional de Jardins. Já na sua 24ª edição, reúne anualmente designers e arquitetos paisagísticos de todo mundo, funcionando como um “laboratório e observatório para o desenho dos jardins do futuro”. A diversidade, a criatividade e a qualidade dos projetos contribuíram para a reputação mundial do festival, que se tornou ponto de encontro obrigatório para a uma nova geração de paisagistas, arquitetos, cenógrafos ou jardineiros. Este ano, apresenta 30 jardins, sob o tema “Jardins de Colecionadores”.
Palácio de Chenonceau
A história do Palácio de Chenonceau cruza-se com a de Chaumont-sur-Loire através das vidas de Catarina de Médicis e de Diane de Poiters e são estas duas mulheres as responsáveis pela característica mais marcante do castelo, a sua galeria sobre o Rio Cher, afluente do Loire, que une uma margem à outra. O castelo, prenda de Henrique II de França a Diane, é apelidado de Castelo das Damas, por ter sido, ao longo da sua história governado por sete mulheres de personalidade forte.
Após a morte de Henrique II, Catarina de Médicis conseguiu que a amante deste trocasse Chenounceau por Charmont-sur-Loire. Ao mudar-se para Chenounceau, como rainha regente de França, continuou o desenvolvimento arquitetónico e artístico deste seguindo os princípios do Renascimento Italiano.
Louise de Lorraine herdou-o de Catarina e, após a morte de Henrique III, recolheu-se ao castelo, onde permaneceu até à sua morte. Foi a última presença da realeza no castelo. Após mais de um século de semi-abandono, tendo passado por vários donos e em que muitas das suas obras foram vendidas, o castelo foi comprado por um proprietário rural chamado Claude Dauphine. Louise Dupin, a sua mulher, trouxe a vida de volta ao castelo ao receber os líderes do Iluminismo: Voltaire, Montesquieu, Buffon, Bernard le Bovier de Fontenelle, Pierre de Marivaux, e Jean-Jacques Rousseau. Louise salvou também o palácio da destruição durante a Revolução Francesa, alegando que era essencial para as viagens e para o comércio por ser a única ponte que atravessava o rio numa área de várias milhas, e abrindo as portas da galeria para que tal pudesse acontecer.
Seguiu-se Marguerite de Pelouze, filha de um industrial da burguesia, que gastou uma fortuna em festas e a restaurar o castelo para que se assemelhasse ao luxo da época de Diane de Poitiers. Após um escândalo financeiro, o palácio foi vendido várias vezes até chegar às mãos da família Menier, que o mantém até hoje.
Durante a primeira guerra mundial Simone de Meunier dirigiu o hospital que a família instalou, às suas custas, nas galerias. Durante a segunda guerra mundial, a mesma família, com Simone como responsável da propriedade, ajudou os residentes da zona, usando a galeria como meio de escape da zona ocupada pelos Nazis de um lado do Rio Cher, para a livre zona de Vichy na margem oposta.
Em 1951, a família Menier encarregou Bernard Voisin de restaurar o palácio, o qual devolveu à delapidada estrutura e jardins (destruídos por bombardeamentos e uma cheia do Rio Cher em 1940) um reflexo da sua antiga glória.
É essa glória que se pode visitar hoje em dia. Para além da arquitetura única do castelo, podem ver-se tapeçarias e mobiliário das várias épocas e pinturas de Murillo, Tintoretto, Correggio, Rubens e outros mestres dos séculos XVI, XVII e XVIII. Todos os Verões, desde há 30 anos, um artista contemporâneo é convidado a expor no piso superior da galeria, e a criar uma visão pessoal do castelo, para o poster da exposição.
Os jardins são mantidos no seu antigo esplendor, e existem duas floristas residentes, responsáveis pelos arranjos que se vêm espalhados pela propriedade. Em julho e agosto, os jardins são iluminados e musicados e permitem visitas noturnas. No dia 18 de julho de 2015, por exemplo, a noite será acompanhada de uma degustação de vinhos da região, gratuita e aberta ao público (apenas terá de pagar-se o acesso aos jardins).
Para evitar filas e poupar tempo, pode comprar o ingresso antecipadamente para o Castelo de Chenonceau.
Palácio de Clos Lucé
O Palácio de Clos Lucé foi a ultima residência de Leonardo da Vinci. A convite de Francisco I, o mestre italiano cruzou os Alpes, em 1516, e mudou-se para Amboise, onde passou os últimos três anos da sua vida. A admiração do rei era tal que lhe ofereceu a propriedade e uma mesada, para que pudesse “pensar, sonhar e executar”. Em troca quis apenas o prazer de o ouvir falar.
Leonardo assim fez, passando esses anos a pintar e a desenvolver as suas inúmeras paixões nos campos da engenharia, arquitetura e do pensamento.
Hoje, o palácio está restaurado de modo a transmitir o aspeto e caráter que tinha durante esta estadia e os jardins foram transformados no Parc Leonardo da Vinci. Neste, todos os diferentes campos do conhecimento e artes explorados pelo mestre são expostos em grande escala. A sua inspiração surgia enquanto observava a natureza e aqui, através de um percurso pelo jardim pode beber-se dessa inspiração através de 16 máquinas gigantes acionáveis e 32 telas translúcidas de três a quatro metros de altura, onde estão representados desenhos e pormenores dos quadros de Leonardo da Vinci. Existem ainda 8 pontos sonoros onde podem ouvir-se – pela voz de Jean Piat – os pensamentos do grande génio do Renascimento.
A ambição dos proprietários para Clos Lucé é: “tornar-se um ponto alto de humanismo e pensamento internacional, num mundo que procura, através das suas provações, por um caminho para um novo Renascimento”, através da partilha e recolha de informação sobre a vida e obra do Mestre.
Para evitar as filas, recomendo comprar o ingresso antecipadamente para o Chateaux Clos Lucé.
Chambord, o maior chateaux do Vale do Loire
Chambord é o maior castelo do Vale do Loire e Património Mundial pela UNESCO. A propriedade estende-se por 5.440 hectares, e o castelo é um emblema do Renascimento Francês. Foi mandado construir por Francisco I, para servir apenas como residência de caça, mas com todo o esplendor que lhe permitisse exibir o seu poder aos outros soberanos que o visitavam.
Até hoje, não se sabe exatamente quem foi o arquiteto responsável pelo projeto, mas acredita-se que tenha sido um discípulo de Leonardo da Vinci e que a escada de dupla hélice, imagem de marca do palácio, foi desenhada pelo próprio mestre.
Passear pelas torres, escada acima, escada abaixo em caracol e perder-se pelos vários quartos que se ligam uns aos outros sem que saibamos já por onde entrámos e saímos leva-nos de volta ao imaginário das conspirações reais, dos jogos de cama, das damas e cavalheiros a entrar e sair escondidos.
Caminhar no telhado, com as suas janelas, chaminés e torreões esculpidos de formas e cores diferentes é como passear num conto de fadas. Daqui conseguimos imaginar o Rei Sol, que também usou o palácio em várias ocasiões, a olhar, como nós, para o verde que se espalha a toda a volta, a perder de vista. Ao pôr-do-sol, o Rio Cosson (tributário de um dos afluentes do Loire) serve de espelho a Chambord, que adquire uma tonalidade dourada.
Alguns dos quartos foram recuperados e demonstram mobiliário e tapeçarias da época, mas a maioria do castelo é usado hoje como uma enorme galeria de arte e quer o interior, quer o exterior são usados para vários espetáculos ao longo do ano. Existe ainda um programa de residências artísticas para artistas plásticos, escritores e músicos. Aqui, como nos outros palácios mencionados, respira-se cultura e modernidade ao mesmo tempo que nos passeamos por páginas da história.
Para evitar as filas no Castelo Chambord, compre o ingresso com antecedência.
Em Nantes, há uma linha que une Cultura e História
Esta simbiose também se sente no pensamento que orienta o desenvolvimento turístico de Nantes. Le Voyage a Nantes, uma empresa pública que junta os departamentos culturais e de turismo da região, desenvolveu, a par de outras atividades, um evento anual com o mesmo nome que deixa um trilho de arte permanente na cidade.
A “linha verde” é um percurso de 8,5 km que liga pontos de interesse histórico e paisagístico da cidade, mais e menos conhecidos. Ao longo deste percurso, durante dois meses no verão, desde 2012, são criados eventos, instalações artísticas e atividades, trazendo uma nova perspetiva ao mesmo percurso.
Esta linha, marcada no chão, mantém-se todo o ano, e algumas das instalações que se tornaram permanentes fazem já parte integrante da paisagem da cidade. Isto insere-se na visão de Jean Blaise, o responsável pelo turismo de Nantes (e também, desde 2014, pelo Projeto Nacional para a Arte e Cultura no Espaço Público – MNACEP), de trazer a arte para os espaços públicos e, a par do desenvolvimento turístico, proporcionar aos habitantes novas maneiras de olhar para a sua cidade.
E, também, nas palavras dos organizadores, “fazer turismo e economia rimar com cultura e arte”.
Dicas para visitar os chateaux do Loire
Excursões aos castelos do Vale do Loire
Caso tenha pouco tempo ou prefira conhecer os castelos numa viagem organizada, veja as seguintes excursões recomendadas:
- De Paris: Excursão nos Castelos do Loire (em Pequenos Grupos)
- De Paris: Castelos do Loire com Degustação de Vinhos
- De Tours: Castelos Chambord e Chenonceau com Almoço Familiar
Onde ficar em Nantes
Veja o artigo sobre onde ficar em Nantes, onde se mostram os melhores hotéis para pernoitar no centro da cidade. Alternativamente, utilize o link abaixo para encontrar os melhores hotéis (ao melhor preço) em qualquer local da cidade.
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