Não devia ter acontecido, mas aconteceu. E ninguém está livre de um descuido destes.
Segunda-feira ao fim da tarde, véspera de embarcar para Tóquio. Ao preparar o equipamento para a viagem, fui buscar o passaporte para o guardar na mochila. Como já aqui escrevi, tenho dois passaportes por motivos profissionais. Peguei no que queria levar, mas reparei que o outro estava a precisar de ser renovado. Caducara há duas semanas. Foi quando tive um pressentimento. Tinha a ideia de que eu e a Luísa tínhamos tirado esse passaporte juntos o que, a ser verdade, queria dizer que o passaporte dela estava caducado. E estava mesmo.
Eram 19:10 de segunda-feira, o voo estava marcado para as 15:05 do dia seguinte do aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto. Tínhamos um problema sério para resolver.
Avisei a Luísa, ficou incrédula. Imediatamente liguei para o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no aeroporto do Porto; apesar de ultrapassada a hora de expediente, o inspetor J. R. atendeu-me com extrema simpatia. Tentei perceber as hipóteses de fazer um passaporte em tempo útil. Não dava. Nem com urgência. Nem indo a Lisboa (o nosso voo era do Porto). O inspetor estava a tentar ajudar, mas não havia tempo útil para emitir um passaporte novo.
Até que ele me disse: “Só há aqui uma hipótese, dê-me um minuto”. Quando voltou à fala, após ter verificado que o Japão em princípio aceitaria o documento, sugeriu: “só se tirar um passaporte temporário”.
“Em casos de urgência comprovada na emissão de um documento de viagem e no sentido de possibilitar a resolução de constrangimentos pontuais, poderá ser concedido um Passaporte temporário (PT), de harmonia com o disposto nos art.º 38-A a 38-F do Regime Jurídico da concessão de Passaporte Eletrónico Português – RJPEP.”
Naturalmente, aceitei a sugestão. O inspetor pediu-me para ir ao aeroporto às 8:00 da manhã seguinte (apesar da Loja do Passaporte só abrir às 9:00) e de lá ligar à PSP para ir ter com os inspetores do SEF. “Vamos fazer isso entre os voos, por isso venha cedo”. E assim fiz.
Ida ao aeroporto para pedir o passaporte temporário
Passava pouco das oito da manhã. Credenciámo-nos junto da polícia e veio um inspetor do SEF acompanhar-nos. Talvez por razões de segurança, só deixou entrar a Luísa, razão pela qual fiquei na zona das chegadas à espera.
Por essa altura, ainda não estava muito confiante que o passaporte temporário fosse aceite por todas as entidades envolvidas na viagem. Muita coisa poderia correr mal:
- a Turkish Airlines poderia recusar o check-in ou o embarque no Porto;
- a companhia poderia também recusar o embarque em Istambul;
- a Luísa poderia ser barrada à chegada a Tóquio pelos inspetores fronteiriços – e isso significava ser recambiada para Portugal.
Enquanto a Luísa tirava o passaporte temporário, fui ao balcão da Turkish Airlines indagar sobre a possibilidade de alterar o nosso voo para daí a dois dias, e assim dar tempo para emitir um passaporte eletrónico normal. Seria uma espécie de plano B, mas rapidamente me disseram que a tarifa não o permitia. Já estava à espera; tento sempre arranjar promoções e comprar voos baratos, mas as tarifas nesses casos são sempre mais restritivas.
Assim sendo, sem a possibilidade de adiar o voo, tínhamos de arriscar. Faltava ter a certeza que o Japão aceitaria o passaporte temporário.
Já durante a noite anterior, aproveitando a diferença de fuso horário, tinha ligado para a Embaixada de Portugal em Tóquio, mas não me souberam ajudar. Na internet havia relatos contraditórios, incluindo o de um sueco que afirmava que o Japão aceitava os passaportes temporários, desde que fisicamente fossem tipo “um passaporte normal, não uma folha A4”. Faltava falar com a Embaixada do Japão em Portugal.
Pouco passava das 9:00 quando liguei para a Embaixada do Japão, em Lisboa, para tentar perceber se o passaporte temporário era mesmo aceite. Atenderam rapidamente e confirmaram sem hesitar. Fiquei mais descansado.
Nesse instante, a Luísa apareceu com o passaporte temporário na mão, visualmente muito parecido com um passaporte normal, mas azul, escrito à mão e, claro, sem ser eletrónico. Tudo parecia encaminhar-se para um final feliz mas, como disse, ainda muita coisa poderia correr mal durante a viagem. Ter um passaporte era apenas o primeiro passo.
Viajar com um passaporte temporário (a minha experiência)
Ao início da tarde, voltámos ao aeroporto do Porto para apanhar o avião. O check-in e o embarque decorreram sem problemas; a funcionária do handling nem estranhou e na porta de embarque ninguém disse nada.
Já o embarque no aeroporto de Istambul decorreu com um pequeno incidente. Após o sinal para embarcar, apresentámos os passaportes e os cartões de embarque na porta de entrada. A funcionária do handling pediu para esperarmos. Ligou para alguém. Esperámos, sem qualquer explicação adicional, enquanto os outros passageiros iam embarcando. Perguntei se estava tudo ok, disse-me que sim. Mas continuámos à espera. Às tantas, sem que nada tivesse aparentemente acontecido, devolveu-nos os passaportes (um normal, o outro temporário) e mandou-nos entrar no avião. Talvez tivesse recebido algum OK no sistema informático, mas não me apercebi.
Entrámos no avião, mais confiantes; faltava apenas ultrapassar o pior cenário possível: a Luísa ser impedida de entrar no Japão após um total combinado de 20 horas de voos e escala.
Já em Tóquio, ficámos com um pouco mais de ansiedade, ainda que em momento algum as autoridades tenham dado a entender que não a deixavam entrar com o passaporte temporário. Acontece que, no controlo de passaportes, não a deixaram logo passar; mandaram-na para uma sala, onde um outro funcionário ficou com os documentos. Eu acompanhei-a.
Nessa sala, estavam uns sete ou oito turistas. Esperámos, tranquilamente, sem que ninguém nos dissesse nada.
Esperámos mais um pouco.
Não tínhamos qualquer indicação do que estava a acontecer; restava esperar e estar confiantes.
Até que chamaram a Luísa e a mandaram colocar os dedos na máquina que regista as impressões digitais. Era o sinal de que tudo estava bem. Aproximei-me e mostrei também o meu passaporte. “Estão juntos?”, perguntou o funcionário. Respondi que sim, ele sorriu e virou-se para a Luísa: “Porque não traz um destes? Não teve tempo?”. Estava muito sorridente, comprovando que estava tudo ok. Perguntou ainda o que iríamos visitar no Japão, aparentemente por mera curiosidade, já que logo a seguir nos acompanhou pelo trajeto reservado ao pessoal de bordo.
Estávamos em território japonês!
Conclusão
Deixar caducar o passaporte é um descuido que não deveria nunca ter acontecido. Não foi comigo, mas eu devia ter também verificado. É um erro de principiante, ou facilitismo de quem está acostumado a viajar e encara as viagens com extraordinário à-vontade. Mas a verdade é que aconteceu. Por esquecimento, demasiada confiança ou o que seja. Estejam atentos.
Desta vez correu bem, mas eu não confiaria muito no passaporte temporário para as minhas viagens futuras.
Guia prático
Como pedir um passaporte temporário
O passaporte temporário deve ser usado como último recurso, em situações absolutamente excecionais e devidamente fundamentadas. Como uma viagem marcada para o próprio dia ou para a manhã do dia seguinte.
Para pedir o passaporte temporário, eu sugiro a Loja do Passaporte dos aeroportos de Lisboa ou Porto. Oficialmente, deve apresentar os seguintes documentos:
- Requerimento preenchido e assinado;
- Bilhete de Identidade ou Cartão de Cidadão válido;
- Duas fotografias;
- Documento que justifique o carácter urgente e excecional do pedido (exemplo: bilhete de avião);
- 150€ em dinheiro.
À Luísa, pediram ainda para levar o passaporte comum caducado, que ela teve de entregar por não ter qualquer visto válido.
O passaporte temporário tem validade de um ano e deve ser substituído por um passaporte comum “logo que possível, ainda que dentro do prazo de validade”.
Para mais informações sobre as regras aplicáveis, consulte o site oficial do Passaporte Eletrónico Português.
Atenção
O passaporte temporário não é um passaporte eletrónico (não tem chip), pelo que não é aceite como documento de identificação válido em vários países, incluindo os Estados Unidos da América. A melhor forma de saber se pode entrar no seu destino de viagem com um passaporte temporário português é ligar para a respetiva embaixada ou representação consular em Portugal (caso exista). Melhor do que ninguém, eles saberão as regras de entrada no seu país.
Seguro de viagem
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