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Caminhada no Monte Canigou, Pirenéus

Por Ana Isabel Mineiro

Vista do topo do Canigou, Pirenéus

A apenas cinquenta quilómetros da costa mediterrânica, o pico do Canigou, com 2.784 metros, é um verdadeiro miradouro sobre uma região de rara beleza partilhada entre a França e a Espanha: a Catalunha.

Monte Canigou, uma montanha à beira-mar

Não é difícil perceber porque é que os Pirenéus são tão verdes: de Verão e de Inverno, a chuva abate-se sobre as montanhas de forma impiedosa, durante dias e noites. As nuvens emaranham-se nas árvores, as florestas densas parecem vogar num mar branco de humidade. As estradas, estreitas e curvilíneas, transformam-se em espelhos negros e brilhantes, o frio entra no corpo até aos ossos. A neve começa nos cumes, mas desce pelas encostas até às aldeias, e só se desfaz em riachos e milhares de cascatas a meio da Primavera. Mesmo no pino do Verão, as noites nunca são muito quentes por causa desta abundância de água na terra e no ar.

As termas são uma realidade incontornável numa zona de boas e abundantes águas; Molitg-les-Bains, Amélie-les-Bains e Vernet-les-Bains são algumas das mais conhecidas da zona. O cenário é aprazível e mesmo bucólico, se não nos aproximarmos demasiado das encostas das montanhas. Aí, desaparecem os prados verdes com vaquinhas ruminantes para surgirem os grandes picos rochosos calcinados pelo vento e pela neve. A toponímia não nos deixa esquecer que estamos na Catalunha; por todo o lado aparecem os nomes de sonoridades inconfundíveis, como se, de facto, nunca tivéssemos mudado de país – sobretudo agora, que já não se atravessam fronteiras. Saímos de St. Joan de les Abadesses, na Catalunha do Sul, como os catalães gostam de dizer, e passamos por Prats-de-Mollo e Valmanya, já na Catalunha do Norte. Faz-se gala das riscas vermelhas e amarelas, da dança da sardana, das especialidades como a Crema Catalá e a escudella. Fala-se tanto o francês como o catalão. E o monte Canigó, como também é conhecido por aqui, é a montanha-mãe, que muitos catalães sobem todos os anos numa espécie de peregrinação nacionalista.

Do lado francês, a sua vertente Norte destaca-se nas planícies do Roussillon. Terra fértil, de imensos cerejais e vinhas, antecipa o verde profundo das florestas que cobrem os Pirenéus e está semeada de pequenas aldeias que parecem ter congelado no tempo à sombra do Canigou, que se avista de todo o lado. Coberto de neve até ao fim da Primavera, caracteriza-se pela sua grande elevação a apenas cinquenta quilómetros do mar e pelas suas vertentes alcantiladas, de onde lhe veio o nome de Fujiyama Catalão. Até ao século XIX foi considerado erroneamente como o pico mais alto dos Pirenéus, ponto de orientação para os marinheiros, que o avistavam do mar. Por todas estas razões, apesar de não ser um dos maiores ou dos mais altos maciços pirenaicos, esta montanha acabou por ganhar a grande notoriedade que ainda hoje mantém.

Caminhante durante o trekking nos Pirenéus, França
Caminhante durante o trekking nos Pirenéus

Vernet-les-Bains é, talvez, o melhor ponto de base para explorar esta zona dos Pirenéus Orientais. A cidadezinha é pitoresca e verdejante. Como é frequente na zona, possui uma estância termal e um casario aglomerado na encosta, de onde sobressai o campanário pontiagudo de uma igrejinha. No fundo do vale estreito por onde corre um rio límpido, avista-se os telhados da Abadia de Saint Martin du Canigou que, juntamente com a de Saint Martin de Cuixa, ali próxima, constituem os mais belos exemplos do estilo românico da Catalunha francesa. Mas a principal atracção é mesmo a aproximação ou a subida ao cume desta montanha emblemática. Há várias maneiras de o fazer, consoante as épocas do ano. Durante o Verão, pode subir-se a pé ou de automóvel até ao refúgio de Cortalets e daí são duas horas até ao pico. Nas épocas intermédias e parte do Inverno, o melhor é seguir a estrada de asfalto e depois em terra até ao refúgio de Mariailles, e daí continuar montanha acima. A última hipótese é mais longa (cerca de seis a sete horas ida e volta), mas por isso mesmo permite-nos mergulhar mais profundamente na magnífica paisagem pirenaica.

O caminho é acessível a todos, à excepção do acesso à chaminé de pedra por onde se alcança o cume, onde é preciso usar de mãos e pés para subir. Há quem leve as crianças e o cãozinho, e há quem faça só parte do percurso até ao belo prado que rodeia o refúgio de Aragó, onde há uma fonte e uma área de prado ideal para um piquenique. Em Maio e Junho, as flores saem dos lugares mais inesperados para dar cor às pedras, aos prados, às margens dos muitos regatos que descem das últimas camadas de neve.

Trekking e caminhadas: França
Canigou

O Canigou, sendo um maciço com vários picos de altitudes muito aproximadas, impressiona mais pela sua massa do que pela altura. O trilho de acesso ao cume começa por uma passeata amena por bosques sombrios, até atingirmos os primeiros montes de pedra que resvalaram com a neve. Atravessa-se dois riachos sobre “pontes” improvisadas com troncos e pedras, e chega-se a um belo vale coberto de pinheiros e giestas, que representam ainda a vegetação mediterrânica. Depois, a subida leva-nos até uma zona de vegetação alpina, rasa e com tapetes de flores azuladas. E logo a seguir vem o reino das pedras e das marmotas, que lançam gritos de aviso à nossa passagem. Finalmente, a neve. Algumas placas resistem até ao Verão, abrigadas do vento no circo natural formado pelas paredes da montanha. É preciso atravessá-las com cuidado até chegar à parede íngreme e pedregosa do cume, que se ergue numa serrilha de aspecto aguçado e se eriça de chaminés rochosas. Resta-nos seguir o carreiro bem batido e, com a ajuda das mãos, transpor os últimos degraus naturais que levam a uma plataforma.

Lá no alto, a recompensa é a imensidão da vista. Do alto dos seus 2.784 metros, num dia claro abrange-se os Pirenéus e o Mediterrâneo. Dois miradouros assinalados por cruzes metálicas mostram-nos, de um lado, Vernet-les-Bains e outras aldeias espalhadas pela planície do Roussillon, até à mancha azul do mar; do outro lado fica um pequeno lago negro como petróleo, no sopé da cordilheira pirenaica tingida de branco pela neve. Junto à grande rosa-dos-ventos que marca o cimo, alguns jovens aproveitaram para fazer fotos de grupo com a bandeira vermelha e amarela. Diz-se que todos os catalães podem ver o Canigó da sua porta. Mas muitos deles, mesmo assim, não resistem a vir pelo menos uma vez conhecer pessoalmente este símbolo natural da sua nacionalidade, provavelmente o mais belo de todos.

Catalunha, mil cenários, mil anos de história

Se há região de paisagem variada é mesmo a Catalunha. Os seus cenários naturais desdobram-se entre praias de areia ou costas rochosas, todas banhadas pelo Mediterrâneo. Serras nuas e agrestes, planícies verdejantes, encostas húmidas cobertas de florestas e lagos, picos nevados, distribuem-se dos dois lados de uma fronteira que já não existe, pela Catalunha do Norte e pela do Sul. Mas se as paisagens variam, a cultura, da língua à gastronomia, essa é apenas uma, até porque a história também é comum.

Trekking e caminhadas: França
Pormenor da vegetação durante o trekking

A Catalunha como unidade cultural começou a afirmar-se durante a época de Carlos Magno, com a sua língua própria, as suas leis, o nome, e mesmo um emblema que a diferenciava dos seus vizinhos. Barcelona foi, desde o início, a cidade mais importante, sede do arcebispado e núcleo de uma série de condados que se agrupavam à sua volta. Guerras com os árabes, a Sul, e com os Francos, a Norte, foram alterando sempre os seus limites geográficos. Durante os séculos XII e XIII, a Catalunha chegou a ocupar as Ilhas Baleares e a conquistar Valência aos mouros. Nos séculos XIV e XV, guerras com os reinos cristãos de Castela e de França e duas guerras civis foram enfraquecendo cada vez mais o reino. Carlos V unificou os reinos de Espanha sob a sua coroa mas, só no século XVII, quando o conde-duque de Olivares quis abolir as constituições individuais de cada um, é que a Catalunha acordou de novo para a guerra pela nacionalidade. Os rebeldes acabaram por se submeter ao rei de França e perdeu-se a união entre o Sul e o Norte dos Pirenéus, ficando os últimos – as regiões do Roussillon e da Cerdanya -, a pertencer desde então a França. De um lado e de outro, sucederam-se as tentativas políticas e legislativas vindas do poder central, no sentido de estrangular a singularidade da Catalunha – em vão, como se pode verificar facilmente ainda hoje. Apesar de repartida por dois países, a Catalunha está bem viva e unida, na região que circunda o monte Canigó.

Pirenéus, uma fronteira selvagem

Os Pirenéus estendem-se de mar a mar, isto é, entre o Oceano Atlântico e o Mar Mediterrâneo. São quatrocentos e trinta quilómetros de montanhas que dividem – ou unem – a França e a Espanha. O ponto mais alto é o pico de Aneto, com 3.404 metros de altura, que se situa do lado espanhol. Pelo meio ficam muitos hectares de florestas e bosques, muitos deles áreas protegidas com estatuto de reservas e parques naturais e nacionais. Protege-se aí uma flora e fauna riquíssimas, com exemplares endémicos ou raros a nível da Europa.

Uma das raridades – e novidades – dos Pirenéus é a reintrodução do urso em 1996. Uma fêmea e dois machos foram trazidos da Eslovénia para iniciar este programa de sucesso e, neste momento, estimam-se já na dúzia os ursos pirenaicos. No entanto, ao caminhar na zona do Canigou não há que ter qualquer receio; para além dos ursos serem extremamente tímidos e elusivos, até agora têm deambulado mais pelo País Basco e Aragão, nunca tendo sido a sua presença assinalada por estas paragens. Por aqui há abundância de marmotas nas zonas rochosas, assim como outros mamíferos de pequeno e médio porte, algumas camurças, mas nada de lobos ou ursos. O maior receio para o caminhante deve ser a meteorologia instável, com frequentes tempestades de Verão, que todos os anos fazem vítimas na montanha. É necessário partir cedo (geralmente as mudanças bruscas de tempo têm lugar de tarde) e levar o equipamento adequado para o caso de se ser apanhado por uma tempestade inesperada, assim como reservas energéticas e de água, prevenindo uma demora na descida por razões difíceis de prever. É que os lugares selvagens são assim mesmo, juntam sempre à beleza uma dose de perigo – e é por isso mesmo que continuam a ser selvagens.

Guia de viagens a Canigou

Este é um guia prático para viagens ao Monte Canigou, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e sugestões de actividades na região.

Como chegar aos Pirenéus

Dada a sua situação fronteiriça mesmo junto a Espanha, acaba por ser boa ideia partir de automóvel e ficar com todas as vantagens da mobilidade para visitar as antigas abadias beneditinas da zona, como Saint Martin du Canigou, e para se aproximar dos refúgios de onde pretende iniciar o passeio pela montanha. A via mais directa para Vernet-les-Bains é a que liga Lérida a Puigcerda e atravessa aí os Pirenéus, em direcção a Perpignan. Vernet está bem assinalada, e encontra-se numa estrada secundária que parte de Villefranche-de-Conflent em direcção às encostas do Canigou. Para fazer o percurso até ao refúgio de Mariailles, sair de Vernet em direcção a Casteil e Col de Jou, e daí continuar por um estradão de terra até ao refúgio de Mariailles, onde há um parque de estacionamento e possibilidade de comer e dormir. Há muitas outras hipóteses de aproximação: a pé desde Vernet ou desde Saint Martin du Canigou, em 4×4 até ao refúgio de Cortalets, etc. O turismo da vila tem todo o tipo de informações, guias e mapas.

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Onde ficar

Para os que gostam de dormir no chão, não faltam os Parques de Campismo. Em Vernet-les-Bains, o Le Cerisier é especialmente simpático e familiar. Quanto a hotéis, apesar da terra ser muito pequena, trata-se de uma estância termal, e por isso também não falta escolha. Dois exemplos são o Le Mas Fleuri, de três estrelas e o Éden, de duas. No caso de querer pernoitar na montanha, será melhor, pelo menos durante o Verão, fazer reservas para os refúgios que pretende, através do turismo local; os refúgios de Mariailles e o de Cortalet são os mais práticos para aceder ao cume. Também é permitido bivacar, mas de Verão as tempestades são frequentes.

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Restaurantes

Há muitos restaurantes e creperies, o melhor é escolher pelas listas expostas antes de se sentar. Para provar as especialidades catalãs sem ir muito longe, aconselhamos Le Moliére, em Casteil, a caminho da Abadia de Saint Martin du Canigou. A zona do Roussillon é famosa pelos seus vinhos e a cozinha catalã afirma-se aqui nos enchidos e nos queijos, assim como nos temperos com misturas de azeite com alho, laranja e amêndoa.

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Ana Isabel Mineiro

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