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Ilhas Farasan, o Mar Vermelho desconhecido

Por Filipe Morato Gomes
O que fazer nas Farasan: visitar House of Riffai
A majestosa entrada da House of Riffai, a mais famosa casa familiar das ilhas Farasan

Por enquanto desconhecidas no que toca ao turismo internacional, as ilhas Farasan, em pleno Mar Vermelho, são um inesperado destino de praia na Arábia Saudita. São, por assim dizer, um destino por desvendar; e, por isso mesmo, tinha de lá ir.

Depois de várias peripécias para conseguir um bilhete para o carro no ferry Jizan – Farasan, dirigi-me à hora marcada para o porto marítimo de Jizan. No terminal de passageiros, um oficial graduado fez questão de me passar à frente de todos os restantes passageiros, impedindo até que eu passasse pelos detetores de metais. Simpatia em exagero, porventura – mas foi o mote para o que iria encontrar nos dias seguintes: gente solícita e hospitaleira, sempre com vontade de agradar.

Dentro do barco, em menos de nada conheci o capitão egípcio Ramadan Ibrahim, que fez questão de me dar pessoalmente as boas-vindas à embarcação. A viagem de barco decorreu sem incidentes e, hora e meia depois, atracava no porto das ilhas Farasan.

A minha experiência nas ilhas Farasan

Porto de pesca na ilha Farasan
Um pequeno porto de pesca próximo de Sair, ilhas Farasan

Quando cheguei às ilhas Farasan, já a tarde ameaçava desmaiar, com um ar quente e abafado e um céu alaranjado. Uma vez que a chamada Al Qessar Heritage Village ficava a caminho, aproveitei esses últimos raios de sol para a visitar.

Consta que até há sensivelmente 50 anos ainda havia residentes da povoação de Farasan a morar em Al Qessar. Atualmente, o complexo é uma espécie de museu ao ar livre com casas de adobe e pedra coral, e a visita permite ter um primeiro contacto com o modo de vida básico e tradicional da ilha.

Segui depois para a principal povoação da ilha Farasan e, chegado ao hotel, recebi com agrado a recomendação para jantar no mercado de peixe. A ideia era comprar o peixe nas pequenas peixarias do mercado e levá-lo para um dos minúsculos restaurantes adjacentes o cozinharem. Pareceu-me perfeito. E assim fiz.

Um dos vendedores com quem meti conversa, de origem indiana, insistiu para que experimentasse um peixe enorme cuja espécie não identifiquei. Que era “delicioso e barato”, insistiu, e praticamente “sem espinhas”. Acedi. De peixe na mão, fui então procurar um restaurante que o fizesse grelhado (ou, pelo menos, não frito); e, uma hora depois, chegava um magnífico peixe assado no forno com especiarias, acompanhado por arroz branco e um estufado de legumes.

E ali estava eu numa mesa de madeira velha e suja em plena rua, rodeado de obras e montes de terra, junto ao mercado de peixe de Farasan, a comer um peixe fresco absolutamente delicioso. Foi uma refeição épica.

Farasan
Uma rua na povoação principal de Farasan

Na manhã seguinte, acordei cedo e percorri ruas desertas (uma constante na Arábia Saudita!) até chegar à chamada House of Riffai. É a mais famosa casa das ilhas Farasan, antiga propriedade de uma família importante da ilha, agora praticamente em ruínas.

Na propriedade, encontrei dois trabalhadores oriundos do Bangladesh que aparentavam tratar da manutenção do que resta da casa senhorial. Apesar do mau estado de conservação, fiquei impressionado com o minucioso trabalho decorativo na fachada, no majestoso pórtico de entrada e também no interior da sala principal – a mais bem preservada da House of Riffai.

Não estava a contar encontrar algo assim nas ilhas Farasan, mas as surpresas não tinham ainda terminado.

Depois de abandonar a casa, caminhava de regresso ao carro quando avistei um homem numa ruela, sentado no chão. À distância, parecia estar a trabalhar no piso da rua mas, assim que me aproximei, reparei que estava a partir a concha de búzios, ainda vivos, para os retirar de lá.

Pescador nas ilhas Farasan
Helmi, um pescador iemenita à porta de sua casa nas Farasan

Helmi pareceu surpreso pelo meu interesse, mas rapidamente os seus filhos sairam de casa e juntaram-se a nós na rua. Com ajuda do tradutor do Google, fiquei a saber que eram do Iémen e que estavam a viver nas Farasan há já cinco anos, em busca de melhores condições de vida.

Em menos de nada estava a beber café árabe e a provar búzios crus, ainda vivos, molhados num delicioso molho amarelo, com consistência de maionese, que ainda hoje não sei o que era. A esposa de Helmi espreitava pela cortina da porta, curiosa mas sem nunca aparecer. E por ali fiquei algum tempo…

As despedidas foram emocionadas, como se fôssemos velhos amigos. Antes de virar costas, e depois de beijos e abraços apertados, Helmi e os seus filhos insistiram que levasse um frasco do tal molho, tal tinha sido a minha reação quando o provei. Foi quando deixei cair umas lágrimas de emoção, agradecido por conhecer pessoas tão humildes quanto hospitaleiras, muito mais generosas do que eu alguma vez conseguirei ser. O Iémen, cada vez mais, a chamar por mim!

Café Roqan, Farasan
Um homem descansa no café Roqan, junto a um porto de pesca nas ilhas Farasan

Com o plano de conhecer a ilha de carro, segui então até ao pequeno porto perto do Farasan Park Hotel, na esperança de inquirir sobre eventuais passeios de barco para o dia seguinte. Foi lá que conheci Alberto, um viajante holandês, e um jovem natural das ilhas Farasan.

Sentámo-nos a conversar no pequeno café Roqan – e assim, num ápice, os meus planos para o dia mudaram.

Passeio de barco nas Farasan

Floresta de Qandal, Farasan
Um pescador na chamada floresta Qandal

Tinha pensado fazer um passeio de barco no dia seguinte, mas o jovem ligou a um seu conhecido, dono de um barco, que lhe disse que daí a uma hora ia sair para pescar com um grupo. Pouco mais fiquei a saber sobre o passeio, mas decidi aproveitar a oportunidade – mesmo sem saber bem onde iríamos.

A minha ideia era fazer snorkelling e visitar praias noutras ilhas do arquipélago das Farasan (tinha visto algumas fotografias lindíssimas), mas não foi bem isso que aconteceu.

Na verdade, visitei o manguezal na chamada floresta Qandal, fiz snorkelling num local praticamente sem vida e não conheci as ilhas que tinha em mente; mas acabei a pescar com um divertido grupo de sauditas. Se foi o que eu esperava? Nem pensar. Se valeu a pena? Claro que sim.

De carro pelas ilhas Farasan

Casa senhorial nas ilhas Farsan
O professor Ahmad mostrando o que resta da antiga casa de uma família importante da aldeia de Sair, nas ilhas Farasan

No dia seguinte, fui então explorar de carro o resto da ilha. Não tinha um plano bem definido, mas comecei por visitar a povoação de Sair, no extremo noroeste da Farasan.

Quando passei de carro, notei uma certa agitação à porta da escola. Os miúdos estavam nas traseiras de uma carrinha de caixa aberta, provavelmente a caminho de casa. Aproximei-me e fui recebido por professores que me convidaram a entrar.

Fui levado para a sala de professores; estive à conversa com docentes e diretores sobre o momento de transformação atual na Arábia Saudita; visitei a escola e um muito interessante museu etnográfico; até que, na hora de ir embora, o professor Ahmad se disponibilizou para mostrar a ruína de uma casa ali perto, com trabalhos semelhantes à House of Riffai. Foi mais uma bela surpresa arquitetónica.

Praia na ilha Farasan
Aspeto da praia num futuro complexo turístico das Farasan

Segui depois de carro para outros locais da ilha. Encontrei uma ou outra praia agradável, com água tépida e areais desertos, pese embora seja notório a fraca relação dos sauditas com a praia. Apesar disso, vi um complexo turístico que aparentava estar em construção, porventura sinal de que, aos poucos, o turismo nas ilhas Farasan irá aumentar.

Com o calor vespertino a apertar, optei por recolher ao hotel para um merecido descanso; antes de rumar novamente ao mercado de peixe de Farasan para uma última deliciosa refeição na rua. Raramente em viagem, fora de Portugal, comi peixe tão saboroso e bem preparado como nas Farasan!

Na manhã seguinte, apanhei o ferry de regresso a Jizan. Estava contente. Visitar as ilhas Farasan tinha sido uma agradável surpresa. Despedi-me do capitão egípcio que de novo estava no barco, e prossegui a minha exploração da Arábia Saudita.

O que fazer nas ilhas Farasan

Eis algumas das atividades que pode incluir no seu roteiro nas ilhas Farasan.

  • Visitar o que resta da House of Riffai;
  • Explorar povoados como Sair e Khutob;
  • Fazer um passeio de barco para fazer snorkelling, conhecer praias desertas e outras ilhas do arquipélago das Farasan.
  • Comer peixe delicioso no mercado do peixe na povoação principal (várias vezes);

Nota: o chamado forte otomano não tem, na minha opinião, grande interesse.

Forte otomano, Farasan
Forte otomano nas ilhas Farasan

Guia prático: ilhas Farasan

Como chegar

Para chegar a Jizan, há várias opções, dependendo do seu tempo e estilo de viagem. Para além do carro alugado, há várias companhias aéreas sauditas que voam de cidades como Riade ou Jeddah para Jizan. Além disso, a partir de Abha, Riade e Jeddah (e muitas outras) há autocarros para Jizan. Veja preços e horários no site da SAPTCO.

Uma vez em Jizan, o acesso à principal ilha das Farasan faz-se de ferry. Há duas ou três partidas diárias, gratuitas, que ligam o porto de Jizan às ilhas Farasan em sensivelmente 90 minutos. Quando eu visitei a ilha, os ferries partiam de Jizan às 7:00 e às 15:30; deve estar no local de embarque às 5:30 e 14:00, respetivamente.

::: Ferry Jizan – Farasan (sem carro)

Para quem viaja sem carro, o processo é fácil. Disseram-me, aliás, que dava para reservar online no site do Ministério dos Transportes (em árabe, use tradução automática); mas não tive essa experiência.

::: Ferry Jizan – Farasan (com carro alugado)

Caso queira levar o carro para as Farasan, as coisas são mais complexas. Isto porque tem de reservar lugar presencialmente nos novos escritórios da empresa, junto ao porto de Jizan (ver localização – ignore quem lhe disser local diferente). E, quase sempre, não há vagas para carros – especialmente ao fim de semana.

Dito isto, caso não possa passar em Jizan com vários dias de antecedência, pode sempre ir para o porto e ficar em fila de espera. Caso alguém com bilhete não apareça, poderá embarcar. Obviamente, não é certo que aconteça, pelo que é uma solução arriscada.

Transportes nas Farasan

Se me pergunta qual a melhor opção, sem dúvida que levar carro facilita imenso a visita às ilhas Farasan. Se conseguir lugar no ferry, não hesite.

Caso viaje sem carro, saiba que não há táxis oficiais na ilha. Há uma empresa de rent-a-car a operar junto ao porto, em Farasan (ao que parece pratica preços inflacionados, mas como viajei de carro não fui verificar). Consta também que é possível encontrar habitantes locais disponíveis para o transportar na ilha – embora os preços praticados sejam também elevados (a não ser que viaje com outras pessoas, para dividir o custo).

Coisas que deve saber antes de visitar as ilhas Farasan

A ilha Farasan não é um destino para todos os viajantes. Quem espera bons hotéis e conforto, infraestruturas turísticas dignas de uma estância balnear caribenha ou mediterrânica vai ficar imensamente desiludido. Nesse caso, é melhor não ir.

Se, por outro lado, espera condições básicas, dificuldades de comunicação, dificuldades na organização de atividades (à mistura com algum desconhecimento sobre as necessidades do turista), gente simples e hospitaleira num destino ainda não explorado, então vai com toda a certeza adorar a ilha Farasan.

Onde ficar

Quando viajei para as ilhas Farasan não havia hotéis listados nas centrais de reserva internacionais, pelo que cheguei à ilha sem fazer reserva. Como viajei durante a semana não tive problemas, mas ao final de semana pode ser complicado. Fiquei num hotel chamado Tasnim Palace Hotel Suites e, tendo em conta as alternativas, pareceu-me uma boa opção. Visitei também o Rahaf Residential Units mas optei por não ficar. Ambos cobram cerca de 150 SAR por um quarto duplo.

Note que a situação pode entretanto ter mudado – confirme no link abaixo se já aparecem hotéis nas Farasan para reserva online. A alternativa de recurso pode ser levar uma tenda e acampar na praia.

Pesquisar hotéis nas Farasan

Como organizar atividades nas ilhas Farasan

O turismo nas ilhas Farasan está ainda a gatinhar, pelo que o melhor é ir para a ilha sem grandes planos e resolver localmente o que fazer, falando com habitantes locais.

Para fazer passeios de barco, porventura a melhor forma é dirigir-se ao referido porto de pesca, junto ao café Roqan, e indagar diretamente. Foi-me referido um preço por hora a rondar 200 SAR, mas não confirmei in loco.

Uma das pessoas que me foi recomendada mas com quem acabei por não fazer nada dado os preços elevados é Adel, morador nas Farasan. Fale com o seu filho Muhammad via WhatsApp (+966 50 915 7483) – ele fala um pouco de inglês. Se viajar em grupo pode compensar.

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.

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