Situada na ponta de uma pequena península na costa de Moçambique, a Barra é uma minúscula amostra das potencialidades do país enquanto destino turístico: um imenso areal estendido entre o oceano e uma vasta área de mangal, que proporciona a qualquer banhista que se preze os prazeres da praia e de uma natureza muito tropical. E esta é a opinião de quem nem aprecia muito a beira-mar.
Os últimos passageiros saíram num cruzamento de estradas de terra vermelha e areia branca, ao lado de uma extensa área de mangal e coqueiros. O condutor do chapa, o pequeno autocarro que faz a ligação a Inhambane, virou-se para trás, intrigado: “Já acabou! Vai voltar a Inhambane?”, perguntou.
Tinha-me esquecido de sair no fim da linha, distraída pela paisagem que faz da costa de Moçambique uma bela praia com mais de dois mil quilómetros de comprimento, a maior parte dos quais ainda à espera de serem descobertos pelo turismo. Coqueirais abrigam pequeníssimas aldeias de cubatas, espaçadas entre si, e dão depois lugar a florestas de mangue do lado esquerdo da estrada.
No cruzamento final, o verde só era cortado pela roupa e toalhas coloridas que os vendedores penduram em cordas, uma tentação esvoaçante a anunciar o areal escondido por trás de filas de árvores. Um ramalhete de cartazes e placas anunciava os lodges disponíveis em direção ao farol, e para a esquerda, pela comprida estrada de terra que se alongava em curvas a perder de vista, em direção à ponta da Barra.
Pouco disposta a parar, decidi seguir a estrada até ao fim, em busca do bando de flamingos que era suposto frequentar a ponta da península. A maré tinha recuado, e o mangal era agora uma pasta de lama impenetrável ao longo da estrada. Grupos de mulheres apareciam de vez em quando, algumas com grandes alguidares vazios à cabeça, em grandes risotas e brincadeiras que levantavam a areia vermelha do caminho.
A estrada alongava-se, o calor aumentava, e ao desejo de ver os flamingos começou a sobrepor-se a ideia de meter os pés no azul do mar, que continuava fora de vista mas que já conhecia de outras bordas de água, mais a sul. Tanto mais que alguns dos hotéis espalhados pelos coqueirais eram acompanhados por caminhos tentadoramente abertos na direção da costa. Não resisti: subi um monte de areia, transpus os coqueiros, avancei para o areal.
O mar estava lá ao fundo; uma linha azul até ao infinito, antecedida por umas dezenas de metros de areia branca. E sobre essa linha deslizava o que parecia ser um espetáculo de sombras chinesas, protagonizado por um punhado de dhows, os barcos típicos de desenho árabe que até hoje são utilizados pelos pescadores: homens de pé abriam e fechavam as velas ao sabor das brisas, recortando um balé de silhuetas contra a luz intensa refletida na água. O excesso de luz eliminava a profundidade, criando ilusões sobre o tamanho dos barcos – pequenos barquinhos de papel que cabiam na mão de uma criança, e verdadeiros batéis de carga com uma tripulação de meia dúzia de homens.
Na praia aguardavam grupos de mulheres, que desvendaram o segredo dos grandes alguidares que transportavam à cabeça: os barcos aproximavam-se da costa baixa com a ajuda de um varapau, e os homens desciam com cabazes de peixe, que era separado e distribuído pelas bacias.
As mulheres seguiam depois com a carga até mais à frente, onde outro dhow se aproximava da costa. As velas abriam e fechavam, recolhia-se a safra do dia. De vez em quando uma rede era puxada para terra por todos.
Olhando para a praia nos dois sentidos, contei talvez uma dúzia de turistas que assistiam ao espetáculo esticados na areia. Grupos de miúdos passavam com ramalhetes de pulseiras e sacos de ráfia para vender aos estrangeiros, em menor número que os pequenos grupos de vendedores.
Reconheci o falar português e o sotaque sul-africano, mas os números eram decididamente baixos; e no entanto, noutro canto qualquer do mundo, uma praia destas poderia estar cheia de banhistas, eriçada de guarda-sóis de aluguer, atulhada de toalhas, bares com música e restaurantes.
Aqui há uma linha descontínua de lugares para ficar, de preço e conforto variáveis, que oferecem desde bungalows ao estilo cubata moderna, para uma estadia mais “tradicional”, a edifícios em cimento e tijolo, para os que não abdicam do quarto standard. Mas os únicos turistas presentes em força, muitas vezes proprietários de casas de aluguer, quase sempre gigantescas mas nem sempre graciosas, são os vizinhos sul-africanos. Aqui encontram preços mais apetecíveis, mais segurança, e lugares bem menos frequentados que as suas praias natais.
Caminhei água dentro, mas o movimento silencioso dos barcos e os bandos de mulheres que passavam nas suas capulanas garridas eram bem mais fascinantes do que o banho. Saí da praia em direção ao mangal, do lado oposto da estrada, onde o único lugar para ficar tem o nome promissor de Flamingo Bay Lodge.
Um passadiço de madeira sobre estacas avança umas dezenas de metros dentro da floresta de árvores baixas, e vai ligando vários edifícios tradicionais, feitos de madeira e com telhado de folhelho. O restaurante convida a uma paragem para um café e uma refeição ligeira; optei por uma colorida salada fresca com pesto de matapa (pasta de folhas de mandioca e leite de coco), tão bonita que mereceu uma fotografia.
O passadiço continua depois para a zona de chalés palafitas, as longas estacas assentes na água baixa do estuário. À volta há só o mangue e o mar.
E é justamente esta zona tranquila que os flamingos escolhem para se deixar avistar. Apenas um punhado, numa fila longínqua e atarefada, mergulhando os bicos na maré baixa. Tão baixa que as mulheres que recolhem lenha nos mangues atravessam a vau para o outro lado da península, com braçados de achas à cabeça e as capulanas arregaçadas, os passos curtos e inseguros limitados pela lama.
O fim da tarde amaciou o calor e a maré foi subindo devagar pelo chão da floresta, acompanhando-me até ao cruzamento, onde o chapa já aguardava por clientes. O regresso fez-se de coração ligeiro, com a certeza de que é fácil voltar.
Guia de viagens à Praia da Barra
Este é um guia prático para viagens na região de Inhambane, nomeadamente à Praia da Barra, com informações sobre a melhor época para viajar, alojamento e como chegar à Barra.
Quando ir
Começa por volta de novembro a época mais quente no litoral de Moçambique, que dura até março, e alia temperaturas entre os 22 e os 26 graus a um nível de humidade bastante alto. Com o avançar da estação aumentam as chuvas, e a possibilidade de ocorrência de ciclones.
Como chegar à Praia da Barra
A TAP voa para Moçambique (Maputo) a partir de Lisboa, com preços variáveis em função da época e da procura (podem atingir os 2.400 , ou até mais). De Maputo pode voar para Inhambane com a LAM, mas há também bons autocarros que partem de manhã cedo ou à noite, muito confortáveis e pontuais, com refeições leves a bordo e/ou paragem para comer com reserva prévia. De Inhambane à Praia da Barra não faltam chapas a fazer a ligação todo o dia, e são apenas 20 km de distância.
Hotéis na Barra
Na Barra há vários locais onde dormir, a começar pelo Flamingo Bay Water Lodge, lugar de luxo com bungalows palafitas e um bom restaurante. Os preços mínimos rondam os 100 por pessoa. Há opções bem mais baratas, como o conhecido Barra Lodge ou o Bali Hai, mas o mais económico é mesmo ficar na cidade de Inhambane, onde pensões como a Panchiça ou a Olinda oferecem quartos duplos, simples mas asseados, a partir de 30 .
Onde comer
Os lodges da Praia da Barra geralmente têm também restaurante. O que está mais à mão é o Neptune, mas também é possível frequentar outros, como o do Flamingo Bay. Ficando em Inhambane, trazer um piquenique também pode ser uma boa solução. É de esperar muita oferta de peixe e marisco frescos, mas também saladas e a típica matapa, feita com folhas de mandioca e leite de coco.
Informações úteis
É obrigatório obter um visto para Moçambique. Pode fazê-lo num consulado ou à chegada ao aeroporto de Maputo, por 50 . A moeda é o metical, cuja unidade vale cerca de 3 cêntimos; no entanto, os preços acabam por não ser muito baratos para os turistas, a começar pelos voos internos e pelos hotéis, que têm preços muito parecidos com os europeus. Bancos e ATM, só em Inhambane, cidade capital da província com o mesmo nome, a cerca de 500 km de Maputo.
O que comprar
Na região é de destacar a excelência do artesanato em ráfia, caninha, palha ou qualquer tipo de fibra seca, de grande variedade e com preços irresistíveis, quer nos vendedores ambulantes da praia quer no mercado de Inhambane.
Cuidados de saúde
Convém proteger-se contra as picadas de mosquitos ao fim da tarde e durante a noite, com redes (quase sempre já instaladas nos quartos de hotel) e repelentes aplicados sobre a roupa e pele há algum risco de malária durante todo o ano.
Seguro de viagem
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