Alma de Viajante

Blog de Viagens de Filipe Morato Gomes

  • Destinos A-Z
  • Portugal
  • Brasil
  • Europa
  • América
  • África
  • Ásia
  • Oceânia
Blog de viagens » Médio Oriente

Na “Disco” de Dohuk (Do Cairo a Teerão #10)

Por Filipe Morato Gomes | Do Cairo a Teerão Iraque Médio Oriente
Atualizado em 16.07.2017 | Tempo de leitura: 6 minutos

Amadiyah
Amadiyah

Anos de guerra e violência sem fim à vista fazem com que a palavra “Iraque” acarrete uma certa dose de loucura e perigo que afasta do país a maioria dos potenciais viajantes. No Curdistão iraquiano, no entanto, a realidade cedo se encarrega de desmentir os preconceitos: é um lugar seguro e tranquilo, situação assim resumida por um habitante curdo de Dohuk: “Nos últimos dez anos, houve mais atentados em Londres que no Curdistão”.

Sentia um friozinho na barriga quando o autocarro em que seguia parou na pequena estação de camionagem às portas de Silopi, no sul da Anatólia. Um grupo de taxistas rapidamente nos rodeou, a mim e demais passageiros, oferecendo o transbordo até ao lado iraquiano da fronteira. Só nessa altura avistei T. J., nome de guerra de um turco musculado a trabalhar na base norte-americana de Kirkuk, território proibido mesmo para os viajantes mais destemidos. T. J. trabalha numa loja que confecciona fatos à medida dos soldados e regressava de férias com matéria-prima para o negócio, principalmente pesados rolos de tecido preto de boa qualidade que se haverão de transformar em ternos para os endinheirados militares. Falava bem inglês. Segui num táxi com ele e com um seu parceiro de negócios a caminho da fronteira com o Iraque.

Aldeia de Amadiyah, no norte do Iraque
Aldeia de Amadiyah, no norte do Iraque

A passagem na fronteira dificilmente poderia ter sido mais expedita. Do lado turco, revistaram cuidadosamente a mercadoria dos meus parceiros de viagem, mas não a minha bagagem; do lado iraquiano, dois oficiais bem-humorados chamaram-me para perguntas de circunstância – porquê o Curdistão?, quanto tempo vai ficar? – mas três minutos depois já se falava de futebol e não dos motivos da minha viagem. Na verdade, o passaporte estava já carimbado quando entrei no escritório envidraçado. Ofereceram-me chá e uma confortável cadeira. Um preferia o Brasil. Eu ia para Dohuk. O outro a Argentina. Eu viajava sozinho. O Messi parecia-lhes melhor que o Cristiano Ronaldo. Eu pus açúcar no chá. Em menos de nada, devolveram-me o passaporte com um aperto de mão. Bye. Estava oficialmente no Iraque.

Dohuk é uma cidade perfeitamente tranquila. Até porque a esmagadora maioria das pessoas no Curdistão iraquiano afirma gostar dos “americanos” e isso significa que somos todos – estrangeiros em geral – muito bem-vindos. Turisticamente, no entanto, Dohuk não é o mais impressionante dos destinos, mas tem um bazar coberto agradável, uma barragem com belas vistas sobre a cidade e gente incrivelmente amigável e com vestes atraentes. Por uma vez, o olhar reteve-se no trajar masculino. É composto por umas calças muito largas entre as pernas, um casaco aberto em V até meio do peito com uma camisa geralmente branca por baixo, e um fantástico lenço várias vezes enrolado na cintura fazendo de cinto. Os tons dominantes são pastéis, mormente castanhos, verdes-azeitona e cinzas. Para complementar, um tradicional shemagh enrolado na cabeça. Que coisa mais deliciosa!

Fortaleza de Amadiyah
Fortaleza de Amadiyah

Quando regressei ao hotel após uma primeira exploração de Dohuk, perguntei se havia qualquer outro viajante ali hospedado. Havia apenas um, Greg, um inglês de apenas 19 anos estagiário no The Independent e muito interessado em política internacional. Quando nos cruzámos no hall de entrada, Greg estava de saída para conhecer a “Cidade dos Sonhos”, um parque de diversões onde, nas noites de quinta e sexta-feira, batalhões de iraquianos se passeiam, namoriscam e divertem. É o local ideal para ver e ser visto em Dohuk. E era precisamente quinta-feira. Fomos juntos. No caminho, metemos conversa com dois adolescentes que afirmavam ir para uma “Disco”. Tentei perceber a que se referiam, mas limitavam-se a apontar para a frente com o braço em riste, dizendo que não era longe. Intrigados, acompanhámo-los.

A tal “Disco” ficava no complexo “Cidade dos Sonhos”. Entrámos. Era um vasto parque com áreas relvadas e algumas árvores, e atracções como uma montanha-russa, rodas gigantes, carrinhos de choque e espaço para crianças, para além de um edifício coberto com mesas de ténis de mesa, bilhar e jogos electrónicos. Prosseguimos pelo relvado na direcção da música que se escutava ao longe e só parámos em frente a uma grande roda horizontal, com bancos a toda a volta e espaço livre no centro.

Dohuk, Iraque
Cidade de Dohuk, Iraque

Assim que começou a rodar, movendo-se de forma incerta como um touro mecânico, os homens mais afoitos foram para o meio do circulo, tentando a todo o custo equilibrar-se de pé perante os safanões da máquina endiabrada. A multidão delirava, os homens e mulheres nos bancos em volta lutavam para não se desequilibrarem, os jovens pareciam surfar no centro do círculo. Não houve acidentes. A música estava alta e ritmada. Havia muitas luzes a piscar em torno da roda. Ao fundo, por detrás da roda, havia um placard luminoso com uma imagem de Michael Jackson de sorriso plástico. À sua direita, um letreiro luminoso com letras coloridas anunciava: “Disco”.

Na manhã seguinte, outra agradável surpresa: montanhas com encostas verdejantes, turistas domésticos impecavelmente vestidos em peregrinação de fim-de-semana às “piscinas” de Sulav, e uma aldeia deliciosamente encavalitada no cimo de um monte achatado. Amadiyah – assim se chama o vilarejo para onde me dirigi – fica sensivelmente a 70 quilómetros de Dohuk. Visitei-a na companhia de um filho da terra, motorista de profissão. Conheci a sua casa e a maior parte dos familiares, tomámos vários copos do inevitável chá, mostrou-me Amadiyah e os arredores, passámos pela vizinha Kanya Mala, até terminarmos o dia num pequeno café de Sulav não fazendo outra coisa que observar famílias curdas em dia de descanso. Não, o Iraque não é apenas deserto, militares fardados e atentados terroristas. “Nos últimos dez anos, houve mais atentados em Londres que no Curdistão”, concluiu.

Erbil, Iraque
Cidadela de Erbil, a capital do Curdistão iraquiano

De regresso a Dohuk, arrumei a mochila e fui procurar transporte para Erbil, capital do Curdistão iraquiano, sabendo de antemão que o caminho mais perto e rápido entre Dohuk e Erbil passa nos arrabaldes de Mosul. Acontece que Mosul está fora do domínio curdo, pelo que é um local a evitar a todo o custo. Demasiado perigoso. Tinha que ter a certeza que o táxi partilhado não seguia por essa rota. Fui indagar. Perguntei e perguntei e perguntei. Sempre que pronunciava a palavra Mosul, os meus interlocutores levavam a mão à garganta, decapitando-se teatralmente. “Sei que não vou por aí”.

O projecto Cairo - Teerão foi uma viagem terrestre pelo Médio Oriente, com a duração de três meses. Teve início no Cairo, capital do Egito, e término em Teerão, capital da República Islâmica do Irão. As crónicas foram originalmente publicadas no suplemento Fugas do jornal Público.

Seguro de viagem

A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.

Fazer seguro na IATI (com 5% de desconto)

Saiba mais sobre: Do Cairo a Teerão Iraque Médio Oriente

Planeie a sua próxima viagem

A melhor forma de ajudar o Alma de Viajante a manter-se sem anúncios e continuar a inspirar e a dar dicas de viagens gratuitamente é usando os links disponibilizados neste artigo para fazer as suas reservas. Nomeadamente:

Reserve um hotel em Iraque e aproveite as promoções do booking (é onde eu faço a maioria das minhas reservas).

Se precisa de viatura própria, alugue um carro na Discovercars. Passei a recomendá-la desde que descobri que têm preços bem mais baixos do que a Rental Cars.

E não se esqueça de fazer um seguro de viagem na IATI Seguros (tem 5% de desconto usando este link). Eu nunca viajo sem seguro.

Livro grátis

Junte-se a +25.000 viajantes e receba por email uma newsletter (em português) com muita inspiração e dicas para viajar mais e melhor. E ainda lhe ofereço o livro Alma de Viajante, há muito esgotado nas livrarias, com as crónicas da minha primeira volta ao mundo.

Sucesso! Por favor verifique o seu email para confirmar a subscrição.

There was an error submitting your subscription. Please try again.

Powered by ConvertKit

« De Diyarbakir a Mardin, viajar no feminino (Curdistão turco)
A preto e negro no Norte do Irão (Do Cairo a Teerão #11) »

Deixe uma resposta Cancelar resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Em caso de dúvida, leia a política de comentários do blog.

Sobre o autor

Filipe Morato Gomes, blogger de viagens

Olá! O meu nome é Filipe Morato Gomes, vivo em Matosinhos, Portugal, sou blogger de viagens, co-autor do projeto Hotelandia e Presidente da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses.

Tenho 52 anos e muita experiência de viagem acumulada. Já dei duas voltas ao mundo, fiz dezenas de viagens independentes e fui líder de viagens de aventura.

Mais recentemente, abracei um novo desafio chamado Rostos da Aldeia, onde se contam histórias positivas sobre as aldeias de Portugal e quem nelas habita.

SEGUIR NO INSTAGRAM

Assine a newsletter e receba o livro da minha primeira volta ao mundo gratuitamente (está esgotado nas livrarias).

Destinos em destaque

  • Japão
  • México
  • República Dominicana
  • Zanzibar
  • Puglia
  • Sardenha
  • Malta
  • Maiorca
  • Menorca
  • Lanzarote
  • Tenerife

Iraque

Reserve um hotel em Iraque ao melhor preço.

Faça um seguro de viagem com proteção Covid-19 (5% de desconto usando este link).

Alugue um carro para a sua próxima viagem.

Sobre

Alma de Viajante é um blog de viagens sob o mote “Viajar. Partilhar. Inspirar.”, onde partilho de forma pessoal e intimista as minhas viagens pelo mundo. O objetivo é “descomplicar” e inspirar mais gente a viajar como forma de enriquecimento pessoal. Há também guias, roteiros e dicas para o ajudar a viajar. Note que sou um blogger de viagens, não um operador turístico. Saiba mais sobre o Alma de Viajante.

Política editorial

Alma de Viajante é um blog completamente independente. Nenhum eventual parceiro tem qualquer influência no conteúdo editorial publicado e só recomendo aquilo que uso nas minhas viagens. Conheça a minha política editorial e comercial. Este blog contém links de afiliados.

Contactos · Na imprensa · Prémios

Explore o blog

  • Comece aqui
  • Artigos de viagens
  • Planear viagens
  • Trekking
  • Notícias
  • Blogging

Grandes viagens

  • Volta ao Mundo
  • Diário da Pikitim
  • Do Cairo a Teerão

Os meus convidados

  • Portugueses pelo Mundo
  • Viagens na Minha Terra

Redes sociais

Mais de 250.000 pessoas viajam com Alma de Viajante nas principais redes sociais. Junte-se a esta comunidade de amantes de viagens, assine a newsletter e inspire-se com as minhas aventuras em destinos de todo o mundo.

Blog de viagens fundador da ABVP

ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses

Copyright © 2023 Alma de Viajante · Um blog de viagens com roteiros, dicas e muita inspiração para viajar mais e melhor · Jornalismo de viagens