O deserto de Atacama, no Norte do Chile, não é como os outros: para além de ser o mais seco do mundo, o seu solo, quase sempre duro e salgado, permite o deslizar de uma bicicleta pelas suas estradas e caminhos. A partir da cidade-oásis de San Pedro de Atacama, um roteiro de viagem pelo coração do deserto.
Atacama a pedais
San Pedro de Atacama passou de pequeno oásis poeirento a atracção cosmopolita.
As ruas quadrangulares de casas baixas de adobe estão cheias de restaurantes e hotéis para acomodar o número crescente de turistas que chegam de todo o lado, a começar pelo próprio Chile.
A praceta sombreada e a igrejinha branca do século XVI são já dos postais mais famosos do país, e abundam as agências que organizam viagens aos lugares mais longínquos do deserto – e mesmo aos mais próximos, como é o caso do belíssimo Vale da Lua, a Pucará (fortaleza) de Quitor, ou ainda a Garganta do Diabo.
Mas para absorver a beleza do deserto, a solidão – ou, pelo menos, o silêncio – e as luzes mais ternas da madrugada e do fim da tarde são requisitos inalienáveis. Portanto, nada melhor do que organizar a nossa viagem pessoal, aprontando-nos com uma bicicleta, um farnel a preceito e muita água, para percorrer em solitário estradas e estradões no meio de um dos nadas mais impressionantes do planeta.
De San Pedro de Atacama ao Vale da Lua (39 Km)
Ainda o dia não tinha nascido e já eu fechava cautelosamente o portão da pensão. A frescura manteve-me o casaco vestido até à primeira subida, logo à saída do oásis. Pedalei à sombra, por uma estrada nova de asfalto, seguindo as placas que indicavam o Vale da Lua.
O sol foi pintando de cor de laranja os cumes artisticamente recortados em forma de torres, castelos, cidades de fadas; por fim desceu até à estrada, aquecendo-me as costas enquanto me aproximava cada vez mais do fabuloso cenário natural.
A estrada começa por subir, mas só para nos colocar cada vez mais próximo de paredes trabalhadas pelo vento, verdadeiros favos de areia e sal, que vão alternando com dunas de areia fina e cinzenta. A vista é impressionante e os carreiros tentadores – é só encostar a bicicleta e escolher o lugar ideal para o pequeno-almoço.
A paisagem é feita de montes rosados cobertos por uma leve camada de neve, mas que na verdade é sal. Mesetas e colunas levantam-se do chão e algumas têm nome, como as Três Marias, verdadeiras estátuas criadas pela erosão.
Das dunas escuras saem cristas de pedra branca e na Cuesta del Sal, o sol, que já batia com força, fazia brilhar o chão como se estivesse polvilhado de diamantes. Uma paisagem digna da Lua, que abandonei com pesar enfrentando o caminho de regresso pela estrada de Calama, que sobe suavemente até ao extraordinário Vale da Morte, onde nem o vento consegue viver.
De Quitor à “Quebrada del Diablo” (21 Km)
Há duas estradas para Pucará de Quitor, que fica a uns três quilómetros de San Pedro de Atacama. Parti pela que se dirige ao Vale da Morte, para mais uns minutos a sós com a sua paisagem quieta e rugosa, como um gigantesco mar petrificado.
A fortaleza data do século XII, e é um dos raros vestígios do povo atacamense. Prima pela localização mais do que pelos muros de pedra que sobraram do casario, escorregando pelo flanco íngreme de uma encosta, no cimo da qual (mais) um miradouro impressionante nos mostra o deserto e o vale onde passa o rio e a estrada de terra.
A dificuldade é atravessar o rio duas vezes, caso tenha água – e tinha. Mas desta vez pedalei no meio do verde, rodeada por cabeços ressequidos que se iam fechando sobre mim.
O ponto de viragem para entrar na Garganta do Diabo não está assinalado, mas situa-se no local exacto em que a estrada bifurca, num pequeno cabeço encimado por uma cruz; seguimos para a direita, atravessando o rio, e a fenda da garganta é visível na nossa frente.
Uma vez lá dentro, é melhor pousar a bicicleta numa sombra e seguir o labirinto de corredores, ora estreitos ora largos, descobrindo anfiteatros de sal e terra com texturas variadas e, aparentemente, extraplanetárias: riscas, borbulhas, redes, camadas, tudo cor de terra morta.
O regresso não permite grandes variações – apenas tomar a estrada da esquerda, não atravessando o rio em Quitor, entrando assim em San Pedro de Atacama pelo arrabalde de El Carmen.
Guia de viagens a Atacama
Este é um guia prático para viagens ao deserto de Atacama, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e sugestões de actividades em redor de San Pedro de Atacama.
Localização geográfica
O Chile é um país longo e estreito, com a cordilheira andina a delimitar as fronteiras com o Peru, a Bolívia e a Argentina; do lado oposto fica o Oceano Pacífico. Tem 4.300 km de comprimento, uma média de 175 km de largura, e a sua variedade geográfica abrange fiordes, glaciares, vulcões, ilhas e o deserto de Atacama, a Norte, que é o mais seco do mundo, com uma precipitação que não ultrapassa as quatro chuvadas por século.
Como chegar a Atacama
Os voos para Santiago do Chile, via Rio de Janeiro, ficam por cerca de 1.200 €. Daí há 4 autocarros por dia para San Pedro de Atacama, onde, caso aceite a sugestão de conhecer Atacama a pedalar, não faltam agências e mesmo pensões que alugam bicicletas.
Onde ficar
Um dos hotéis mais recomendados é o El Tatio, com quartos à volta de um pátio por 30 a 40 €, na Rua Caracoles. Mais económico é o Hostal Inti Para, na rua Calama, com pátio, cozinha à disposição e aluguer de bicicletas; uma cama num dormitório para quatro pessoas custa pouco mais de 6 € e um quarto à volta de 10 €. Também existem parques de campismo e turismos rurais.
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Onde comer
Em San Pedro de Atacama há restaurantes de todos os géneros; gostei especialmente do restaurante Adobe e do café Tierra Todo Natural, ambos na Rua Caracoles. Há também uma excelente padaria no fim da mesma rua, assim como algumas lojinhas e supermercados onde é possível comprar o necessário para um dia fora de bicicleta.
Informações úteis
San Pedro de Atacama é um oásis a 2.400 metros de altitude e tornou-se o centro turístico da zona. Tem cerca de 5.000 habitantes e todas as infraestruturas necessárias, desde ATMs (às vezes ao fim-de-semana não funcionam), banco, restaurantes, hotéis e pensões de todos os géneros.
Mas não é um lugar barato; a unidade monetária parece ser 5.000 pesos, e os preços rondam os de Portugal. Na realidade, 1 euro vale cerca de 775 pesos chilenos.
Os autocarros são extremamente confortáveis, não há que ter medo das viagens longas ou nocturnas. Indispensável é a protecção para a cabeça, os olhos, a pele, os lábios. O ar é extremamente seco e deve ter sempre água consigo.
Seguro de viagem
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