Este texto foi escrito pelo Dr. Eduardo Gonçalves, pediatra da minha filha mais velha, a propósito de uma volta ao mundo em família com uma criança de cinco anos que fiz em 2012. Foi publicado originalmente no blog Diário da Pikitim.
«Chamo-me Aude Girard. O meu filho adorado, Aymeric, morreu com 7 anos, no dia 10 de maio de 2010 em Dakar, de um paludismo (plasmodium falciparum). Ele tinha dor abdominal e pouca febre. O médico diagnosticou um problema gástrico e não pediu um teste de despistagem de paludismo (malária). Morreu alguns dias depois.» Aude Girard (com o Dr. Strady) realizou um guia (em francês, inglês e alemão) que pode ser consultado em www.chasseurs-sans-frontieres.com.
A prevenção das doenças infecciosas relacionadas com viagens deve fazer-se muito antes e prolongar-se para além da viagem terminada.
Durante as viagens, as famílias aceitam correr riscos que numa situação normal não aceitariam: comer comida “duvidosa”, beber água não potável, beber diferentes tipos de álcool e em maior quantidade, usar meios de transporte locais sem cintos ou cadeiras próprias para crianças…
Quando se viaja, principalmente com crianças, deve-se estar informado sobre os locais de destino, assim como os riscos para a saúde desses mesmos locais. É prudente que, antes de uma família viajar, consulte informação recente sobre possíveis surtos de doenças, quer através das recomendações da World Health Organization (WHO) quer do U.S. Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
Vacinas para viagens internacionais
A imunização antes de uma viagem internacional tem dois passos: 1º Verificar a atualização do Plano Nacional de Vacinação (PNV) e 2º Vacinação específica para os destinos das viagens. Os reforços de vacinas em atraso devem ser feitos e alguma dose adicional de vacinas de rotina pode também ser necessária (eventual reforço de sarampo para certos locais da Ásia ou de poliomielite para a Índia ou África). Todas as crianças devem também vacinar-se contra a gripe segundo as recomendações habituais ou seja em caso de doença crónica ou se suscetíveis de complicações.
As recomendações relativas às vacinas dependem dos locais de destino, da duração da estadia, dos antecedentes médicos e de eventuais riscos a que a criança possa estar exposta.
#1 Hepatite A
Esta vacina é recomendada a partir dos 12 meses, quando se viaja para países subdesenvolvidos e é altamente eficaz. A forma mais frequente de transmissão é de pessoa a pessoa, devido à contaminação fecal e alimentação (via fecal-oral).
#2 Febre tifóide
A imunização anti-tifoideia aumenta a resistência à infeção por Salmonella Typhi, mas o grau de proteção conferido pelas vacinas atuais é limitado (eficácia de 50% a 80% segundo a Food and Drug Administration (FDA).
A vacina anti-tifoideia polissacárida (I.M.) pode-se administrar a partir dos 2 anos, mas a vacina de micróbios vivos atenuados (Via Oral) só está autorizada depois dos 6 anos. No entanto e apesar da vacina, os viajantes para zonas de risco devem saber que a vacina não substitui a seleção cuidadosa dos alimentos e das bebidas, assim como os legumes e o marisco serem cozinhados.
#3 Febre-amarela
Viajantes para alguns locais da América Latina ou África são também candidatos à vacinação. Uma dose da vacina feita pelo menos 10 dias antes da viagem é suficiente para conferir imunidade durante 10 anos e as crianças com idade superior a 9 meses que viajem a zonas de infeção endémica devem vacinar-se. Está contra-indicada a vacinação antes dos 4 meses de idade (risco de encefalite) e a decisão de vacinar as crianças entre os 4 e os 9 meses deve ser ponderada. Está também contra-indicada a vacinação de crianças alérgicas ao ovo já que a vacina contém proteínas de ovo.
#4 Sarampo
A vacinação contra “sarampo + parotidite + rubéola” (VASPR -MMR) tem sido feita no PNV português aos 15 meses (talvez passe para os 12 meses). Em caso de viagem a zona de risco ou em caso de surto de sarampo, pode-se vacinar os lactentes de mais de 6 meses com a vacina anti-sarampo monovalente ou com a trivalente (VASPR-MMR). No entanto, a taxa de sero-conversão é baixa quando se vacina antes dos 12 meses pelo que devem ser revacinados aos 12-15 meses e aos 4-6 anos.
#5 Varicela
A vacinação contra a varicela faz parte do plano vacinal dos U.S.A. há mais de 10 anos e deve realizar-se às crianças a partir dos 12 meses (exceto aquelas que tiveram a doença). Em Portugal existem duas vacinas para a varicela (que não faz parte do PNV) e, embora não disponível em Portugal, também existe uma vacina tetravalente que para além da varicela, também vacina contra o sarampo + parotidite + rubéola (MMRV).
#6 Encefalite japonesa
Esta vacina pode estar indicada para viagens a alguns destinos na Ásia. O risco para estadias inferiores a 4 semanas e em centros urbanos é baixo e trata-se de uma doença sazonal. A vacina está autorizada a partir dos 12 meses de idade e é possível obter informação atualizada sobre os lugares de transmissão do vírus da encefalite japonesa e sobre as recomendações de vacinação em www.cdc.gov/travel.
#7 Infeção meningocóccica
A vacina tetravalente pode estar indicada para alguns destinos especialmente onde haja surtos (África subsaariana). A informação sobre os locais de risco e surtos está também disponível na CDC. A vacinação contra os meningococos faz parte do PNV a partir dos 3 meses.
#8 Malária (paludismo)
Verdadeira praga, os mosquitos são vetores de várias doenças graves e na primeira linha está a malária. Por ano, de 350 a 500 milhões de pessoas são infetadas com malária (mais de 1 milhão morre). Não existe atualmente vacina contra a malária, embora exista prevenção e tratamento. Esta doença deve-se a um parasita (plasmodium) transmitido pela fêmea de um mosquito (anopheles) e esse mosquito “ataca” entre o pôr-do-sol e o nascer do dia.
Raramente se aconselha a prevenção medicamentosa da malária para estadias muito prolongadas, devido aos efeitos secundários potenciais. Por outro lado, essa profilaxia com medicamentos não é uma garantia absoluta contra a doença, mas aumenta a resistência do corpo à infeção.
Viajantes para zonas endémicas de malária devem ser devidamente informados pelo seu médico ou uma consulta do viajante sobre os métodos de prevenção, sinais e sintomas da doença e quando se deve procurar ajuda médica. A adesão a um esquema de quimioprofilaxia adequada é o fator determinante do êxito da prevenção. O medicamento mais importante na prevenção da malária para quem viaja para regiões onde não haja resistência à cloroquina, é a cloroquina; toma-se 1 vez por semana iniciando a prevenção 1-2 semanas antes da viagem e até 4 semanas após o regresso e é geralmente bem tolerada. Uma opção de prevenção para zonas cloroquina-resistentes pode ser a mefloquina cujo esquema é igual à cloroquina.
A decisão sobre a quimioprofilaxia compete, logicamente, ao médico assistente ou consulta do viajante (antecedentes médicos, local de destino, duração da viagem).
Saúde em viagem – Condições gerais
Apesar do principal objetivo da “consulta pré-viagem” ser a vacinação e a prevenção da malária, os acidentes e outras doenças infecciosas (tal como as diarreias e as infeções respiratórias altas) são as causas mais frequentes de morbilidade durante as viagens com crianças. Todos os que viajam com crianças devem ser informados sobre os cuidados com a alimentação, a rehidratação oral, a prevenção dos acidentes, a proteção solar, o jet-lag, os enjoos, os afogamentos, a segurança rodoviária e a “pequena farmácia” que devem levar.
A diarreia do viajante afeta 50% das crianças que viajam para países subdesenvolvidos. Pode ser prevenida com uma atenção especial à água e à alimentação. É de evitar água “duvidosa” não fervida e gelo, assim como fruta crua com casca e vegetais não cozinhados ou comida cozinhada conservada à temperatura ambiente e exposta às moscas.
A rehidratação oral (O.R.S.) é o principal tratamento para uma situação de diarreia moderada. Os pais devem vigiar a criança e se a situação se agravar (febre alta, sangue nas fezes, desidratação) devem levar a criança ao médico. Nos casos mais graves de diarreia do viajante, pode ser necessário um antibiótico e um medicamento para diminuir o trânsito intestinal (geralmente não aconselhado a menores de 6 anos).
O jet-lag é extremamente frequente quando se atravessam dois ou mais fusos horários e os sintomas podem durar uma semana ou mais, geralmente 1 dia por cada hora de mudança horária. Não existe atualmente qualquer tratamento conhecido para as crianças.
Para alguns destinos mais remotos e/ou viagens prolongadas é aconselhável fazer um seguro para “evacuação de urgência”.
Material médico para viajantes – “pequena farmácia”:
- Antibiótico oral para diarreia do viajante (azitromicina)
- Medicamentos anti-motilidade intestinal (Ioperamida)
- Anti-piréticos / anti-inflamatórios
- Anti-histamínico e cortisona orais e tópicos
- Antibiótico e anti-fúngico tópicos
- Escabicida
- Termómetro e adesivos / pensos rápidos
- Repelente de insetos e protetor solar
- Saquetas para rehidratação oral
- Desinfetantes para as mãos
- Soro / seringas de plástico
- Medicação crónica da criança (anti-convulsivantes, medicação para o coração, etc.)
- Contactos do pediatra / médico assistente
Seguro de viagem
Em todas as situações – e mais ainda se viaja com crianças -, não parta sem fazer um seguro de viagem. É fundamental!
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.