Numa visita à Madeira é indispensável conhecer o seu interior natural, caminhando ao longo de um dos seus antigos canais de irrigação, conhecidos por levadas, que já são uma imagem de marca da ilha. Alguns, como o que leva à Cascata do Risco ou o das 25 Fontes, são acessíveis a todos e levam-nos em pouco tempo a lugares belíssimos e com um ambiente remoto.
O Paul da Serra é uma espécie de reservatório de água para a Madeira: o seu interior possui das maiores reservas de água doce da ilha por baixo do planalto rochoso que o compõe. À vista de quem passa na estrada, é apenas uma reta – a maior da ilha – numa paisagem mais ou menos plana, coberta de vegetação baixa aproveitada por umas vacas mansas e curiosas, que vêm espreitar os carros que param.
Mas a água brota por todo o lado de formas magníficas, e para o comprovar basta um par de passeios que se fazem numa manhã, ou num dia inteiro de caminho bem pausado, com tempo e espaço mais que suficientes para um piquenique em família ou com amigos.
É só estacionar o veículo no parque de estacionamento do Rabaçal e descer até ao ponto de partida dos carreiros que levam às cascatas do Risco e das 25 Fontes, o que se faz a pé, ou melhor ainda, num veículo vai-e-vem que circula todo o ano por uma longa e sinuosa estrada, encurtando o caminho até à Casa Florestal do Rabaçal em cerca de uma hora. O trilho está assinalado por placas e começa a poucos minutos dali. E um pouco mais adiante chegamos a um cruzamento onde nos confrontamos com a difícil escolha sobre qual a primeira cascata a visitar.
Optando pela do Risco, temos pela frente uns oitocentos metros de pura beleza, entre penedos cobertos de vegetação frondosa, paredes que escorrem água e alimentam pequenas plantas de folhas delicadas, e a levada que deu origem ao caminho, por onde passam peixes apressados, que mal temos tempo de ver. Estamos em plena Floresta Laurissilva, protegida como Património Mundial da Humanidade desde 1999 e de uma beleza difícil de descrever.
Apesar destes trilhos serem dos mais frequentados da ilha, por serem os mais acessíveis – não é raro ver famílias com crianças e pessoas de todas as idades -, alguns minutos a sós com a paisagem podem levar-nos ao início do mundo, tal a pureza transmitida pela floresta densa. Nada parece ter sido tocado desde há milhares de anos, e as plantas continuam a crescer numa organizada e impenetrável profusão, de uma beleza bravia.
A cereja no topo do bolo, se estivermos com atenção e soubermos parar para ver, é o contacto com os pequenos habitantes da floresta, aves e pequenos ratinhos do campo, por exemplo, que vão levando as suas vidas como se ali não estivéssemos. Com sorte podemos até avistar o Pombo Trocaz (Columba trocaz trocaz), um exclusivo da Madeira.
Por fim a cascata do Risco ouve-se, ainda antes de se deixar avistar. Aproximamo-nos por um chão cada vez mais molhado e acabamos por ser borrifados por uma nuvem de pingos refrescantes. A sua origem é uma impressionante queda de água que jorra com força de uma parede a pique de rocha escura, com riscos alaranjados. Um túnel que permitia ter acesso à cascata está encerrado por razões de segurança – e não é difícil perceber porquê.
Ficamos num miradouro suficientemente próximo para nos molharmos, mas suficientemente largo e afastado para não cairmos no abismo verde onde a água se some, abatendo-se de uma altura de mais de mil metros acima do nível do mar.
Depois de uma pausa – porque não um piquenique na Casa Florestal, onde há mesas e uma fonte, tudo numa plataforma com magníficas vistas sobre a paisagem? – deseja-se recomeçar, ir mais uma vez floresta adentro. A pouco mais de dois quilómetros as placas prometem outra descoberta fabulosa: a Lagoa das 25 Fontes.
Desta vez há mais do que um carreiro de terra: há também escadas escavadas na pedra, corredores esculpidos nas paredes de rocha, bem mantidos e delimitados por cordas. Além de seguir a levada contornamos as curvas fechadas da montanha, subimos e descemos ligeiramente, atravessamos a garganta da Ribeira Grande, um pequeno vale fechado atapetado de seixos brancos, sobre uma antiga ponte de pedra.
À nossa volta repete-se o prodígio da Laurissilva, a paz sombreada do interior da ilha onde o único ruído é o marulhar da água. À chegada repete-se também o espanto da beleza, mas desta vez podemos tocar na água sem ser borrifados por ela.
Podemos aceder à margem da lagoa, mas a lenda recomenda que não se mergulhe: parece que quem entra na água não sai mais de lá. Provavelmente porque não quer: as 25 Fontes afinal são mais, e pingam numa delicada bacia de pedra formando um lindo lago verde e fresco, rodeado de trepadeiras viçosas e fetos gigantescos.
Apetece ficar por ali sentado num dos grandes pedregulhos redondos e esbranquiçados, que invernos e muita água fizeram rolar até ficarem lisos e macios. É mais um local que lembra os inícios do planeta, não fora os caminhantes que vão chegando, o ritual das fotos, as vozes que ecoam nas paredes. Mal partem todos instala-se outra vez o som suave da floresta viva e da água – e o coração natural da ilha recomeça a bater.
Guia de viagens à Madeira
Este é um guia prático para passeios pedestres na Ilha da Madeira, com informações sobre a melhor época para caminhar, trajetos em levadas e como chegar ao Funchal.
Quando visitar a Madeira
A Madeira é linda todo o ano, mas os passeios pedestres são mais agradáveis com bom tempo. Só por isso, recomenda-se viajar entre a primavera e o outono. Mas não esquecer que deve levar calçado adequado a piso molhado e escorregadio, em qualquer altura do ano.
Como ir
A TAP tem voos para a Madeira a partir de Lisboa e do Porto, e faz regularmente campanhas de preços baixos. As low cost easyJet e Transavia fazem a ligação entre o Funchal, Lisboa e Porto, respetivamente.
Uma vez na ilha, não há grande frequência de transportes públicos para o Paul da Serra, ponto de partida das levadas mencionadas – pode pedir informações mais detalhadas num posto de turismo. Com veículo próprio, aconselha-se a estacionar no parque ao lado da estrada e tomar o shuttle até ao início dos trilhos: a descida (ou subida) a pé é longa e desinteressante. O serviço funciona todo o ano em carrinhas da Câmara, e fica por 5€ por ida e volta, ou 3€ só um dos percursos (2€ para as crianças).
Hotéis e restaurantes
A vila de São Vicente é a povoação mais próxima do Paul com infraestruturas turísticas, como locais de dormida, alguns restaurantes e cafés. Um dos locais recomendados para dormir é a Casa da Piedade, unidade de turismo rural numa antiga casa típica madeirense recuperada. Os preços rondam os 55€ a 77€, dependendo do tipo de quarto e da época do ano, e incluem pequeno-almoço. Pode fazer reservas através da Associação Madeira Rural, que tem um balcão no aeroporto e múltiplas opções de alojamento para o turismo de Natureza.
Para outras opções hoteleiras, consulte uma lista com os melhores hotéis da Madeira, escolhida com base nas opiniões de hóspedes que neles pernoitaram recentemente.
Informações úteis
Nunca é demais desaconselhar passeios por trilhos de montanha em solitário. Na Madeira não faltam agências que disponibilizam programas de caminhadas pelas levadas, e entre as mais recomendadas está a Madeira Adventure Kingdom. Além de guias e toda a logística, a agência inclui também o serviço de transferes entre o alojamento e a levada que se pretende percorrer.
Seguro de viagem
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