Das Areias do Deserto a um Mar de Coral (De Cabo a Cabo #09)

Das Areias do Deserto a um Mar de Coral

Os dias na Jordânia terminam sobre as areias vermelhas do magnífico deserto do Wadi Rum. O barco que me levará ao Egito, carrega mais esperança do que simplesmente passageiros e carga e do outro lado do Golfo de Aqaba, um mar de coral espera tranquilamente a sua chegada.

Para sair de Wadi Rum tenho de apanhar o autocarro que segue para Amã às 8 da manhã, sair no cruzamento da estrada que leva a Aqaba e conseguir um outro autocarro até lá, pelo que tenho de deixar o acampamento por volta das 5 e meia. A noite ainda é espessa quando me levanto e desmonto a tenda mas rapidamente estou a caminhar em sentido contrário, pisando as areias que vão empalidecendo à medida que o sol se espreguiça. Não há ninguém! Apenas a minha sombra, ainda comprida, me faz companhia.

As cores do deserto vão-se transformando à velocidade de cada passo, assim como o frio se vai despedindo. Ao longe vislumbro beduínos aproximando-se, montando os seus camelos – quais Lawrence das Arábias – trazendo-os pelas mesmas areias que este pisou durante a revolta árabe.

É ainda relativamente cedo quando chego à Rest House do deserto de Wadi Rum e sirvo-me do que resta na mochila do jantar de ontem para um pequeno-almoço na esplanada. Há mais alguém à espera do mesmo autocarro. Pouco antes das 8 juntamo-nos todos e, apresentações feitas, chegamos rapidamente à conclusão ser mais fácil e rápido partilhar um táxi do que esperar pelo autocarro que já vem atrasado.

Minutos depois, estou numa pick-up com mais três companheiros, dois deles mãe e filha. São de Inglaterra e tiraram as férias para se encontrarem e viajarem pela Jordânia, uma vez que a filha trabalha no Dubai e há muito não se viam.

Enquanto partilhamos experiências de viagem, um comboio de mercadorias atravessa as areias do deserto, naquele que é o único vislumbre possível de um comboio na Jordânia, uma vez que o serviço de passageiros há muito que deixou de se fazer.

Em Aqaba, pelo meio de atletas de uma qualquer prova de atletismo a decorrer nas ruas da cidade, procuro o barco que me levará até ao Egito. Aqaba nada parece ter a ver com o resto da Jordânia. Estando situada na extremidade norte do Golfo de Aqaba, banhada pelas suas águas quentes e com um clima veraneante durante todo o ano, é mais um destino de resorts e turistas de calção e chinelos como em qualquer outra cidade do mediterrâneo europeu.

Depois de alguns minutos de caminhada, encontro finalmente a agência onde comprar o bilhete para o barco. O bilhete tem de ser pago em dólares, pelo que terei de voltar ao centro da cidade e trocar o que resta dos meus euros. Para além disso, informam-me que não terei qualquer problema em conseguir o visto egípcio à chegada ao país, o que me deixa mais tranquilo e garante em definitivo a minha partida hoje para o Egito.

Ainda não é meio-dia e o barco supostamente só parte às 3 da tarde, mas na agência dizem-me que é melhor seguir já para o porto e esperar lá. Depois da experiência com o ferry entre a Turquia e o Chipre, tenho quase a certeza que a espera será longa…

No porto a azáfama é enorme! Cumpro os habituais procedimentos fronteiriços que – como se já não bastasse o que se paga para entrar! – incluem o pagamento de uma taxa de partida devido ao tempo de permanência no país, não sei se por defeito ou por excesso.

Apesar de ainda faltarem mais de 3 horas para a suposta partida do ferry, já muita gente aguarda no exterior, numa zona de espera rodeada de pequenos quiosques onde estão instaladas televisões que, sendo hoje sexta-feira – dia santo para os muçulmanos – transmite aquilo que parece ser o sermão dominical na versão islâmica.

Rapidamente descubro que muitos destes passageiros têm destinos mais longínquos que o próprio Egito. Muitos são sírios e parecem fugir dos recentes problemas que afligem o país. Conheço dois irmãos a caminho do Sudão e um grupo de cinco amigos em busca de melhor sorte numa Líbia em transformação e que inesperadamente me oferecem comida; pão, queijo, hummus, tomate, pepinos e salsichas.

Quando o barco aporta no cais, uma enorme agitação de carregamento tem início. São precisos mais de três camiões TIR para carregar toda a bagagem destes passageiros de longo termo. Enormes sacos que parecem conter todos os pertences de quem os carrega são atirados para o interior do atrelado dos camiões e até mobília de quarto é possível vislumbrar no amontoado de sacos.

Há finalmente permissão para embarcar. Passageiros ocidentais têm uma inexplicável prioridade sobre todos os outros e, na companhia de um casal alemão, sou um dos primeiros a embarcar, mas rapidamente todos os lugares ficam preenchidos e um ritual de oração e jantar tem início.

Qualquer espaço entre assentos é suficiente. Descalçam-se e dão início à oração e outros se vão juntando no mesmo espaço, antes de abrirem os seus farnéis que partilham sentados no chão.

Percorro o exterior do barco e sob as estrelas e a brisa amena que sopra à velocidade do nosso avanço, penso em como será fabuloso desembarcar no Egito numa altura como esta, em que o seu povo escreve uma nova página da sua história.

Todos os procedimentos fronteiriços são surpreendentemente rápidos e só a ausência de visto não permite que cumpra todos os requisitos ainda no próprio barco. Nuweiba é uma fronteira estranhíssima! Já é noite quando aportamos no lado egípcio e do barco até à saída do porto é necessário seguir de autocarro. Os meus novos amigos sírios esforçam-se por me ajudar com tudo. Uma outra agitação tem lugar agora com toda a bagagem a ser descarregada numa área de terra batida onde carregadores se apinham com os seus atrelados na busca de clientes.

Procuro o gabinete onde comprar o visto e levo-o às autoridades para que mo coloquem no passaporte e mo devolvam. Por mais estranho que seja o lugar e a agitação, tudo decorre com enorme brevidade e rapidamente estou na companhia de mais quatro viajantes à procura de um táxi que nos leve até Dahab, uma vez que todos se dirigem para lá e um deles trabalha num hostel que me diz ser super barato e bastante decente.

– Tem Internet, cozinha e lavandaria? – Pergunto.
– Sim.
– Então tem tudo o que necessito para os próximos dias!

Nada melhor do que terminar um dia inteiro de viagem numa esplanada aquecida por pequenas fogueiras, com vista para a baía de Dahab, na companhia de uma Stela (cerveja egípcia).

De Cabo a Cabo tem por objetivo unir os pontos mais a norte da Europa e mais sul de África, numa viagem em busca das afinidades e multiplicidades dos povos, das suas culturas, crenças e esperanças, das suas singularidades e de como o homem é um ser “pacífico e cooperativo”, como dizia o professor Berger a Paul Theroux durante a sua «Viagem Por África». Com saída de Santa Maria da Feira, Portugal, no dia 28 de agosto de 2011, Mateus Brandão percorreu 20 países em 3 continentes durante 9 meses.

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Mateus Brandão

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