Seriam umas 10:30 quando cheguei aos escritórios da Indie Campers na Maia. Na altura, a jovem Ana limpava uma autocaravana que tinha um vidro partido, vítima de um assalto noturno na cidade do Porto. Estatisticamente, e como gosto de pensar de forma positiva, a probabilidade de me acontecer o mesmo ficou por isso mais diminuta.
Ana, funcionária da Indie Campers, explicou-me os procedimentos básicos da autocaravana Active Plus – modelo Ducato da Fiat -, com a qual haveria de fazer a minha roadtrip em família por Portugal durante os 10 dias seguintes. Mostrou-me os cantos à casa, explicou como funcionava o chuveiro e a sanita química que solicitei; e, num instante, estava quase pronto a assumir os comandos da autocaravana.
Faltava apenas completar os trâmites burocráticos, entre os quais o pagamento devido e a escolha do seguro de viagens mais adequado. Pouco depois, era então altura de carregar a Active Plus com a nossa bagagem, alguma comida e brinquedos. A viagem estava prestes a começar.
Como foi viajar com a Indie Campers
Manda a verdade dizer que a primeira impressão foi de desconforto. Apesar de já ter experimentado uma campervan na Nova Zelândia, por exemplo, nunca tinha conduzido uma autocaravana tão comprida como a da Indie Campers. A principal dificuldade tinha precisamente a ver com o comprimento do veículo, que tornava as marcha-atrás e as curvas e desvios para a esquerda complicados.
Como é evidente, fui-me habituando ao longo do tempo ao tamanho da autocaravana da Indie Campers; mas tive de conduzir com redobrados cuidados e atenção. Bem vistas as coisas, foi o preço a pagar para ter espaço interior para uma família de quatro pessoas; se a autocaravana fosse mais pequena, dificilmente viajaríamos de forma confortável.
Tirando esse aspeto que necessitou de alguma habituação, pouco tenho a apontar à autocaravana Active Plus da Indie Campers (apenas o frigorífico e o chuveiro, mas explico abaixo os motivos). Era confortável e espaçosa, com o interior bem pensado e funcional para um casal com duas crianças – dentro das limitações inerentes.
Havia uma bancada de cozinha e um pequeno frigorífico; muito espaço para arrumação; equipamento de cozinha adequado; um chuveiro; bancos para os miúdos estarem em segurança quando em andamento; e uma mesa com um sofá na parte traseira, que dava para as crianças se entreterem com jogos, desenharem e pintarem, verem filmes no portátil e, claro, para fazer as refeições.
Na prática, os dias começavam quase sempre com o desfazer das camas, transformando a área da mesa num espaço novamente transitável. Seguia-se o pequeno-almoço a bordo; depois do qual, normalmente, seguíamos viagem rumo ao próximo destino. Quanto às restantes refeições do dia, muitas vezes almoçámos coisas rápidas (por exemplo, sopa já pronta comprada em supermercados e sandes; ou restos do jantar reaquecidos); aos jantares, por outro lado, e depois de um dia quase sempre cansativo, cozinhava na autocaravana e por lá ficávamos.
De resto, nunca tive problemas em estacionar a autocaravana; pelo que nos permitimos parar em qualquer lugar onde nos apetecesse ficar. E assim, em termos de alojamento optámos uns dias por dormir em parques de campismo e outros por estacionar na rua, em locais sem vigilância; foi o que fizemos, por exemplo, no Baleal e em Mina de São Domingos. Nas praias da Costa Vicentina e Algarve, aliás, vi dezenas e dezenas de autocaravanas estrangeiras estacionadas sem qualquer problema – e essa liberdade é uma das grandes mais-valias de viajar de autocaravana em Portugal.
Por fim, para os miúdos, tínhamos quase a certeza de que iriam adorar. E não nos enganámos. Para eles – e principalmente para o mais novo – foi sempre uma emoção viajar numa “casa sobre rodas”. E a autocaravana da Indie Campers esteve sempre à altura.
O que gostei menos na Indie Campers
Como é natural, nem tudo correu às mil maravilhas com a Indie Campers. Eis as coisas de que menos gostei na experiência.
Chuveiro pouco útil
Uma das coisas que me pareceu não fazer sentido é a limitação que o chuveiro tem. Na prática, a água quente só funciona quando a carrinha está ligada à corrente. Ou seja, nos parques de campismo. Que é onde há (quase sempre) água quente. Por essa razão, em 10 dias de viagem nunca tomei banho na autocaravana.
A boa notícia é que, quando entreguei a autocaravana à Indie Campers e mencionei este facto, disseram-me que as novas autocaravanas (de 2018) já virão sem essa limitação.
Frigorífico pequeno
Dava jeito um frigorífico um pouco maior e com mais autonomia. Não sei como se poderia organizar o espaço da autocaravana para isso ser possível mas, numa carrinha desenhada para quatro pessoas, o frigorífico existente é manifestamente insuficiente.
Seguros
Quando alugo carros costumo fazer seguro contra todos os riscos. Na verdade, da Escócia a Omã, passando pela Austrália ou Nova Zelândia, nunca tive de acionar o seguro. Mas pago para viajar com paz de espírito; para não ter chatices e surpresas desagradáveis no final. Foi exatamente o que aconteceu neste caso (já lá vamos).
Apesar de ter pago 15€ por dia de seguro adicional (o equivalente a 5.475€ de prémio anual!), esse seguro só servia para diminuir a franquia e cobrir problemas com os pneus e a quebra de vidros (e, vi depois, lendo o contrato, que cobria apenas um (1!) pneu e um (1!) vidro, espelhos excluídos). Ofereceram-me uma opção ainda mais dispendiosa, de 25€ por dia, mas servia apenas para diminuir ainda mais a franquia. Ou seja, não havia qualquer seguro que permitisse viajar com total paz de espírito.
O valor a pagar por eventuais “estragos”…
Sou uma pessoa extremamente cuidadosa a conduzir. Nunca tive um acidente na vida (tenho por máxima que “o meu dinheiro não é nem para polícias nem para chapeiros”).
Sou também uma pessoa precavida. Isto é, tento sempre antecipar problemas e diminuir os riscos de algo correr mal. Por exemplo, quando chegámos ao acesso à Praia dos Galapinhos, no local onde estacionei havia vários vidros partidos no chão, sinal de assaltos a viaturas enquanto as pessoas estavam na praia. Por isso mesmo, a Luísa ficou na carrinha enquanto eu fui fotografar a Praia dos Galapinhos. Prejudicámo-nos em nome da segurança da carrinha. Mesmo tendo seguro para a quebra de vidros.
Outro exemplo: na minha roadtrip em Portugal, decidimos regressar a Matosinhos na noite anterior ao dia da entrega da autocaravana. Para não deixar a carrinha sozinha numa rua de Matosinhos durante a noite, dei-me ao trabalho de ir colocá-la no parque da Indie Campers a quase 20km de casa (eles estavam fechados, foi o segurança do complexo industrial que me deixou passar); recolher o meu carro; e voltar na manhã seguinte para entregar oficialmente a autocaravana e fazer o check-out. Foi nessa altura que tive uma surpresa desagradável.
Durante a viagem, estava num parque de campismo quando detetei que uma peça de plástico colocada na lateral da autocaravana estava meia solta. Para evitar males maiores, retirei a peça de plástico e coloquei-a na bagageira. Essa zona lateral tinha também uma pequena amolgadela, indício de que alguém terá dado um toque na autocaravana. Eu, é certo, não bati em nada (lá está, o meu dinheiro não é para chapeiros).
Quando entreguei a autocaravana à Indie Campers, referi esse facto e foi aí que fui surpreendido com uma conta extravagante. Vou-vos poupar aos detalhes da conversa mas, basicamente, fui obrigado a pagar 717€ porque, de acordo com uma tabela que me mostraram na hora, era esse o valor do arranjo.
Nestas situações não adianta muito argumentar, até porque a Indie Campers tinha os dados do meu cartão de crédito e estava naturalmente defendida pelo contrato de aluguer. Ou seja, nada podia fazer. E assim paguei, levando comigo um enormíssimo sentimento de injustiça.
Até porque, repito, não só tratei a carrinha como se fosse minha, como não tive qualquer culpa no “acidente”. Além disso, não me foi permitido fazer um seguro contra todos os riscos para evitar estas chatices, e depois apresentaram-me um preço exorbitante para um problema tão pequeno. Sempre cordiais, mas sem hipótese de discussão. Era pagar ou pagar.
Felizmente, esta história teve um final feliz. Dias depois, os responsáveis da Indie Campers contactaram-me via email e telefone para garantir que, para além das regras escritas, se regem pelo bom senso; e que, sempre que há estragos do género, analisam a situação “caso a caso”. Mais: sem que eu o tivesse pedido, informaram-me que iriam devolver o dinheiro cobrado. Com esta atitude, ganharam muitos pontos na minha consideração.
Em resumo, apesar de, no momento da devolução, o pessoal se ter mostrado inflexível no cumprimento das regras escritas, posteriormente reconsideraram por iniciativa própria – o que é sempre de louvar. A Indie Campers estava salvaguardada do ponto de vista legal (lá está, eu assinei o contrato de aluguer onde estão lá plasmadas as condições), mas usaram o bom senso em favor do cliente.
… e multas
Está escrito no contrato que, no caso de ser multado, teria de pagar o valor das multas (como é normal), acrescido de uma “taxa administrativa” de 50€. Não vejo qualquer razão plausível para esta taxa; muito menos para o seu valor – manifestamente exagerado.
Conclusão
Tudo somado, gostei muito da experiência de viajar de autocaravana em Portugal com a Indie Campers. Adoro o conceito e valorizo o facto de ser uma empresa portuguesa. Para quem quiser fazer uma viagem semelhante em território europeu (incluindo, naturalmente, Portugal), recomendo sem problemas a utilização da Indie Campers. Não é, no entanto, uma opção isenta de riscos; isto é, apesar do bom senso dos proprietários, sentir-me-ia mais confortável se fizessem alterações cirúrgicas a algumas cláusulas contratuais.
As coisas que me deixam desconfortável são o facto de a Indie Campers não permitir fazer seguro contra todos os riscos; e, não o permitindo, o preço manifestamente exagerado das peças e da reparação (em caso de algum acidente).
Além disso, lido o contrato com mais atenção, há cláusulas que, uma vez acionadas, podem tornar o aluguer num pesadelo. Por exemplo, está escrito que, em caso de reparação, o “locatário será responsável pelo período em que o veículo não seja alugado durante o período de reparação”; ou seja, deduzo que, além dos preços exagerados da reparação, se o contrato fosse levado à letra eu teria de pagar o valor equivalente ao aluguer da autocaravana durante o tempo em que a mesma estivesse a ser arranjada. Parece-me um abuso. E não percebi se este valor está coberto pela mesma franquia do seguro, ou se teria de ser pago na totalidade (que, no verão, pode chegar aos milhares de euros em poucos dias).
Em resumo, o episódio dos 717€ deixou-me marcas. Felizmente, a forma como o resolveram revelou uma cultura de empresa voltada para o cliente, e não para o lucro a todo o custo. Estão de parabéns, por isso. Na minha opinião, falta só melhorarem os seguros, diminuírem os preços dos consertos e tornarem os contratos mais equilibrados. Quanto às autocaravanas propriamente ditas, são fantásticas – nesse aspeto recomendo vivamente.
Guia prático
Como alugar uma autocaravana da Indie Campers
Esta foi a primeira vez que optei por alugar uma autocaravana em Portugal. Tratei todo o processo online, no site da Indie Campers. Entre os vários modelos disponíveis, a Active Plus pareceu-me a mais indicada para quatro pessoas. Havia autocaravanas maiores, mas mais caras; e não me pareceu necessário.
Quanto ao preço, as diárias variam bastante consoante o modelo e a época do ano. Para ter uma ideia, em novembro, por exemplo, o custo base da Active Plus é de 53€ por dia (+ “taxa de serviço”); o que difere bastante dos 149€/dia do mês de agosto.
Nota: se viajar com crianças numa Active Plus, peça um dos modelos mais recentes, em que as camas são amovíveis; os modelos anteriores têm camas fixas e o espaço útil diurno é exíguo para quatro pessoas.
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.
A roadtrip de autocaravana em Portugal foi feita com o apoio da Indie Campers, que me ofereceu um desconto significativo no aluguer da autocaravana.