A deslocação durou quase 30 horas, desde que saímos de casa até nos instalarmos no hostel Mitraa Inn. Um percurso extenuante para adultos e crianças. Valeu o entusiasmo com a novidade e a vontade que sempre aparece para brincar e desenhar em qualquer canto. O mais difícil foi combater o jet lag. Mas já há diário na calha.
Tínhamos plena consciência de que o primeiro trajeto da viagem não seria uma empreitada fácil. Desde que saímos de casa para o aeroporto Sá Carneiro, às 8h00 da manhã de sexta-feira, até que chegámos ao nosso hostel em Singapura, às 21h00 de sábado – pelo meio estão as oito horas de diferença horária que separa Portugal de Singapura -, passaram quase 30 horas. Demasiado tempo para adultos e crianças aguentarem sem mossa.
Foram quatro aeroportos e muitos meios de transporte (dois aviões, um autocarro, três mudanças de metro), longos momentos de espera e uma noite mal dormida a bordo. Passar a noite num avião “não é lá muito confortável”, haveria de dizer ela por telefone à avó, à chegada. “Primeiro tens de lavar os dentes, e depois dormir na cadeira. Mas a cadeira não se deita toda para trás”, explicou-lhe.
A melhor companhia durante o voo foi “a televisão que está mesmo à frente dos olhos”, onde havia um manancial de filmes e de séries à disposição. O facto de os filmes não terem locução nem legendagem em português não incomodou a Pikitim. Chateou-se mais com o facto de os primeiros auscultadores não quererem funcionar e, pior ainda, com a tentativa desastrada da mãe em abreviar a impaciência: “deixa lá, filha, também não consegues perceber o que eles dizem no filme”. Resposta: “eu não sei falar inglês, mas quero aprender, mãe!”
Nas cerca de 12 horas que dura o voo entre Londres e Singapura, a Pikitim aguentou acordada boa parte do tempo. E (só) perguntou três vezes se ainda faltava muito para chegar. Aterrámos em Singapura três horas depois de ter acordado e tomado o pequeno almoço. Por isso, não queria acreditar quando lhe dissemos que já era quase de noite. “A sério, mãe??!”. Foi a oportunidade de lhe mostrar que sim, que estávamos do outro lado do mundo, e que, se “de um lado do mundo é dia do outro é noite”. E sim, nós de facto estávamos do outro lado do mundo, e por isso é que a viagem tinha sido tão longa.
Jet lag
Chegados ao hostel e com um jantar já fora de horas no estômago, como convencer uma criança que deve deitar-se às duas da manhã de Singapura, poucas horas depois de ter acordado no avião, se em Portugal – para o seu corpo, portanto – seriam apenas seis da tarde? Ou como impedi-la de se querer levantar às cinco e meia da madrugada se – sentia o seu relógio biológico – aquele sono tinha sido apenas uma “sesta”?
Com um jet lag de muitos fusos horários a pesar no corpo, manda o bom senso que se tente desde logo cumprir os horários “normais” do destino, esquecendo o mais rapidamente possível as horas do país de origem. Mas “tirar” oito horas a um dia cria uma diferença difícil de esbater. Com os horários tão trocados, só na segunda noite a Pikitim pareceu ter reposto o sono, após dormir mais de dez horas seguidas, permitiu-se finalmente “descansar”, algo que nunca quis fazer nem nos muitos tempos mortos da longuíssima viagem até Singapura.
Na verdade, os tempos mortos foram e são quase sempre pretexto para se pôr a dançar ou a correr de um lado para o outro. Mesmo quando os pais lhe pedem insistentemente cautela, para olhar para quem está à volta e não atropelar ninguém, seja numa carruagem de metro, na sala de embarque de um aeroporto ou numa estação de autocarros, a resposta é sempre a mesma: “só estou a tentar divertir-me!”. E está feliz. Ao final do primeiro dia, o pai perguntou-lhe como é que ela estava. Respondeu rapidamente: “cansada, mas contente”.
O hostel passou a ser chamado de “casa” e as duas camas do quarto (um beliche, com cama de casal em baixo, e cama de solteiro em cima) facilmente se transformaram no novo mundo da Pikitim. A cama de cima passou a ser o seu universo, com uma prateleira que ostenta a máquina fotográfica e uma boneca Barbie; as Polly Pocket passaram a andar espalhadas pelo colchão e os livros de histórias saíram da mochila.
De resto, continua a espalhar canetas e cadernos por todo o lado. Nas mesas dos cafés e restaurantes, em bancos e nos jardins, em cima da cama ou no chão do quarto (“a mesa é muito alta, não me dá jeito trabalhar aqui”, explica), vai fazendo desenhos em folhas soltas que depois cola no caderno de folhas brancas. A toda a hora. Diz que vai escrever uma história – “a história da Inês, da Luísa e do Filipe”. Ultrapassado o jet lag, eis a boa nova: a Pikitim começou a escrever o seu diário.
Guia prático
Onde ficar em Singapura
Eu fiquei alojado no simples mas decente hostel Mitraa Inn. É relativamente bem localizado, na zona de Little India; mas o principal motivo para a escolha foi o preço. Entre os hotéis em Singapura com melhor relação qualidade/preço estão o incrível AMOY by Far East Hospitality e as cápsulas do moderno Cube Boutique Capsule Hotel @ Chinatown.
Se quiser ficar alojado em Marina Bay, um dos melhores hotéis é o The Fullerton Bay Hotel Singapore, embora o mais emblemático e popular seja, de longe, o Marina Bay Sands. São ambos dispendiosos, mas consta que valem pela experiência. Para outras opções utilize o link abaixo.
Seguro de viagem
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Sobre o Diário da Pikitim
Este post pertence a uma série que relata uma volta ao mundo em família, com 10 meses de duração. Um projeto para descomplicar e mostrar que é possível viajar com crianças pequenas, por todo o mundo. As crónicas da viagem foram originalmente publicadas em 2012 na revista Fugas e no blog Diário da Pikitim.
Veja também o post intitulado Viajar com crianças: 7 coisas que os pais devem saber.