O dia tinha acordado soalheiro e preparava-me para sair do Stone City Hostel e explorar Gjirokaster. Estava a terminar o pequeno-almoço quando Wouter, o dono do hostel, desafiou os presentes para um passeio rumo às montanhas. Mencionou umas cascatas e parecia entusiasmado pelo que, sem pensar muito, aceitei a sugestão. Não fazia ideia de onde me estava a meter…
Eram 13:30 horas quando arrancámos de Gjirokaster para um passeio de jeep. Não tinha feito muitas perguntas, razão pela qual não sabia bem o que iríamos ver ou fazer. Tinha fixado a palavra “cascatas” e pouco mais.
Ao chegar a Tepelene, Wouter saiu da estrada principal, virou à esquerda e entrámos numa estrada de terra batida a caminho das montanhas, o novo território dos barões da droga albaneses.
Em meados de 2014, a polícia albanesa lançou uma grande operação para tentar pôr fim às plantações de cannabis em Lazarat, uma pequena aldeia no sul da Albânia afamada por ser uma das principais regiões produtoras de marijuana de toda a Europa.
Nos meses seguintes, para dificultar o trabalho da polícia, muitos dos produtores de Lazarat deslocalizaram a produção para campos de cultivo mais pequenos e espalhados pelas montanhas. Era precisamente numa dessas zonas montanhosas que me encontrava.
À medida que íamos subindo, cruzámo-nos com um ou outro jeep em sentido contrário, quase sempre com um ou dois homens de ar rude lá dentro. Eram traficantes. A partir desse momento, a nossa presença na região ficou conhecida. E passámos a ser vigiados.
Prosseguimos viagem, por vezes acompanhando o leito de um rio, protegidos pelo abraço de um vale, outras vezes subindo as montanhas e parando em locais com vistas muito atraentes para vales e desfiladeiros. Às tantas, a estrada de terra batida deu lugar ao alcatrão, chegámos a uma aldeia e Wouter decidiu parar para nos mostrar algo. Era o vislumbre de uma cascata enorme, do outro lado de um grande canyon.
Não teriam passado cinco minutos desde que andávamos a pé no extremo da aldeia quando apareceram dois homens com ar, digamos, suspeito. Nada disseram. Sentaram-se a uns 50 metros de onde nos encontrávamos e ficaram “a conversar”. Assim que regressámos ao jeep, levantaram-se também e foram-se embora. Era a confirmação: estávamos mesmo a ser vigiados.
Adiante, parámos o jeep junto a um rio com pouca água. O objetivo era chegar até umas cascatas que Wouter conhecia. Entrámos no leito do rio e começámos a caminhar.
Aos poucos, o leito pedregoso foi-se tornando mais estreito e o declive mais acentuado. Começaram a aparecer algumas piscinas e cascatas, semelhantes às que me lembro de encontrar, ainda criança, no Parque Nacional Peneda-Gerês.
Caminhámos junto ao rio até avistarmos uma cascata maior. Depois outra de acesso mais difícil. Para lá chegar, seguimos um pequeno trilho montanha abaixo até aparecer uma rocha com um arco que servia de passagem para o outro lado, onde se encontrava a cascata.
Sentia-se um odor muito característico no ar. Sim, nas minhas costas havia uma plantação de cannabis. As plantas estavam já bem crescidas, provavelmente prestes a serem colhidas. Não muito longe, uns bidões e outros artefactos denunciavam utilização recente. Estávamos em pleno território de produtores de marijuana.
Às tantas, no topo de uma montanha lá ao fundo, vislumbrei a silhueta de um homem. Parecia estar sozinho; apareceu, ficou por ali uns tempos, deixei de o ver. Não faço ideia de como ali apareceu nem de onde veio, mas era cada vez mais evidente que a nossa presença na área era bem conhecida dos traficantes.
Por momentos, senti-me desconfortável. Ninguém no grupo disse nada. Ninguém mostrou sinais evidentes de preocupação, mas era notória alguma apreensão. Pouco depois, Wouter achou por bem regressar ao carro.
Houve ainda tempo para Wouter nos mostrar um dos muitos marcos da era ditatorial albanesa. Parámos para observar a estranha construção e fotografar e, uma vez mais, pouco depois apareceu um rapaz vindo não sei de onde. Sentou-se junto ao carro, e por lá ficou tranquilamente.
Assim que nos dirigimos ao jeep, cumprimentei o rapaz e ele pediu um cigarro a um dos viajantes. Afastei-me um pouco e, quando de novo direcionei o olhar para lá, já o rapaz tinha misteriosamente desaparecido.
No regresso, já longe das plantações de marijuana, parámos junto à ponte pedonal sobre o Rio Vjose, em Tepelene. A ponte está atualmente em muito mau estado, mas continua a ser utilizada pelos habitantes da região (vi pedestres e até motorizadas a cruzarem a ponte).
Para além de fotogénica, a grande curiosidade da ponte de Tepelene reside no facto de ter sido mandada construir pelo militar albanês Ali Pasha como oferenda à sua aldeia. De facto, do outro lado da ponte há um caminho que leva até Beçisht, a aldeia onde Ali Pasha nasceu.
Foi a última paragem do passeio por uma Albânia rural dominada por traficantes de marijuana. Pouco depois, chegaríamos a Gjirokaster. Sãos e salvos.
Guia prático
Como chegar a Gjirokaster
Chegar a Gjirokaster vindo de Saranda ou Berat são as rotas mais comuns para quem anda a viajar na Albânia.
De Saranda, há minibuses regulares que fazem a curta viagem entre as duas cidades (não se preocupe com horários); só não deixe para o final do dia porque deixa de haver transporte.
De Berat, as opções são mais limitadas: existem apenas dois autocarros (ou vans) diários com ligação a Gjirokaster; um de manhã muito cedo, outro por volta das 14:00-14:30 no terminal de camionagem de Berat. Informe-se do horário correto no seu hotel.
Veja o roteiro de uma semana na Albânia.
Como fazer o passeio às cascatas
É virtualmente impossível fazer este passeio sem transporte próprio, pelo que recomendo que pergunte no Stone City Hostel; foi com o dono que fiz o passeio.
Dito isto, partilho a minha experiência para que conheçam uma Albânia mais rural, mas tenho alguma dificuldade em aconselhar a visita a alguns dos locais onde estive. Tudo por causa das plantações de cannabis que existem na região e da presença dos respetivos traficantes. Informe-se sobre as condições de segurança antes de partir.
Onde dormir
Se gosta de hostels, não pense muito: conheça a minha experiência no Stone City Hostel e fique lá a dormir. Caso contrário, elaborei uma lista com os melhores hotéis de Gjirokaster, onde encontra excelentes alternativas para se alojar.
Reservar hotéis em Gjirokaster
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