Tenho andado a pensar nisto de ser blogger de viagens e queria partilhar convosco o que me vai na alma. Porque nem sempre gosto daquilo em que nos estamos a tornar…
Quando comecei o Alma de Viajante, algures em 2001, fui pioneiro em Portugal. Não havia praticamente nada sobre viagens em português e as minhas referências digitais – os locais onde busquei inspiração – eram todas de viajantes ou jornalistas anglo-saxónicos (como o saudoso Vagabonding, de 2003).
Por essa altura, viajava “livremente”, vivia intensamente as experiências no terreno sem constrangimentos editoriais, e o computador portátil que eu levava para escrever e descarregar as fotografias fazia de mim um alien nos espaços comuns dos hostels onde dormia por esse mundo fora.
É verdade. Quando fiz a minha primeira volta ao mundo ninguém viajava com portáteis nas mochilas. Eram pesados, e praticamente não havia blogs de viagens. Até o wi-fi era praticamente inexistente em restaurantes e hotéis, e só alguns hostels mais modernos tinham já um computador comunitário ligado à internet.
Na prática, duas ou três vezes por semana tinha de procurar um cibercafé para enviar os textos e as fotos em alta resolução para a revista Fugas, atualizar o blog e fazer esporadicamente upload de um álbum de fotos. Estávamos em 2004 e tudo era novidade. Para mim e para as duas ou três centenas de pessoas que, diariamente, acediam ao blog para comentar um post ou na esperança de encontrar um novo álbum de fotos ou texto inédito (não havia Facebook, nem twitter, nem Google +, nem Instagram, nem Pinterest, nem bloglovin, nem emails automáticos e ferramentas que tais para avisar das novidades). E as coisas eram feitas sem imediatismo.
E, na ausência de Skype ou Facetime, o blog servia para manter família e amigos a par do que ia fazendo e, não menos importante, receber palavras calorosas, de incentivo, coisa tão importante para manter a moral em alta quando nos afastamos dos nossos por meses ou anos.
Mas não se ganhava dinheiro com blogs.
E o foco da viagem era o ato de viajar propriamente dito, não o de relatar. Sim, para além do dinheiro que recebia pelo trabalho semanal enviado para o jornal – e que me ajudava a pagar as contas da viagem -, o meu objetivo era, simplesmente, viajar.
Nessa época, nunca condicionei as minhas experiências em função do que tinha de escrever. O pensamento era exatamente o oposto desse: vivia as experiências, fossem elas quais fossem, chegava ao fim da semana e sentava-me a pensar no que tinha acontecido de mais relevante durante esses dias, e escrevia a crónica. Simples. Partilhava a viagem como ela era.
Hoje, parece-me que tudo está diferente.
Muito mais gente viaja (o que é bom) e há milhares de blogs de viagem em Português (o que também é excelente).
O problema é que, hoje em dia, o ato de partilhar parece ter tanta ou mais relevância do que o próprio ato de vivenciar, de conviver, de experimentar. Por vezes, a obrigação de registar tudo e mais alguma coisa em fotos ou vídeos, para depois partilhar, interfere até com a própria experiência. Outras, o viajante torna-se ele próprio o foco do blog – não os destinos, as pessoas ou as culturas que visita. E ambas as coisas não me parecem positivas.
When you ask a person to repeat something, you’re no longer documenting what’s real. You’re making your subject act – Rick Gershon, MediaStorm
Eu próprio sinto-me apanhado nesta voracidade informativa. Viajo de forma diferente. Faço atividades em viagem que não faria se não tivesse blogs ou redes sociais que é preciso alimentar.
E então penso:
Que bom seria se todos deixássemos as crianças do mundo inteiro sossegadas, sem máquinas fotográficas intimidatórias apontadas a um metro de distância.
Que bom seria se todos tentássemos comunicar com o chefe de uma aldeia africana em vez de tirar uma selfie com ele.
Que bom seria se desfrutássemos de refeições deliciosas sem as instagramar.
Que bom seria se todos ouvíssemos um espetáculo de rua dançando e olhando o músico na cara, e não através do ecrã de um tablet ou smartphone.
Que bom seria se ninguém encenasse algo para parecer espontâneo, só porque o filme não ficou bom ou a câmara não estava pronta.
Que bom seria que todos voltássemos a viajar para crescermos e nos redescobrirmos, não para contar que crescemos e nos redescobrimos.
Percebem a ideia?
Por vezes penso o quão bom seria que todos – eu, principalmente! – voltássemos a viajar sem máquina fotográfica, sem computador portátil nem smartphones, e sem a obrigação de relatar as experiências quase em direto.
Viajar pelo prazer de viajar. De vivenciar experiências novas. Ir, apenas ir. Com os sentidos despertos e um Moleskine em branco. Inspirado, quem sabe, pelas pisadas de Paul Theroux África abaixo. Ou outros. Mas ir, simplesmente. Guardar tudo na memória, no coração, no papel. Quem sabe desenhar em vez de fotografar. E talvez escrever um livro, muito depois de regressar. Ou não fazer nada além de guardar as memórias para todo o sempre.
Não sendo possível, ao menos que tenhamos consciência de que os nossos atos na busca da melhor fotografia, da melhor “história” interferem com a vida das pessoas, e são por vezes uma violência desnecessária e uma falta de respeito. Isso, respeitar – as gentes, os costumes, o património. Coisas como esta são inadmissíveis!
Viajemos, pois, mas de forma ética e responsável. Respeitemos as pessoas, os lugares, as culturas. E deixemos de fotografar, de filmar e de partilhar sempre que outros valores estejam em causa. Porque há valores mais importantes que um like, um click ou uma pageview.
Tenho andado a pensar nisto de ser blogger de viagens. Em como posso ser um melhor viajante, e inspirar outros a fazerem o mesmo. Talvez esteja a ficar velho.
Seguro de viagem
A World Nomads oferece um dos melhores e mais completos seguros de viagem do mercado, recomendado pela National Geographic e pela Lonely Planet. Outra opção excelente e mais barata é a IATI Seguros (tem um seguro para COVID-19), que não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. São os seguros que uso nas minhas viagens.
… «o foco da viagem era o ato de viajar propriamente dito, não o de relatar». Exactamanente!… deve ser assim e sempre assim! Gostei muito deste desabafo e artigo. Também quando comecei a viajar intensivamente no anos 70 do século passado não havia esta panóplia de médias onde se despejam constantemente relatos, fotos etc… as pessoas às vezes esquecem-se onde estão e a «raison d´être» porque viajam… então os selfies… é demais… por isso continuo a viajar pelo prazer de viajar. Pensei num blog de viagens mas desisti pelas razões que apontas. Faço umas fotos, desfruto dos momentos e depois publico algumas delas no FB, acompanhadas dum pequeno texto, só para me lembrar por onde andei…
Adorei a “alma” do texto! Viajo para me sentir viva, conhecer culturas diferentes, lugares paradisiacos, paisagens nunca antes imaginadas e sempre registrando em um lindo “photobook” para eternizar as experiencias. Superando os meus limites, na idade madura, em viagem “solo”. Das grandes cidades europeias a pequenas vilas, de exoticas paisagens a visoes deslumbrantes da natureza…. O mundo tem muito a oferecer, valorize cada detalhe, cada pessoa que encontrar no caminho e cada cultura!
Obrigado pela simpatia, Marilisa. Abraço.
É isso mesmo! Viajar tornou-se demasiado fácil, para o bem e para o mal!
Saudades dos anos oitenta em que se tiravam uns rolos de fotos ou slides, que só se revelavam quando chegávamos a casa e tínhamos dinheiro para isso. Depois juntávamos os amigos numa almoçarada ou jantarada e mostrávamos o que tínhamos vivido.
Cada vez mais guardo as imagens para mim, no coração.
Parabéns pelo texto, Filipe. Está excelente. Focas uma ‘preocupação’ que os verdadeiros amantes da viagem, do explorar, do conhecimento, do vivenciar devem ter. Acho que a voracidade (da vaidade e das redes sociais) vai traindo muita gente…
No meu caso, o http://www.bornfreee.com nasceu como algo egoísta: eternizar, para mim, memórias de momentos e poupar trabalho, em viagem, a responder a familiares e amigos sobre o que fazia e por onde andava no Mundo. Tem sido, essencialmente, um projeto para me divertir.
Infelizmente, a voracidade das redes sociais é um tsunami ao qual poucos resistem. Uma adição em busca de público que parece que, demasiadas vezes, se vai sobrepondo ao essencial da viagem. Não há cinco minutos sem uma foto e a ânsia do feedback dos ‘seguidores’. Embora respeite, dispenso-me a esse ‘circo’. Ainda assim, cada um sabe dos seus objetivos e ‘estratégia’ para os atingir. Perfeitamente legítimo. E não me advogo o direito de sugerir aos outros qual a melhor forma de viajar. A que lhes dá mais prazer e se torna mais recompensadora. Apenas sinto o mesmo que tu. E ponto final.
Continuarei a fazer muitas viagens sem postar uma única foto e manterei o princípio de muitooooo raramente integrar uma imagem a ilustrar os meus textos: quando o faço, não é gratuitamente, tem um motivo especial (para mim ou grupos que lidero).
E, não. Não estás velho. Antes refinado. Parabéns pela reflexão. Vamo-nos vendo por aí. Abraço!
Olá, Rui. É bom não deixarmos de nos questionar, e é isso que tento fazer. Tenho poucas respostas mas muitas perguntas. Grande abraço e obrigado pelas tuas palavras.
Excelentes palavras. Boa liberdade sem dúvida. Grande abraço!
Sem dúvida que hoje em dia somos prisioneiros das redes sociais e da Internet – mesmo quem não tem um blog.
Penso que é tentar sair do sistema. Na minha última viagem a Cabo Verde não levei o computador por exemplo. Foi bom sentimento de não ter de procurar Internet ou ficar ligado ao mundo. Apesar de cada vez que abrimos as notícias, facebook’s etc, é praticamente só coisas que na verdade não interessam para nada.
Penso que é um problema ainda maior para muita gente que se considera viajante profissional, algo que sempre me tentei afastar.
Mas porque raio alguém quer viajar profissionalmente? Pergunto-me eu. Há pessoas que saem de um trabalho, despedem-se, e começam a viajar, para ter logo de seguida um outro trabalho?
É uma escapa fatal, é óbvio que atraí desilusão e faz que que voltemos ao velho sentimento de prisão e obrigação. Mais tarde ou mais cedo baterá com força.
Filipe, tens de te lembrar que maior parte dos bloggers de que falas, só têm blogs para tentar ganhar dinheiro, e não propriamente para partilhar.
A principal preocupação não é de inspirar a viajar, nem de partilha informação prática para genuinamente alguém poder fazer o mesmo, mas sim a de tentar ganhar umas massas para poder viajar mais.
Já expus esta problemática em vários grupos por exemplo aqui
http://bloggingthing.com/bloggers-advice#JoaoLeitao
Gosto de ser viajante amador e ter o meu blog a nível amador, e realmente partilhar informação prática pós-viagem. É bom sermos amadores, de não termos razões, obrigações e motivos para viajar. Como já conheces o meu trabalho há muito tempo, sabes que o meu blogue sempre foi bom e rico em informação prática – como ir – onde ir – onde dormir, e menos bom em relatos, sentimentos e histórias de viagem. Nunca foi esse o meu objectivo – daí pensar que há blogues mais e menos comerciais… penso que já tivemos esta conversa anteriormente até.
Este teu artigo é excelente, e um abre olhos, e mostra como podemos pelo menos pensar a sair do sistema egocêntrico de partilhar onde estamos como estamos ou o que fazemos.
É doentio…. Eu tento na maioria partilhar fotos sem a minha pessoa, e, assim uma vez por outra faço, e sinto um sentimento estúpido, de revolta, de super egocentrismo e digo para mim mesmo que nunca mais. Há dias que penso até apagar todas as minhas fotos da minha conta pessoal facebook. Interessante saber que afinal não sou o único com esta problemática, é bom saber que também tu partilhar desta preocupação de liberdade individual através de saber estar só.
De qualquer maneira Filipe, temos a responsabilidade de inspirar e viajar. Tu sabes que os teus blogs inspiram à viagem, as pessoas dizem-te. Por isso é uma missão cruel para ti, mas com um efeito positivo para outros milhares de pessoas que poderão sentir-se inspirados e motivados para mudar de vida, viajar, etc.
Grande abraço desde a Polónia!
Concordo plenamente com o texto, Filipe!
No verão passado passei 1 semana com umas amigas espanholas para lhes mostrar Portugal desde Braga até Lisboa e quando voltei para Madrid reparei que tinha uma quantidade exorbitante de fotos (umas 800, acho)… a maioria delas muito pouco interessantes e pus-me a pensar “Mas que porcaria é esta? Onde estão as viagens em que gastar 3 rolos de 36 fotos já era “passar dos limites”?”…
Nas últimas viagens tenho tirado muito menos fotos, desfrutado muito mais da companhia e da viagem em si, e observado as outras pessoas a viver atrás de um ecrã de telefone/tablet/câmara em vez de desfrutarem o que têm em frente… E quanto às redes sociais do meu blog… Não me dou ao trabalho de pegar no telefone a cada 5min para mostrar o que estou a fazer… Com sorte no final do dia, publico algo!
Oi Felipe, adorei o artigo. Adoro viajar e sinto muita saudade da época em que, após voltar pra casa, daí alguns dias fazia outra viagem em cima das fotos, guando reunia familiares e amigos para compartilhar as histórias vividas. Era uma sensação de partilha muito boa, tentar passar para as pessoas ao seu redor suas experiências, culturas, histórias e ver em seus semblantes a curiosidade de aprender e descobrir sobre lugares e a humanidade. Muito mais genuino do que distribuir imagens virtualmente. Tenho saudade desta época. Parabéns.
Acho que deves lembrar-se de mim. Nos “falamos” pelo Instagram quando recentemente visitastes o Brasil e pçus-me ao seu dispor no Rio de Janeiro. Chegamos a marcar um encontro que não foi possível porque eu estaria fora de minha cidade quando estavas nela.
Bem, sobre o tema deste post, concordo plenamente sobre o que dizes acerca ser blogger de viagens na atualidade. Com cada palavra. Sou um dos bloggers pioneiros de viagens no Brasil há dez anos (Fatos & Fotos de Viagens), com mais de sete milhões de visitantes e que chegou a ter no pico algo em torno de 7 mil visitantes únicos por dia! Hoje não chegam a 500.
Mas por aqui deste lado do Atlântico – além do que foi mencionado – o fenômeno da “monetização” acabou com a credibilidade, com a maturidade, a seriedade, confiabilidade e provocou na blogosfera brasileira de viagens queda de audiência e de interesse coletivo. Alguns por razões muito óbvias. Outros nem tanto. O fato é que os blogs estão em crise generalizada. De excelência, qualidade e credibilidade.
A “monetização” por aqui funciona assim: blogueiros são contatados por agências de criação de conteúdo, de propaganda ou de marketing e passam a pautar-se por marcas, produtos, serviços. Tudo quanto for possível passa a ser escrito por dinheiro. Ou por mimos, como se fala por aqui, os “presentinhos” (um bem material) ou dinheiro, viagem, hospedagem, passagem aérea em troca de posts. Daí começam a redigir e publicar matérias positivas sobre um produto, serviço ou marca que estejam lhes pagando. Mas cada dia é menor a quantidade de leitores que confia em “elogio patrocinado”. Também creio que por aqui os sintomas da perda de interesse na blogosfera não estão apenas no rumo que ela mesma tomou. Provavelmente é um tanto mais óbvia e universal: a saturação digital e a busca por novidades de quem usa a Internet, por textos simples e curtos como os do Tweeter. Ou nenhum, como no Instagram.
Enfim, parece que hoje apenas em Portugal encontram-se bons blogs editados no idioma de Camões . Não por menos o vosso é tão prestigiado. E inspirador. Não apenas para quem viaja, sobretudo para quem escreve relatos de viagens.
Por este motivo parabenizo a qualidade e a nomeação como melhor blog profissional de viagens.
Também li que planeias uma viagem à Etiópia. Fiz há dois anos uma viagem ao país e tenho muitos posts escritos. Estou à sua disposição para caso tenhas alguma dúvida.
Sucesso e um abraço do brasileiro carioca admirador e fã!
Uma pura realidade.
Bom é viajar só pelo prazer e vontade de conhecer.
Olá =)
Antes demais, Muitos Parabéns pelo óptimo trabalho (2º comentário que faço, acho que devia deixar isto aqui presente).
Tenho tentado seguir este blog, pois os posts são sempre agradáveis de ler e com informação sobre viagens bastante úteis. Não sou de comentar, mas o seus artigos têm-me deixado com vontade de deixar algo no final =)
Este pequeno desabafo diz tudo o que penso dos blogs de hoje em dia, pouco se pode acrescentar mais.
Lendo os vários comentários, posso ver que todos concordamos com o mesmo. Existe demasiada preocupação em deixar tudo documentado nas redes sociais. Não percebo esta necessidade constante nas pessoas, assim como, acho que não se dão conta do que perdem quando passam constantemente a ver os locais pela olhos do smartphone porque tem que ficar postado no facebook, instagram, etc….
Também é algo que noto imenso nos concertos hoje em dia, todos a filmar. Pergunto-me porquê? Vão ver os videos depois? Eu acho que não… e no final acabam por não apreciar o concerto como devia ser apreciado.
Enfim….
Não está a ficar velho, diria mais sábio. Continue a viajar e deixar aqui os seus testemunhos. Eles inspiram! Pelo menos a mim inspiram de tal modo que penso fazer a minha primeira viagem sozinha, em 2017, até ao Japão. O bichinho de viagem já existia, só tinha que dar o primeiro passo.
Obrigado, Joana. A propósito, tenho um post sobre viajar sozinho que te deve interessar. Beijo grande e boas viagens.
Obrigado pela recomendação!
Já conhecia o post, foi um dos que ajudou a convencer a viajar sozinha. Sempre quis viajar, mas raramente tenho companhia e há sempre mil e um entraves, acabando por desistir da ideia.
Até que disse basta. Não vou ficar a espera de conhecer o mundo porque vou sozinha. Seria bom ter alguém para partilhar a experiencia, mas não deve ser um impendimento para concretizar um sonho ou objectivo.
Olá Filipe
Leio muito do que escreve e do que publica, e neste caso não podia estar mais de acordo – registamos mais o momento ao invés de o vivermos.
Parabéns pela reflexão para acordarmos e meditarmos.
Anseio pelo momento de o ter como guia. Há de chegar o momento.
Até breve
Isabel Amaral
Olá Filipe!
Não estando próximo da tua vivência e dúvidas que o texto exprime, entendo muitas das reflexões aqui deixadas.
Em primeiro lugar, o lado monetário, ou económico, tem (necessariamente) o seu peso. Um viajante ou, por extensão, um blogger de viagens, tem família e, por acréscimo, tem despesas.
Utilizar plataformas, ou ferramentas virtuais, para ter uma sustentabilidade financeira é legítimo.
Claro que, tal como foi aqui escrito, o uso abusivo das redes sociais, ou a prevalência do lado mais comercial, tem os seus custos.
Muitas vezes, em termos de liberdade pessoal.
A questão é como dar a volta ao (con)texto. Na sociedade actual, quem não aparece (seja por boas, ou más, razoes) cai no esquecimento. E as oportunidades perdem-se. Será?
Continuo a acreditar que quando se faz as coisas (uma tarefa, uma actividade) de forma apaixonada e desinteressada, o retorno (mais tarde, ou mais cedo) acaba por nos bater à porta.
Não foi assim em 2001, com o ‘Alma de Viajante’?
Com qualidade, perseverança e paixão, as coisas boas acontecem.
Quem sabe não é altura de voltar aos primórdios? De inovar. De, uma vez mais, criar um registo e uma forma de estar diferente.
Bem sei que tudo já parece estar inventado. Talvez. Porém, a minha percepção é que ninguém estará melhor preparado para ‘abrir a porta’ para uma outra forma de estar perante as viagens.
Filipe, tal como és uma inspiração para muitos, sê uma inspiração para ti mesmo. Imagina. Inova. Ousa. Cria.
Um abraço!
Meu querido amigo, já dei comigo a pensar no mesmo … sendo um utilizador quase compulsivo das redes sociais, há uns meses e enquanto assistia à partida para as 100 milhas no UTMB, envolto numa atmosfera épica, apercebi-me que a esmagadora maioria das pessoas ali à volta estava a perder o momento tão preocupados que estavam em conseguir obter imagens que pudessem publicar … nesse momento, na minha modesta opinião, o importante seria aplaudir os valentes que partiam rumo à aventura!
Excelente texto pois é uma excelente reflexão. Algumas pessoas entram nos lugares e nem olham direito mas já estão tirando fotos. Já me vi fazendo isso também. Muitas paisagens, muitos lugares nos emocionam e isso não é capturado pelas fotos. Temos que viver aquele momento, curtir aquela sensação e se um dia isso se tornar um post será lindo, com certeza.
E quando descobrir um “tesouro” um “segredo”, guarde-o para si e os seus amigos.
Porque, se não o fizer, no dia seguinte, esse local, estará inundado de gente e perderá o encanto.
O ato de viajar está relacionado com a solidão e introspecção, senão mais vale ficar em casa.
Boas viagens.
É mesmo isso, é preciso saber guardar os tesouros. Partilhar todos os detalhes de um lugar faz que com quando cheguemos a um lugar pela primeira vez não sintamos o encanto de o descobrir, ou porque quando lá chegamos achamos que já sabemos tudo sobre ele, ou porque à chegada descobrimos uma multidão que entretanto também o descobriu e não nos deixa desfrutar do espaço como gostaríamos.
Acho as partilhas de informação nas redes sociais abusivas e paranóicas, nomeadamente quando são feitas quase em direto. Mas partilhar algo de vez enquanto pode ser saudável e dizer um pouco de nós, mandar notícias à família tal como o Filipe fazia nos anos 70 com os textos enviados para o Fugas.
Eu, pessoalmente, em viagens de férias ou não levo telefone ou então só o ligo esporadicamente à noite. Na verdade (é segredo!!!) nem sequer tenho um smartphone! Ups, contei! Curioso que a maioria das vezes adoro não ter um desses bichinhos que resolvem todos os problemas e não me deixam pedir ajuda a quem passa e viver a viagem, a experiência de sobreviver num mundo desconhecido, de dar espaço a que algo que não estávamos à espera aconteça. E o inesperado é na maior parte das vezes tão bom… As minhas saudades, as minhas lembranças de viagem estão quase sempre enraizadas nesses momentos.
As viagens em férias são para mim fugas e ocasiões onde posso estar comigo própria ou com a minha família. Viajo há mais de 5 meses na China sem telefone. Tenho apenas um computador, é certo, mas por vezes até passo vários dias sem me ligar ao mundo. É tão bom viajar sem planos e sobreviver apenas eu e o meu velhinho livro de viagens… (sim ele tem mais de 10 anos, mas tem ajudado muito!)
Boas fugas!
Há tantos detalhes, tanta particularidade, tanta magia nas viagens, que não caberiam sequer em uma foto, em um texto, em uma página.
Oi Filipe! Tudo bem?
Adorei o texto! Fico triste ao ver que hoje em dias as pessoas – não só os blogueiros, mas todos os turistas – não param para olhar o lugar ao vivo, pq só o veem pela tela do celular. Às vezes parece que as pessoas estão ali só pra tirar uma selfie e postar nas redes sociais e que aquela paisagem, a sensação real do vento batendo no rosto, do frio ou do calor do lugar não importam… o importante mesmo é a repercussão.
Me identifiquei bastante com sua reflexão! Aliás, acho que saber aproveitar de fato uma viagem é a melhor maneira de poder relatar as experiências de forma verdadeira nos blogs… virei sua fã! hahaha =)
Obrigado pela simpático comentário, Lígia. Tenho mais dúvidas que respostas. 🙂
Abraço e boas viagens.
Curioso, já acompanho o teu trabalho há algum tempo, nomeadamente nas páginas do Facebook e só depois de ler este artigo reparei que além da página do Alma de Viajante, tens uma página supostamente pessoal, onde a avaliar pelas últimas publicações só fazes publicidade à página ‘profissional’. Neste panorama não me espanta este teu desabafo, no fundo tu acabaste por passar do ‘trabalhar para viver’ ao ‘viver para trabalhar’. Deixaste de fazer viagens para ti, mas sim para os outros. Talvez até, inconscientemente, tenhas começado a fazer as viagens que poderão ser mais interessantes para o teu público alvo, por forma a arranjar conteúdos para lhes ‘vender’, em vez de procurares destinos que gostasses de explorar, mas que poderiam ser uma espécie de fracasso comercial em termos de mercado virtual! Mas isso é natural, afinal de contas é a tua profissão! O que tu estás a precisar é de tirar umas férias, pegares na tua família e viajar pelo prazer de viajar, vais ver que é completamente diferente e provavelmente até vais encontrar motivos que inspirarão a tua vida profissional… 🙂 Mas pelo sim pelo não, leva a máquina, depois experimenta juntar os teus amigos e partilha alguns desses momentos com eles, vai-te saber tão bem!… 😉
| PS – Eu ainda não me esqueci do livro!… 😉 |
Abraço
Muito legal esse desabafo. Gostei muito de saber sua trajetória com o blog e a evolução que foi acontecendo. Começar como pioneiro não é fácil, mas o importante é curti como vc curtiu. Infelizmente, essa época da informação faz a gente perder muito do que temos no início… por isso devemos manter o foco em nós divertir e fazer como vc disse: viajar por viajar.
Obrigada por compartilhar esse texto… ampliou ainda mais o meu horizonte e me fez ver que não podemos esquecer a essência.
abraço
Gosto do texto e acho que tens muita razão. A preocupação das pessoas às vezes é tanta em querer fotografar e relatar para dizer que esteve ali que acabam por não sentir o verdadeiro sentido da viagem. Ainda estão a fazer o caminho e já só pensam no final, não vivenciando verdadeiramente, não sentindo com a alma.
Estive em Varanasi, na Índia há menos de 3 semanas, local que adorei e que é fantástico para fotografar, contudo quando assisti às cerimónias hinduístas ao nascer do sol no barco em pleno Rio Ganges, e vendo a quantidade de turistas que estavam a tentar fotografar o momento, a meu ver de forma invasiva para quem estava ali a rezar e a celebrar aos seus deuses, houve momentos que fui incapaz de pegar na máquina e fotografar (e eu adoro fotografar); primeiro porque preferi observar tudo, tentar absorver tudo o que estava a ver, com os meus olhos e de forma a que ficasse gravado na minha retina e na minha memória… de forma a sentir a energia e a mágica do momento. Segundo porque achei tão invasivo e tanta falta de respeito para com as pessoas que estavam ali a banhar-se no rio, nas suas rezas e nas suas celebrações enquanto um mar de turistas, que mais pareciam um bando de abutres com a máquina fotográfica em punho disparavam constantemente, sem sequer se darem ao trabalho de ver e sentir o que realmente se passava ali, sem perceberem a magnitude daquele momento para aquelas pessoas.
No momento que me apercebi disto fiquei chocada, sentei-me no barco e fiquei a admirar a paisagem e a sentir a energia da celebração. Ganhei muito mais do que se tivesse estado constantemente a fotografar, sem sentir…
Parabéns pelo excelente artigo e escreveres com alma o que te vai dentro… Esse o grande desafio saber lidar nos dois mundos entre o registo na alma e o registo digital. Qual o melhor caminho? Ambos são válidos dentro do bom senso. Mas até o bom senso é discutível porque para uns é uma coisa para outros é outra.
Acima de tudo acho importante mesmo é fazer o que vai na alma e está sempre tudo certo.
Também muitas saudades em que uma simples carta registava o momento. Mas por vezes também dou por mim a querer partilhar o momento de uma forma instantânea com o mundo… Ambos praseirosos desde que não fiques escravo deles… Abraço Filipe e não percas essa autenticidade na partilha.
Obrigado, Luís. Grande abraço.
Nossa, sinto exatamente da mesma forma. Gostei muito da forma como colocou, pois me vejo tendo os mesmos pensamentos sobre isso. Às vezes, o “ter” que mostrar a viagem parece mais importante do que a viagem em si, e isso por vezes me faz questionar o caminho. Continue compartilhando suas percepçōes, bom saber que não estamos sozinhos nessa!
Bom fazer uma reflexão de vez em quando. Se não pararmos para pensar no que significa viajar, conhecer pessoas, culturas, acabamos caindo no “frisson” de tudo documentar, fotografar, para depois lembrar do que deixamos de saborear. Ótimo texto.
Grata pela reflexão! Partilho da mesma inquietação! Ando na corda bamba do equilíbrio entre viajar para mim ou para os outros. Abraços do Brasil.
Gostei muito de sua reflexão e me preocupo com essa voracidade de fotos e redes sociais. Sou uma viajante solitária há boas duas décadas, não de muitos países mas de muitos lugares e embora já tenha tido surtos de encher meu face de fotos de viagem isso já é passado, instagram sempre rejeitei instalar para não cair no vício. Do mesmo jeito que viajo para cidades predominantemente turísticas também viajo para lugares sem esse apelo, lógico que gosto de boas fotos mas procuro admirar e viver aquele momento também, mas tenho um vício que às vezes me impede de aproveitar um bom restaurante mais vezes do que eu gostaria. Tenho vício de comentar no tripadvisor. Como sou aposentada e gosto muito de escrever e viajar, isso se tornou uma atividade prazerosa e do mesmo jeito que sou beneficiada com informações que tiro de lá, gostaria que as minhas informações fossem úteis a outras pessoas. Então em vez de ir em algum lugar que gostei mais vezes que gostaria resolvo conhecer outros lugares para oferecer mais informações, sei que isso também tem o lado bom pois amplia nossos horizontes de conhecimento tanto de lugares quanto de sabores. Um abraço
Muito legal e inspirador o teu texto.
Sabes que tenho enfrentado uma outra dúvida, o quanto a presença excessiva de turistas atraídos pelas tantas fontes de informação, acabam distorcendo ou afetando a cultura local. Sou contribuidor do tripadvisor desde 2007, quando ninguém sabia o que era. Hoje, ele se tornou uma máquina de propaganda que acaba tornando os tops de avaliação em lugares insuportavelmente cheios.
Passei a não divulgar certos “achados”, como o clube de tango que encontrei em Buenos Aires, ou o bar no Porto que recebe fadistas amadores às terças-feiras. Se alguém quiser saber, me pergunte que eu conto. Mas não publico para que esses lugares não desapareçam na sua essência.
Então, o blog que tenho em mente teria mais como objetivo compartilhar a minha experiência de planejamento de viagens, menos as coisas vistas ou vividas. Essas eu teria a pretensão de guardar para mim. Um abraço.
Viajar pelo prazer de viajar.
Nem mais…
o problema é que agora o pessoal faz um blog, porque quer ganhar dinheiro. E não propriamente para partilhar.
Antecipaste-te com um artigo que já ando a escrever para o meu blog versão em inglês.
Acho doentio o que agora se anda a fazer de serem as pessoas o foco das contas de blogs e blogueiros.
Fotos de viagens em que o foco são os autores, deixando para trás, o local em si. Ou seja, pergunto-me, se é que elas algumas vez aproveitaram o lugar, ou se só se viram a elas mesmo nesse dito lugar, algo secundário para elas, já que a estrela é… o blogueiro.
(vómito)
Abraço da turquia!
Isto faz-me muito sentido, até porque ultimamente tenho pensado muito em como viajamos, que visão temos das outras culturas, etc. Curiosamente, ou talvez não, ando a ponderar um “setup tecnológico” mais leve e a tentar livrar-me do portátil em viagem. Também pelo lado logístico da coisa, mas fundamentalmente pela simplicidade. Não me passa pela cabeça deixar de levar máquina fotográfica, é a minha “razão de viver em viagem”, mas mesmo aí tenho sido cada vez mais assertivo e disparado menos.
Olá! Comecei a viajar quando vários familiares faleceram, num curto espaço de tempo, com as mais diferentes idades. Desde então, comecei a me planejar para viver o hoje! As primeiras viagens foram bem corridas, mas hoje consigo vivenciar bem os locais que escolho para conhecer, sem medo de ir apenas um dia em Londres só para ver Notting Hill rs. Tento dividir minhas experiências no deboapelomundo.wordpress.com
Olá, adorei o post, eu amo viajar e ao ler tudo aqui me traz sentimentos fortes dos momentos maravilhosos que passei nas minhas viagens, obrigada mesmo. Beijos 🙂
É tão verdade Filipe! Tenho saudades de quando me metia no comboio e levava só um caderno e uma caneta. Este ano, no Carnaval de Podence, a bateria do meu telemóvel estragou-se e fiquei sem ele durante 3 dos 4 dias em que lá estive. Foi brutal. Parecia uma criança a divertir-me no desfile, a falar com as pessoas nas tascas… muito, muito fixe!
Ótimo artigo.
Sou jornalista angolano e desejo iniciar um projeto designado Reporter Itinerante que visa viajar por África. Seus artigos ajudam muito na inspiração e motivação.
Abraço de Angola.
Francisco Inácio