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Os ventos assassinos de Hvalnes (um dia para esquecer)

Por Filipe Morato Gomes | Atualizado em 19 Mar 2019 | Viagens Europa Islândia 8 Comentários
Tempo de leitura: 9 minutos

Conduzir em segurança: Hofn, Islândia
Oficina em Hofn, Islândia

Há dias assim. Negros.

Era o sexto dia de um roteiro de viagem na Islândia, que tinha como ambicioso objetivo percorrer a totalidade da chamada Ring Road, a principal estrada do país. Seriam 1.332 km, sem contar com os incontáveis desvios que a paisagem impele a fazer.

À saída de Hofn, pedi à Luísa, companheira de vida e de viagem, para verificar o site safetravel.is, que nos tinha sido recomendado quando alugámos a autocaravana em Reykjavík. O mapa do site não indicava estradas fechadas, pelo que prosseguimos. Só mais tarde haveríamos de reparar num alerta global que desaconselhava toda e qualquer deslocação rodoviária em território islandês. Em todo o território, repito. Mas seria demasiado tarde. O dia iria estar mesmo perigoso, com a chegada de ventos ciclónicos, e nós não nos tínhamos apercebido.

Adiante, em Vestrahorn, virei em direção ao promontório de Stokksnes para conhecer uma das mais desoladas pontas da Islândia. A paisagem era agreste e inóspita, quase desumana. O cinzento era a cor dominante; e chovia. Ao fundo, num local em que a estrada terminava (sim, parecia mesmo o fim do mundo), havia uma atração a que chamaram Aldeia Viking; mas nem o interesse era muito nem o vento nos permitiu sair da autocaravana. Foi o prenúncio do desastre.

Demos meia volta e regressámos à Ring Road. A ideia era pernoitar no povoado de Seyðisfjörður, já na região dos fiordes de Leste. Havia, pois, muito para andar. Foi quando Hvalnes apareceu no mapa.

Hvalnes

Conduzia calmamente, apreciando a brutalidade da paisagem. Parecia estar no lugar mais inóspito do mundo quando uma curva bastante larga anunciou uma baía, à direita. Não havia areia na praia, e o chão parecia coberto de seixos escuros.

Ao fundo, mas cada vez mais perto, aproximando-se a uma velocidade estonteante, uma chuvada… não, uma nuvem de insetos… não, uma nuvem de areia… não, eram mesmo pedras a voar… pum!!!

Durante alguns segundos, uma chuva de seixos arrastados pelos ares por ventos de mais de 120km/h começou a atingir a lateral direita da autocaravana. Era como uma violenta tempestade de areia, mas com pequenas pedras. Foram talvez 30 segundos a sermos fustigados por pedras, literalmente, com a carrinha em movimento estrada fora tentando sair dali, até que tudo ficou calmo outra vez.

Por essa altura, não me tinha ainda apercebido a magnitude do sucedido. Do perigo que corrêramos.

Às tantas, os companheiros de viagem, que vinham numa outra autocaravana, atrás de nós, informaram, via walkie talkie, que tinham uma janela sem vidro (o vidro tinha-se partido e sido levado pelo vento). Na altura, ainda não sabia que me tinha acontecido exatamente a mesma coisa; segundos depois, foi a minha janela estilhaçada que voou.

As crianças estavam assustadas.

Só quando a Ring Road nos permitiu parar a autocaravana, junto a uma espécie de miradouro, é que percebi verdadeiramente o que tinha acontecido. Uma janela sem vidro em cada autocaravana; pedras a voar que poderiam ter acertado na cabeça de quem seguia do lado direito das viaturas. E a impossibilidade de prosseguir viagem naquelas condições. A viagem à Islândia estava estragada, por descuido e algum azar.

Ida à oficina

Autocaravana numa oficina, Islândia
A minha autocaravana já com plástico no lugar de vidro

Liguei para a empresa de rent-a-car, contei o sucedido e pedi instruções. Após alguns minutos, informaram-me que a oficina mais próxima ficava na cidade de Hofn, de onde tinha saído de manhã. Era preciso voltar para trás uns 50km.

Ou seja, era preciso passar novamente pelo local do acidente. E o vento continuava forte.

As crianças ficaram ainda mais assustadas!

Estávamos tensos. Liguei o modo profissional, aprimorado por dez anos de gestão de grupos como líder Nomad, e fiz o trajeto de volta até Hofn sem um vidro, concentradíssimo na estrada, cheio de frio mas sem pensar muito, quase 100% razão e zero emoção. Só queria chegar a Hofn em segurança. Depois logo se via.

Quando, por fim, depois de 50 quilómetros que pareceram 500, chegámos à oficina indicada e contámos ao mecânico o sucedido, a reação não poderia ser mais esclarecedora: “Ah, foi em Hvalnes…! Não são os primeiros!”. Senti-me estúpido.

Estúpido por não ter tido o devido respeito pelos humores climatéricos da Islândia. O clima é extremo, não se pode facilitar! É uma questão de sobrevivência. Os islandeses sabem disso. Não há nenhuma razão para um viajante experiente facilitar.

Para me fazer sentir ainda pior, foi só nesse momento, depois de fustigado pelos ventos de Hvalnes, que entendi o comportamento de uma viajante com quem me tinha cruzado de manhã, enquanto eu fazia o check-out do parque de campismo. “Está mau tempo, vamos ficar mais uma noite”, disse ela ao rececionista. Na altura, pareceu-me uma resolução desprovida de qualquer lógica: se estava mau tempo, o que faria sentido era sair dali em busca de bom tempo para aproveitar a viagem. Qualquer pessoa normal faria isso, certo? Não, claro que não. Não na Islândia.

Sim, só nesse momento, depois de fustigado pelos ventos de Hvalnes, percebi a estupidez do meu raciocínio matinal. Estava mesmo mau tempo, não era seguro andar na estrada e, por isso, ela iria ficar mais uma noite em Hofn. Por segurança. À espera que os alertas da proteção civil islandesa fossem levantados. Porque era mesmo perigoso andar na estrada.

Senti-me estúpido e inconsciente. Viajava com os meus dois filhos. Na outra autocaravana, iam dois miúdos de um casal amigo. Podíamos ter morrido. Indesculpável.

Mudança de planos

Na oficina, foi colocado um plástico grosso para substituir o vidro. Em princípio, iria aguentar o resto da viagem, e ajudar a manter a temperatura dentro da autocaravana minimamente aceitável, incluindo durante a noite. Mas era preciso tomar decisões sobre o que fazer a seguir.

Apesar de termos pouca margem de manobra em termos temporais, ainda ponderámos prosseguir o plano de dar a volta à Islândia pela Ring Road. Analisámos com redobrada atenção as previsões meteorológicas para a Islândia, especialmente os fiordes do sudeste e a região de Mývatn. Os ventos amainavam no dia seguinte mas voltariam em força nessa mesma noite; e as temperaturas em Mývatn iriam descer muitos graus abaixo de zero, sendo muito provável a ocorrência de neve. Foi aí que o bom-senso imperou e a ideia foi abandonada.

Com plástico no lugar de uma janela (e a consequente exposição aos ventos e menos eficiente isolamento térmico), e sem correntes nem pneus apropriados para conduzir sobre neve ou gelo, rapidamente concluímos que era imprudente prosseguir. Se o fizéssemos, estaríamos a arriscar demasiado, até porque – lá está – viajávamos com crianças na Islândia. E a experiência de Hvalnes estava fresquíssima.

Tudo somado, decidimos transformar a viagem num roteiro pelo Sul da Islândia, em vez da planeada volta à Islândia pela Ring Road. E assim decidimos regressar calmamente a Reykjavík, pelo mesmo trajeto, mas aproveitando para visitar locais que nos tinham escapado na ida. Exemplos? O magnífico Museu Lava em Hvolsvöllur e a piscina de Seljavallalaug.

Foi uma decisão triste, mas necessária. E foi sem dúvida a opção mais consciente. O resto da viagem seria passado em clima de fim de festa, passando por alguns locais já conhecidos, com um plástico a fazer de vidro. E com a lição aprendida: sempre atento aos mapas dos ventos e aos alertas emitidos pelas autoridades responsáveis pela segurança rodoviária. O respeito é muito bonito!

Guia prático

Conduzir em segurança

Não se deixe enganar pelas fotografias idílicas: viajar na Islândia não é um passeio no parque. O país tem condições climatéricas extremas. E a velocidade com que as condições no terreno podem mudar é estonteante. Por isso, informe-se antes de começar a conduzir na Islândia (todos os dias, várias vezes ao dia). Não arrisque. É a sua vida (e dos seus entes queridos, caso viaje acompanhado) que está em jogo. E isto não é exagero!

Como acompanhar as previsões meteorológicas da Islândia

Várias pessoas me recomendaram a utilização do safetravel.is e, de facto, tem muita informação relevante. É bom para saber se há alguma estrada cortada, por exemplo, ou para conhecer os alertas sobre as condições de segurança de uma determinada estrada em concreto. É, por assim dizer, um lugar que interpreta os dados meteorológicos e emite alertas, tal como a Proteção Civil portuguesa. Os islandeses, no entanto, usam mais frequentemente dois outros sites.

Assim, para detalhes sobre as condições de vento e da probabilidade de ocorrência de neve, o melhor é mesmo socorrer-se do excelente site www.vedur.is, do Icelandic Meteorological Office. As tabelas de vento, temperatura e pluviosidade são preciosas para planear o roteiro de viagem na Islândia; e o mapa com a nebulosidade no território islandês, apelidado de Aurora forecast, é um extra muito útil.

De volta à segurança na estrada, atente também nas recomendações do site www.road.is, propriedade da Road and Coastal Administration.

Seguindo estas recomendações estará muito mais apto para conduzir em segurança na Islândia.

Seguro de viagem

Nunca é demais enfatizar a importância de fazer um seguro de viagem. Mais: no caso de alugar um carro ou autocaravana na Islândia, escolha um seguro que cubra a despesa com a franquia do rent-a-car, em caso de sinistro. É o caso da World Nomads.

Como sabem, eu costumo fazer seguros da World Nomads nas minhas viagens – e até já tive de acionar uma vez o seguro. Infelizmente, desta vez, quando o casal amigo com quem viajei me perguntou se queria que me juntassem ao seguro deles, disse que sim. Nem pensei muito no assunto, andava ocupado e assim poupava trabalho e dinheiro (o seguro deles era mais barato do que o da World Nomads).

Foi um erro crasso, porque o seguro de viagem não cobria as franquias do rent-a-car. E assim, mesmo tendo contratado localmente o seguro máximo permitido para proteger a autocaravana, o acidente com o vento custou-me 750€. Dinheiro que não recuperei por, dessa vez, não ter feito o seguro de viagem com a World Nomads (como habitualmente faço).

Fazer seguro na World Nomads

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Por fim, poupe centenas de euros em taxas bancárias usando um cartão Revolut ou TransferWise. Eu uso ambos nas minhas viagens.

Comentários

  1. Luciana

    Meu amigo, que loucura extrema enfrentaste! Ainda bem que deu tudo certo.

    Responder
  2. Nuno França Photography

    Que loucura!
    Ainda bem que ninguém se magoou!
    Já me serve de guia para quando lá for. 🙂

    Responder
  3. Edilberto silva

    Acompanho suas aventuras no site. A Islândia realmente é uma viagem exotica. Estive há alguns anos na capital por 5 dias. Aluguei um carro por 1 dia para ir ao lago azul e rodar um pouco nas redondezas. Foi fantástico conhecer esse país.

    Responder
  4. Francisco

    Lamentavelmente a Worldnomads só segura até aos 65 anos.

    Responder
    • Filipe Morato Gomes

      Francisco, nesse caso veja a IATI Seguros.

      Responder
    • Clara

      Só agora consegui ler. Viajar é sempre uma aventura, mas de facto essa foi mesmo imprudente. Ainda bem que apenas foram danos materiais e ficou mais uma história para nos alertar.

      Responder
  5. Álvaro Cabrita Vieira

    Para visitar a Islândia o melhor mês deve ser o mês de junho quando os dias são muito maiores que as noites e no Norte da Islândia no dia 21 de junho a noite é muito pequena. A temperatura também é mais elevada que o mês de setembro, há menos dias de chuva e de ventos ciclónicos.

    Responder
  6. Gabriel Soeiro Mendes

    Que aventura Filipe. Deixaste-me empolgado. O que vale são estas as melhores histórias para se contar. Que te valha isso. Abraço
    Gabriel

    Responder

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Sobre o autor

Filipe Morato Gomes, blogger de viagens

Olá! O meu nome é Filipe Morato Gomes, vivo em Matosinhos, Portugal, sou blogger de viagens, co-autor do projeto Hotelandia e Presidente da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses.

Tenho 49 anos e muita experiência de viagem acumulada. Já dei duas voltas ao mundo, fiz dezenas de viagens independentes e fui líder de viagens de aventura.

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