Situada no centro do Camboja, a cidade de Angkor já foi capital e centro religioso de um império pujante, que abrangia partes da Tailândia, Laos, Vietname e China. Hoje, Angkor Wat é o único chamariz turístico de um país permanentemente à beira do caos. Roteiro de viagem aos templos de Angkor, nas proximidades de Siem Reap.
A história dos magníficos templos de Angkor
Angkor faz-se merecer. Para lá chegar, é provável que o viajante tenha de passar pela capital, Phnom Penh, e deparar-se com algo que o fará visualizar o aspecto de um gigantesco campo de refugiados. Aqui aglomera-se cerca de um milhão de habitantes, muitos deles agricultores que preferiram as dificuldades de uma vida incerta na cidade, onde a segurança se tem vindo a tornar um problema, ao risco das minas perdidas e de uma agricultura improdutiva.
À vista da capital, ninguém pensaria que este foi o berço de um grande império asiático, que ocupou um território que abrangia partes da Tailândia, Laos, Vietname e a província do Yunnan, na China.
Mesmo na pequena povoação de Siem Reap, uma terrinha poeirenta que serve de base para qualquer visita a Angkor, é impossível adivinhar que ali muito próximo fica o expoente máximo das capacidades artísticas e criativas deste povo, e uma das mais magníficas cidades jamais construídas.
O Camboja é um dos mais homogéneos países da Ásia, no que diz respeito à etnia: aponta-se para uma população constituída por 90% de khmer, o povo originário desta zona.
Começa a falar-se dos khmer depois do reino de Funan se fundir com os reinos Chenla dos Kambujas, os “nascidos de Kambu”, uma figura da mitologia hindu. No século VIII, javaneses invadiram parte deste território e um século mais tarde iniciou-se o glorioso e fascinante período angkoriano.
Entre os séculos IX e XIII, uma sucessão de reis khmer foi contribuindo para o esplendor artístico de Angkor, com centenas de palácios e templos budistas e hinduístas, os últimos dedicados aos deuses Shiva e Vixnu. O rei Jayavarman II, descendente de tribos vindas de Java por volta do ano 800, tornou-se o primeiro devaraja, ou rei-deus, e instalou-se sucessivamente em quatro capitais, todas bem perto do Tonlé Sap, à letra “Grande Lago”, que é, de facto, o maior do país.
Na última capital, Roluos, ensaiaram-se as técnicas e materiais de construção que atingiriam o apogeu em Angkor. O tijolo e a pedra trabalhada começaram por ser apenas utilizados em construções religiosas, para garantir a sua nobreza e eternidade; das casas de madeira do povo, que não deviam ser muito diferentes das palafitas onde ainda hoje vive grande parte da população, já nada resta.
Construídos entre os anos de 879 e 900, os primeiros templos têm já os traços originais da arte khmer: torres torneadas, elefantes e nagas (cobras-capelo) que assinalam os pontos cardeais, largas ruas empedradas de acesso e muros altos que protegem os edifícios.
A morada mitológica dos deuses hindus e centro do universo, o Monte Meru, é repetida simbolicamente vezes sem conta, sob a forma de pirâmides de pedra onde se erigiam santuários, rodeadas por grandes reservatórios de água, os baray, que representavam o igualmente mítico Oceano de Leite.
Indravarman I fez construir um sistema de irrigação que permitiu o cultivo intensivo, dando origem a obras de génio que para sempre ficarão associadas à civilização khmer. Para além da reserva de água para as populações, tão importante nos países asiáticos, que alternam fortes monções com períodos de seca, a cultura do arroz, base da sua alimentação, também dela exige vastíssimas quantidades.
O reino de Angkor elaborou um complexo sistema de diques, canais e reservatórios, que chegou a prover a cerca de um milhão de habitantes. O maior dos reservatórios, o Baray Ocidental, tinha oito quilómetros de comprimento, mais de dois de largura e uma profundidade de doze metros, representando uma capacidade de armazenamento de mais de duzentos milhões de metros cúbicos de água.
Ainda hoje se vê claramente o seu leito, embora só fique cheio na altura da monção, à falta de manutenção regular.
Angkor torna-se capital
Foi o rei Yasovarman que mudou a capital para Angkor, ao mesmo tempo que alargava o império, conquistando vasto território aos países vizinhos. Tal como já antes tinham feito outros monarcas, a sua cidade seguiu o esquema arquitectónico que veio a ser conhecido como “angkoriano”: cada rei se identificava com um deus do panteão hindu a quem eram dedicados os templos, e a cidade organizava-se em volta das réplicas do sagrado Monte Meru. Palácios, templos, estradas e reservatórios alternavam com as habitações e os campos de arroz, em volta deste simbólico “umbigo do mundo”.
Entre os séculos X e XII, o reino viveu um longo período de pujança política e económica até à invasão Champa, que destruiu a capital e a ordem no Império. Esta foi restabelecida por Jayavarman VII, que construiu um dos mais importantes símbolos desta civilização: a cidade de Angkor Thom, a última das capitais, que manteve o seu estatuto até meados do século XV.
A cidade ocupava cerca de dez quilómetros quadrados e era rodeada por uma muralha e um fosso com cem metros de largura. Cinco arcos de pedra, semelhantes a “arcos de triunfo”, davam acesso ao seu interior, recheado de templos e monumentos de um insuperável génio artístico – mercadores chineses do século XIII descreviam-na como uma “metrópole trepidante”.
Ali próximo, Suryavarman II fez erguer outro símbolo do império, hoje símbolo nacional graças à sua presença na própria bandeira do país: o complexo de templos, palácios, lagos e bibliotecas de Angkor Wat, uma maravilha de pedra construída durante o século XII – enquanto na Europa se cultivava a sobriedade do estilo românico.
Angkor Wat é ainda hoje considerado um dos mais inspirados monumentos arquitectónicos jamais construído. Os seus relevos e estatuária revelam as requintadas pompas do rei-deus, que incluíam desfiles de elefantes, apsaras (dançarinas dos templos), faustosas celebrações de vitória sobre os inimigos e cenas do Mahabarata, célebre obra épica hindu.
A delicadeza e o pormenor são impressionantes, e o seu estilo, único.
Durante o século XIV, o hinduísmo foi sendo substituído pelo budismo, que veio a tornar-se a religião maioritária no Camboja. Guerras constantes com o reino Tai levam a pedidos de ajuda a portugueses e espanhóis, de passagem pela zona; os portugueses acabam por não intervir, mas a resposta dos espanhóis é tal que os príncipes khmer acabam por se associar aos inimigos, os tailandeses!
Por fim, no século XV, a capital é mudada para Phnom Penh e o país vai perdendo importância; nos séculos XVI e XVII, e até à chegada dos franceses, em 1863, os reis governaram sempre sob a protecção do Vietname ou da Tailândia. Foi assim que o delta do rio Mekong acabou por ficar a pertencer aos vietnamitas, num acordo político que ainda hoje é motivo de ressentimento por parte dos cambojanos. Já longe dos tempos imperiais, a independência desta parte da Indochina francesa só chegou em 1953.
O império redescoberto em Angkor Wat
Desde a mudança de capital que Angkor ficou entregue a si mesma – e à selva. Angkor Wat, ocupado por monges, chegou a ser um importante centro de peregrinação budista, mas o resto dos monumentos foi, ora pilhado por locais e pelos famigerados Khmer Vermelhos, que financiaram as suas actividades assassinas com o saqueio de obras de arte, ora devorado pela selva.
Pedras levantadas, tectos abatidos pelo peso das árvores, relevos cobertos por raízes gigantescas – a vegetação foi recuperando o espaço que lhe tinham tirado, pintando de verde o cinzento das pedras, esvaziando os tanques e lagos, apagando as formas soberbas de Budas, elefantes e dançarinas de pedra.
Henri Mouhot, naturalista francês, despertou a curiosidade do mundo sobre esta “cidade perdida” com a publicação do seu livro “Le Tour du Monde”, em 1860. O desbravar da selva e a recuperação progressiva de alguns monumentos começou no início do século XX, interrompida pelo reinado de terror dos Khmer Vermelhos, nos anos setenta.
Foram encontradas valas comuns na área de Angkor e as minas tornaram-se um problema que só nos anos oitenta pode começar a ser resolvido; foram retiradas cerca de seis mil minas e quinze mil engenhos explosivos, só do perímetro da cidade [ver O Lado Esquecido de Angkor Wat].
Neste momento, este é o único chamariz turístico do país, visitado por mais de cem mil pessoas por ano, sobretudo desde que a paz estabilizou no país e a UNESCO o colocou sob a sua protecção, em 1992.
Surpreendente Angkor Thom
Angkor Thom. Depois de Phnom Penh, o confronto com o requinte das velhas ruínas é algo de surpreendente. Despojada de todos os edifícios que a poderiam fazer assemelhar-se a uma verdadeira cidade, é agora um museu ao ar livre, exibindo uma fabulosa colecção de monumentos, alguns ainda escondidos sob o verde da selva.
Um dos mais impressionantes é o templo Bayon. Tem três andares, quarenta e nove torres, cento e setenta e dois rostos de pedra, mil e duzentos metros de baixos-relevos. No entanto, a sua descoberta começa por ser decepcionante. A princípio não parece mais que um monte de pedras, mas a cada passo que damos na sua direcção há um nariz, dois olhos e depois uma boca que sobressaem, deixando ver traços tipicamente khmer.
Subindo aos terraços, acabamos por ficar rodeados por aqueles sorrisos de felicidade estática que se tornam a esbater quando recuamos, dando lugar a uma amálgama de pedras cinzentas, amontoadas em torres bicudas, com alguma elegância mas nenhuma forma precisa.
À volta dos templos, leões, elefantes e nagas guardam as entradas, impávidos e cinzentos mesmo quando miúdos os cavalgam debaixo de chuva, contentes com as inesperadas tempestades de Verão.
Não faltam monges em peregrinação – alguns de walkman e óculos escuros – agora que a liberdade religiosa voltou. Ali perto, no Terraço dos Elefantes, os monarcas assistiam a desfiles e procissões, rodeados por pequenas capelas com imagens religiosas e centenas de rostos esculpidos.
A cerca de três quilómetros fica Angkor Wat, considerado uma das mais espectaculares obras da humanidade, onde se reconstitui o mundo mítico dos deuses hindus com a maior perfeição e delicadeza.
Os relevos dos muros exteriores contam histórias fantásticas do Camboja do século XII e o interior sombrio e reservado foi, no início, dedicado a Vixnu, e mais tarde consagrado por monges budistas.
Na sua silhueta destacam-se cinco torres com a característica forma de espiga de milho, a única parte do edifício que se eleva acima da vegetação; vistas ao pôr-do-sol, exalam um misticismo que poucos lugares do mundo ainda possuem. Permanentemente restaurado e limpo de vegetação, este é um dos mais importantes lugares de peregrinação do país, constantemente visitado por monges, militares, e mesmo noivos em dia de casamento.
O templo de Ta Prohm, pelo contrário, continua debaixo de gigantescas raízes de árvores, tal como estava quando foi encontrado, permitindo aos visitantes reviver o êxtase da descoberta: os pátios levantam-se em degraus, os morcegos habitam o interior, as paredes desarticulam-se num gigantesco puzzle de pedra, as estátuas estão decepadas.
São aos milhares, as peças de estatuária retiradas do que é considerado como “o maior museu do mundo”, para longe da vista de quem visita o local – mas também a salvo dos que continuam a pilhagem dos monumentos, apesar das brigadas especiais que os vigiam.
Guia de viagens a Angkor Wat
Este é um guia prático para viagens aos templos de Angkor, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e sugestões de actividades na região.
Quando visitar os templos de Angkor
A melhor estação é o Inverno, para fugir aos grandes calores de Abril / Junho e à monção que se segue, a época mais húmida do ano.
Como chegar a Siem Reap
Se voar para Bangkok e aí marcar ligação para Phnom Penh, pode arranjar voos mais baratos; ou então viajar de autocarro entre Bangkok e Siem Reap. Mas se prefere a segurança de voos marcados com antecedência, terá de pagar cerca de 1.200 € por um voo Lisboa – Phnom Penh, com paragens numa capital europeia (Amesterdão, por exemplo) e Bangkok. Entre Phnom Penh e Siem Reap pode escolher entre avião, barco e transporte terrestre; um táxi partilhado pode ser a melhor hipótese para conhecer um pouco mais o país.
Onde ficar
Em Phnom Penh pode contar com todo o tipo de hotéis, como o 4 estrelas Cambodiana (em Sisowhat Quay 313), onde um duplo vale quase 100 €, mas também inúmeras pensões, como a Happy Guesthouse, na rua 93, Sras Chok, com quartos entre 2 € e 8 €. Em Siem Reap o panorama é o mesmo: a Garden Village Guesthouse, por exemplo, tem quartos a 4 €, e o Amansara, na estrada para as ruínas, quartos a mais de 800 €.
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Informações úteis
Há caixas ATM em Phnom Penh e Siem Reap, mas é aconselhável levar dinheiro vivo, de preferência dólares norte-americanos. O bilhete para visitar os templos de Angkor fica por 20 USD para um dia, 40 para três dias e 60 para uma semana. Recomenda-se pelo menos 3 dias. O nível de vida é muito baixo, sendo possível comer por dois ou três Euros. O inglês é a língua estrangeira mais falada no Camboja.
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.