Sou uma pessoa afortunada. Porque adoro viajar e viajo bastante. Porque tenho um estilo de vida simples, mas que me permite ser feliz. E tenho uma filha maravilhosa, uma mulher que compreende esta minha sede de viajar, um ninho onde regressar. Já tive até oportunidade de fazer uma grande viagem em família, onde levámos ao limite esse conceito de felicidade em movimento. Mas nem sempre é fácil conciliar a vida familiar com a fome de estrada. É sobre isso que hoje vos falo.
Quando regressei da minha primeira volta ao mundo, homem diferente e amadurecido, tomei três decisões importantes com implicações na minha vida. Uma delas – a que importa para o caso – foi a de ter um filho. Já era casado. E assim nasceu a Inês.
Desde então, dizem-me por vezes que tenho “o melhor dos dois mundos” – o ninho da família e a liberdade das viagens. É provável. Assim como é provável que nem sempre dê o devido valor a esse facto. Sou uma pessoa sem raízes – sou ave, não árvore. Mas também elas precisam de um ninho. E é neste paradoxo que me movo.
Não é, na verdade, fácil. As vidas de viajante e de “homem de família” são realidades tão distantes que por vezes se atropelam. Quando estou em casa, só penso em viagens. Olho para mapas, pesquiso destinos, imagino próximas aventuras. Fico tentado sempre que há uma promoção de voos bombástica para outro continente. E controlo-me (quase sempre). Mas só me apetece partir. Quando estou em casa, penso em viagens que gostava de fazer mas que não vão ser possíveis porque precisaria de muitos meses e, no ninho, é preciso gerir o quotidiano, a escola e as atividades da miúda e ainda os afetos, que uma vida a dois (ou em família) não se compadece com distâncias excessivas – sei-o por experiência.
Mas, quando estou em viagem, principalmente nos primeiros dias das minhas viagens, tenho saudades. Penso que não deveria ter saído de casa, que a minha filha precisa de mim, que eu gostaria de lá estar, com ela, a ajudá-la a fazer os trabalhos de casa, a incentivá-la quando se consegue superar, a ampará-la quando fica frustrada por algo que não faz bem. Tenho saudades dos abraços e de ouvir a palavra “pai”. E depois há o ombro, que é preciso quando menos se espera.
Na verdade, por mais paradoxal que possa parecer, quando estou fora, de mochila às costas pelas estradas do mundo, preciso de tempo para deixar de ter saudades. Talvez uns 10 ou 12 dias. Duas semanas, no máximo. Depois, sim, entro em “modo viajante” e suporto todas as distâncias e isolamentos. Estranhamente, como se de um escudo de defesa se tratasse, deixo de ter remorsos ou saudades. Foco-me na viagem, na descoberta, na liberdade indescritível de viajar sem calendário. Mas nessa altura já a casa precisa de mim. E eu continuo a querer ajudar a minha filha a crescer mulher.
É neste dilema que vivo: como conciliar família e viagens?
Desde que a minha filha nasceu, há praticamente sete anos, tenho vagabundeado bastante por curtos períodos de tempo, mas fiz apenas uma viagem sozinho a que posso chamar de grande. Foram três meses por terra do Cairo a Teerão. As outras, excluindo a volta ao mundo em família que já referi (durou 10 meses e foi uma experiência incrível), foram idas e voltas mais ou menos curtas. Continuo a viajar, mas não da forma que eu mais gosto: por períodos longos de tempo, sem data para regressar.
Talvez um dia, quando a pequena Inês for mais velha, antes ainda de entrar numa universidade, façamos uma outra viagem longa. Ou, depois disso, sozinho ou a dois, sem datas nem itinerários. Até lá, vou gerindo os meus dois mundos – de que muito me orgulho – da melhor forma que sei: uma viagem pequena aqui, outra viagem pequena ali, com regresso marcado ao aconchego do lar dias depois. Nos entretantos, há-de ser possível arquitetar algo mais ambicioso – a ver vamos, que ideias não me faltam.
Não me queixo, nem espero compreensão. Sei que sou afortunado. Por sorte, por mérito, pelas opções que tomei na vida – talvez um pouco de tudo isso. No fundo, talvez seja apenas um tipo complicado que gosta de uma coisa e do seu contrário ao mesmo tempo. Não liguem, estou só a desabafar: agora vou levar a minha filha à escola e já volto para planear a minha próxima viagem!
Seguro de viagem
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Obrigado por esta janela para o meu futuro próximo, daqui a uns anos quando espero também ter uma família e continuar a viajar. É bom saber que dá para balançar as coisas, apesar de não ser fácil. Tal como tu, já experimentei fazer uma viagem longa sozinho, brevemente vou viajar em casal, e espero um dia vir a viajar com crianças pequenas! Abraço
Vocês parecem fundamentalistas islâmicos ou pentecostais falando: “preciso” ter uma família. Família é a Humanidade, todos os humanos são nossas famílias. Esta coisa de papai, mamãe e filhinho é uma imposição social. Principalmente aqui no Ocidente, onde estamos, já passamos esta fase. Se a alma é nômade, não é compatível com este modelo burguês-religioso de família. É ficar andando permanentemente numa navalha. Não se é feliz nem se faz ninguém feliz.
Gostei muito e compreendo-o tão bem!
Se eu não tivesse nascido nos anos 50 e se não tivesse escolhido um curso tão longo e uma especialidade que me absorve tanto e que lida com morte todos os dias, faria o mesmo, porque tenho os mesmos sentimentos que sente!
Belo Post.
Viajar em sempre bom, seja a viagem feita sozinho, seja em casal e melhor ainda em família com miúdos.
Este post consegue mostrar que basta querermos viajar para o conseguirmos… e meio caminho já está feito, e mostra-nos ainda como poderá ser bom fazê-lo em família.
Para mim já se torna difícil pensar numa viagem sem pensar nos miúdos…
A minha melhor experiência de viagem em família foi aos Açores quando a pikena tinha 2 anos… e não foi entrave a fazer a viagem… sei que foi muito cedo… não disfrutou como nós… mas acho que consegui que ficasse com o “vício”.
Abraço
<3
Adorei este blog! Que inspirador!
Como me revejo na tua descrição!…
Já tive esta situação como dilema, se entretanto voltar, nada como ler este post para me voltar a situar.
Obrigado
Parabéns Filipe. Não pelas crónicas (belíssimas), não pelos países visitados mas pela grandeza humana revelada. É um homem mais completo, mais sensível, um exemplo que, para pena de muitos (incluindo eu), gostariam de seguir.
Invejo-o por tudo isso!
Abraço sentido
Filipe !
Parabéns pelo excelente texto. Só que ama viajar e ama a família, entende o quão difícil é conseguir conciliar estes dois amores. Se por um lado queremos viajar e desbravar novos horizontes, por outro queremos estar no aconchego do lar ao lado das pessoas que nos são próximas.
Este com certeza é um dos grandes dilemas da vida, que cabe a nós viajantes, sabermos administrar da melhor maneira possível.
Olá Filipe,
Gosto do seu blogue. E adorava ter a sua vida. Quase nasci a viajar, 5 anos em Moçambique, água foi quase o primeiro elemento que conheci. Aos 2 anos atirava me da prancha de 2 metros do hotel Cardoso, em Maputo , depois a partir dos 14, aterrei no Rio de Janeiro, Santiago do Chile, Buenos Aires durante 17 anos. Em Buenos Aires aprendi a falar espanhol traduzindo os livros de Júlio Dinis, tínhamos uma “estância” em chacomus, onde festejávamos o réveillon à maneira dos gaúchos, e por aí fora; são anos de viagens, aprendizagens por todo o mundo. Meu país preferido é a Colômbia. Mas o que mais desejava e não esperava aconteceu; fui mãe. Aos 40. Mãe solteira. E tudo mudou. Foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida, mas acabou com as viagens. Ser pai e mãe, sem mais ninguém não dava para continuar. Hoje ela tem 16 anos, falta o resto do 11 e o 12 para entrar para a faculdade. Onde? Não sei. Mas ainda acredito que a aventura vai continuar. Nunca fiz um blogue, mas dou aulas de escrita criativa e publiquei um primeiro romance antes dela nascer que por mais que ache estranho continua a vender. Em 2ª mão, claro, porque as editoras foram todas comidas pelas grandes há uns anos. Mas continua a vender no wook. É curioso. Talvez quando tudo isto passar e a mãe nega filha tenha acabado o 12 possa continuar a escrever e viajar. Obrigada Filipe, gosto do seu blogue.
Adorei,o seu texto, Filipe!
Muitas vezes, quando seguia as suas viagens, eu fazia as chamadas “viagens de sofá”!
Sempre tive o sonho de viajar, depois dos 3 filhos não precisarem mais de mim! Tenho um marido, que por afazeres profissionais viajou muito, mas “um susto”, num voo de regresso da África do Sul, fez com que não entrasse mais num avião! Agora… só de carro, e não mais longe que França.
Mas ele não se importaria que eu fosse, acompanhada por uma prima mais velha que eu, mas também ela amante das viagens!
E assim, lá fui eu uma semana, com mais outras 2 amigas. Adorei, mas foi a primeira e última, até hoje!
Há 5 anos, comecei a trazer a minha sogra já com 92 anos, para fins de semana connosco. Ao fim de 2 meses, mudou-se para cá! Tem sido um percurso, que começou muito desgastante, mas agora está melhor. Viagens, é que nunca mais!
Foi então que conheci o seu blog, que me ajudou a sonhar, e lhe escrevi, lamentando não o poder ajudar com as marcações de voos, hotéis, e seguros. O Filipe respondeu-me, que talvez, um dia!
E assim espero, então!
Até lá, agora que não há viagens, e ainda por cima lhe cancelaram a ida a Cabo Verde, se eu puder ajudar de outra maneira, Pf diga- me. Sim?
Um forte Abraço, à sua mulher e à sua filha! É raro haver tanta compreensão! Mas isso “é Amor”!
Obrigado, Isabel, pela partilha da sua experiência. Beijinhos.