Bendita Grécia, que atrai ao mesmo tempo os que procuram um bronze perfeito, estendidos nas praias, ou os que perseguem uma cultura antiga, nos museus e ruínas que profusamente cobrem o território. No meio desta abundância, Náfplio consegue não ser apenas mais uma cidadezinha: esta é a mais italiana das cidades gregas, e até já foi capital da novíssima república helénica, no século XIX.
Na Grécia a vida é dura, na guerra para atrair turistas. O país transborda de ruínas históricas com milhares de anos, museus a rebentar de maravilhas antigas de ouro e prata, vestígios de civilizações desaparecidas e objetos que datam das profundezas da própria glória grega, anterior ao Império Romano.
Junte-se-lhe o facto de o país ser, juntamente com Espanha, o maior “bronzódromo” da Europa, graças ao Mar Mediterrâneo no seu mais manso e morno azul-turquesa, e temos um dos países mais turísticos do mundo.
A cidade de Náfplio já nasceu agraciada pela localização, num golfo perfeito da península do Peloponeso, cujas águas azuis estão rodeadas por bosques perfumados de ervas aromáticas e campos de oliveiras. Fica a cerca de centena e meia de quilómetros de Atenas e a uma dezena de Árgos, que é considerada a mais antiga das povoações da Grécia.
A menos de quarenta quilómetros fica Epidauro, o teatro mais bem preservado no país – mais uma luta renhida ganha – e se quisermos alargar o espetro, com mais um punhado de quilómetros alcançamos Micenas e Corinto. Mas com toda a mais-valia de poder servir de base a uma série de visitas a locais simultaneamente lindos, históricos e muito interessantes, a cidade vale só por si.
Os atenienses descobriram isso nos anos 80, e por isso abundam as segundas casas para feriados e fins de semana. O resultado é que Náfplio não “morre” de inverno, como acontece com tantas outras localidades turísticas, sobretudo nas ilhas, que ficam quase desertas durante meses. O ritmo desacelera, é certo, mas há tradições que ainda são o que eram e que se mantêm todo o ano.
As tertúlias de café, por exemplo. Acabada a sesta, os abundantes kafeneios enchem-se de gente e servem um maravilhoso frapé, café gelado e espumoso. De perna cruzada e sempre prontos à conversa, os locais balançam os seus kombolois ao ritmo da conversa. Este é um verdadeiro monumento ao dolce far niente em versão helénica: o komboloi é uma espécie de rosário (que, de facto, tem origem no “rosário” muçulmano, mais curto do que o cristão), que serve para entreter as mãos e embalar o espírito. Faz-se oscilar, enrola-se e desenrola-se à volta dos dedos enquanto se conversa e beberica, do fim da sesta ao fim da noite. E Náfplio é o único lugar do mundo que lhe dedicou um museu.
A maior parte da povoação distribui-se por uma península por onde serpenteava a primeira muralha construída pelos bizantinos, antes da conquista pelos cruzados franceses, seguida pela dos venezianos, em 1377.
Foi por esta época que a cidade foi ganhando a sua nuance italiana, de edifícios neoclássicos e mansões de tons pastel, em vez da pedra à vista comum no Peloponeso, ou das fachadas de um azul e branco ofuscantes, de cantos arredondados, tão comuns nas ilhas Cíclades.
Estas são as imagens mais graciosas e também mais gastas da Grécia, mas Náfplio tem outras ideias: as buganvílias de cores escandalosas também trepam aqui pelas paredes, mas são paredes pálidas, de cores subtis, onde aparece o ocasional leão de Veneza ainda não destronado, as janelas de tabuinhas e varandins de ferro forjado.
Os italianos chamavam-lhe Napoli di Romania, a Nápoles da Romania, que era o nome dado aos territórios habitados por cristãos ortodoxos, e no século XV construíram a enigmática fortaleza de Bourtzi, para defender a entrada do porto, que ocupa inteiramente uma ilhota no golfo e que desde então já serviu funções tão diferentes como as de prisão, casa dos carrascos e hotel.
A história de Náfplio continua com um ping-pong estratégico entre turcos e venezianos: os turcos conquistaram-na em 1540, os venezianos voltam a ocupá-la em 1685, e em 1715 a cidade voltou para as mãos dos turcos, de onde só saiu pouco antes de ser escolhida para capital do novo estado independente da Grécia, em 1823. O primeiro-ministro da república, Capodistrias, foi assassinado aqui à porta de uma igreja, e em 1833 a capital mudou-se para Atenas, ficando Náfplio como capital da prefeitura até aos nossos dias.
Hoje há um charme elegante e ao mesmo tempo decadente nas ruelas estreitas da cidade antiga, algumas feitas de degraus que levam progressivamente às duas fortalezas que ocupam o cimo da colina, e deixam ver o mar de um lado e do outro da península – e a fortaleza de Bourtzi encalhada no meio do golfo, como um barco de pedra.
Edifícios muito bem restaurados misturam-se com outros decrépitos, cujo charme parece vir do tempo, que os descasca e desenha nas frontarias os sinais da nostalgia. Fontes antigas com dizeres escritos em árabe, ruas estreitas ocupadas por cadeiras pintadas de azulão e mesas com toalhas de xadrez, lojas elegantes de tudo, das joias e relógios aos tapetes e roupa.
Além disso, embora os gregos não gostem muito de reconhecer – como não gostam de reconhecer nada de bom que os turcos façam -, as mesquitas deixadas pelos otomanos dão-lhe uma graça oriental, um toque das Mil e Uma Noites que combina bem com o cenário ao estilo italiano: subir escadas e dar com uma igreja de ângulos retos e torre quadrangular, descer uma viela e encontrar as formas redondas de uma cúpula de mesquita e um minarete cilíndrico é, sem dúvida, um dos encantos de uma cidade feita de pormenores, que deve ser descoberta a pé. O município, felizmente, está de acordo, e a cidade antiga é quase toda património dos peões.
“Amazing Epidauro”, em Náfplio
O Teatro de Epidauro é uma das maravilhas da Grécia, quer pelo seu estado de preservação quer pela espantosa acústica, que faz com que seja ainda hoje o palco de um festival anual de teatro. Tive a sorte e o prazer de, na única vez que lá estive, ter ouvido demonstrações de moedas a cair no chão, um ruído metálico que é amplificado pela estrutura até à última das cinquenta e cinco filas de assentos que acomodam até doze mil espetadores.
Quando ainda estava a deleitar-me de admiração, uma turista americana resolveu testar o som ao limite, com um Amazing Grace tão bem cantado que recebeu palmas de todos os que por ali andavam. Na antiguidade o local era mais conhecido pelo Templo de Esculápio, de que ainda restam ruínas, assim como os edifícios que acompanhavam o seu funcionamento como templo de cura: alojamentos, pórticos, templos menores, etc.
Várias vezes pilhado, foi finalmente abandonado no século VI, depois de dois terramotos terem acabado com o que restava das ruínas. Hoje tem um museu que alberga as descobertas mais importantes, mas é o fabuloso teatro de pedra, com a última tecnologia sonora do século III a.C. que todos procuram.
As histórias de Árgos
Continuamente habitada desde há cerca de sete mil anos, diz-se que é uma das mais antigas cidades da Grécia. O que, tratando-se do país que é, já não é dizer pouco. Não que se note; Árgos é agora uma cidade comum, com as mesmas casas, as mesmas ruas, o mesmo tráfego caótico das outras cidades gregas.
A maior diferença é que, no fim das ruelas centrais, ergue-se uma grande colina com um gigantesco teatro no sopé, coroada pelas ruínas de uma fortaleza – bem visíveis cá de baixo, e com uma vista quase infinita sobre a cidade e arredores, lá de cima. Nauplia, o primeiro nome de Náfplio, significa “base naval” – as funções que teria o porto de Náfplio para a grande cidade-estado de Árgos no início da Época Micénica. Foi rival de Esparta, mas a história de grandeza acaba aqui, no século VI a.C.
Isto, se nos cingirmos aos factos históricos, mas a mitologia também lhe dá destaque: foi fundada por Inachos, que convenceu as populações a descer dos montes e fixar-se aqui. O pior é que a beleza da sua irmã, Io, chamou a atenção de Zeus, o insaciável rei dos deuses, que não gostou de ser corrido por Inachos e mandou um relâmpago que secou o rio – e desde aí o rio seca sempre no verão.
Entretanto Inachos teve um filho com uma ninfa: Foroneus, que teve tanta descendência que o deus Hermes teve de vir cá abaixo explicar que era preciso dispersar a população e criar novos Estados. Não se sabe muito bem porquê, mas o dito Hermes decidiu também que cada Estado devia ter a sua língua, e aqui começaram os problemas e desentendimentos entre as cidades.
Foi então que Zeus deu o poder a Foroneus, que se tornou o primeiro rei mortal do mundo e que criou as primeiras leis e tribunais. Foi também a primeira vez que começaram a usar-se armas, e quando morreu o rei mortal a confusão já era grande. Argos, um sobrinho com olhos no corpo todo e uma força hercúlea, sucedeu-lhe então no poder – e deu o nome à cidade.
Guia de viagens a Náfplio
Este é um guia prático para viagens à cidade de Náfplio, na Grécia, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e sugestões de atividades na região.
Dados sobre Náfplio
Náfplio está situada num local privilegiado do Golfo de Argolis, no nordeste da histórica península do Peloponeso. A região é tão rica em fruta e azeitonas como em vestígios arqueológicos, alguns dos quais facilmente visitáveis a partir da cidade, como Árgos e Epidauro. O porto já foi importante, mas a indústria das pescas cedeu o primeiro lugar nas contas à indústria do turismo.
Para os apreciadores de praia, a da cidade pode não ser a melhor, mas em Karathónas ou Tolo, a apenas 12 km, há mais espaço para plantar o guarda-sol, e uma oferta de alojamento e restauração quase despropositada no que já foi uma aldeia de pescadores. Para além disso, a região dispõe de uma série de praias desertas e selvagens em localizações fantásticas, mas que requerem veículo próprio para acesso. Apesar da falta de areia, o mar tem temperaturas invejáveis e em terra a paisagem é o protótipo do Mediterrâneo, com uma profusão de oliveiras, laranjeiras e ervas aromáticas a cobrirem um relevo montanhoso.
Quando ir
O outono (setembro e outubro) e a primavera (maio e junho) são excelentes alturas para visitar Náfplio, já que os preços são bastante mais baixos do que no verão e a meteorologia apresenta temperaturas agradáveis.
Como chegar a Náfplio
A TAP já tem voos diretos de Lisboa para Atenas. No aeroporto pode apanhar o autocarro 93, que vai até ao Terminal A da KTEL, a companhia nacional de autocarros, na Avenida Kifissoú 100. Há várias partidas diárias (pode obter informações sobre horários no posto de turismo do aeroporto), a viagem dura cerca de duas horas e o bilhete custa à volta de 20€.
Onde ficar
Náfplio é uma cidade turística, por isso há abundância de hotéis de todos os tipos. Mas os preços não são baixos. Fora de época é possível encontrar quartos a 50€, por exemplo no Omorfi Poli Hotel, bem central, nas proximidades da Praça Syntagma.
Gastronomia grega
A comida grega é rica e variada, abrangendo peixe e marisco nas zonas costeiras, carne (muito carneiro) no interior, e em todo o lado uma abundância e variedade de legumes e vegetais, incluindo alguns que os portugueses remetem para a sopa por não saberem o que lhes hão de fazer, como a beringela ou a curgete.
A “salada grega” (queijo feta, azeitonas, pepino e tomate) é a mais comum, mas existe uma série de mezedhes (entradas), como as dolmadas (folhas de vinha recheadas), que podem ser autênticas refeições. A não perder, por quem gosta de doces, são também as sobremesas, sobretudo os delicados e dulcíssimos kataífi.
Os locais que oferecem melhor relação qualidade-preço são os restaurantes familiares – na Grécia chamados “tavernas”; em Náfplio, a Arapakos ou a O Pseiras são recomendadas e fáceis de encontrar.
Informações úteis
Os preços na Grécia subiram bastante na última década, e em Náfplio não ficam atrás dos de Atenas. As línguas estrangeiras mais faladas são o alemão e o inglês. Há vários ATM espalhados pela cidade, e muito onde gastar os levantamentos: o porto tem mais restaurantes, tavernas e esplanadas do que barcos, e as casas de artesanato típico grego têm peças irresistíveis, sobretudo a nível de jóias de design inconfundivelmente helénico, ou de kombolois, na loja do Museu do Komboloi. O site oficial do Turismo da Grécia oferece informação atualizada sobre as principais atrações turísticas das distintas regiões da Grécia, incluindo, naturalmente, Náfplio e toda a península do Peloponeso.
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