O Cairo não se explica, vive-se. Mesmo em lugares que os turistas de hoje não dispensam, como o Museu Egípcio, a Mesquita de al-Azhar, o Mercado de Khan al-Khalili ou as Pirâmides de Gizé, a cidade do Cairo é uma viagem de descobertas. E com mais pirâmides à mão de semear, que vale a pena conhecer mesmo no pico do Verão.
Preparados para o Cairo
Podemos pensar que estamos preparados para o Cairo, mas nunca estamos. Se esperamos que seja uma cidade puramente africana, ficamos de queixo caído, assim que deixamos para trás o aeroporto e somos conduzidos por avenidas largas, de moradias bem tratadas, até um núcleo urbano de prédios iluminados, onde o Nilo quase não se adivinha, escondido pela noite e pelos barcos de luzes coloridas que aguardam os turistas. Se já ouvimos dizer que o Cairo é a mais europeia cidade de África, ela corta-nos a respiração, com o calor sufocante, a fina camada de areia que parece cobrir os seus edifícios, e a degradação doce de quase todos os prédios de traçado clássico.
O Cairo não se explica. Em pleno Agosto, quando o mais aconselhável é fugir do Egito, o calor do meio-dia arrasa qualquer estrangeiro. Porque os egípcios, sobretudo as mulheres, agem como se não fosse nada. Escondem o corpo sob calças de ganga, camisolas justas de lycra de manga comprida, meio escondidas por túnicas ou outras camisolas, tapam os cabelos e os pés e parecem não ter uma gota de suor a sair-lhes do corpo.
As ruas estão cheias. De gente e de táxis, muitos táxis. Um amontoado de carros decrépitos, que às vezes necessitam de um empurrão para começarem a andar, conduzidos por homens sem muita esperança. A cada dez passos que se dá na rua, há pelo menos dois taxistas que fazem soar a buzina e procuram chamar a atenção, desesperados para, naquela que deve ser uma das profissões mais competitivas do país, serem eles a levar umas moedas para casa.
Uma ida ao Egito não pode encarar o Cairo como um mero ponto de passagem a caminho da praia ou das ruínas históricas. Vale a pena deixar-se perder pelas ruas da capital, sem pressa. Caminhar pelo centro e explorar uma livraria, comer um gelado, levantar a cabeça e apreciar a decadência cativante da cidade. Depois, há destinos que não pode perder: o Museu Egípcio, por tudo, a Mesquita de al-Azhar, para perceber como estes espaços são muito mais do que um local de oração, o Mercado de Khan al-Khalili, para beber um chá de menta nas chávenas velhas do Fishawi, e as Pirâmides de Gizé que, sim, também fazem parte do Cairo.
Do Museu Egípcio à mesquita e ao mercado
É completamente alheio a qualquer lógica tentar ver o Museu Egípcio num só dia.
O edifício cor-de-rosa, construído em 1902 propositadamente para receber os mais sagrados tesouros arqueológicos do país, está a abarrotar de preciosidades. O que o torna tão genial é que o Museu parece a arrecadação por arrumar de um museu, tal é a quantidade de estátuas, sarcófagos, jóias, papiros, mobiliário ou múmias que possui. Por muito que nos convençamos que vamos directos aos tesouros de Tutankhamon ou às salas das múmias reais (para visitar estas galerias tem de comprar bilhetes específicos no interior do museu), não é possível deixar de parar a cada passo, no primeiro ou no segundo piso, para observar mais uma peça.
E, se tem a esperança de fugir ao calor abrasador da cidade, boa sorte. Pode ter sido azar, mas quando lá estivemos, à excepção das fresquíssimas salas das múmias reais, o ar condicionado não devia estar a funcionar.
Dito isto, se é um apaixonado por arqueologia, e tem tempo para ficar no Cairo alguns dias, aconselhamo-lo a que passe boa parte do seu tempo no Museu Egípcio. O museu alberga tesouros da história milenar do país, recuperados das areias do deserto graças, em grande parte, aos esforços dos exploradores dos séculos XIX e XX. Há imensas coisas para ver, cobrindo a vida de diversos reis e faraós, o período das invasões greco-romanas ou a presença de Alexandre, o Grande, no Egito.
Mas, se tiver que escolher apenas duas coisas para ver não perca, definitivamente, a Galeria das Múmias Reais, onde os corpos de Amenhotep I, Seti I ou Ramsés II permanecem preservados, como se fossem estátuas de couro. E, não pode perder também as salas dos tesouros descobertos no túmulo de Tutankhamon, em 1922, pelo arqueólogo britânico Howard Carter. A máscara funerária de ouro, reproduzida milhares de vezes em documentários, livros ou folhetos, está lá, tão perfeita como se tivesse sido feita ontem, assim como o trono coberto a folha de ouro e cravejado de pedras preciosas, além de milhares de outros itens únicos.
Tutankhamon morreu muito novo e foi um dos faraós menos importantes do Egito, mas Carter concedeu-lhe a imortalidade e o reconhecimento internacional quando descobriu o seu túmulo intacto, com todas as riquezas que acompanhavam os faraós na morte – quase um milagre, tendo em conta que a grande maioria dos túmulos foi saqueada ao longo dos séculos.
Quando deixar o museu, dê um salto à Mesquita de al-Azhar e ao Mercado Khan al-Khalili, ao lado um do outro e no centro do Cairo Islâmico. Para entrar na mesquita deve deixar os sapatos na entrada e cobrir a cabeça e os ombros. O mais provável é que alguém se ofereça para lhe fazer uma pequena visita à madrassa, a escola religiosa islâmica, a troco de algumas moedas, mas não se sinta obrigado a aceitar.
No interior do complexo, o pátio rodeado por arcadas e de onde se vêem os três minaretes construídos nos séculos XIV, XV e XVI abrasa sob o sol, mas as diferentes salas amplas da mesquita são frescas e usadas pelos egípcios para muito mais do que rezar. Lá dentro há muita gente que aproveita para dormir a sesta, comer ou conversar ao telemóvel.
Deixando a mesquita para trás, deixe-se embrenhar pelas vielas frescas do Mercado Khan al-Khalili. É uma armadilha para turistas, onde a cada passo é confrontado com a solicitação dos vendedores para que compre chinelos, t-shirts, lenços, sacos, miniaturas kitsch de pirâmides e da esfinge. Mas, se estiver disposto a não se deixar intimidar, é também um bom sítio para passear protegido pela sombra, para observar os egípcios que também ali fazem compras ou para ver a vida passar, enquanto saboreia um chá de menta ou experimenta o cachimbo de água no café Fishawi, coberto de espelhos e que, supostamente, está aberto há 200 anos. Aí, não conseguirá mesmo escapar às hordas de vendedores que procuram impingir-lhe relógios falsificados, isqueiros ou bancos de pele. Mantenha a boa disposição e vá dizendo que não, enquanto conseguir.
Aa Pirâmides de Gizé e a Esfinge
No dia em que decidir visitar as Pirâmides de Gizé acorde bem cedo. Às 7h00 da manhã o calor já o fará sentir-se pegajoso mal põe o pé fora de casa. Às 11h00, vai desejar nunca ter deixado o quarto com ar condicionado. Se optar por explorar o complexo de Gizé por conta própria (o que aconselhamos), apanhe um táxi no centro do Cairo e tenha a certeza que negociou de forma clara o preço antes de entrar no carro. Depois, deixe-se guiar pelos subúrbios da capital, até ao distrito de Gizé, um dos mais afastados do centro.
Se tiver sorte, há-de ser uma manhã de sol, com apenas uma fina penugem de areia a enevoar o horizonte. E quando estiver distraído a observar as casas semi-construídas, semi-destruídas que se acumulam ao longo do caminho, o seu motorista há-de dizer-lhe, “ali está a grande pirâmide”, e você vai voltar a cabeça para onde ele aponta e ver surgir, enorme contra o céu, ofuscando tudo o que o envolve, o perfeito triângulo de pedra que é aquela construção.
Para muita gente, as pirâmides são uma desilusão, porque não estão perdidas no meio do deserto. Para nós, não foram. São grandes. Solitárias. Velhas. Imponentes. E todos os turistas que, inevitavelmente, as rodeiam, desaparecem como mosquitos sob as suas pedras empilhadas em socalcos perfeitos, a que hoje – e ao contrário do que aconteceu até meados do século XX – já não se pode trepar.
No plateau das três Pirâmides de Gizé, antigos túmulos de reis egípcios, a estrela é Keops ou Kofu, a Grande Pirâmide, construída por altura de 2500 a.C.. Com os seus 146 metros, é a maior de todo o Egito e a mais antiga do complexo – apesar de estar longe de ser a mais velha do país.
A entrada no complexo faz-se, precisamente, junto à grande pirâmide, vendo-se, atrás dela, para a direita, as Pirâmides de Quéfren e Menkaure (ou Miquerinos). Não tenha ilusões – está no limiar do deserto e por muito perto que estas duas pirâmides pareçam estar, não estão de facto. Chegar até elas será extenuante, por isso pense bem se quer ir até lá, para repetir a foto mil vezes captada das pirâmides alinhadas, uma a seguir à outra.
Se não quer perder a oportunidade de estar mesmo ao lado de cada uma das peças que constituem uma das sete originais maravilhas do mundo, tem sempre a possibilidade de alugar um camelo, um burro ou uma pequena carroça para o ajudar a galgar os metros de distância. Mais uma vez: nunca é demais recomendar, negoceie muito bem o preço antes de iniciar a viagem.
A grande pirâmide é a única onde é permitido entrar. A ascensão pelo interior da gigantesca construção de pedra é paga à parte. Vale a pena? Se está à espera de encontrar grandes revelações no seu interior, não. A escalada é extenuante, o ar rarefeito vai dar-lhe a sensação de desmaio, os músculos das pernas irão ressentir-se de subir, quase sempre curvado.
É sempre a subir, ao longo de 40 metros que mais parecem 40 quilómetros, num plano inclinado e claustrofóbico, para encontrar, no topo, a Grande Galeria, uma sala vazia com 47 metros de comprimento que dá acesso ao Quarto da Rainha, uma sala mais pequena, construída com blocos de granito vermelho. Dito isto, vale a pena. A experiência de se saber no interior da Grande Pirâmide é inesquecível e, afinal, quantas pessoas conhece que tenham feito o mesmo?
Fora da Pirâmide de Keops, para a esquerda, e sempre a descer, vai encontrar a Esfinge. A construção misteriosa, metade humana, metade leão, que aterrorizou durante séculos quem dela se aproximava, tem um ar curiosamente sereno. O nariz desapareceu algures entre os séculos XI e XV e parte da barba foi retirada por aventureiros do século XIX, mas nenhuma destas mutilações choca tanto como as patas luzidias e restauradas, que parecem não encaixar na idade da escultura.
É “obrigatório” tirar uma foto junto da Esfinge e, antes de deixar o complexo, dê um salto ao Museu da Barca Solar, nas traseiras da Grande Pirâmide (mais um espaço com um bilhete específico).
No seu interior, além de uma temperatura decente, vai encontrar uma gigantesca barca de madeira que era utilizada para transportar o corpo do faraó morto através do Rio Nilo. Depois de cumprir a sua função, estas barcas eram enterradas junto aos monumentos funerários, caso o faraó necessitasse de atravessar outro rio na vida depois da morte em que os egípcios acreditavam profundamente. A barca em exposição foi desenterrada em 1954 e restaurada a partir de 1.200 pedaços de madeira.
E que tal mais umas pirâmides?
A maior parte dos turistas que passam pelo Cairo fica-se por aqui. Mas não quer dizer que tenha de fazer o mesmo. Entre numa das várias agências de turismo junto ao Museu Egípcio e marque transporte e guia para visitar a antiga capital real, Mênfis, e algumas das pirâmides mais antigas do Egito, em Saqqara e Dahshur.
A viagem deverá levá-lo, primeiro, até Saqqara, para ver aquela que se pensa ter sido a primeira pirâmide do Egito e a primeira construção de pedra em todo o mundo, a Pirâmide de Zoser. No complexo funerário de Zoser, construído em 2650 a.C., além da pirâmide em degraus é possível visitar o Grande Pátio (onde o faraó fazia uma corrida ritual para mostrar ao povo a sua boa forma física), encimado pelas cabeças de cobra que simbolizavam a realeza egípcia, e vários outros túmulos, onde é possível identificar diversas cenas da vida da altura cravadas nas paredes.
A Pirâmide de Zoser estava a sofrer grandes intervenções de conservação, depois de parte da parede ter ruído, pelo que não era possível visitar o seu interior.
Em Mênfis, praticamente não restam vestígios da antiga capital do Egito, apesar de os constantes trabalhos arqueológicos no país deixarem sempre em aberto a possibilidade de que novos tesouros possam ser revelados. Capital antes de Tebas (a actual Luxor) e o Cairo, Mênfis é hoje, em termos turísticos, pouco mais que um museu ao ar livre construído em torno de uma magnífica estátua de Ramses II, caída e protegida por uma construção de pedra. No exterior, há várias estátuas deste faraó e uma curiosa esfinge de alabastro.
A última paragem do dia será em Dahshur, para espreitar a Pirâmide Vermelha e a Pirâmide Curvada, ambas construídas por Sneferu (2613-2589 a.C.), pai de Keops, o da Grande Pirâmide de Gizé. A Pirâmide Curvada foi a primeira tentativa conhecida de fazer uma pirâmide com o aspecto alinhado das que se vêem em Gizé, e não em socalcos, como acontecera em Zoser.
Só que, durante a construção, os ângulos utilizados pelos arquitectos começaram a provocar a abertura de fendas na estrutura, o que os levou a tentar solucionar o problema reduzindo drasticamente o ângulo de construção mais ou menos a meio caminho da altura total da pirâmide, o que a levou ao aspecto curioso, em curva, que lhe dá o nome.
Depois de aprender com a experiência anterior, os mesmos arquitectos partiram para a construção da Pirâmide Vermelha – a primeira a cumprir o modelo que seria depois utilizado em Gizé. Se quiser, também é possível entrar no interior desta pirâmide. Procure o acesso no cimo de 125 degraus íngremes.
O dia de viagem às primeiras pirâmides do Egito e a Mênfis são um contraste agradável com os espaços apinhados de turistas no Cairo. E o esforço de ficar mais um dia na capital para poder conhecer estes locais, vale a pena. Para lá destas paragens, ao longo do Nilo, para sul e para norte, fica um mundo inteiro por descobrir.
O Cairo é apenas o ponto de partida para viagens mais intensas Egito adentro.
Guia de viagens ao Cairo
Este é um guia prático para viagens ao Cairo, com informações sobre a melhor época para visitar, como chegar, pontos turísticos, os melhores hotéis e actividades na capital egípcia.
Localização geográfica do Cairo
A cidade do Cairo é a capital e principal metrópole do Egito. Fica no nordeste do país, a meio caminho entre Alexandria e o Canal do Suez.
Quando ir
As temperaturas incrivelmente altas do Egito desaconselham qualquer viagem no Verão. Por outro lado, é a época baixa no turismo do país, o que torna os preços mais agradáveis e, nesta altura, dificilmente encontrará filas intermináveis de acesso aos principais monumentos, que podem transformar num pesadelo uma simples visita ao Museu Egípcio noutra altura do ano.
Como chegar ao Cairo
Qualquer agência de viagens vende programas para o Egito, que incluem, normalmente, uma passagem pelo Cairo e um cruzeiro no Nilo. Contudo, se quiser fugir aos percursos formatados que elas oferecem, há inúmeras companhias aéreas europeias com voos para o Cairo – a Lufthansa é uma delas, com preços abaixo dos 600€. De resto, tenha em atenção que não é comum as agências de viagens incluirem visitas a Saqqara ou Dahshur, lugares absolutamente imperdíveis no Norte do Egito.
Onde ficar
Há inúmeras ofertas de alojamento no Cairo e para todos os bolsos. Procure bem. Pode preferir ficar no centro da cidade, mas se quer dormir de forma mais sossegada, experimente o distrito de Zamalek, bem menos barulhento que o centro e com várias árvores a ladear as ruas. Entre as opções mais baratas para viajantes independentes contam-se o African House Hotel e o Hotel Juliana, dois dos mais elogiados hostels da cidade.
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.