As engenhosas “casas de formigas” deixaram a Pikitim incrédula. Foi perto de Exmouth que viu termiteiras ao vivo pela primeira vez – e eram bem maiores que o pai! -, quando nos dirigíamos para um dos mais fantásticos parques marinhos de toda a Austrália. Em termos de beleza e riqueza do habitat subaquático, os recifes de coral de Ningaloo não ficam atrás da afamada Grande Barreira de Coral. Com a vantagem de ter pouca gente. E assim conseguimos ter a Natureza só para nós.
A Pikitim é uma criança curiosa como todas as crianças de cinco anos. Recebe com entusiasmo as explicações que pede, com frequência, e gosta de desafios e novas descobertas. Se a busca for polvilhada com um pouquinho de mistério e teatralização, tanto melhor. Quanto mais emoção, mais divertido. Mesmo que a resolução do mistério dependa tão simplesmente de… abrir gavetas.
Foi isso que aconteceu há dias no Museu da Austrália Ocidental, em Perth. A Pikitim passou largos momentos a abrir e fechar gavetas, sofregamente, sem saber o que de lá iria sair – se um coral, se um ovo, se as ossadas de um animal ou um gigantesco inseto. Foi também com alguma curiosidade que se encostou a uma vitrina e ouviu o pai explicar-lhe que, à sua frente, tinha uma termiteira, uma engenhosa construção feita por térmitas que estava ali, aberta ao meio, para melhor percebermos como as formigas se organizam, trabalham em equipa e armazenam o que vão colhendo para se alimentarem durante o ano. “Como na história da cigarra e da formiga”, acrescentou ela. Claro que sim!
De Coral Bay a Exmouth
Umas semanas depois, mais de mil quilómetros a norte da capital estadual, Perth, haveríamos de ver termiteiras bem de perto. Quando parámos a caravana e nos abeirámos de uma dessas termiteiras, muito mais alta que o seu pai, a Pikitim nem queria acreditar. “São mesmo casas de formigas?”, questionou, praticamente encostando o nariz numa delas, como se a proximidade lhe trouxesse maior verosimilhança. “Mas se isto é de areia, ou terra, ou lá o que é, como é que não se desfaz?”, perguntou, intrigada. Estava verdadeiramente perplexa. “Como é que as formigas conseguiram fazer isto?”, insistiu. Relembrámos-lhe os méritos do trabalho em equipa, e a termiteira aberta ao meio que tínhamos visto no museu em Perth. “Lembro-me muito bem. Mas é mais giro vê-las aqui que num museu”, respondeu prontamente. “Na verdade”, concluiu, “nunca imaginei ver uma coisa destas!”.
E a verdade é que viu várias. Centenas, se não milhares, especialmente na estrada que liga Coral Bay a Exmouth, a caminho dos recifes de coral de Ningaloo.
Saímos de Coral Bay já de barriga cheia com belíssimos snorkellings feitos a partir da praia. Os corais não eram muito coloridos, quase todos acastanhados, mas as formações que apresentavam eram variadas.
Estávamos com grandes expectativas sobre o Parque Marinho de Ningaloo, na água, e sobre o adjacente Parque Natural de Cape Range, em terra firme. De ambos, a cidade costeira de Exmouth é a principal porta de entrada.
Apesar de ser inverno, por ser a altura do ano em que os tubarões-baleia acorrem à costa de Ningaloo para se alimentarem, era época alta em Exmouth e estava lotação esgotada no Parque Nacional Cape Range. Verdade seja dita, há algumas dezenas de lugares disponíveis em todo o parque, o que permite manter bem controlada a pressão turística nos habitats costeiros. E o alojamento não é mais do que uma autorização para estacionar uma campervan ou montar uma tenda em locais pré-determinados, onde as comodidades existentes se resumem a uma sanita e existe, regra geral, um casal de reformados que toma voluntariamente conta do espaço.
À chegada a Exmouth, conseguimos lugar em Tulki Beach para daí a dois dias, num dos acampamentos localizados já dentro do Parque Nacional Cape Range, onde seríamos recebidos por Patrick e sua mulher. Até lá, ocupámos os dias a explorar praias belíssimas, como as de Janzs e Wobiri, que todos os anos são escolhidas por distintas espécies de tartarugas para desovar. Infelizmente, as últimas tartaruguinhas bebé tinham abandonado o conforto dos ovos há três ou quatro semanas, mas ainda assim foi um momento intenso: os três a dar um mergulho, num areal soberbo, que estava ali, à nossa exclusiva disposição. E a Pikitim foi a primeira a reparar no absurdo: “Já viram, uma praia tão bonita como esta e só aqui estamos nós?”
Foi uma sensação que experimentámos continuadamente, a de nos sentirmos esmagados pela imensidão e beleza superlativa dos lugares, desertos de gente. Que nos tornava únicos, mesmo em época alta. Em lugares como Yardee Creek, um desfiladeiro dentro do Parque Nacional Cape Range (onde continuámos a avistar termiteiras), era quase impossível não nos emocionarmos. São, talvez, as palavras simples, como as que saíram da boca da Pikitim, que melhor o descrevem: “Este lugar é mesmo bonito!”. Uma beleza que não se descreve, sente-se. A aridez avermelhada, a rocha bruta, um rio a caminho da foz, um barquinho a navegar…
Mas, se Cape Range é bonito em terra, foram as águas do adjacente Parque Marinho de Ningaloo que ali nos trouxeram. E, no mar, tudo é ainda mais estarrecedor. Em lugares como Lakeside, Oyster Sacks ou Turquoise Bay a vida subaquática é tão rica que muitos não hesitam em comparar Ningaloo com a mundial e justamente famosa Grande Barreira de Coral. Não raras vezes ouvimos até dizer que Ningaloo é “muito melhor”. Nunca estivemos na Grande Barreira de Coral, na costa oposta da Austrália, mas a proximidade da costa dos recifes de coral em Ningaloo tornam-nos acessíveis de forma incrivelmente fácil. Assim sendo, não é preciso embarcar num veleiro e gastar fortunas para fazer snorkelling nas águas de Ningaloo. E, de máscara e snorkel na face, Ningaloo é absolutamente fascinante.
Para nós, só foi pena a Pikitim ter ganho algum receio ao snorkelling e quase nunca ter querido sair de terra firme. Pensamos que foi uns dias antes, já na Austrália, em alto mar, com uma ondulação demasiado forte que a assustou ao ponto de, num ápice, querer regressar ao barco para não mais de lá sair. Tirando isso, foram dias de prazer e tranquilidade.
Cape Range e Ningaloo transmitem uma imensa sensação de paz. A Pikitim ainda não o sabe verbalizar, mas o seu olhar revelou que também a sentiu. Por exemplo, quando vários pássaros se abeiraram da mesa do pequeno-almoço no acampamento de Tulki Beach e só o seu chilrear fazia coro com o marulhar das ondas. Tudo o resto era imensidão, beleza, silêncio. Ou quando, num pôr-do-sol magnífico avistámos a silhueta de um canguru no topo de uma duna, com o seu corpo preto contra os tons laranjas, amarelos e vermelhos do céu fazendo pose para os humanos.
São imagens como estas que ficam de Cape Range e Ningaloo – um canguru, uma tartaruga, um tubarão, peixes de mil cores, corais de mil formas, desfiladeiros, praias desertas. Ou ainda a emoção de nadar com tubarões-baleia, um dos maiores habitantes dos oceanos. E isso, tal como a Pikitim sentiu ao avistar termiteiras, tem bem mais interesse ao vivo.
Guia prático
Onde ficar
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Sobre o Diário da Pikitim
Este post pertence a uma série que relata uma volta ao mundo em família, com 10 meses de duração. Um projeto para descomplicar e mostrar que é possível viajar com crianças pequenas, por todo o mundo. As crónicas da viagem foram originalmente publicadas na revista Fugas e no blog Diário da Pikitim.
Veja também o artigo intitulado Viajar com crianças: 7 coisas que os pais devem saber.