Visitar Bolama, a capital da Guiné Portuguesa

Por Filipe Morato Gomes
Palácio dos Paços do Concelho, Bolama
O que resta do majestoso Palácio dos Paços do Concelho

Está a pensar visitar a ilha de Bolama, no arquipélago dos Bijagós, Guiné-Bissau? Pois bem, recentemente tive oportunidade de viajar até Bolama, nos Bijagós, e foi sem qualquer dúvida um dos destinos onde me senti melhor em todo o país. Não sei explicar, mas há uma boa onda especial em Bolama.

Outrora capital da Guiné Portuguesa, Bolama guarda um património arquitetónico único e grandioso. É pena estar em péssimo estado de conservação, mas ainda assim os antigos edifícios coloniais marcam de forma vincada a paisagem urbana.

Dito isto, não foi a arquitetura que mais me marcou em Bolama. É muito difícil traduzir em palavras, mas foi um lugar onde me senti incrivelmente bem.

Visitar Bolama
Ilha de Bolama

Infelizmente, nesta viagem só tive oportunidade de visitar a ilha de Bubaque e conhecer Bolama. Ilhas como Rubane, Canhabaque, Uno, Orango, Orangozinho, Kéré e todas as pequenas ilhas do Parque Nacional Marinho João Vieira e Poilão, entre outras ilhas do arquipélago dos Bijagós, terão de ficar para uma eventual próxima viagem.

Assim, eis algumas dicas e sugestões para visitar Bolama, nos Bijagós, a partir da minha experiência na ilha. Vamos a isso.

Ilha de Bolama, Bijagós

A viagem de Bissau para Bolama, via Enxudé

Transporte Enxudé - São João
Transporte numa carrinha de caixa aberta entre Enxudé e São João (a fotografia possível)

O ferry de Bissau para Enxudé saiu com meia hora de atraso e, já no canal e com Enxudé à vista, ficou preso num banco de areia. Depois de quase uma hora de manobras, lá conseguiu avançar e finalmente atracar no pequeno cais de Enxudé.

Junto ao cais havia várias carrinhas de caixa aberta e bancos corridos preparadas para levar passageiros para Tite, São João e outras localidades da região. Subi para a parte traseira de uma delas, sobrelotada de gente e mercadorias, com o objetivo de chegar ao lugar de São João, onde pretendia apanhar uma canoa até à ilha de Bolama. E assim foi.

Ilha de Bolama
Ilha de Bolama

A viagem foi extremamente poeirenta, ao ponto de muitos guineenses usarem máscaras cirúrgicas que ficaram da pandemia. Mas, entre galinhas e pó, lá acabei por chegar a São João. Do outro lado do canal já se avistava a ilha de Bolama, pelo que foi só esperar alguns minutos até que uma canoa me levou até à ilha.

Em suma, demorei muito mais tempo do que antecipara a fazer a viagem entre Bissau e Bolama. Mas o mais importante é que estava finalmente em Bolama, pronto para a explorar a outrora vibrante capital da Guiné Portuguesa. Por esta altura, ainda não sabia que me iria apaixonar por Bolama. Perdidamente!

Bolama, a minha experiência

Visitar Bolama
Bolama

Atraquei no cais e de novo fui invadido pela emoção. Tal como ao cruzar a fronteira da Guiné-Bissau pela primeira vez, a caminho de Varela e sua praia, senti algo de especial assim que pisei a ilha de Bolama. É para mim muito difícil de explicar, mas senti-me imediatamente em casa.

Percorri o cais, atravessei o Largo D. Luís I, passei no atual edifício do Centro de Formação Pesqueira de Bolama e subi pela retilínea Avenida Amílcar Cabral em direção ao local onde iria pernoitar. Fui-me cruzando com pessoas genuinamente simpáticas, que me cumprimentavam com naturalidade. Era quase como se eu fizesse parte da comunidade. Enquanto caminhava rumo ao Hotel Gã-Djau, fui sendo invadido por uma estranha e indescritível sensação de bem-estar. Por algum motivo, Bolama estava-me no sangue.

Restaurante em Bolama
Um dos poucos locais onde comer em Bolama

Parei então para almoçar num espaço vazio, com apenas uma mesa, três bancos, galinhas, gatos e cães, um triciclo infantil e um carrinho de mão usado nas obras. Ainda esperei muito para lá da hora combinada e, quando veio a refeição, creio ter sido das poucas alturas em que a comida guineense não me soube bem. Era peixe fumado, com um molho que tinha um sabor muito amargo de que não gostei.

Por essa altura, o calor apertava, mas queria muito explorar a cidade de Bolama e a sua imponente mas decrépita arquitetura colonial.

A arquitetura colonial

Arquitetura colonial Bolama
Atual edifício do Centro de Formação Pesqueira de Bolama

Olhar para os edifícios de Bolama traz um misto de sentimentos. Por um lado, percebe-se ter sido uma cidade importantíssima, com casas luxuosas e edifícios públicos imponentes. É grandioso. Por outro, a esmagadora maioria dessas construções está em péssimo estado de conservação, algumas das quais literalmente em ruínas. É uma pena.

É o caso, infelizmente, do Palácio dos Paços do Concelho (ou Palácio do Governador), cujas colunas magnânimas ainda dominam a paisagem da praça Jardim Teixeira Pinto, mas do qual pouco mais resta de pé do que essas colunas e algumas paredes. O mesmo se aplica ao quartel militar, à antiga mãe d’água e a várias casas de habitação espalhadas pela cidade, estruturas belíssimas que o tempo se foi encarregando de inutilizar.

Visitar Bolama
Vista da praça junto ao cais de Bolama (Monumento aos Aviadores Italianos)

Claro que há estruturas mais bem conservadas, como aquela onde está atualmente instalado o Centro de Formação Pesqueira de Bolama, a dois passos ao cais, mas não é essa a regra em Bolama.

Dito isto, mesmo com os telhados em baixo, as paredes inseguras e com múltiplas camadas de tinta a descascar, há algo de profundamente atraente na cidade de Bolama. E os bolamenses têm muita responsabilidade nisso…

As pessoas

Habitantes de Bolama
Ero e Adama – ou a simpatia dos habitantes de Bolama

Uma das coisas que mais me surpreendeu ao visitar Bolama foi, precisamente, a amabilidade das suas gentes. A cidade é incrivelmente tranquila, e talvez isso seja o reflexo mais evidente de uma comunidade afável e hospitaleira. Não há problemas de segurança e há uma boa onda no ar difícil de traduzir em palavras.

Sim, os bolamenses são gente boa e tolerante. Cristão e muçulmanos parecem conviver harmoniosamente na cidade, sem qualquer tipo de atrito ou conflito; e todos parecem acolher quem os visita de sorriso rasgado e braços abertos.

Vendedor no mercado de Bolama
Vendedor de roupa no mercado de Bolama

De Ero e Adama – que fotografei sentados à porta de casa – ao vendedor de roupa com quem falei no Mercado de Bolama, passando pelo Delegado Rui Djassi que conheci no barco para Enxudé e me ajudou com toda a logística da viagem, pelas inúmeras crianças e adultos que me cumprimentaram nas ruas de Bolama ou pelos jogadores de damas com quem partilhei um pedaço de uma tarde, todos me fizeram sentir em casa.

Aos de Bolama, só tenho uma coisa a dizer: obrigado! Por me fazerem sentir tão bem numa terra que, apesar de não ser minha, pareceu ficar a ser.

Mercado de Bolama

Mercado de Bolama
Vista do Mercado de Bolama

É público e notório que eu gosto de visitar mercados, pelo que não poderia deixar de conhecer o Mercado Central de Bolama. Trata-se de um espaço pequeno e simples, e onde, de vegetais a calças de ganga, se pode comprar de tudo um pouco (para a realidade de Bolama, claro está!)

Modere as expectativas e passe por lá que vale a pena.

Para comprar víveres e outros produtos, há também uma mercearia conhecida como Loja Verde onde se podem comprar bens indispensáveis para a estadia em Bolama. Está assinalada no mapa abaixo.

O antigo quartel militar de Bolama

Antigo quartel de Bolama
Antigo quartel de Bolama

Estando em Bolama, não poderia deixar de visitar o antigo quartel militar. Tal como a maioria do património arquitetónico da ilha, também o quartel está em péssimo estado de conservação. Os edifícios estão a ser tomados pela Natureza, com as paredes instáveis, os telhados inexistentes e alguns canhões ferrugentos que resistem da época em que Bolama era a capital da Guiné Portuguesa.

Mas não deixa de ser fascinante passear entre a antiga messe dos oficiais, o centro de radiotelegrafistas e a carpintaria, parcialmente engolidos por árvores, arbustos e outras plantas.

Antigo quartel de Bolama
Antigo quartel de Bolama

Praia de Ofir

Se há local que gostaria de ter visitado na ilha de Bolama, esse lugar é sem dúvida a Praia de Ofir. Ouvi dizer maravilhas e imaginei ser do género da Praia Etikorete, na ilha de Bubaque, com um areal bonito, águas tranquilas e muitos manguezais em redor.

Não sei se a imagem que construí mentalmente corresponde ou não à verdade, porque, como abaixo explico, acabei por sair de Bolama um pouco mais cedo do que o previsto. Terá de ficar para uma próxima viagem a Bolama – que espero aconteça um dia!

Regresso a Bissau, de canoa

Pescadores de Bolama
Pescadores de Bolama

O regresso a Bissau, esse, foi feito de forma muito mais tranquila. Tinha pensado fazer exatamente o mesmo trajeto que me levara a Bolama, mas no sentido inverso. Ou seja, levantar muito cedo para apanhar uma canoa de Bolama para São João, de lá uma carrinha de caixa aberta até Enduxé, e depois o ferry da Consulmar até ao porto de Bissau.

Acontece que conheci uma equipa de portugueses a trabalhar num projeto solidário em Bolama que tinham alugado uma canoa para irem nessa tarde diretamente para Bissau. Quando me ofereceram boleia, ponderei as alternativas e resolvi aceitar. E assim fiz uma viagem direta e muito calma de Bolama para Bissau, num barco sem gente a mais e sem respirar pó. O paraíso, portanto!

Em jeito de conclusão, dizer que saí de Bolama com a nítida impressão de que é um destino com um potencial gigantesco para o turismo. E não estou a falar dos ex-combatentes e seus descendentes que sonham um dia regressar à Guiné-Bissau; refiro-me a todos os que amam viajar. Que o turismo possa em breve contribuir para um maior desenvolvimento da comunidade local – é esse o meu desejo.

Mais fotos da cidade de Bolama

Para quem aprecia as artes ligadas à imagem, a cidade de Bolama é muito fotogénica. Deixo, por isso, alguns registos fotográficos adicionais, para que melhor possa sentir o ambiente que se vive na cidade.

Avenida Amílcar Cabral, Bolama
Avenida Amílcar Cabral, a principal artéria da cidade de Bolama
Jogo de damas em Bolama, Guiné-Bissau
Jogo de damas em Bolama
Visitar Bolama
Uma das várias praças da cidade de Bolama
Quotidiano em Bolama
Quotidiano na cidade de Bolama
Cais da ilha de Bolama
Vista do cais da ilha de Bolama
Discoteca Som das ilhas, Bolama
Discoteca Som das ilhas, Bolama
Traseiras do Palácio do Governador, Bolama
Traseiras do Palácio do Governador, Bolama
Mãe d'água, Bolama
Mãe d’água atualmente inativa na cidade de Bolama

Mapa dos lugares a visitar na ilha de Bolama

No mapa acima, encontra a localização exata de todos os lugares referenciados no artigo, incluindo as pousadas existentes. Como vê, e entre passeios pelo centro, mercados e edifícios coloniais, ainda há algumas coisas para ver e fazer numa viagem a Bolama.

Dicas para visitar Bolama

Como chegar a Bolama

Como referido, chegar de Bissau a Bolama é surpreendentemente complexo. Para além das canoas que ligam as duas cidades sem grandes condições de segurança, e descontando a opção de alugar uma barco privado, resta a opção de seguir para Bolama via Enxudé e São João. Foi o que eu fiz.

Para tal, há um ferry diário (de segunda a quinta-feira) da empresa Consulmar entre Bissau e Enxudé, com partida de Bissau às 8:00 da manhã (8.500 XOF). No sentido inverso, o ferry sai de Enxudé com destino a Bissau às 10:00, igualmente de segunda a quinta-feira. Veja os horários atualizados no site da Consulmar.

Estando em Enxudé, apanhe um transporte terrestre para São João (1.000 XOF) e saia na última paragem; local onde estará à sua espera uma canoa para o levar até à ilha Bolama, do outro lado do Canal (300 XOF).

Onde ficar em Bolama

Antes de mais, note que não é possível reservar qualquer hotel em Bolama nas centrais de reservas online habituais. Mas não se preocupe que tudo se resolve. Há atualmente duas pequenas pousadas onde pode ficar em Bolama – e vou tentar ajudar nesse processo.

Uma é o Hotel Gã-Muria, que estava em obras de renovação (pintura) na altura em que visitei Bolama. Fica mesmo no centro da cidade e dizem que os anfitriões são muito prestáveis. Para reservar, contacte Nguabi pelo Whatsapp +245 955777676. A outra, onde fiquei hospedado, fica um pouco mais afastada, mas pessoalmente gostei muito. Chama-se Hotel Gã-Djau e, para reservar, contacte o gerente Imba pelo por Whatsapp +245 966559084.

Abaixo, deixo link para os hotéis de Bolama no booking, para o caso de entretanto surgir alguma novidade. E não deixe de ver também o artigo sobre onde ficar nos Bijagós, caso esteja a pensar visitar outras ilhas do arquipélago.

Pesquisar hotéis em Bolama

Estas duas pousadas de Bolama estão referenciadas na aplicação Maps.me. Ignore as alegadas pousadas que aparecem marcadas no Google Maps.

Gastronomia e onde comer

Não há muitas opções para fazer refeições em Bolama e, atualmente, é sempre melhor encomendar com antecedência. Dito isto, da minha experiência, o melhor local para almoçar ou jantar é o novíssimo restaurante Bar Nacite, aberto no primeiro trimestre de 2023. É propriedade de Imba, o muito prestável gerente do já referido Gã-Djau. Convém encomendar com antecedência.

Seguro de viagem

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.

1 comentário em “Visitar Bolama, a capital da Guiné Portuguesa”

  1. Como saboreei as suas palavras!
    Para mim, Bolama é casa, as gentes são família!
    Tive oportunidade de fazer uma viagem solidaria a esse paraíso.
    Apaixonei-me por tudo.
    Que dias maravilhosos.
    Que sorrisos de gente que nada tem e tanto dá.
    As crianças! ❤️ Tantos, todos!
    Obrigada Bolama!
    Sempre no meu ❤️
    Obrigada pela sua partilha.

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