A pandemia provocada pelo Coronavírus entrou de rompante nas nossas vidas. Com as fronteiras a fecharem; com as imprescindíveis restrições à circulação de pessoas a serem cada vez maiores; com as incertezas sobre o futuro próximo a aumentarem de dia para dia, incluindo as previsíveis dificuldades económicas que muitos de nós sentirão na pele nos próximos meses; é cada vez mais inevitável que todos tenham que cancelar viagens – ou, no mínimo, adiar.
Num período conturbado como o que se vive neste momento, há, no entanto, que manter a cabeça fria e tentar, na medida do possível, contribuir para o não agravamento do problema.
É por isso que muitas companhias aéreas têm pedido aos seus passageiros que remarquem os voos para data posterior – mesmo que seja uma data por definir, através de open tickets -, em vez de pura e simplesmente os cancelarem e solicitarem o respetivo reembolso.
A sugestão é pertinente, mas nem sempre exequível. Já lá vamos.
Pela minha parte, desde o início desta crise global tive já de cancelar viagens a Berlim, à Sicília, a Copenhaga e Ilhas Faroé, à Turquia e, mais recentemente, com a quase certeza de que o surto vai demorar meses a ficar controlado em todo o mundo, à Indonésia.
Neste texto, vou partilhar a minha experiência neste processo doloroso de cancelar viagens, na expectativa de que isso o possa ajudar a diminuir o seu prejuízo, tentando em simultâneo não levar à falência as companhias aéreas e os hotéis – principalmente as pequenas pousadas familiares que dependem do turismo para sobreviver e, muitas delas, contribuem de forma decisiva para as economias locais.
Dica sobre reservas efetuadas em agências de viagens: Se reservou a sua viagem – sejam voos, hotéis ou ambos – através de uma agência de viagens, deve solicitar ajuda à agência. Não adianta contactar diretamente as companhias aéreas e os hotéis; com isso estará apenas a contribuir para entupir os respetivos centros de apoio ao cliente. Só as agências poderão ajudar.
Como cancelar voos
Antes de mais, dizer que não é hora para tentar pedir indemnizações às companhias aéreas por atrasos ou cancelamentos. A situação é excecional – e muda a cada dia -, pelo que é preciso alguma compreensão.
Dito isto, é evidente que os passageiros devem exigir um tratamento digno e adequado, descontando um normal aumento do tempo de resposta nos canais de contacto. Para evitar isso, privilegie, sempre que possível, a resolução online de cancelamentos ou remarcação de voos, diretamente nos sites das companhias (ou junto da agência de viagens que vendeu o bilhete).
Vamos então por partes.
As alternativas: reembolso, remarcação, voucher ou open ticket?
Ao procurar como cancelar viagens em várias companhias aéreas, tenho verificado a existência de respostas variadas – e em constante mutação -, mas que incluem as seguintes hipóteses:
- Solicitar um reembolso total do montante pago pelas passagens aéreas. Esta opção é a mais gravosa para as companhias aéreas. Use-a apenas se tiver a certeza que não lhe será possível viajar para o mesmo destino num prazo razoável (o prazo exato para os voos resultantes das várias opções depende das companhias – consulte as regras específicas abaixo).
- Remarcar para outras datas. Caso tenha já dias de férias marcados para o último trimestre do ano, por exemplo, pode, ao invés de cancelar a viagem, remarcá-la para as datas das férias. Assim, não perderá o dinheiro e estará a ajudar as companhias aéreas. Pelo menos no caso das tarifas serem semelhantes. (Infelizmente, regra geral, ao remarcar os voos para nova data o passageiro tem de assumir a eventual diferença de tarifa – algo que, em minha opinião, não se compreende numa situação de exceção como esta). Se a companhia lhe exigir mais dinheiro pela remarcação das passagens aéreas, cancele.
- Trocar os voos por um open ticket que lhe permita viajar para o mesmo destino em data posterior, sem que tenha de definir já essa data. É uma situação interessante caso mantenha a intenção de visitar o destino e o possa fazer dentro do limite temporal estabelecido pela companhia aérea.
- Receber um voucher no valor da reserva, para utilização futura em qualquer voo da companhia. É o que a TAP anunciou e, do meu ponto de vista, é a opção mais equilibrada para ambas as partes. Isto porque permite à companhia não ter de reembolsar o cliente e ao passageiro usar esse crédito numa futura viagem para qualquer destino, facilitando-lhe a vida. Mas há empresas que estão a fazer mais para agradar aos seus clientes: a Air Baltic, por exemplo, no caso dos voos cancelados pela companhia está a oferecer aos passageiros afetados um voucher no valor da reserva + 20€ por trajeto.
Obviamente, as opções variam de transportadora para transportadora.
Dica: Caso a data ou os horários dos voos tenham sido alterados significativamente e o passageiro não tenha ainda aceite a alteração, poderá, em principio, recusar a alteração e solicitar o reembolso. Seja solidário: faça isso apenas se não vislumbrar possibilidade de remarcar a viagem para outra data.
O que fazer em função da situação do seu voo?
Mais uma vez, não se precipite a cancelar os voos de forma impulsiva. Estude as várias hipóteses oferecidas pelas companhias aéreas e atue com ponderação; até porque o tempo pode jogar a seu favor. Eis três cenários distintos que influenciam a decisão sobre como proceder:
- O seu voo já foi oficialmente cancelado. Provavelmente já foi informado pela companhia, dando-lhe a opção de remarcar outro voo ou cancelar a reserva. Se possível, opte pela remarcação da viagem (ou receber o voucher para utilização futura) e, com isso, estará também a ajudar a companhia. Não sendo possível, peça o reembolso total.
- O seu voo ainda não foi cancelado mas a probabilidade de poder voar é diminuta (por exemplo, voos agendados para abril ou maio de 2020 para países “críticos”). Neste caso, as companhias aéreas ainda não oferecem o reembolso – e isto é natural porque os voos podem, em teoria, vir a realizar-se. Assim, caso possa viajar mais para o final do ano, peça para mudar as datas ou aceite o voucher; caso ainda não saiba se poderá voar num futuro próximo, não faça nada e aguarde (até porque os voos podem vir a ser efetivamente cancelados).
- O seu voo é para daqui a muitos meses. Não faça nada por agora. Aguarde por novos desenvolvimento e vá monitorizando a situação.
Nota: Tudo o que aqui escrevo reflete apenas a minha perceção pessoal sobre como cancelar viagens, tendo a preocupação de minimizar os prejuízos do passageiro e, sempre que possível, os inconvenientes para a companhia aérea.
A minha experiência a cancelar voos por causa do Coronavírus
Não tenho, obviamente, experiência a cancelar viagens com todas as companhias aéreas. Neste contexto de pandemia, tive de lidar com reservas de voos da Ryanair, easyJet, Turkish Airlines, Atlantic Airways (todos reservados diretamente nos sites das transportadoras) e Lion Air (reservado através de uma agência online). E as experiências foram muito diversificadas.
Ryanair
No caso da Ryanair, a maior low cost a operar em Portugal, tinha dois voos marcados: do Porto para Berlim, onde iria participar num Festival de Viagens, e depois de Berlim para a Catânia, na Sicília, onde iria participar no TBEX. Ambos os voos operaram normalmente, mas eu não embarquei (no show, na terminologia das companhias aéreas) porque ambos os eventos foram cancelados. Naturalmente, não teria direito ao reembolso. Tentei, isso sim, cancelar antecipadamente as reservas, e em teoria poderia receber as taxas de aeroporto e governamentais. Mas isso não sucedeu.
Acontece que a Ryanair cobra 20€ de “taxas administrativas” (algo que considero abusivo) para proceder ao reembolso de valores pagos que, na verdade, não lhe pertencem; pelo que não valia a pena pedir o seu reembolso. É o típico caso em que uma companhia lucra indevidamente. Um mau exemplo, portanto.
Nota: As empresas ditas tradicionais, como a TAP, a Lufthansa ou a Turkish Airlines, costumam devolver as taxas de aeroporto quando o voo é cancelado antecipadamente. E, que eu saiba, sem taxas administrativas.
EasyJet
No caso da easyJet, a situação foi curiosa. Tinha um voo Catânia – Genebra – Porto, “ligado” pelo serviço de conexão Dohop (serviço pago). Ou seja, tinha dois voos “corridos” numa única reserva, tal como fazem as companhias tradicionais.
Eu não poderia fazer esse regresso ao Porto porque, lá está, não tinha embarcado no voo da Ryanair para a Catânia, pelo que pretendia pedir o reembolso (ter um voo solto de regresso, para uma data futura, não fazia sentido).
Ora, sendo o primeiro voo cancelado, seria natural que a easyJet oferecesse a possibilidade de reembolso do valor total da reserva. Infelizmente, não foi isso que aconteceu. Após um contacto via Facebook, procederam à devolução da tarifa referente ao voo efetivamente cancelado (o primeiro); mas não devolveram nem o valor pago pelo “serviço de conexão” nem o segundo voo da reserva. Recebi apenas um terço do total. Não julgo que o procedimento seja o correto (já reclamei mas ainda aguardo resposta).
Turkish Airlines
A minha maior despesa com voos comprados que não iria utilizar foi com a Turkish Airlines. Eram duas viagens familiares.
Uma das viagens que cancelei era para a Turquia, na Páscoa; e, como o voo foi cancelado, tinha direito a ser reembolsado ou remarcar. Gostaria de poder ter optado pela remarcação mas, sendo a viagem em família, só poderei voltar a fazer a viagem na Páscoa de 2021. Infelizmente, a remarcação da Turkish exigia que o voo fosse efetuado até ao fim de fevereiro de 2021. Assim sendo, optei pelo reembolso – que já me foi creditado na conta. Um excelente exemplo de serviço ao cliente – vou-me recordar disto quando tiver de reservar voos no futuro!
A outra viagem era uma nova longa viagem em família para a Indonésia. Sei já que não vou poder viajar nas datas previstas mas, por enquanto, nada indica que o voo seja cancelado. Sei também que, sendo a viagem em família e tendo quase três meses de duração, só a poderei fazer nas férias escolares de 2021, data para a qual a Turkish Airlines não me permite remarcar o voo. Poderei, em último caso, solicitar o reembolso da passagem aérea uma vez que o horário do voo foi alterado (ver dica acima); mas, ao abrigo das situações excecionais provocadas pela pandemia do Coronavírus, não terei, em princípio, esse direito.
Atlantic Airways
Tenho um voo entre Copenhaga e as Ilhas Faroé que sei que não vou utilizar. À data de hoje, a companhia cancelou boa parte dos voos até meados de abril, sendo que o meu voo está agendado para meados de maio. Vou, portanto, aguardar.
Lion Air
No caso da Lion Air, ainda falta bastante tempo para a data dos voos domésticos na Indonésia, pelo que terei de aguardar por novos desenvolvimentos.
Já sei que não vou fazer a viagem e, se cancelasse agora, pelas regras da companhia aérea, teria direito a receber 75% do valor pago. Na verdade, simulando no site onde comprei os bilhetes, receberia exatamente 58%. Resta-me aguardar mais algum tempo e ver o que acontece.
Nota sobre a TAP: Bem sei que seria útil ter informação sobre a TAP mas, como não tinha nenhuma reserva da TAP para os próximos meses, não tenho nada de útil (fruto de experiência pessoal) para partilhar.
Cancelar reservas de hotéis (e alojamentos locais)
Antes de mais: se possível, remarque. Caso tenha remarcado os voos, pode – e deve! – optar pela alteração de datas dos hotéis, em vez de pura e simplesmente cancelar as estadias. Poupa trabalho a procurar novas hospedagens e ajuda os proprietários a sobreviver a esta vaga destrutiva de cancelamentos.
Dito isto, no que toca ao alojamento há várias plataformas que permitem, na maioria dos casos, cancelamento gratuito dentro de um razoável período de tempo. Costumo usar o booking e foi assim que cancelei vários alojamentos na Turquia, Itália e Indonésia sem custos. Mesmo no airbnb, tinha algumas hospedagens que permitiam o reembolso integral (na Indonésia).
Há, no entanto, situações em que o reembolso total não faz parte das regras (ou o prazo para o conseguir foi já ultrapassado). Nestas situações, há duas estratégias possíveis para lidar com reservas sem cancelamento gratuito:
- Verificar se as condições excecionais por causa do COVID-19 permitem o cancelamento sem custos. Para isso, acompanhe permanentemente as páginas com as regras de cancelamento da central de reservas onde efetuou a sua reserva. Sendo possível cancelar sem custos (e se remarcar para nova data não for opção), é só seguir as instruções de cada plataforma na página da respetiva reserva.
- Contactar diretamente os proprietários, explicando a situação e solicitando a flexibilização das regras. É sobre este último caso que queria contar um pouco mais da minha experiência (veja abaixo).
Tal como com os voos, também no caso dos hotéis as regras variam muito em função da central de reservas utilizada. Eis algumas páginas de suporte ao cliente relacionadas com o COVID-19 que pode consultar:
Booking: Important information regarding the Coronavirus(página dedicada aos hoteleiros, mas que permite ver quais as situações de exceção em que os reembolsos são permitidos)- Airbnb: Extenuating circumstances policy and the coronavirus (COVID-19)
Agoda: Atualização da Agoda sobre o COVID-19Hoteis.com: Assistência ao cliente
Pedir diretamente o reembolso
Um exemplo. Tinha uma reserva com política de reembolso zero para Goreme, na Capadócia, feita através do booking. Estando a viagem anulada, enviei uma mensagem aos proprietários indagando se, dadas as circunstâncias excecionais, poderiam flexibilizar as regras e eliminar a penalização. Os responsáveis do hotel foram extraordinários e cancelaram, eles próprios, a reserva na plataforma. Fiquei agradavelmente surpreendido.
Escusado será dizer que farei questão de lá ficar hospedado quando concretizar esta viagem à Capadócia. O hotel chama-se Emit Cave Hotel e merece toda a minha consideração pela nobre atitude. Devemos sempre ajudar quem nos ajuda. Fica a dica.
Nota: Já me aconteceu, numa situação anterior, o proprietário concordar em devolver 50% da reserva quando as regras de cancelamento não o permitiam. Fica sempre ao critério dos proprietários serem mais ou menos flexíveis.
Outro exemplo. Tenho uma segunda reserva, desta feita no airbnb, onde, segundo as regras, de um valor de 190€ teria apenas direito a receber 93€ de reembolso. Fiz o mesmo pedido à proprietária mas ainda aguardo resposta. Como é evidente, tem toda a legitimidade para recusar – resta-me aguardar pela sua decisão.
Cancelar viagens: conclusão
Renovo o apelo para que não se precipite a tomar decisões. Ao invés, mantenha-se atento às páginas sobre a pandemia nos sites das centrais de reserva e das companhias aéreas. Só assim poderá tomar uma decisão racional e ponderada.
Por fim, fale com a sua agência de viagens se for o caso. Não contacte os centros de apoio a clientes para cancelar viagens daqui a muitos meses. Exija ser tratado com respeito mas seja compreensivo. E, não menos importante, considere sempre que possível a opção remarcação, voucher ou open ticket em detrimento do reembolso dos voos.
Havemos de ultrapassar esta situação e voltar a explorar o Mundo!
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