“Amor é Fogo que arde sem se ver”. A frase, adaptada do intemporal soneto de Luís Vaz de Camões, ocorreu-me enquanto recordava tudo o que tinha visto na ilha do Fogo. Sorri, sozinho, na coxia do avião que levantava voo do aeroporto de Santiago. Estava a regressar de Cabo Verde e, por essa altura, o sentimento já era indisfarçável: estava apaixonado por djarfogo!
Foi uma viagem tão curta quanto intensa. Um dia na ilha do Fogo – apenas um dia. Pouco tempo para apreciar todas as belezas da ilha; para fazer caminhadas; para explorar Mosteiros ou Chã das Caldeiras, uma localidade assustadoramente instalada no interior da cratera do vulcão do Fogo; e até para subir ao topo do vulcão.
Felizmente, apesar de muito ter ficado por ver e vivenciar, foi o suficiente para sair da ilha do Fogo encantado. Venha comigo nesta viagem a uma das mais bonitas e surpreendentes ilhas de Cabo Verde.
A minha visita à ilha do Fogo, Cabo Verde
Estava já no aeroporto de Santiago quando soube que o voo da Binter para a ilha do Fogo iria sair atrasado. Nada de preocupante, não fosse o caso da minha estadia no Fogo estar resumida a menos de um dia – contingências de um programa muito apertado por diferentes ilhas do arquipélago.
Na verdade, mais do que para absorver a paisagem ou fazer caminhadas, estava ali para conhecer o trabalho desenvolvido pelos mentores do Festival Sete Sóis Sete Luas em prol do desenvolvimento das ilhas periféricas de Cabo Verde. Sempre através da arte, usando expressões artísticas que vão da música à street art.
Ainda assim, aterrei em São Filipe ainda a tempo de conhecer a povoação e de ir até à cratera do vulcão do Fogo. Nada mau.
O charme de São Filipe
O meu primeiro contacto com a ilha deu-se em São Filipe, a principal povoação do Fogo e uma das localidades mais antigas de Cabo Verde. Assim que comecei a calcorrear as ruas empedradas do centro de São Filipe, senti uma empatia enorme com o povoado, como se daquela calçada emanasse uma energia tão boa que gostei logo de São Filipe, ainda antes de a explorar convenientemente. E é tão bom quando isso acontece…
Haveria de ter tempo, ao final da tarde, de voltar a percorrer parte do centro do povoado e reconfirmar a primeira impressão. Adorei São Filipe – e não consigo verbalizar os motivos! Quando sorris sem saber porquê, sabes que estás onde deverias estar; e essa é das melhores sensações em viagem.
Parque Natural do Fogo
Depois de uma curta passagem pelo Centrum Sete Sóis Sete Luas de São Filipe, segui de carro para o Parque Natural do Fogo, onde se localiza o vulcão do Fogo. Na verdade, a ilha é o vulcão e o vulcão é a ilha. Não sobra muito para lá do cone vulcânico que se impõe, magnânimo, no coração da ilha do Fogo.
A paisagem lunar, os tons pretos e castanhos contrastando com a vivacidade do céu, tudo me pareceu agreste e belo ao mesmo tempo. E assustadoramente perigoso.
O vulcão do Fogo é um vulcão ativo. A sua última erupção ocorreu entre novembro de 2014 e fevereiro de 2015, e deixou um rasto de destruição na ilha do Fogo. Centenas de casas foram literalmente engolidas pela lava. A aldeia de Chã das Caldeiras adormeceu. E tudo é muito recente.
Já tive oportunidade de ver um par de vulcões em atividade – como o vulcão Yasur de Vanuatu -, e sei bem a sensação de pequenez e impotência perante tal fenómeno natural. Não há muito a fazer.
Às tantas, bem dentro da caldeira, a estrada terminou e o motorista parou. Um letreiro anunciava o restaurante Pé do Vulcão. Não era esse o poiso para almoço, porque a foguense Rosa Avelino, uma cozinheira fantástica sem restaurante próprio, tinha preparado um piquenique ao ar livre dentro da caldeira.
Ao fundo via-se um carro junto a uma árvore; era lá que Rosa esperava por nós com a sua catxupa. Decidi continuar a pé.
Tal como na vizinha ilha Brava, também a emigração é um problema no Fogo. Em Cabo Verde, aliás. Dizem-me que há pelo menos meio milhão de cabo-verdianos a viver no estrangeiro (mais do que a população residente), e a ilha do Fogo é uma das mais afetadas pelo êxodo dos seus naturais em busca de melhores condições de vida. Não é o caso de Rosa. Nem de Alcindo, que conheci assim que cheguei ao local do piquenique.
Alcindo Montornd é o Presidente da Associação de Guias Turísticos de Chã das Caldeiras. Um guia de montanha muito experiente, que a minha companheira de viagens, Carla Mota, conhecera numa viagem anterior. Abraçaram-se como só os velhos amigos sabem fazer – e nesse momento soube que se algum dia subir ao topo do Vulcão do Fogo e ao Pico Pequeno será com Alcindo como guia.
Estômago reconfortado com os miminhos de Rosa, Alcindo levou-nos a dar um curto passeio pela caldeira. Falou de algumas plantas, do duro caminho até ao topo do vulcão e caminhámos umas escassas centenas de metros até termos a base do cone do vulcão mais próxima.
Soube a pouco.
Queria ter tido a oportunidade de subir ao vulcão, de pernoitar naquele ambiente mágico de Chã das Caldeiras, de sentir o calor das gentes do Fogo. Mas era preciso seguir viagem, que ainda havia vinho para provar, música para escutar e um barco para apanhar.
O vinho do Fogo
Fomos então provar o chamado vinho chã. O cultivo da vinha é feito de forma totalmente natural, sem fertilizantes químicos e com recurso a pouco mais do que estrume animal. Deu para perceber que a maioria da vinha está cultivada dentro da caldeira, na base do vulcão. Ao que me foi dito, as castas predominantes no Fogo são o Sabro e a Preta; e não é que o vinho dali resultante é bom e refrescante? Pelo menos para mim, que não sou grande apreciador de brancos, gostei muito dos vinhos do Fogo que provei.
Pouco depois, era hora de regressar a São Filipe, comer qualquer coisa rápida no Centrum Sete Sóis Sete Luas, ouvir música cabo-verdiana interpretada pelo grupo residente, que entretanto se juntou no palco do Centro, e regressar ao porto para apanhar o barco para Brava, uma ilha com alma.
Não há forma mais cliché de terminar um texto de viagens, mas faço-o conscientemente. Tenho de voltar à ilha do Fogo! Porque esta viagem soube-me a pouco e Fogo tem tanto para oferecer. Sodade, Fogo meu! Nha cretcheu.
O que fazer na ilha do Fogo
Na impossibilidade de fazer um roteiro na ilha do Fogo mais detalhado, eis uma lista com o que fazer no Fogo, para considerar quando organizar a sua viagem:
- Subir ao Pico do Fogo, o topo do Vulcão do Fogo;
- Subir ao Pico Pequeno;
- Fazer o trilho da caldeira até Mosteiros;
- Visitar uma adega em Chã das Caldeiras;
- Dormir numa casa particular dentro da caldeira;
- Explorar a povoação colonial de São Filipe;
- Assistir a um concerto da Orquestra Popular 7Sóis no Centrum Sete Sóis Sete Luas (em São Filipe).
Guia prático
Quando ir
Pergunte a um foguense qual a melhor época para visitar o Fogo e ele será taxativo: o melhor é evitar julho e agosto, os meses de chuva. Entre outubro e junho será, pois, a altura mais recomendada.
Como chegar à ilha do Fogo
A forma mais cómoda para chegar à ilha do Fogo é voando. Primeiro até à cidade da Praia, na ilha de Santiago, com companhias aéreas como a TAP; e daí num voo doméstico da Binter até ao Aeródromo de São Filipe, na ilha do Fogo.
Alternativamente, pode ir de Santiago ao Fogo de barco, usando os serviços da Cabo Verde Fast Ferry, mas não é viagem que eu recomende. Caso opte por viajar de barco, saiba que não é possível comprar bilhetes a bordo; faça-o numa agência de viagens como a Qualitur, no centro da vila de São Filipe.
Como se deslocar
Para ir de São Filipe até Chã das Caldeiras pode recorrer aos alugueres, com preços a rondar os 1.000 escudos, e aos táxis, naturalmente mais caros. O problema dos alugueres é que os horários são muito limitados (regra geral, apenas um par de viagens por dia em cada sentido); pergunte pelos horários em vigor quando chegar à ilha do Fogo.
Onde ficar
Para usufruir ao máximo da sua passagem pelo Fogo, é recomendável que divida a sua estadia entre São Filipe e o interior da caldeira. Uma terceira opção será a localidade de Mosteiros (caso tenha tempo).
Em São Filipe, é possível reservar um quarto com casa de banho privativa e água quente nas residências para artistas do Centrum Sete Sóis Sete Luas, por cerca de 30€ por noite (contacte a Tatiane de Paiva pelo email tatianebrasileira@gmail.com). Alternativamente, recomendo a Pipi’s Guest House, uma das pousadas mais elogiadas da ilha do Fogo. Mais barato, o Hotel Miramar Fogo Brava é uma das escolhas mais populares em São Filipe, sendo o Tortuga B&B uma opção cujo estilo eu particularmente aprecio (simples e acolhedor). Entre estas três opções, escolha uma.
No interior da caldeira, opte pela Casa do Alcindo, o guia de montanha, para uma experiência intimista numa localização ímpar. A Casa José Doce é outra boa opção na cratera do vulcão.
Pesquisar hotéis na ilha do Fogo
Outras dicas para a ilha do Fogo
Ouvir música de Cabo verde
É possível organizar uma atuação musical/espetáculo do grupo Orquestra Popular 7Sóis do Fogo, em São Filipe. Para tal, contacte o músico Carlos Lúcio, pelo número +238 977 9565 (de preferência via Viber).
Guia para subir ao vulcão do Fogo
Para subir ao vulcão do Fogo com um guia credenciado, recomendo que contacte Alcindo Montornd via facebook, um guia que conheci pessoalmente durante a minha curta passagem pela ilha do Fogo. É um guia de montanha muito experiente e Presidente da Associação de Guias Turísticos de Chã das Caldeiras.
Fazer um piquenique na caldeira
Se quiser uma experiência gastronómica diferente, é possível almoçar ao ar livre, no interior da cratera do vulcão, graças às artes culinárias de Rosa Avelino, uma foguense de mão-cheia que, apesar disso, não tem restaurante na ilha do Fogo. Contacte pelo Viber +238.987.1589.
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.
Viajei a convite da organização Sete Sóis Sete Luas.