Foi um amigo amante das viagens, da escrita e da fotografia que me falou pela primeira vez do Zion. Tinha pensado em visitar alguns dos parques naturais da região sudoeste dos Estados Unidos da América, como o Yosemite e o Dead Valley, na Califórnia, ou o Grand Canyon, no Arizona, mas pouco sabia sobre os parques do Utah. Depois de lhe ter dito que o Zion não estava incluído no meu itinerário, disparou, assertivo: “Obrigo-te a ires ao Zion; depois agradeces-me“.
Ainda faltavam muitos meses até entrar nos Estados Unidos, mas a frase ficou-me na cabeça: “Depois agradeces-me!” – ninguém fala de forma tão afirmativa sem estar absolutamente convicto das suas palavras.
Meses depois, dias antes de aterrar em Los Angeles, aquelas palavras continuavam a perseguir-me. Sabia que me iria arrepender de não ter dado ouvidos ao desafio de alguém que conhecia bem a minha paixão pelos destinos pequenos e rurais, pelos espaços naturais, longe do buliço das grandes cidades. Olhei para o mapa pela enésima vez, tentando desvalorizar as centenas de quilómetros adicionais que teria de fazer para chegar ao estado do Utah, discutimos entre todos as opções – estava a meio de uma longa viagem em família, acompanhado de mulher e filha, então com cinco anos – e, num ápice, os planos estavam definitivamente alterados. Iríamos visitar os desfiladeiros vermelhos do Zion.
Viajávamos de carro alugado e, descontando as incomensuráveis distâncias, tínhamos total liberdade de movimentos. Quando chegou a hora de finalmente entrar no Utah e de nos aproximarmos do Parque Natural Zion, seguimos por uma estrada de montanha bela mas sinuosa em direção à parte leste do parque.
Atravessámos um túnel sem vislumbre de luz durante muito tempo e, do outro lado, esperava-nos a cabeça do espetacular trilho Canyon Overlook.
A caminhada até um miradouro com vistas fabulosas sobre as partes baixas dos desfiladeiros Zion e Pine Creek era o primeiro objetivo a concretizar no interior do Zion Isto porque, estando acompanhado por uma criança, optei por não percorrer o afamado Virgin Narrows que, dizem, proporciona caminhadas espetaculares quase sempre dentro do leito do Rio Virgin.
Carro estacionado, seguimos então por terrenos pedregosos montanha acima, atravessámos grutas, passámos por pontes suspensas que permitiam a passagem nas falésias sem espaço para trilhos, calcorreámos uma ou outra zona com vegetação mais frondosa sempre debaixo de um calor abrasador e, às tantas, chegámos ao ansiado miradouro.
Havia um ou outro jovem mochileiro e alguns turistas volumosos de calções caqui, botas de montanha e chapéu tipo “cowboy” – norte-americanos, com certeza! -, mas ninguém tinha tomado a liberdade de ocupar o topo de um pedregulho estrategicamente ereto a meio do desfiladeiro, envolto em escarpas verticais de tonalidades alaranjadas. Sentámo-nos a descansar. Não poderíamos ter escolhido local mais especial para um piquenique improvisado, sem cestinho nem toalha, enquanto matávamos a fome de Natureza bebericando a paisagem. Lá em baixo, ao fundo, um vale verdejante com o desfiladeiro que dá nome ao parque. Era a nossa próxima paragem.
Excetuando porventura para os amantes de escalada, não há melhor forma para explorar o Zion que caminhando. Mesmo para quem não é praticante de escalada, é absolutamente impressionante olhar para pequenos pontos de cor nas falésias avermelhadas que se movem lentamente escarpa acima. O Zion é famoso pelas suas paredes verticais e, todos os dias, dezenas de homens e mulheres – escaladores experientes – desafiam os seus limites no desfiladeiro Zion. Para os outros, como nós, restam os passeios em terra firme – e não é pouco!
Voltámos a descer rumo ao vale com o objetivo de fazer caminhadas por novos trilhos. Seguimos então para a Canyon Junction e estacionámos o veículo próximo do Visitor Center, onde um autocarro nos haveria de levar até ao início do próximo trilho. À esquerda, vislumbrámos o imponente Court of the Patriarchs, um conjunto de rochedos de arenito bem documentado nas icónicas fotografias do celebrado fotógrafo norte-americano Ansel Adams, assim nomeado em honra dos personagens bíblicos Abraão, Isaac e Jacob.
Percorremos o curto mas interessante Weeping Rock Trail, a “rocha que chora”, e mais um ou outro trilho de pequena dimensão. De qualquer ponto onde parássemos, as vistas do desfiladeiro eram esmagadoras. De pescoço curvado para trás, sentíamo-nos pequenos perante tamanha imponência, pela beleza rude da paisagem criada por ventos e enxurradas ao longo de milhões de anos. Aqui e ali, avistavam-se destemidos escaladores lá no alto, pontos minúsculos que sobressaíam nas tonalidades alaranjadas dando escala humana à imponência das paredes verticais do desfiladeiro Zion. Sentíamo-nos bem, muito bem, no interior do Zion, e só nos apetecia percorrer os trilhos assinalados no excelente mapa fornecido à entrada.
E assim fizemos. Os trilhos Kayenta e o Lower Emerald Pool complementavam-se geograficamente na perfeição, pelo que combinámos os dois num único passeio matinal. Para além de uma ponte suspensa e da presença de uma família de veados com crias de tenra idade, foi a paisagem que de novo nos surpreendeu a cada pedra, a cada curva na falésia.
Não é difícil ficar-se embasbacado nos trilhos do Zion, e foi com essa sensação de espanto que nos despedimos do parque.
No final de várias semanas a viajar pelos Estados Unidos, o Zion tinha sido, de longe, o meu parque natural preferido. Ainda bem que não “desobedeci” ao meu amigo!
Guia prático
Guia de sobrevivência
Não menospreze a Natureza: os estreitos desfiladeiros do Zion são potencialmente letais. Enxurradas repentinas ocorrem com frequência e sem aviso prévio, muitas vezes fruto de tempestades ocorridas a muitos quilómetros de distância do lugar onde se encontra. Antes de partir para caminhadas em zonas de risco, verifique junto dos rangers as condições de segurança e previsões climatéricas. Eles indicar-lhe-ão igualmente os sinais a que deve estar atento para evitar ser surpreendido por uma enxurrada.
De resto, leve sempre muita água e alguma comida, chapéu, calçado confortável (de preferência botas de montanha, e nunca sandálias ou calçado aberto), roupa leve, um agasalho e um impermeável, e ainda protector solar e um kit de primeiros socorros. E, claro, nunca caminhe sozinho. Porque, como diz a literatura oficial do Zion, “a sua segurança é da sua responsabilidade”. Mais informações no site oficial do National Park Service.
Seguro de viagem
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O melhor das (minhas) viagens
A Matinal desafiou-me a partilhar “o que há de melhor em viajar”, incentivando-me a recorrer ao baú de memórias para partilhar experiências marcantes vividas em viagem. Assim nasce esta série de artigos com alguns dos melhores momentos das viagens que tenho feito pelo mundo:
- De barco pelas águas tropicais de Bacuit, Filipinas
- Explosões de lava no vulcão Yasur em Tanna, Vanuatu
- A magia de Petra, Jordânia
- Safari no parque Etosha, Namíbia
- Viver e amar em Ubud, Bali
- Desova das tartarugas em Tortuguero, o milagre da vida na Costa Rica
- Explorando o parque Zion, EUA
- Viajar de autocaravana na Nova Zelândia
- Estocolmo: espelho meu, existe cidade na Europa mais bela do que eu?
- Despertar com os monges de Luang Prabang
- 4×4 no deserto de Gobi, Mongólia