Roteiro cultural em São Paulo (em busca da poesia de suas esquinas)

Sampa não se ama ao primeiro olhar. É “um difícil começo”. Raras vezes me passou pela cabeça, aliás, visitar São Paulo na qualidade de turista. Talvez porque, vista à distância, a cidade intimida.

Senão vejamos. Uma metrópole de dimensões estratosféricas, com multidões e trânsito caótico; o centro económico e financeiro do Brasil, com todo o cinzentismo associado ao mundo das finanças. Um lado feio, inseguro; o ar poluído; a opulência lado a lado com a pobreza extrema; as drogas da Cracolândia. E prédios e prédios e mais prédios.

Acontece que São Paulo não é só o que parece à distância. É “o avesso do avesso do avesso do avesso”. Para os apreciadores de gastronomia, por exemplo, não haverá em todo o país cidade mais entusiasmante. Para os apreciadores de artes e cultura, em nenhum outro destino brasileiro haverá tanta oferta. A vida noturna é vibrante. Dia e noite, de mercados a museus, de botecos a espaços verdes, não falta o que visitar em São Paulo; há incontáveis roteiros possíveis a desbravar – e para todos os gostos. Assim o viajante se permita dar tempo à cidade.

Chegou, pois, o dia em que decidi dar uma chance a São Paulo. E ficar uma semana inteira, para permitir que, aos poucos, a Sampa de Caetano Veloso entrasse em mim, na esperança de, um dia, poder cantar alto e bom som que “alguma coisa acontece em meu coração” ao cruzar “a Ipiranga e a Avenida São João”.

Neste artigo, partilho, pois, uma espécie de roteiro cultural em São Paulo, como resultado desses dias passados na capital paulistana à procura da poesia das suas esquinas. Eis o que fazer em São Paulo, segundo o meu olhar relutante.

O que visitar em São Paulo (as minhas escolhas)

Mercado Municipal de São Paulo (Mercadão)

Projetado pelo arquiteto brasileiro Ramos de Azevedo, responsável por obras emblemáticas como o Teatro Municipal e a Pinacoteca, o Mercado Municipal de São Paulo (também conhecido como Mercadão) é um mercado público localizado no centro histórico da capital paulistana. Foi inaugurado em 1933.

Entre as quase três centenas de stands, destaque para as carnes e os peixes, os queijos e os laticínios, as frutas (ai, as frutas!) e os cafés. Percorrer as bancas do Mercadão, falar com os vendedores e provar algumas das suas iguarias são, para mim, prazeres fundamentais numa visita a São Paulo! Imperdível!

Para saber mais sobre os vendedores do Mercado Municipal de São Paulo, visite o Portal do Mercadão.

Curiosamente, o Mercado Municipal ganhou um improvável ícone gastronómico, entretanto elevado ao patamar de símbolo da cidade (!): a sanduíche de mortadela. São uns exagerados 300 gramas de mortadela colocados dentro de um “pão francês”, alegadamente criado por brincadeira, há mais de 50 anos, na banca atualmente conhecida por Bar do Mané.

Fiz questão de provar, mas acabei por fazê-lo no Hocca Bar, um espaço localizado no mezanino do mercado onde, para além da famosa sanduíche de mortadela, provei ainda vários pastéis, incluindo o de bacalhau. Tudo delicioso, acompanhado por uma cerveja bem gelada! Pensei que não ia gostar daquele exagero de mortadela, mas a verdade é que se come bem.

Para experimentar ambientes distintos, pode provar a sanduíche de mortadela no Bar do Mané e os pastéis no Hocca. Se tiver com quem dividir, tanto melhor (as porções são grandes).

MASP (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand)

Localizado no coração da cidade, o MASP é um dos principais cartões-postais de São Paulo. O museu, instalado num edifício de arquitetura modernista, possui obras de grandes nomes da pintura brasileira e internacional, entre os quais se incluem Botticelli, Cèzanne, Chagall, Delacroix, Matisse, Modigliani, Monet, Picasso, Renoir, Toulouse-Lautrec ou Van Gogh.

Um museu a incluir em qualquer roteiro por São Paulo – mais ainda para quem tem interesse em atrações culturais. Imperdível!

Pinacoteca

Tido como o mais antigo museu de artes visuais de São Paulo, a Pinacoteca do Estado de São Paulo dá particular ênfase à produção brasileira – desde o século XIX até aos tempos modernos.

“A Pinacoteca de São Paulo dedica-se às artes visuais brasileiras e ao seu diálogo com as culturas do mundo ao colecionar, estudar, preservar, expor e comunicar seus acervos para promover a experiência do público com a arte, estimular a criatividade e a construção de conhecimento.”

É, sem qualquer dúvida, um dos mais importantes museus ligados às artes da capital paulistana. Caso se interesse pelo assunto, não deixe de visitar a Pinacoteca!

Para mais informações, consulte o site oficial da Pinacoteca.

Estação da Luz

Literalmente do outro lado da rua fica a Estação da Luz, em tempos a principal porta de entrada em São Paulo. Foi inaugurada há mais de um século, num edifício que inclui uma torre de relógio – uma das estruturas abaladas pelo grande incêndio de 1946, que quase destruiu o edifício.

A Estação da Luz abriga ainda o majestoso Museu da Língua Portuguesa, um dos mais populares espaços culturais da cidade, atualmente encerrado também devido a um incêndio de grandes proporções.

Parque da Luz

Ainda na mesma região, seja antes ou depois de visitar a Pinacoteca ou a Estação da Luz (ou ambas), não deixe de passear pelos jardins do Parque da Luz, onde várias esculturas embelezam o espaço verdejante, transformando-o numa galeria de arte a céu aberto.

Memorial da Resistência de São Paulo

O Memorial da Resistência de São Paulo é um museu relativamente pequeno com uma enorme missão. Tem por objetivo “a preservação de referências das memórias da resistência e da repressão políticas do Brasil republicano” (desde 1889 até à atualidade), através da “musealização de parte do edifício que foi sede do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo”, tida como “uma das polícias políticas mais truculentas” do Brasil – especialmente durante o regime militar.

Foi dos locais mais surpreendentes que visitei no meu roteiro em São Paulo, até porque pouco sabia a respeito e fui por sugestão de um amigo paulista. Fundamental visitar!

Catedral da Sé

Tida como um dos maiores templos neogóticos do planeta, a Catedral da Sé merece a visita de todos os que se aventuram pelo (pouco seguro) coração do centro histórico de São Paulo.

Diante da catedral, está instalado o chamado Marco Zero da cidade de São Paulo; um pequeno monumento de mármore com um mapa das estradas que partem de São Paulo com destino a outros Estados.

Feirinha na Praça Benedito Calixto

Tida como uma das melhores feiras de antiguidades e artesanato do Brasil, a Feira da Praça Benedito Calixto reúne em Pinheiros, todos os sábados, mais de 300 expositores.

De roupas usadas a brinquedos antigos, de discos de vinil a mobiliário vintage, passando por um sem número de antiguidades, de tudo um pouco se pode encontrar, todos os sábados, na Praça Benedito Calixto.

Visitando a feira da Benedito Calixto, nada como aproveitar e ficar para o almoço. Na Praça de Alimentação pode petiscar e ouvir bom chorinho (a partir das 14:30); mas não faltam também restaurantes em redor da feira. Pela minha parte, apostei na feijoada do restaurante Consulado Mineiro – Praça. Uma delícia!

A feira na Praça Benedito Calixto acontece aos sábados, sensivelmente das 9:00 às 19:00.

Perder-se na Vila Madalena

Já aqui escrevi que a Vila Madalena é o meu bairro em São Paulo. Eu tinha um pressentimento de que iria adorar o bairro; e a realidade encarregou-se de comprovar esse feeling. É um bairro descolado, como dizem os brasileiros, com uma onda muito artística – ou hipster, ou o que seja -, recheado de gente criativa, lojas interessantíssimas, cafés deliciosos e, claro, inúmeros bares que ajudam à fama boémia da Vila Madalena.

O eixo Vila Madalena/Pinheiros é igualmente, na minha opinião, uma das melhores regiões onde ficar em São Paulo. Para explorar, de preferência com calma, para absorver o aconchegante ambiente de vida de bairro que por lá se vive.

Beco do Batman

Referência para os amantes de arte urbana em São Paulo – em especial o graffiti -, o Beco do Batman é uma das atrações mais frequentadas da Vila Madalena e um dos grandes atrativos do chamado Roteiro das Artes promovido pela Prefeitura de São Paulo.

O Beco do Batman fica escondido entre as vielas das ruas Gonçalo Afonso e Medeiros de Albuquerque; e está totalmente coberto por trabalhos de artistas brasileiros e estrangeiros.

Ó do Borogodó

Localizado em Pinheiros, o Ó do Borogodó – ou apenas Ó, como é carinhosamente chamado – é uma casa de samba tradicional.

Visto de fora, aparenta ser pouco mais do que uma casa velha gratifada. Imagino que ninguém dê muito por aquilo, a não ser que conheça. E essa é uma das grandes vantagens do Ó do Borogodó: o ambiente intimista. Mas é lá dentro que a magia acontece!

A primeira vez que lá fui parecia que toda a gente se conhecia. Mesmo sendo um evento especial, chamado Ó do Avesso, em que as pessoas assistiam, sentadas, ao espetáculo de uma banda. A música estava a cargo de uma banda maravilhosa, saltitando entre o samba, o forró e os chorinhos que tanto aprecio.

Não imagino uma visita a São Paulo sem uma passagem pelo Ó.

Domingo na Avenida Paulista

Considerada um dos principais centros financeiros da cidade, a Avenida Paulista é o ícone de uma São Paulo virada para os negócios e finanças; enquanto, simultaneamente, alberga alguns dos mais emblemáticos pontos culturais da cidade – como é o caso do MASP ou da Livraria Cultura.

Dito isto, tudo se transforma ao domingo, dia em que a Avenida Paulista se transveste. Os carros dão lugar aos skates e bicicletas, os fatos e gravatas aos chinelos e bermudas, e com isso o ambiente fica mais interessante e respirável.

Registe esta sugestão, para quando estiver a decidir o que fazer em São Paulo num domingo (principalmente de manhã).

Livraria Cultura

Seguramente uma das melhores livrarias de São Paulo, a Livraria Cultura, com mais de 60 anos no mercado, impressiona pelo seu tamanho. Apesar de muito frequentada e com um acervo estimado em mais de dois milhões de obras, a Cultura é um refúgio de calmaria entre o bulício da Avenida Paulista. A visitar.

São Paulo tem muitas outras livrarias interessantes, incluindo espaços quase míticos como a Livraria Zaccara ou a Livraria da Vila (na Vila Madalena).

Parque Ibirapuera

Inaugurado em 1954, durante as comemorações dos 400 anos de São Paulo, o Parque Ibirapuera é o mais frequentado espaço verde da cidade. Trata-se de uma ampla área verdejante, com espaços bem cuidados (ideais para passear, fazer exercício ou, simplesmente, respirar ar puro) e um grande número de atrações culturais.

Entre elas incluem-se o MAM – Museu de Arte Moderna e o surpreendente Museu Afro Brasil (que não incluí neste roteiro por São Paulo). Não muito longe do Parque Ibirapuera, encontra-se também o MAC – Museu de Arte Contemporânea.

MAC – Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo

Embora ligado à pesquisa universitária, o MAC – Museu de Arte Contemporânea tem como principal objetivo tornar a cultura acessível a todos.

O museu possui um acervo de quase dez mil obras de arte, a maioria das quais proveniente do vizinho Museu de Arte Moderna. Entre elas, encontram-se óleos, desenhos, gravuras e esculturas de nomes incontornáveis do século XX, como Kandinsky, Matisse, Miró, Modigliani ou Picasso. É, seguramente, um dos melhores museus de São Paulo (eu, pelo menos, gostei mesmo muito de o visitar).

Dica: não deixe de ir ao terraço do MAC para uma vista desafogada sobre o Parque Ibirapuera.

MIS – Museu da Imagem e do Som

Visitar o MIS – Museu da Imagem e do Som foi outra das boas surpresas do meu roteiro por São Paulo. Trata-se de um museu descontraído, sem formalismos, que exibe muito do que há de mais relevante na área do cinema, do vídeo, da música e das artes multimédia. Tudo conjugado com exposições temporárias sobre assuntos ligados à cultura digital contemporânea – como foi exemplo, há um par de anos, uma exposição sobre a vida e obra de Steve Jobs.

O museu organiza ainda um importante Festival Internacional de Curtas-Metragens.

Igreja Nossa Senhora do Brasil

A caminho do MIS, passando pelo bairro Jardim América, é difícil não reparar na Igreja Nossa Senhora do Brasil. Pode parecer exagero, até porque a sua construção data do século XX, mas fez-me lembrar as igrejas de estilo colonial das cidades históricas de Minas Gerais – como Ouro Preto ou Mariana. Como não amar?

Veja as fotos das igrejas de Ouro Preto e Mariana.

Museu do Futebol

Confesso que nunca me passou pela cabeça visitar um museu dedicado ao futebol. Até ao dia em que a São Paulo Turismo, sabendo da minha passagem pela cidade, me desafiou a fazê-lo. Expectante, acedi.

E, na verdade, gostei de conhecer. É um hino aos virtuosos brasileiros – de Pelé a Falcão, de Sócrates a Zico, de Bebeto a Romário, passando pelo inevitável Ronaldo, o “Fenómeno”. E o projeto museulógico está muito bem pensado, tornando a visita bem agradável.

O Museu do Futebol está instalado debaixo da arquibancada do Estádio do Pacaembu. Gostei de visitar – mas julgo que só faz sentido num país verdadeiramente louco por futebol. Como o Brasil!

Terraço do Sky Bar

Para descontrair, de botecos de bairro a terraços exclusivos, não faltam lugares para sair à noite em São Paulo e tomar um copo. Um desses locais, mais chique do que popular, é o Sky Bar, localizado no topo do Hotel Unique.

Eu, amante de tascos e botecos, não fiquei apaixonado pelo bar. Apesar de, naturalmente, reconhecer que o terraço, com vistas sobre a gigantesca urbe, é muitíssimo agradável – para uma clientela mais seleta.

Mapa com o que fazer em São Paulo (um roteiro cultural)