Turismo sustentável: boas práticas de um viajante consciente

Por Filipe Morato Gomes
Turismo sustentável em Fernando de Noronha
Praia do Sancho, em Fernando de Noronha, arquipélago onde se tenta um equilíbrio em prol de um turismo sustentável

Será o turismo sustentável uma utopia? Não há dúvida de que o turismo é uma atividade incrivelmente enriquecedora, mas infelizmente não faltam impactos negativos. O simples ato de apanhar um avião anula os efeitos ambientais positivos de muitas pequenas decisões quotidianas, igualmente importantes, no que toca à utilização de plásticos e outros comportamentos menos amigos do ambiente.

Mas todos podemos fazer um esforço em prol de um turismo sustentável (ou, pelo menos, progressivamente mais sustentável). Basta estar consciente dos impactos. E tentar ser um viajante mais consciente.

Na verdade, há muitas pequenas coisas que pode fazer nas suas viagens para diminuir a sua pegada ecológica e o impacto negativo do turismo. Em nome do planeta Terra, da sua biodiversidade e das futuras gerações.

Pois bem, depois de participar no Exodus Aveiro Fest e de pensar sobre o problema, tenho tentado ser um melhor viajante. Nesse sentido, decidi compilar uma lista – não exaustiva – de coisas simples que todos podemos fazer em prol de um turismo mais sustentável. Vamos a isso.

Turismo sustentável: dicas e sugestões

Viaje devagar

Não me canso de enfatizar as vantagens de viajar devagar, do ponto de vista da experiência e profundidade com que fica a conhecer os destinos. Acontece que, sendo os transportes uma das principais fontes de emissão de gases para a atmosfera, ficar mais tempo em cada destino é também uma forma de diminuir a sua pegada ecológica em viagem. Pense nisso da próxima vez que planear uma viagem.

Voe o menos possível

Voar é muitas vezes parte indispensável do ato de viajar. No caso de longas viagens intercontinentais, por exemplo, as alternativas são inexistentes. Pode, ainda assim, procurar companhias com aviões mais eficientes em termos de consumo de combustível, mas nem sempre é fácil.

No entanto, para viagens dentro da mesma região geográfica, pode optar, sempre que possível, pela utilização de meios de transporte mais eficientes, como o comboio (de preferência) ou o autocarro. Foi o que fiz, por exemplo, numa viagem de comboio até San Sebastián, por oposição a voar para Bilbau.

É certo que com a proliferação das companhias low cost – nomeadamente na Europa e no Sudeste Asiático -, em que por vezes é mais barato voar do que viajar por terra, nem sempre é fácil tomar a opção de não viajar de avião. Seja como for, em nome do turismo sustentável, faça-o sempre que possível. E ainda fica a ganhar uma experiência mais enriquecedora e próxima dos habitantes locais.

Use transportes públicos

Como é óbvio, o carro alugado ou o táxi não são meios de transporte ambientalmente eficientes. Seja um viajante consciente e, caso existam, prefira sempre os transportes públicos – mesmo que demore mais um pouco a chegar ao destino. É o melhor que pode fazer em nome de um turismo sustentável. E vai ver que é muito mais divertido!

Leve uma garrafa de água reutilizável

Pode parecer uma recomendação óbvia, mas é inacreditável a quantidade de garrafas de plástico que os viajantes utilizam nas suas viagens. É certo que em alguns lugares é difícil escapar a esse flagelo a 100% – especialmente se não confia na água da torneira – mas desconfio que muitas vezes é mais por preguiça do que outra coisa. Quanto à água da torneira, há sempre filtros para purificar a água.

Em suma, leve uma garrafa de vidro ou aço inoxidável e encha-a de água sempre que necessário. Além de contribuir para um mundo melhor, estará a poupar dinheiro em viagem.

Rejeite os plásticos de utilização única

Turismo sustentável e plásticos de utilização única não combinam. Para além da garrafa de água, há muitos outros plásticos de utilização única que podem ser evitados. Quando for às compras a uma mercearia ou supermercado, faça questão de recusar os sacos de plástico – e explique porquê. Transporte consigo sacos de pano para carregar as suas compras.

Países como o Ruanda (sim, o Ruanda) há muito que baniram os sacos de plástico do seu quotidiano; um exemplo recentemente seguido por Marrocos. Mas, seja em que destino for, cada viajante deve fazer a sua parte. Até porque há ainda muito por fazer, como alerta o magnífico trabalho Árvores de Plástico do fotógrafo Eduardo Leal.

Da mesma forma, não há nenhuma razão para usar palhinhas nas suas bebidas (que, muito provavelmente, acabarão nos oceanos). Recuse sempre, seja na sua cidade ou em viagem – e explique os motivos. E o mesmo se aplica aos amenities dos hotéis. Evite o seu uso e também não os leve para casa. Cada frasquinho de champô ou gel de banho tem doses minúsculas; é demasiado plástico para tão pouco uso.

Não saia dos trilhos marcados nos parques naturais

A proteção do meio ambiente é uma preocupação de todo o viajante consciente. O problema é quando, no terreno, somos tentados a sair dos trilhos para espreitar algo. Lembre-se, no entanto, que os trilhos existem por alguma razão. Seja para disciplinar os viajantes, seja em prol da sua segurança, ou ainda por questões de conservação ambiental. Se pretende mesmo fazer um turismo sustentável, há que respeitar os trilhos.

Não deixe lixo na Natureza (nem onde não há tratamento de resíduos)

Mais uma sugestão óbvia mas muitas vezes negligenciada. Não deixe lixo nos parques naturais, nas montanhas, nas praias, em lado algum. E, em ambientes onde não há tratamento de resíduos, transporte o lixo consigo até um lugar onde o possa deixar em segurança.

A este propósito, é bom lembrar o exemplo dos costumes japoneses. No Japão, não há caixotes de lixo nas ruas, porque os japoneses acreditam que o lixo de cada um deve ser levado para casa de cada um. Pense nisso.

Caso seja fumador, não facilite também no que toca às piriscas dos cigarros. Contêm milhares de químicos que podem acabar nos lençóis freáticos.

Seja consciente no ato de comprar

É certo que comprar artesanato e produtos locais ajuda a economia do destino, mas o mesmo não se aplica às bugigangas turísticas da indústria dos souvenirs. Ninguém precisa de uma Torre Eiffel de plástico, um imã com a imagem de um camelo para o frigorífico ou um porta-chaves de Petra Made in China, certo? Em suma, invista em produtos úteis e compre com a preocupação de valorizar os produtores locais.

Da mesma forma, resista à tentação de comprar artigos feitos com marfim ou corais, por exemplo. Interrogue-se sempre que produto é aquele, como foi feito e de onde veio.

Não menos importante, em nome de um turismo sustentável compre bens duradouros. Se precisa de comprar equipamento para as suas viagens – seja t-shirts, botas de montanha, calças de trekking ou equipamento para a neve -, lembre-se que é preferível comprar algo mais caro mas que dure cinco ou dez anos, do que algo muito barato que tenha de ser substituído ao fim de um ano ou dois. Não só porque a médio prazo ficar-lhe-á mais barato, mas principalmente porque os recursos não são infinitos. Uma vez mais, o planeta agradece!

Não pegue em folhetos turísticos desnecessariamente

É uma tendência natural chegar a um aeroporto e pegar em mapas gratuitos e outros folhetos (no aeroporto do Porto, por exemplo, há sempre alguém a distribuir mapas em papel patrocinados pelo El Corte Inglés). Tal como é natural entrar numa agência de viagens local e levar folhetos para “ler com calma” mais tarde.

O problema é que a maioria das vezes a informação nem é assim tão útil; e é um desperdício de recursos. Pior do que isso, depois de lidos por si os papéis vão parar ao lixo (ou, na melhor das hipóteses, serãoo reciclados), ainda que pudessem eventualmente ser úteis a outros viajantes. Já pensou no desperdício que isso representa?

Tal como os plásticos de utilização única, também o uso de folhetos promocionais, quase sempre de utilização única, deveria ser repensado.

Não imprima os bilhetes de avião nem os cartões de embarque

Numa época em que boa parte das companhias aéreas permite o check-in online e o envio dos respetivos cartões de embarque via email (ou para leitura em aplicações como o Wallet), poucas vezes é necessário imprimir os cartões de embarque. Evite fazê-lo. Gasta-se menos papel.

Da mesma forma, não imprima os bilhetes de avião propriamente ditos. Se tiver de fazer o check-in presencial, no aeroporto, basta levar a identificação e, por segurança, o código da reserva (um código com 6 letras e algarismos que faz parte de todas as reservas).

O mesmo se aplica às reservas de hotéis. Se usa o booking, por exemplo, instale a respetiva app no seu smartphone e terá as reservas sempre disponíveis.

Tenha cuidado com a forma como utiliza a água

A água é um bem escasso. E é importante nunca esquecer esse facto. Seja no duche, na piscina do resort ou na hora de colocar as toalhas do hotel para lavar. Também neste aspeto, seja um viajante consciente. Porque o problema da água é muito sério.

Sabia, por exemplo, que há resorts que consomem quantidades desmesuradas de água em ambientes onde as populações têm dificuldades no acesso a água potável? Tenha isso em conta na hora de reservar hotel para as próximas férias.

Não desperdice comida

Se as porções forem demasiado grandes e sobrar comida às refeições, não deite fora. Peça para levar as sobras e aqueça numa próxima refeição (muito fácil se estiver hospedado num apartamento ou hostel com cozinha) ou ofereça a alguém que necessite. Qualquer das opções é melhor do que deitar comida boa ao lixo.

Coma menos carne

Não só em viagem, como na sua própria casa, reduza a quantidade de carne vermelha que consome. É sabido que a criação de gado – nomeadamente bovino – é um dos principais problemas ambientais da atualidade. Não só pela contínua deflorestação na busca de terrenos de pastagem, mas também pela enorme quantidade de água necessária para produzir a carne (estima-se que sejam necessários pelo menos 15 mil litros por cada quilo de carne bovina produzido).

Note que não precisa de se tornar vegetariano; basta reduzir o número de vezes que consome carne de vaca e de porco (esta última, uma indústria muito poluente).

Contribua para a economia local

Sempre que possível, use empresas locais em detrimento das grandes multinacionais. Isso aplica-se aos hotéis onde dorme, por exemplo. Escolha pequenas guesthouses familiares em detrimento das grandes cadeias, onde o dinheiro raramente fica nas populações locais.

Mas não só. Por exemplo, contrate excursões com agências da região; escolha restaurantes locais em vez dos franchising internacionais; prefira mercearias locais ao 7 Eleven; e, acima de tudo, tenha a consciência de que muitas vezes a maior parte do lucro resultante do turismo não fica na comunidade.

No fundo, tenha consciência que as suas escolhas importam. E que o turismo sustentável passa por estas pequenas opções.

Não pactue com abusos a animais

Passeios no dorso de elefantes, espetáculos com animais adestrados, fazer festas em tigres, aves de rapina presas com correntes para a fotografia. Exemplos – apenas isso – que servem para ilustrar o quão importante é ser um viajante consciente na hora de lidar com animais selvagens em cativeiro. Não entre nesse jogo.

Não toque nos animais selvagens

Assistir à desova de tartarugas é uma experiência fascinante, tal como estar com gorilas de montanha, mergulhar com golfinhos, fazer snorkelling com tartarugas ou nadar com tubarões-baleia.

Seja como for, por mais dóceis – como os golfinhos – e lentos – como as tartarugas – que possam ser os animais, resista à tentação de lhes tocar. Respeite a vida selvagem. Por alguns segundos de prazer, pode estar a transmitir aos animais doenças potencialmente devastadoras.

Não alimente peixes (nem os outros animais)

Do Brasil ao Irão, passando pelo Sudeste Asiático, vi demasiadas vezes guias e turistas a atirarem pão e outros alimentos aos peixes, por forma a atraí-los para a proximidade da embarcação – para gáudio dos turistas. Não compactue com essa barbaridade, que altera o comportamento normal das espécies e as torna dependentes do homem e, por isso mesmo, mais vulneráveis. Certo dia, escrevi o seguinte numa reportagem sobre o litoral de Alagoas.

Uma vez chegados às piscinas naturais [de Maragogi] e assim que as âncoras se enterram nas areias do fundo do mar, os turistas são confinados a um pequeno círculo de mar delimitado por bóias amarelas. Há guias turísticos a gritar e a apitar sonoramente, uma multidão de gente que se acotovela na água, o tempo contado ao minuto, o marketing associado ao passeio alugando e vendendo de tudo um pouco (espetinhos de carne e queijo assados, bebidas e cocktails, fotografia subaquática, aluguer de máscaras e snorkels). O que se vê do convés do barco, olhando para todas as cabeças que quase cobrem as águas de preto, castanho e loiro, não é bonito de se ver.

Se se preocupa com a sustentabilidade do turismo, não seja conivente!

Não roube “lembranças” (respeite a cultura e a Natureza)

Quando liderava viagens ao Irão para a agência Nomad, ao entrarmos em mesquitas era normal alguns viajantes se sentirem tentados a trazer uma turbah – pequenas peças de cerâmica, regra geral redondas ou hexagonais, usadas pelos muçulmanos para colocar a cabeça nas orações. Sempre que me apercebia, não deixava. “Mas há tantas…”, respondiam-me. Sim, mas é uma questão de respeito. Além de que, se todos os viajantes começarem a tirar as turbah das mesquitas, qualquer dia proíbem-nos de entrar nelas. E com razão.

O mesmo se aplica a pedras e outros objetos naturais que muitos viajantes trazem das suas viagens “como recordação”. Não faça isso. Pense assim: se toda a gente levar para casa uma pedrinha vulcânica do vulcão dos Capelinhos, no Faial, como ficará a paisagem? Turismo sustentável é também respeitar os lugares.

Seja respeitoso na hora de fotografar

Se há imagem que me choca é ver um grupo de meia dúzia de turistas de máquinas fotográficas apontadas à cara de uma criança, sem qualquer interação, sem qualquer respeito pelo menor, como quem “rouba” um momento sem dar nada em troca. E o mesmo se aplica à generalidade dos seres humanos, mas especialmente comum não só com as crianças mas também com tribos ou minorias étnicas visualmente apelativas.

Eu vivo da escrita e da fotografia de viagens, mas tenho por princípio não ultrapassar essa linha; interagir com as pessoas; saber o seu nome; e, sempre que possível, pedir permissão para fotografar. Nem sempre acontece, é certo, mas uma coisa posso garantir: assim que vejo muita gente a “disparar” sobre um indivíduo sem sequer lhe dirigir a palavra, sou o primeiro a abdicar da foto. Porque valores mais altos se levantam!

Leia também uma reflexão sobre fotografar pessoas.

Não dê esmolas a crianças

Estou consciente que este é um assunto delicado, mas julgo ser importante não contribuir para o aumento da mendicidade; especialmente entre as crianças. Bem sei que é difícil ignorar um pedido de dinheiro se vindo de uma criança, mas lembre-se que em muitos lugares as crianças são usadas como “mendigos profissionais”, porque é mais rentável do que as deixar ir à escola. O mesmo se aplica às crianças que o abordam na rua vendendo pequenas coisas como lenços de papel.

Em casos extremos, como naqueles retratados pelo fotógrafo Mário Cruz no seu magnífico trabalho Talibes, as crianças são inclusive tratadas como escravos. Mesmo não sendo essa a norma, esteja atento.

Dito isto, se quer mesmo fazer a diferença, contacte organizações não governamentais bem estabelecidas no local que visita, e canalize a sua ajuda diretamente para essas organizações. Por último, se não consegue mesmo ignorar um pedido de ajuda infantil, ofereça comida em vez de dinheiro.

Turismo sustentável: aceita o desafio?

Como é evidente, esta não é uma lista exaustiva daquilo que pode fazer para ser um viajante mais consciente. Há muito mais que cada um de nós pode fazer. Não pretende também ser um texto moralista – até porque eu próprio tenho muito a melhorar em nome do turismo sustentável. Mas são bons princípios para seguir em todas as viagens.

Vamos todos fazer um esforço?

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Filipe Morato Gomes

Autor do blog de viagens Alma de Viajante e fundador da ABVP - Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, já deu duas voltas ao mundo - uma das quais em família -, fez centenas de viagens independentes e tem, por tudo isso, muita experiência de viagem acumulada. Gosta de pessoas, vinho tinto e açaí.