
Hoje, na série de portugueses pelo mundo, vamos até São Paulo, a mega-metrópole do Brasil, pela mão do Marco Freire. O Marco é gestor e está a viver em São Paulo há quatro anos. Convidei-o a partilhar connosco as suas sugestões de dicas com o melhor de Sampa, incluindo o celebrado Parque Ibirapuera, um dos seus locais preferidos da capital paulista.
É um olhar diferente e mais rico sobre São Paulo – o de quem vive por dentro o dia-a-dia da cidade, estando simultaneamente fora da sua “zona de conforto”, deslocado, como acontece a todos os viajantes. Este é o 26º post de uma série inspirada no programa de televisão “Portugueses pelo Mundo”.
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Em São Paulo, com o Marco Freire (entrevista)
- Define São Paulo numa palavra.
- Sampa ou São Paulo?
- São Paulo é uma cidade boa para viver? Fala-nos das expectativas que tinhas antes de chegar, e se a realidade que encontraste bateu certo com a ideia preconcebida que trazias.
- É verdade que é preciso tempo para aprender a gostar de São Paulo?
- E o que mais te marcou em São Paulo?
- Como caracterizas os paulistanos?
- E o que é essa “coisa” que acontece no coração quando se “cruza a Ipiranga e a Avenida São João”?
- Como terminarias esta frase: “Não podem sair de São Paulo sem…”
- Quanto ao turismo, vamos tentar fazer um roteiro de 3 dias em São Paulo. Indica-nos as coisas que, na tua opinião, sejam “obrigatórias” ver ou fazer.
- O Brasil está-se a tornar um destino muito caro, em especial nas grandes cidades como São Paulo, mas com certeza sabes alguns truques e dicas para se poupar dinheiro. Conta-nos.
- Falemos de comida. Que especialidades gastronómicas temos mesmo de provar?
- Imagina que queremos experimentar comidas locais. Gostamos de tascas, botecos, lugares tradicionais com boa comida e se possível barato. Onde vamos jantar?
- E se um viajante estiver mesmo, mesmo com saudades de Portugal, por onde deve passar? (onde é que tu matas saudades?)
- Falemos de diversão. O que sugeres a quem queira sair à noite em São Paulo?
- Escolhe um café e um museu.
- Uma das decisões críticas para quem viaja é escolher onde ficar. Em que bairro nos aconselhas a procurar hotel em São Paulo?
- Tens alguma sugestão para quem quiser fazer compras em São Paulo?
- Antes de te despedires, partilha o maior “segredo” de São Paulo; pode ser uma loja, um barzinho, um restaurante, um parque, uma galeria de arte, algo que seja mesmo “a tua cara”.
- Guia prático
Em São Paulo, com o Marco Freire (entrevista)
Define São Paulo numa palavra.
Diversidade. Enquanto escrevo este texto, ouço pássaros na minha varanda e vejo do meu 5º andar uma encosta onde predominam pequenas casas, rodeadas de uma vegetação densa e verde.
Esta não é a São Paulo do imaginário geral, das grandes avenidas comerciais e de escritórios, mas é uma São Paulo onde se pode encontrar, paradoxalmente, tranquilidade, vida de bairro, onde podemos ser tratados pelo nome na padaria e no quiosque – e isto a 10 minutos das avenidas de escritórios.
Hoje [no dia em que o Marco respondeu às perguntas] é feriado de Tiradentes, evocativo da Inconfidência Mineira, uma revolta ocorrida no séc. XVIII contra a coroa portuguesa, que teve entre as suas causas o aumento dos impostos. A coroa pretendia cobrar 100 arrobas de ouro de impostos, independentemente da produção. Com a queda da produção em Minas Gerais, o imposto chegou, em algumas regiões, alegadamente, a 100% da produção… “some things never change”!
Sampa ou São Paulo?
Tem dias… também a cidade tem vários nomes e personalidades.
São Paulo é uma cidade boa para viver? Fala-nos das expectativas que tinhas antes de chegar, e se a realidade que encontraste bateu certo com a ideia preconcebida que trazias.
Sem dúvida. Acho uma cidade magnífica e inesgotável em termos de propostas, em qualquer fase da vida.
A primeira vez que me mudei para São Paulo, em 2007, vinha com umas dicas de amigos que tinham vivido cá e uns 500 emails com alertas sobre a insegurança e criminalidade. A verdade é que, após a adaptação inicial ao trânsito, calor e a um certo caos, fui descobrindo os encantos e me apaixonei pela cidade.
É verdade que é preciso tempo para aprender a gostar de São Paulo?
Acredito que sim. A cidade não conquista por uma especial beleza, embora tenha lugares belos. O que salta mais ao olhar desarmado é um urbanismo algo desordenado (embora varie entre os diferentes bairros) e um trânsito muito intenso, de uma cidade de 12 milhões de habitantes, que cresceu muito rapidamente e não conseguiu acompanhar com infraestruturas, sobretudo de mobilidade urbana.
E o que mais te marcou em São Paulo?
A tal diversidade.
Se juntarmos umas dezenas de paulistanos ao acaso teremos sobrenomes portugueses, italianos, espanhóis, japoneses, polacos (poloneses, como se diz por cá), libaneses, alemães, arménios, enfim…
Ando bastante de táxi e às vezes proporciona-se uma conversa sobre as origens dos sobrenomes. Tenho conhecido histórias fantásticas de gente cujos pais ou avós fugiram da guerra e da fome na Europa e acabaram por vir adicionar a sua peça neste mosaico humano tão rico e variado.
Como caracterizas os paulistanos?
Acho realmente difícil fazer uma caracterização genérica, depois do que falámos sobre a diversidade. Tive a sorte de conviver com pessoas de diferentes origens, culturais, socioeconómicas, etárias e posso dizer que são pessoas abertas e habituadas a conviver com todas estas diferenças.
Evidentemente, as assimetrias conhecidas, sobretudo no que respeita ao poder económico, marcam também as relações. Mas isso seria assunto para estudo bem mais detalhado, que não caberia aqui.
E o que é essa “coisa” que acontece no coração quando se “cruza a Ipiranga e a Avenida São João”?
Caetano escreveu essa música nos anos 60 quando, vindo do nordeste, cruzava essas avenidas e sentia o cruzamento das culturas, o poder da riqueza versus a miséria de quem vive nas favelas, a “dura poesia concreta das esquinas”. Nessa época, a cidade deveria ter cerca de 3 milhões de habitantes. Hoje tem 12 milhões, portanto dá para imaginar quantos mais cruzamentos geográficos e sentimentais por aqui se ensaiaram.
Para mim essa “coisa” pode acontecer ao passear um sábado por Higienópolis, bairro com forte presença de judeus ortodoxos, com os seus trajes a caminho da Sinagoga e em seguida ir ao cinema na Rua Frei Caneca, onde se concentra a comunidade GLS. Este é um exemplo de um cruzamento que se pode fazer no mesmo dia: é só atravessar uma avenida.
Como terminarias esta frase: “Não podem sair de São Paulo sem…”
… ver o anoitecer no Terraço Itália – bar e restaurante situados no 41º andar do Edifício Itália, com uma das vistas noturnas mais belas de São Paulo. Fica bem perto do Edifício Copan, outro marco arquitetónico da cidade.
Ambos os edifícios sofreram alguma degradação durante as últimas décadas, mas vêm sendo alvo de maior atenção e recuperação, compatíveis com a dignidade destes locais que curiosamente (ou não), ficam na Avenida Ipiranga.
Quanto ao turismo, vamos tentar fazer um roteiro de 3 dias em São Paulo. Indica-nos as coisas que, na tua opinião, sejam “obrigatórias” ver ou fazer.
Entre muitas alternativas, sobretudo culturais e gastronómicas, selecionaria:
- Caminhar pelo Bairro dos Jardins e Av. Paulista
- Almoçar no Figueira Rubayat
- Visitar a Pinacoteca
- Visitar o centro da cidade (Sé, Teatro Municipal e Pátio do Colégio)
- Passear pelo parque Ibirapuera
- Ir ao Teatro
- Brunch nos Bairros de Moema ou Vila Madalena
- Assistir a um concerto na Sala São Paulo
- “Tomar um drink” no Skye (bar do Hotel Unique, outro local com uma vista fantástica do skyline de São Paulo)
- Visitar o Bairro do Morumbi, com paragem na Fundação Maria Luisa e Óscar Americano
- Fazer um percurso noturno pela Marginal Pinheiros, admirando o skyline da cidade
- Assistir a corridas de Cavalos no Jockey Club
- Passear pela Rua Óscar Freire
Leia também a reportagem Sampa, a mil, na cidade que nunca dorme e o meu roteiro cultural em São Paulo.
O Brasil está-se a tornar um destino muito caro, em especial nas grandes cidades como São Paulo, mas com certeza sabes alguns truques e dicas para se poupar dinheiro. Conta-nos.
Apesar da mediatização da insegurança, o metro na zona sul (onde se encontram os maiores pontos de interesse) é bastante seguro. Pena é que a capilaridade da rede não seja a melhor.
A cidade torna-se muito cara nos capítulos hotelaria e restauração, pelo que o viajante low budget terá que encontrar aqui os melhores equilíbrios. Algumas redes de hotéis low cost estão presentes e a diversidade de botecos e restaurantes permite alternativas para todos os orçamentos.
Falemos de comida. Que especialidades gastronómicas temos mesmo de provar?
Um capítulo onde mais uma vez a diversidade é extraordinária. Ao nível (ou acima) de qualquer grande metrópole. Para todo o tipo de gosto e orçamento:
- Comer uma sanduíche de mortadela no Mercado Municipal
- Comer uma coxinha de frango com queijo catupiry
- Pizza. Os paulistanos orgulham-se de ter elevado a pizza a níveis superiores (há rivalidades com a original italiana e já ocorreu algum “incidente diplomático” com este assunto…)
- Feijoada de quarta-feira ou sábado
- Sushi
Imagina que queremos experimentar comidas locais. Gostamos de tascas, botecos, lugares tradicionais com boa comida e se possível barato. Onde vamos jantar?
Existem pela cidade vários locais com cozinha tradicional, das especialidades de boteco ou feirinha. As mais conhecidas são as coxinhas, o pastel acompanhado com caldo de cana, a carne seca e as carnes grelhadas na chapa. Da cozinha nordestina à de Minas Gerais, da Amazónia a Santa Catarina, a culinária tradicional está bem representada.
Sugiro os Bairros de Vila Madalena e Pinheiros. É possível encontrar propostas com preços honestos.
Não resisto, no entanto, a recomendar aquele que é, para mim, o melhor lugar para conhecer comida tradicional brasileira, com especial dedicação à culinária sertaneja: Mocotó. Já ganhou prémio de “Bom e Barato” nas mais variadas revistas, pelo que hoje mantém a qualidade, mas os preços já não são o que foram no passado. Longe de tudo, demasiado na moda, mas ainda assim “the best”!
E se um viajante estiver mesmo, mesmo com saudades de Portugal, por onde deve passar? (onde é que tu matas saudades?)
Pessoalmente, se tiver vontade de uma especialidade de cozinha portuguesa, prefiro comprar os ingredientes no Mercado Municipal e cozinhar em casa. Existem no entanto muitas opções de restaurantes com culinária portuguesa. Destaco nos mais tradicionais, o Alfama dos Marinheiros e o Ora Pois. No registo sofisticado, o Bela Sintra.
Para um turista em São Paulo, aconselho a que se deixe de saudades e se delicie com as 1001 opções, dos botecos às temakerias e alta gastronomia. Minhas sugestões, subjetivas por natureza:
- Dalva e Dito, do Chef Alex Atala, muito falado em Portugal recentemente
- Sal Gastronomia
- Pizzaria Veridiana
- Carlota
- JAM – Japanese Food, Arts & Music
Falemos de diversão. O que sugeres a quem queira sair à noite em São Paulo?
Para um ambiente descontraído, recomendo os bares de Vila Madalena ou Rua Augusta. Quanto a clubes (baladas), dependendo dos orçamentos: o Disco ou o Mynt Lounge.
Conheça a Vila Madalena.
Escolhe um café e um museu.
Faltou falar de uma coisa muito especial em São Paulo que é a “cultura de padaria”. A função do café é em larga medida preenchida pelas padarias, muitas delas fundadas por portugueses e que evoluíram para um misto de padaria e loja gourmet. Algumas disponibilizam refeições tipo buffet (muito típico em Sampa) e até sushi…
A melhor padaria é a que fica junto de nossa casa e onde já conhecem os nossos gostos. Para alguém de visita, recomendo a Santa Etienne ou Galeria dos Pães (esta última, aberta 24 horas e, portanto, uma excelente opção para quem quiser “cair na balada”).
Em relação a museus, como já referi minha favorita é a Pinacoteca, a segunda opção é o icónico MASP, situado na Avenida Paulista, desenhado nos anos 60 pela arquiteta Lina Bo Bardi e que foi na época considerado o maior vão livre da América Latina. Quem visita São Paulo, deve estar preparado para ouvir com frequência a expressão “o maior da América Latina”. Por motivos óbvios… e para grande orgulho dos paulistanos!
Veja o artigo sobre os melhores museus de São Paulo.
Uma das decisões críticas para quem viaja é escolher onde ficar. Em que bairro nos aconselhas a procurar hotel em São Paulo?
A cidade é muito extensa, mas os principais pontos de interesse concentram-se na zona sul. A região dos Jardins e da Av. Paulista apresentam muitas opções.
Veja também o artigo sobre onde ficar em São Paulo.
Tens alguma sugestão para quem quiser fazer compras em São Paulo?
Para produtos importados os preços são cerca de 50% acima do que podemos encontrar em Portugal, pelo que a ida ao shopping tende a ser pouco interessante do ponto de vista económico. Para artesanato, arte ou bric-à-brac, Vila Madalena.
Antes de te despedires, partilha o maior “segredo” de São Paulo; pode ser uma loja, um barzinho, um restaurante, um parque, uma galeria de arte, algo que seja mesmo “a tua cara”.
Diferentes momentos da vida trazem à memória diferentes lugares de São Paulo. Estou atualmente numa fase de privilegiar o contacto com a natureza (parece paradoxal, vivendo em São Paulo…), pelo que vou escolher algo que partilho com muitos paulistanos: o prazer de uma corrida no Parque Ibirapuera, entre skateboarders, lagos, paisagismo de Burle Marx e arquitetura de Niemeyer!
Obrigado, e até uma próxima viagem a São Paulo.
Guia prático
Hospedagem em São Paulo
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Seguro de viagem
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Leia os relatos de outros Portugueses pelo Mundo - os seus testemunhos sobre viver no estrangeiro são de uma riqueza extraordinária.
Outros destinos a visitar no Brasil
Se está a pensar visitar São Paulo, talvez tenha interesse em saber um pouco mais sobre o que ver e fazer noutras cidades, ilhas e destinos turísticos do Brasil.
Arraial d’Ajuda・Belém do Pará・Belo Horizonte・Cabo de Santo Agostinho・Caraíva・Costa do Descobrimento・Fernando de Noronha・Ilha do Marajó・Lençóis Maranhenses・Macapá・Manaus・Olinda・Parintins・Porto Seguro・Recife・Salvador・Trancoso (Bahia)
Acrescento à lista de visitas obrigatórias em São Paulo, o maravilhoso Museu da Língua Portuguesa. Maravilhoso mesmo! Imperdível!