Breve história do Alma de Viajante
Custa a acreditar que foi há tanto tempo, mas faz agora 20 anos que comecei este Alma de Viajante. No dia 19 de janeiro de 2001 registei o domínio fmgomes.com (de Filipe Morato Gomes) e, um mês depois, por altura do meu trigésimo aniversário, ocorrido a 25 de fevereiro de 2001, estava a colocar online os primeiros artigos, fotografias e reportagens num site muito amador a que chamei… Alma de Viajante.
A homepage tinha o seguinte aspeto:
ESTADOS DE ALMA
VIAJAR é um prazer, ESCREVER é um estado de alma, FOTOGRAFAR é uma paixão. Juntos, os três verbos formam a Alma de Viajante e este é o seu recanto na rede global. O recanto onde se junta a paixão de fotografar pessoas, culturas e lugares, a sede de escrever sobre tudo e sobre nada e a magia de descobrir o que o imenso planeta tem de belo e diferente.
Alma de Viajante não é mais do que uma partilha de momentos. De opiniões. Partilha de emoções e vivências. Umas publicadas, todas por prazer. O prazer pelo prazer. É um projeto pessoal esperançadamente sempre incompleto. Mas cada vez menos. Porque outras viagens se seguirão, outros negativos haverá para revelar, muitas letras para agrupar. Com alma. Com calma.
Fica o desejo de que sinceramente gostem de percorrer este espaço.
Ainda hoje, 20 anos volvidos, me identifico com as palavras então escritas.
No interior do Alma de Viajante havia apenas três ou quatro reportagens de viagens, entre as quais uma sobre as ilhas Maurícias, publicada meses antes na revista Fugas com o título Maurícias, aguarela no Índico (na época, nenhuma revista de viagens portuguesa tinha presença online).
Havia ainda opiniões sobre hotéis, galerias fotográficas e reviews de sites de viagens que escrevia para o Público numa rubrica chamada Olhares na Web; e, para terminar, um emotivo poema dedicado a Timor Lorosae, chamado Lágrima (escrito em Vila Chã, a 4 de junho de 1999).
O mar trouxe-me uma lágrima Numa onda cor de paz Embrulhada em salpicos De um naufrágio de ilusões A cada gota de água Transmitiu sua tristeza Inundando o oceano Com amargas emoções Viu uma gaivota voar E escolher o seu destino Ambicionou umas asas E os sonhos de criança
Viu uma alga flutuar Ao sabor livre da maré Ambicionou sua cor Sentiu ventos de esperança Um dia hei-de lá ir Ao outro lado do mundo Abraçar o crocodilo Que em terra se transformou Um dia hei-de chorar Lágrimas de alegria E devolver ao crocodilo A lágrima que um dia soltou
Assim era a primeira versão do Alma de Viajante.
Nessa altura, não havia ainda o conceito de blog. O sistema Movable Type apareceu no final desse ano de 2001 e o WordPress apenas em 2003. As páginas eram estáticas; e, do design à programação html, passando naturalmente pelos textos e fotos das viagens, tudo era integralmente feito à mão.
Em 2004, por altura da minha primeira volta ao mundo, decidi adaptar o Alma de Viajante e partilhar a viagem de 14 meses num formato totalmente inspirado no Vagabonding, que retratava precisamente uma volta ao mundo levada a cabo pelo norte-americano Mike Pugh e que, nesse tempo, era o melhor travelogue que eu conhecia (travelogue era como se chamavam então os atuais blogs de viagem). Foi aí que o Alma de Viajante assumiu pela primeira vez a forma de um travelogue / blog de viagens.
Tudo isso numa época em que as máquinas fotográficas digitais davam os primeiros passos; em que era preciso ir com uma pen a cibercafés públicos para enviar as reportagens, atualizar o blog e responder aos comentários dos leitores (que perdi, entretanto, numa remodelação do blog).
Tempos em que os guias da Lonely Planet eram os melhores amigos do viajante; em que se interpelavam os transeuntes em vez de se usar o Google Maps; e em que, nos hostels, as pessoas conversavam.
Duas décadas.
Um caminho recheado de altos e baixos. Épocas de muitas viagens e outras totalmente caseiras; períodos de grande sucesso e outros de enorme frustração. Felizmente, sempre acreditei. Mesmo nas épocas mais difíceis, mantive a paixão de contar histórias sobre lugares e pessoas, de partilhar vivências, de inspirar outros a explorar o mundo, a descobrirem-se e a serem mais felizes.
Hoje, tanto tempo depois, sinto uma pontinha de orgulho pelo caminho feito, pelas pessoas que inspirei, pelos viajantes que ajudei. E estou imensamente grato por tudo o que o Alma de Viajante me proporcionou.
Ora, na impossibilidade de celebrar fisicamente com amigos, leitores e companheiros de viagens, serve este texto para assinalar esta data redonda, em jeito de celebração confinada.
Brindemos à paixão, à perseverança, aos sonhos concretizados e à tecnologia que permitiu a tantas pessoas a oportunidade de trabalharem online e serem felizes em qualquer canto do mundo.
Agradeço a cada um dos leitores que já passou pelo Alma de Viajante; aos que me enviam mensagens de incentivo, aos que me fazem saber o quanto algum texto – inspiracional ou com dicas práticas – os ajudou, aos que me enviam sugestões para o blog.
Em clima de celebração, partilho, pois, uma seleção com as experiências de viagem mais marcantes que vivi ao longo dos tempos. Espero que gostem.
Caso tenha curiosidade, veja a história completa do Alma de Viajante.
Alguns momentos e locais marcantes das minhas viagens
Para assinalar os 20 anos do Alma de Viajante, ocorreu-me ir ao baú das memórias e recordar algumas das experiências mais marcantes que vivenciei em viagem.
São momentos que ficaram para sempre gravados na memória, seja pela tensão emotiva da experiência, pelas pessoas que conheci ou pelo deslumbramento do momento. Assim, de mergulhos subaquáticos à convivência com gorilas de montanha, passando pelo devastador tsunami de 2004 ou pela beleza indescritível de glaciares e vulcões em erupção, eis uma seleção de grandes experiências que fui vivendo ao longo dos tempos.
Junto ainda uma lista de grandes cidades que me apaixonaram (apesar de preferir lugares pequenos); mercados que recordo com saudade; e um conjunto de museus difíceis de encarar e de onde saí profundamente emocionado.
São seleções subjetivas e, com grande probabilidade, ter-me-ei esquecido de outros lugares e momentos. Mas vamos a isso.
Artigos que fazem parte da história do blog
Não é fácil destacar uns artigos em detrimento de outros. Boa parte deles retrata momentos irrepetíveis em viagem e transporta memórias pelas quais nutro grande carinho. Ainda assim, há alguns que julgo valer a pena destacar pela importância que tiveram ou pelo bom uso que os leitores lhes deram.
A terminar este post, em jeito de celebração de 20 anos de blog, eis, pois uma seleção de alguns dos textos mais emblemáticos, bem sucedidos ou simbólicos publicados ao longo destes anos no Alma de Viajante.
O início
A primeira grande reportagem que vendi a uma revista, sobre as Maurícias; e a primeira crónica de viagem da volta ao mundo que mudou a minha vida.
Reflexões e artigos inspiracionais mais apreciados
Eis algumas reflexões e artigos vincadamente inspiracionais publicados ao longo dos tempos e muito acarinhados pelos leitores do blog.
Roteiros mais acarinhados pelos leitores
Eis alguns exemplos de artigos de enorme sucesso no Alma de Viajante, seja porque de facto estão bem conseguidos e são úteis aos leitores, seja porque os destinos abordados têm grande procura entre os viajantes portugueses e brasileiros; ou ainda porque os motores de busca decidiram valorizá-los.
Dicas de viagem mais populares
Por vezes publico também artigos com dicas de viagem que não têm que ver especificamente com um destino. Eis alguns dos mais apreciados.
O sucesso mais inesperado…
Em jeito de curiosidade, eis a maior surpresa que tive em 20 anos como blogger de viagens. Trata-se de um post muito simples que contém uma lista de produtos naturais que encontrei à venda numa ervanária de Belém do Pará, e que partilhei apenas por me parecer curiosa.
Estava longe de imaginar que se iria tornar num dos artigos mais lidos e comentados pelos leitores brasileiros – um sucesso totalmente inesperado e difícil de entender.
… e o exemplo de um fiasco
Não raras vezes, decidi investir tempo a criar algo que considerava útil para os leitores, na esperança de que o artigo fosse visto e recomendado; para depois chegar à conclusão que, por algum motivo, o dito não teve qualquer sucesso.
Tenho alguns exemplos desse género, e aqui deixo um dos mais curiosos: um roteiro cultural em São Paulo que fiz com grande empenho, mas que praticamente não tem visitas. É a prova de que nunca se sabe quando um artigo vai ser bem aceite (pelos leitores ou pelo Google).
E agora?
Com tudo isto fica a conhecer um pouco melhor a história do Alma de Viajante. “E agora?”, perguntar-me-á.
Perguntam-me muitas vezes se quero continuar a fazer disto vida “para sempre”, e por vezes dou comigo a refletir sobre esse assunto. E a verdade é que não sei.
No regresso da minha primeira volta ao mundo, levada a cabo após perder o emprego que tinha na área do multimédia, decidi que, enquanto fosse possível, queria viver das viagens, da escrita e da fotografia. Hoje, mantenho exatamente a mesma posição, acrescentando apenas ao rol de condições (“enquanto for possível”) a minha vontade. Enquanto for financeiramente viável e eu tiver prazer naquilo que faço, continuarei; quando uma ou ambas deixarem de ser verdade, vou fazer outra coisa qualquer. Sem dramas.
Por enquanto, mantenho a firme vontade de continuar. Apesar de ser blogger nos dias de hoje ser muito diferente de há uns anos, ainda não me cansei de viajar, de partilhar essas experiências, de inspirar outras pessoas a fazerem-se à estrada, a descobrirem-se e a serem mais felizes. E, enquanto assim for, cá estarei de corpo e alma.
Até porque tenho uma enorme lista de viagens que quero fazer nos próximos anos:
- Paquistão
- Iémen
- Pamir Highway (Quirguistão, Tajiquistão)
- Ladakh (Índia)
- Mustang (Nepal)
- Butão
- Bangladesh
- Nagaland (Índia)
- Sudão
- Etiópia
- Mali e Burkina Faso
- Guiné-Bissau
- Ilhas Comores
- Malawi, Zâmbia e Zimbabué
- Taiwan
- Sulawesi, Togean e Raja Ampat (Indonésia)
- Caminho Português de Santiago
- Yukon (Canadá)
- Gronelândia
- Kamchatka (Rússia)
- Ilhas Lofoten e Svalbard (Noruega)
- Capadócia (Turquia)
- Equador
- Patagónia
- Antártida
Gostava de começar por locais como o Paquistão, o Iémen, o Ladakh indiano, o Nepal ou a Patagónia; mas se há coisa que os últimos tempos me ensinaram é que não vale a pena fazer grandes planos. O vento encarregar-se-á de me empurrar para os próximos destinos.
Mais uma vez, obrigado por estar desse lado.
E venham mais vinte!