Aldeia recentemente elevada a coqueluche do turismo do Alto Minho, a região de Sistelo tem a particularidade de oferecer paisagens pouco comuns em território nacional. Falo dos seus incríveis socalcos.
Os socalcos de Sistelo foram criados para favorecer a agricultura de subsistência em terrenos difíceis, sendo por isso um símbolo da convivência secular entre Homem e Natureza – um pouco à imagem das paisagens do Douro vinhateiro, moldadas por mão humana ao longo dos séculos. Neles se produz milho, feijão e batata, e ainda forragens e pastagens para alimentação animal. São absolutamente fabulosos.
Vou, pois, tentar partilhar um pouco deste fascínio, mas com espírito crítico para dizer com frontalidade o que não me parece tão positivo. Vale o que vale! Vamos a isso.
- 1 Peço desculpa, mas Sistelo não é “o pequeno Tibete português”
- 2 Os desafios do turismo em excesso
-
3
O que ver e fazer em Sistelo (a minha experiência)
- 3.1 Largo Visconde de Sistelo
- 3.2 Casa do Castelo de Sistelo
- 3.3 Espigueiros
- 3.4 Igreja Matriz do Sistelo
- 3.5 Passear pelos Passadiços de Sistelo (PR25 AVV)
- 3.6 Fazer o Trilho dos Socalcos de Sistelo (PR14 AVV)
- 3.7 Fazer o Trilho das Brandas de Sistelo (PR24 AVV)
- 3.8 Fazer o Trilho do Miradouro da Estrica (PR27 AVV)
- 3.9 Ir ao Miradouro dos Socalcos (Porta Cova)
- 3.10 Visitar a Branda do Alhal
- 4 Dicas para usufruir da aldeia de Sistelo com menor impacto negativo
- 5 Guia prático
Peço desculpa, mas Sistelo não é “o pequeno Tibete português”
Quando publiquei esta foto no Instagram, tirada no chamado Miradouro dos Socalcos, escrevi o seguinte:
“Não exagero se disser que esta foi das paisagens mais bonitas que vi em Portugal nos últimos tempos. Com alguma sorte, o momento foi perfeito: o céu estava carregado de nuvens que dançavam ao sabor do vento contra o céu azul, fazendo com que a paisagem mudasse a cada instante com a luz e as sombras em constante movimento. E ali fiquei tempos infinitos, no pequeno miradouro a caminho do lugar de Porta Cova, a apreciar os socalcos de Sistelo”.
Que fique, pois, bem claro: adoro a paisagem dos socalcos de Sistelo. Mas, infelizmente, está a ser vítima do turismo em excesso.
Primeiro, foi a fantástica Ecovia do Vez e a construção dos chamados Passadiços de Sistelo que colocaram a aldeia no mapa turístico do Alto Minho. Depois, a aldeia de Sistelo foi elevada a Monumento Nacional, enquanto “paisagem cultural evolutiva viva”. Por fim, o mediatismo do epíteto “o pequeno Tibete português” que, por algum motivo que a razão desconhece, pegou de estaca nas redes sociais, em blogs de viagens e até em alguma imprensa dita de referência. Nunca compreendi o absurdo de lhe chamarem tal coisa (a paisagem do Alto Minho nada tem a ver com a do Tibete!) – mas a verdade é que, em termos de marketing turístico, resultou na perfeição.
Os desafios do turismo em excesso
As consequências foram novas oportunidades económicas para os habitantes, fundamentais para o desenvolvimento local num território onde as mesmas não abundam; mas também um desencontro crescente entre a procura turística e a capacidade de carga do destino.
Nos feriados de junho 2020, por exemplo, o cenário era “assustador”, com a aldeia de Sistelo a ser “invadida por uma multidão” e “gente a fazer fila para entrar na Ecovia do Vez pela Ponte de Vilela”. As palavras são de um habitante local que depende profissionalmente do turismo, e não foram proferidas com alegria. Aparentemente, algo precisa de ser feito para devolver o equilíbrio a Sistelo.
Nos Passadiços do Paiva, por exemplo, foi introduzido um sistema de reservas, pagas, com controlo do número diário de visitantes. Será esse o caminho para Sistelo, os seus passadiços e quem sabe até os miradouros com vista para os socalcos? Não sei; mas, lá está, algo precisa de ser feito…
Dito isto, deve visitar Sistelo? Eu acredito que sim. Mas faça-o de uma forma consciente e, se me permite, apenas no caso de ter genuíno interesse em ambientes rurais e queira fazer trilhos ou verdadeiramente conhecer a aldeia de Sistelo e as suas gentes. Não porque está na moda.
Veja algumas dicas para minimizar o impacto da visita a Sistelo, no final deste artigo.
O que ver e fazer em Sistelo (a minha experiência)
Honestamente, não creio que muita gente visite Sistelo unicamente por causa da aldeia; mas a verdade é que tem alguns pontos de interesse, para ver antes ou depois das caminhadas. Entre eles, o cruzeiro no Largo Visconde de Sistelo, a eira comunitária e seus espigueiros, a Casa do Castelo e a Igreja Matriz.
Largo Visconde de Sistelo
A não ser que chegue pela Ecovia do Vez, o Largo Visconde de Sistelo será, muito provavelmente, o primeiro espaço que conhecerá dentro da pequena malha urbana de Sistelo. Está bem cuidado, tem um cruzeiro e boas vistas sobre a Casa do Castelo.
Casa do Castelo de Sistelo
Um dos elementos arquitetónicos mais emblemáticos da aldeia é a chamada Casa do Castelo. Trata-se de um palácio com duas torres, edificado na segunda metade do século XIX por Manuel A. Gonçalves Roque, primeiro Visconde de Sistelo. Marca de forma indelével a paisagem da aldeia, mas desconheço se é possível visitar (quando lá passei não estava aberto ao público).
Espigueiros
No coração da aldeia, há um conjunto de espigueiros – outrora usados para secar e armazenar milho – ao qual é difícil ficar indiferente. Não se compara, naturalmente, aos conjuntos de espigueiros do Soajo ou do Lindoso; mas, ainda assim, são belos exemplares destes tradicionais celeiros de pedra.
Igreja Matriz do Sistelo
A Igreja Matriz fica no final da rua principal da aldeia. Não estava aberta quando fui visitar Sistelo, pelo que não posso falar a respeito. Consta, por exemplo, que nas suas traseiras se encontra um jazigo neoclássico pertencente ao primeiro Visconde de Sistelo. Fica a referência.
Passear pelos Passadiços de Sistelo (PR25 AVV)
Depois da elevação de Sistelo a Monumento Nacional, os chamados Passadiços de Sistelo são uma das principais razões do sucesso turístico da aldeia.
Trata-se de um passeio bonito e circular, com início na aldeia e apenas 2km de extensão (os passadiços propriamente ditos são menos de 1km, mas fazem parte da mais abrangente Ecovia do Vez) e isento de dificuldades; perfeito para fazer com crianças.
Para além dos passadiços de madeira construídos na margem do Rio Vez, o percurso calcorreia caminhos de pedra moldados pelos rodados dos carros de bois entre a aldeia e o rio.
Fazer o Trilho dos Socalcos de Sistelo (PR14 AVV)
O Trilho dos Socalcos de Sistelo é uma Pequena Rota muito agradável, com cerca de 5km de extensão ao longo de paisagens relativamente diversificadas.
Manda a verdade dizer, no entanto, que não tem a espetacularidade que eu estava à espera em função do nome dado ao percurso; até porque as melhores vistas dos socalcos têm-se a partir do chamado Miradouro dos Socalcos, por onde o trilho não passa. Tem também algumas centenas de metros feitas no asfalto da estrada nacional, facto que lhe retira algum interesse.
Tudo somado, e apesar de não ser o melhor trilho de Sistelo, não me arrependo de o ter feito. Até porque passa por paisagens bonitas, com algumas vistas para os socalcos e demais campos cultivados.
Veja o post sobre o Trilho dos Socalcos para conhecer melhor o passeio.
Fazer o Trilho das Brandas de Sistelo (PR24 AVV)
Infelizmente, já não consegui fazer o Trilho das Brandas de Sistelo, que passa pelo lugar de Padrão e pela Branda do Alhal. Se fosse hoje, teria provavelmente optado por fazê-lo em detrimento do Trilho dos Socalcos. Julgo que avaliei mal na hora de planear a visita a Sistelo. Terá de ficar para quando regressar à região, porventura em família.
Note que a primeira parte do trajeto é comum ao Trilho das Brandas e ao Trilho dos Socalcos, pelo que não é obrigatório decidir antecipadamente qual deles quer fazer. Tendo tempo e energia, continue a subir para as brandas.
Fazer o Trilho do Miradouro da Estrica (PR27 AVV)
Tradicionalmente conhecido como Penedo do Castelo, o Miradouro da Estrica caracteriza-se pelo facto de se desenvolver sobre uma rocha de grandes dimensões, proporcionando a quem empreende a caminhada vistas desafogadas sobre a região dos socalcos. Eu não tive tempo, mas fiquei com vontade de o fazer!
Ir ao Miradouro dos Socalcos (Porta Cova)
O Miradouro dos Socalcos tem acesso mais fácil (de carro) e oferece a melhor vista sobre os socalcos de Sistelo; concretamente os que se encontram nas encostas onde se localizam as povoações de Padrão e Porta Cova. Foi onde fiquei sem palavras perante a beleza da paisagem, com as nuvens a dançarem à minha frente, proporcionando jogos de luzes e sombras inacreditavelmente belos nos socalcos.
Não tenho dúvidas em dizer que valeria a pena visitar Sistelo apenas para ir ao Miradouro dos Socalcos!
Visitar a Branda do Alhal
Pode aproveitar a ida ao Miradouro dos Socalcos para conhecer a Branda do Alhal, local onde os pastores da região pernoitavam nos meses de verão. Infelizmente, tinha outros compromissos e várias coisas a fazer em Arcos de Valdevez, pelo que acabei por não ter tempo.
Nota sobre brandas e inverneiras
As brandas e as inverneiras são núcleos habitacionais temporários, típicos do antigo modo de vida em transumância. As populações deslocavam-se das suas habitações nos vales e outras zonas baixas, onde o frio não era tão intenso (as inverneiras), para as zonas mais altas da serra, onde abundavam pastos férteis para alimentar o gado (as brandas).
Era um sistema muito comum, por exemplo, nas serras do Soajo e da Peneda-Gerês, região onde continua a haver pessoas a praticar a transumância, alternando entre brandas e inverneiras ao longo do ano.
Dicas para usufruir da aldeia de Sistelo com menor impacto negativo
O turismo, por muito benéfico que seja, tem quase sempre impactos negativos; e cabe ao viajante minimizar os aspetos menos positivos da sua passagem por um destino. Eis, pois, algumas coisas que pode fazer para diminuir o impacto da sua visita a Sistelo.
- Evite visitar Sistelo durante o fim de semana ou nos feriados (é quando há mais gente na aldeia, na Ecovia do Vez e nos percursos pedestres).
- Fique a dormir em Sistelo (ou nas proximidades) – reserve aqui! Dessa forma, poderá conhecer uma faceta mais tranquila da aldeia; seja ao final da tarde ou de manhã cedo, antes da maioria dos turistas chegar a Sistelo.
- Dê preferência aos trilhos mais longos, como o Trilho das Brandas de Sistelo ou o Trilho dos Socalcos de Sistelo, em detrimento dos Passadiços de Sistelo. São menos frequentados.
- Não faça barulho nem leve sistemas de som para a aldeia.
- Respeite os moradores locais e as suas propriedades (Sistelo não é um museu).
- Não deixe lixo (nem deixe outros vestígios da sua passagem) nos trilhos.
Guia prático
Como chegar a Sistelo
Tendo como referência a cidade do Porto, a melhor forma de chegar a Sistelo é seguir pela A3 até Ponte de Lima e, daí, prosseguir pela IC28 e EN101 até Arcos de Valdevez. Depois, siga as indicações (EM505, EN202-2) e facilmente chegará a Sistelo. No total, são pouco mais de 120km de viagem.
Percursos pedestres em Sistelo: que trilho escolher
Em resumo, há quatro trilhos principais (mais a Ecovia) que pode fazer a partir de Sistelo, relativamente acessíveis a todos. A saber:
- PR 14 AVV – Trilho das Brandas de Sistelo (9km)
- PR 24 AVV – Trilho dos Socalcos de Sistelo (5km)
- PR 25 AVV – Trilho dos Passadiços de Sistelo (2km)
- PR 27 AVV – Trilho do Miradouro da Estrica (4,5km)
- Ecovia do Vez (troço de 11km, entre a Ponte de Vilela e a aldeia de Sistelo)
Eu optei por fazer o PR 24 de manhã, almoçar na aldeia, e depois o pequeno PR 25. Não sei se foi a melhor escolha, porque o caminho pelas brandas parece mais interessante do que o dos socalcos; e qualquer um deles dava para combinar com os passadiços, no mesmo dia.
Em resumo, se vai com crianças muito pequenas, fique pelos Passadiços de Sistelo. Se gosta de caminhar mas tem pouco tempo, o Trilho dos Socalcos pode ser uma boa opção; mas, em dias de muito movimento em Sistelo, talvez seja mais sensato optar pelo Trilho do Miradouro da Estrica. Por fim, se gosta de um bom desafio e tem mais tempo, siga o PR14 e suba até às brandas. Ou, claro, faça a Ecovia do Vez; seja a totalidade, a partir de Arcos de Valdevez (32km); seja a versão reduzida, começando na Ponte de Vilela (11km).
Onde dormir
Caso pretenda pernoitar em Sistelo e, dessa forma, vivenciar a aldeia praticamente sem turistas, o turismo rural Casa da Ferreirinha (no centro da aldeia) é das opções com melhor relação qualidade/preço.
Se, por outro lado, preferir dormir na vila de Arcos de Valdevez, saiba que há alguns hotéis muito interessantes. Desde logo, o Ribeira Collection Hotel, um hotel de grande qualidade e localização ideal. Hipótese mais criativa, embora mais afastada do centro de Arcos de Valdevez, é o belíssimo turismo rural Moinho do Ázere; alternativamente, a Quinta do Olival merece também toda a atenção.
Gastronomia e onde comer
Sendo uma aldeia pequena, não há muitas opções de restaurantes em Sistelo. Dito isto, tenho uma recomendação perfeita para um almoço bom e barato: Tasquinha Ti’Mélia.
Entrei por puro feeling, enquanto atravessava a aldeia após terminar o Trilho dos Socalcos de Sistelo; perguntei se tinha prato do dia e a resposta foi afirmativa. O que se seguiu foram momentos de puro prazer gastronómico: sopa de legumes deliciosa, um saboroso prato de carne estufada que dava (à vontade!) para duas pessoas, bebida e café. O preço é imbatível (creio que paguei 7€) e o pessoal simpático e prestável.
O Ti’Mélia só tem menu do dia durante a semana; ao fim de semana o serviço é à la carte. Os petiscos, esses, há todos os dias!
Seguro de viagem
A IATI Seguros tem um excelente seguro de viagem, que cobre COVID-19, não tem limite de idade e permite seguros multiviagem (incluindo viagens de longa duração) para qualquer destino do mundo. Para mim, são atualmente os melhores e mais completos seguros de viagem do mercado. Eu recomendo o IATI Estrela, que é o seguro que costumo fazer nas minhas viagens.